Acórdão nº 3174/03.5TBGDM.P1.S1 de Supremo Tribunal de Justiça (Portugal), 17 de Junho de 2010

Magistrado ResponsávelSALAZAR CASANOVA
Data da Resolução17 de Junho de 2010
EmissorSupremo Tribunal de Justiça (Portugal)

S Privacidade: 1 Meio Processual: REVISTA Decisão: CONCEDIDA A REVISTA Área Temática: DIREITO CIVIL - RESPONSABILIDADE CIVIL Doutrina: - Almeida Costa, Direito das Obrigações, 2009, pág. 619. - Joaquim de Sousa Ribeiro, “ O Ónus da Prova da Culpa da Responsabilidade Civil por Acidente de Viação”, 1980, pág. 7.

Legislação Nacional: CÓDIGO CIVIL (CC): - ARTIGOS 487.º, N.º1, 493.º, N.º 2, 494.º, 500.º, E 503.º . CÓDIGO DA ESTRADA: - ARTIGOS 2.º E 56.º . CÓDIGO DE PROCESSO CIVIL (CPC) : - ARTIGO 664.º .

Jurisprudência Nacional: ACÓRDÃO DO TRIBUNAL DA RELAÇÃO DE ÉVORA: - DE 29-11-2001- TAVARES PAIVA -, C.J.,5, PÁG. 253 ACÓRDÃO DO TRIBUNAL DA RELAÇÃO DE LISBOA: - DE 12-12-1996 - SOUSA DINIS -, C.J.,5, PÁG. 140. ACÓRDÃO DA RELAÇÃO DO PORTO: - DE 5-11-1991- CARDOSO LOPES -, B.M.J. 411-647 ACÓRDÃOS DO SUPREMO TRIBUNAL DE JUSTIÇA: - DE 29-1-2003 -LOUREIRO DA FONSECA -, REVISTA Nº 4338/02 -2.ª SECÇÃO; - DE 13-3-2008 - OLIVEIRA ROCHA -, C.J.,1, PÁG. 178. ASSENTOS DO SUPREMO TRIBUNAL DE JUSTIÇA: - DE 21-11-1979; - DE 14-4-1983, B.M.J. 326-302; - Nº 7/94, DE 2-3-1994, D.R.,N.º 98, I-A DE 28-4-1994; B.M.J. 435-40.

Sumário : I - O acidente num armazém de mercadorias aberto ao público ocorrido com uma empilhadora, veículo de circulação terrestre, que, quando o seu condutor efectuava manobra de marcha atrás, atingiu o lesado no momento em este escolhia mercadoria exposta para venda, tal acidente subsume-se ao disposto no art. 503.º do CC, devendo considerar-se, face a tais circunstâncias, que o condutor actuou com culpa efectiva.

II - O condutor do empilhador, que circulava com o veículo no exercício das suas funções por conta da entidade patronal, responderia sempre por culpa presumida nos termos do art. 503.º, n.º 3, do CC, respondendo o comitente nos termos do n.º 1 desse mesmo preceito.

III - É uma actividade perigosa a actividade de veículos de circulação terrestre; a não aplicabilidade a esta actividade do disposto no art. 493.º, n.º 2, do CC por força do assento de 21-11-1979, hoje com força de jurisprudência uniformizadora, segundo o qual “o disposto no artigo 493.º, n.º 2 do Código Civil, não tem aplicação em matéria de acidentes de circulação terrestre” não significa que tal actividade não seja perigosa. Por isso, nada obsta a que o disposto no art. 493.º, n.º 2, do CC seja aplicável às relações de comissão que se inscrevam no âmbito do art. 500.º do CC; seria sempre este o caso do acidente – atropelamento – ocorrido com uma empilhadora, veículo circulante em espaço fechado (armazém) conduzido por comissário se não se subsumisse tal acidente ao disposto no art. 503.º do CC.

IV - No caso de acidentes ocorridos com veículos em que à actividade perigosa de circulação acresce uma perigosidade especial, o mencionado assento de 1979 deve ser sujeito a interpretação restritiva, aplicando-se nesses casos, em razão dessa especial perigosidade, o regime contemplado no art. 493.º, n.º 2, do CC.

Decisão Texto Integral: Acordam no Supremo Tribunal de Justiça: 1.

AA demandou em acção declarativa com processo ordinário BB, entretanto falecido sendo habilitado como herdeiro seu filho CC, DD- D... - Comércio e Representações de Produtos para o Lar, S.A. e EE- I... B... - Companhia de Seguros, S.A. pedindo a condenação dos réu no pagamento de 146.808,56€ com juros, à taxa legal, que se vencerem desde a citação até efectivo pagamento.

  1. O pedido de indemnização respeita aos prejuízos físicos e morais sofridos pelo autor que no dia 9-3-2002, quando se encontrava no armazém da ré a escolher artigos que pretendia adquirir, sofreu o embate da traseira de uma empilhadora que estava a ser manobrada pelo empregado da ré DD-D... que o atingiu com a violência da marcha atrás na perna esquerda.

  2. Invocou o autor os seguintes danos patrimoniais num total de 86.808,56€, a que acrescem 60.000,00 de danos morais, assim discriminados: a) 14.663,50€ durante o período de incapacidade absoluta para o trabalho.

    1. 49.200,00€ pela IPP de 15% para o trabalho.

    2. 20.000,00€ dano por não conclusão de curso.

    3. 578,62€ custo de inscrição no curso.

    4. 75,00€ pelas calças e sapatos estragados.

    5. 2.291,44€ de transportes, taxas moderadoras e medicamentos.

