Acórdão nº 1336/06.2TBBCL-G.G1.S1 de Supremo Tribunal de Justiça (Portugal), 20 de Maio de 2010

Magistrado ResponsávelALBERTO SOBRINHO
Data da Resolução20 de Maio de 2010
EmissorSupremo Tribunal de Justiça (Portugal)

S Privacidade: 1 Meio Processual: REVISTA Decisão: NEGADA A REVISTA Sumário : 1. Toda a impugnação da lista de credores reconhecidos referente à inclusão ou exclusão de créditos, seus montantes e qualificação a eles atinentes, tem que ser obrigatoriamente deduzida no momento processual a que se reporta o nº 1 do art. 130º.

Não tendo sido apresentada qualquer oposição, dentro desse prazo, aos créditos, e sua qualificação e montantes, dos credores incluídos na respectiva lista têm de se ter por reconhecidos e não mais podem ser já questionados, limitando-se a sentença, então, a homologar essa lista, atribuindo-se efeito cominatório à falta de impugnações.

Precludido fica o direito a impugnar posteriormente a existência e quantitativos desses créditos.

  1. Das disposições combinadas dos arts. 442º e al. f) do nº 1 do art. 755º decorre linearmente que o promitente-comprador que obtém a traditio da coisa goza do direito de retenção, no caso de incumprimento imputável à outra parte.

    Este direito real de garantia confere ao seu titular a faculdade de recusar a entrega da coisa enquanto o devedor não cumprir, assim como a de se pagar pelo valor dela, com preferência sobre os demais credores.

    A alteração legislativa que redundou no aditamento da al. f) ao nº 1 do art. 755º foi introduzida tendo em vista a defesa do consumidor, mas visando também, em alguma medida, dinamizar o mercado de construção.

    Depois, as normas foram ditadas por necessidade de salvaguarda de interesses constitucionalmente protegidos, tal como emerge do art. 60º da Constituição ao preconizar que os consumidores têm direito à protecção dos seus interesses económicos, e a que o legislador entendeu dar prevalência ao conferir primazia ao direito de retenção sobre a hipoteca.

    Por outro lado, quando a coisa é logo entregue ao promitente-comprador, antes, portanto, da celebração do contrato definitivo, é-lhe criada uma mais forte expectativa na concretização do negócio, pelo que se justifica, postulado pela boa fé, que lhe corresponda uma segurança acrescida.

    Finalmente, não é consagrada qualquer diferenciação subjectiva quanto ao modo de satisfação dos créditos sobre o património do devedor, limitando-se o legislador a introduzir um mecanismo regulador de satisfação simultânea desses créditos.

    Estas normas não afrontam quer o princípio da proporcionalidade acolhido no art. 18º, n.º 2, da Constituição, quer o princípio da confiança e da segurança jurídica consagrados no art. 2º da Constituição, quer o princípio da igualdade explicitado no art. 13º da Constituição.

    Decisão Texto Integral: Acordam no Supremo Tribunal de Justiça: I. Relatório Por sentença de 5 de Junho de 2006, transitada em julgado, foi declarada a insolvência de AA & Filhos, Ldª, após o que o Administrador da Insolvência apresentou a lista dos créditos reconhecidos e não reconhecidos, nos termos do disposto no art. 129º Código da Insolvência e da Recuperação de Empresas.

    Dos créditos reconhecidos foram impugnados os créditos de BB e CC, questionando-se que tivessem entrado na posse da fracção que prometeram comprar à insolvente antes da declaração de insolvência, e de DD, Ldª, defendendo o próprio que o seu crédito, reconhecido como comum, devia antes ser reconhecido como garantido por gozar de direito de retenção sobre a fracção prometida comprar.

    Na tentativa de conciliação realizada, estes créditos não obtiveram reconhecimento.

    Elaborado o despacho saneador, teve lugar depois a audiência de julgamento, após o que foi proferida sentença, a 1 de Julho de 2008, que julgou reconhecidos, além dos créditos assim considerados pelo Administrador, também os créditos impugnados, após o que procedeu à sua graduação.

    Relativamente ao prédio descrito na Conservatória do Registo Predial de Barcelos, sob o nº ...

    , foi determinado o pagamento a vários credores reconhecidos com crédito garantido por direito de retenção sobre as fracções “AB”, “AJ”, “J”, “AA”, “P”, “AL”, “M”, “X”, “R”, “BD”, “AC”, “AE”, “AM”, “F”, “BE”, “AN”, “I”, “AI”, “Q”, “A”, “AO”, “T”, “AD”, “B”, “Z”, “S”, “BC”, “CB”, “AZ”, “U”, “AG” e “F”, respectivamente, antes e com preferência sobre os créditos da “Caixa ..., S.A.” garantidos por hipoteca voluntária.