  3. A acção foi julgada parcialmente procedente em 1ª instância nestes termos: - Os réus BB, DD-D... -Comércio e Representações de Produtos para o Lar, S.A. e EE- I... B... - Companhia de Seguros, S.A. foram condenados a pagar ao A. a quantia de 20.075,00€ [20.000,00€ de danos morais + ver (e) infra) ] com juros de mora, à taxa legal, desde a citação até integral pagamento.

    - Os réus BB e DD-D... - Comércio e Representações de Produtos para o Lar, S.A. foram condenados a pagar ao A. AA a quantia de 56.231,35€ [ (a)+(b) infra] acrescida de juros de mora à taxa legal, desde a citação, até integral pagamento.

    Dos valores reclamados a sentença reconheceu, a título de danos morais 20.000,00€ e a título de danos materiais os montantes a seguir indicados, encontrando-se entre parêntesis rectos os valores peticionados: a) [14.663,50] — 14.663,50€ b) [49.200,00€] — 41.567,85€ c) [20.000,00€] — não atribuído d) [578,62€] — não atribuído e) [75,00€] — 75,00€ f) [2.291,44€] - não atribuído por não provado: ver resp. ao Q13 e alínea I).

  4. O A. AA e a ré D-DD... recorreram para o Tribunal da Relação do Porto que julgou procedente a apelação da ré por entender que não está provada a culpa do condutor do empilhador, absolvendo-a do pedido, improcedendo, em consequência, a apelação do autor.

  5. O autor interpôs recurso de revista para o Supremo Tribunal formulando as seguintes conclusões: 1- No dia 9 de Março de 2002, pelas 11.20, o A. estava dentro do armazém da ré DD-D..., sito na Z... I... do P..., n.º ..., S. P... da C..., Gondomar a fim de comprar artigos para a loja da sua esposa.

    2- Quando o A. se encontrava a escolher os artigos que pretendia, junto das respectivas prateleiras, acompanhado pela empregada da esposa, FF, foi embatido pela traseira da empilhadora que estava a ser manobrada pelo réu BB que, ao efectuar uma manobra de marcha atrás no corredor entre as prateleiras, atingiu-o na perna esquerda; resultando destes factos presunção legal simples de culpa (aparente) pelo que cabia ao condutor BB fazer a contraprova , que não conseguiu, conforme respostas dadas aos quesitos 24º e 25º.

    3- Em consequência do embate, o A. sofreu as lesões e danos comprovados na sentença de 1º instância, na matéria assente, respostas aos quesitos, alegações de apelação e constantes das conclusões da alegação da apelação, designadamente, fractura distal da tíbia e do perónio, à esquerda, que lhe causaram uma incapacidade permanente geral de 10%.

    4- O réu BB, no dia do acidente, estava a trabalhar na condução da empilhadora, sob as ordens, direcção e fiscalização da ré DD-D... e no horário de trabalho que lhe tinha estabelecido.

    5- Por acordo titulado pela apólice n.º ME..., a ré DD- D... transferiu para a EE-I...B..., Companhia de Seguros, a responsabilidade civil contra terceiros resultante de acidentes causados dentro do seu armazém por máquinas e outros objectos ou pessoas.

    6- A EE- I... B... pagou ao Hospital de S. João do Porto as despesas inerentes ao tratamento e intervenções ministradas ao A. em consequência do acidente em questão e não interpôs recurso da sentença de 1ª instância, concordando com ela.

    7- A ré EE- I...B... pagou ainda ao A. pelo menos a quantia de 2037€ respeitante a taxas moderadoras, remédios e transportes aos hospitais.

    8- A manobra de marcha atrás no corredor entre prateleiras onde o A. se encontrava com outros clientes a fazerem compras impunha ao condutor da empilhadeira que tomasse os cuidados adequados às circunstâncias de modo a que não colhesse essas pessoas como o faria um bom pai de família.

    9- Um bom pai de família, nas mesmas circunstâncias externas do réu BB, teria procedido de outro modo: não circulava dentro do armazém entre prateleiras sem primeiro se certificar que, nesse corredor, não se encontrava ninguém, o que não fez.

    10- Assim , o acidente que vitimou o A. deveu-se a culpa efectiva do réu BB por ter violado o disposto no artigo 487.º/2 do Código Civil: não agiu conforme teria procedido, naquelas circunstâncias um bom pai de família, um homem de diligência normal considerado em abstracto.

    11- De resto, no domínio da responsabilidade civil por factos ilícitos, basta , para provar a culpa, que o prejudicado estabeleça os factos que, segundo os princípios da experiência geral, tornem muito verosímil a culpa, cabendo ao lesante fazer a contraprova: esses factos encontram-se assentes conforme as conclusões precedentes designadamente a segunda (Ac. do S.T.J. de 20-12-1990, B.M.J. 402-558).

    12- Se a prova da presunção judicial produzida pelo lesado apontar no sentido da culpa do lesante, como no caso sub judice, cabe a este o ónus da contraprova, que não fez, aliás, no caso sub judice (respostas dadas aos quesitos 24º e 25º da base instrutória).

    13- Mas, sem prescindir, se não for considerado que o réu BB teve culpa efectiva na produção do acidente sub judice há então que admitir que a circulação de uma empilhadeira de marcha atrás pelos corredores entre prateleiras do armazém comercial da ré, DD-D..., aberto ao público e cheio de clientes a escolher artigos para o lar, constitui uma actividade perigosa por criar para terceiros uma probabilidade de perigo maior que a normal para causar danos.

    14- No caso em questão, o réu BB conduzia a empilhadeira dentro do estabelecimento comercial da ré DD-D... pelos corredores entre prateleiras, de marcha atrás, quando se encontrava aberto ao público e nele estavam vários clientes a escolher e a comprar artigos incluindo o autor.

    15- Os clientes do...

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