    Não se conformando com o decidido apelou o credor hipotecário Caixa ..., pugnando pela inconstitucionalidade da norma que fundamentou a graduação preferencial dos credores garantidos por direito de retenção, bem como pela inexistência desse direito de retenção.

    O Tribunal da Relação de Guimarães julgou, porém, improcedente o recurso, confirmando a sentença recorrida.

    Ainda irresignada recorre agora de revista para o Supremo Tribunal de Justiça, continuando a defender que os créditos dos promitentes-compradores não gozam de garantia e que eles apenas têm direito ao recebimento do sinal em singelo, bem como a inconstitucionalidade do nº 2 do art. 759º C.Civil.

    Os recorridos mantiveram as contra-alegações apresentadas no recurso de apelação, para elas remetendo, pugnando pela manutenção do decidido.

    Colhidos os vistos legais, cumpre apreciar e decidir II. Âmbito do recurso A- De acordo com as conclusões, a rematar as respectivas alegações, o inconformismo da recorrente radica, em síntese, no seguinte: 1- A decisão proferida em primeira instância e confirmada pelo acórdão recorrido, relativamente às fracções do prédio descrito na Conservatória do Registo Predial de Barcelos sob o n° ..., reconheceu aos promitentes-compradores um crédito equivalente ao dobro do sinal prestado, graduando-o acima do crédito hipotecário da C..., por se encontrar garantido por direito de retenção, nos termos estabelecidos na alínea f), do n° 1, do art° 755° do Código Civil.

    2- As promessas de compra e venda relativas às parcelas daquele prédio são de natureza meramente obrigacional, porquanto não foram celebradas por escritura pública nem sujeitas a registo, não tendo a aposição de eficácia real sido, sequer, alegada.

    3- À data da declaração de insolvência estes contratos-promessa encontravam-se, ainda, em curso, apesar de mora contratual do promitente-vendedor.

    4- Como nenhum dos contratos possui convenção de resolução, a conversão de mora em incumprimento definitivo teria sempre de obedecer à disciplina do art° 808° do C.Civil, limitando-se os credores a reclamar o cumprimento integral das obrigações contratuais assumidas e, subsidiariamente, o pedido de devolução em dobro do sinal prestado para a hipótese do não cumprimento dos contratos.

    5- As promessas de compra e venda em apreço deverão ser apreciadas à luz do estatuído nos art° 102° a 119° do CIRE, por dizerem respeito a negócios em curso à data da declaração de insolvência.

    6- O Administrador recusou o cumprimento destes contratos ao reconhecer aos promitentes compradores o seu pedido subsidiário de devolução do sinal em dobro sem o sujeitar à condição do não cumprimento do contrato, e ao facto das fracções terem sido vendidas a terceiro (que não promitentes-compradores) em sede de liquidação do património da massa insolvente.

    7- Em sede de principio geral introduzido pelo art. 102º CIRE, optando o Administrador de Insolvência pela recusa do cumprimento do negócio em curso, por entender ser mais vantajoso para a pluralidade de credores, o valor da indemnização à contraparte fica limitado ao dano provocado, ainda que com significativas restrições.

    8- Para além de que o crédito indemnizatório resultante da opção pelo não cumprimento do contrato é um crédito sobre a insolvência (art° 102°, n° 3, alínea d), iii)), de natureza comum.

    9- Sendo imperativas as disposições constantes dos art°s 102° a 118°, enfermando de nulidade qualquer convenção ou cláusula que exclua ou limite o seu âmbito de aplicação.

    10- Nos casos de promessa com eficácia real, o nº 2 do art. 164º-A do CPEREF consignava o direito do promitente-comprador à celebração do contrato ou à respectiva execução específica, mantendo o falido promitente alienante vinculado à celebração do negócio, sendo esta norma adoptada pelo legislador do CIRE que, com a introdução do requisito da tradição, a consagrou no art° 106°, atribuindo assim ao contrato-promessa de compra e venda com eficácia real e com traditio um tratamento especial (o do art° 106°) e diferenciado (por referência á regra geral do art° 102°).

    11- Já nos casos de promessa sem eficácia real, aquele art° 164°-A, no seu n° 1, postulava a regra da respectiva extinção ipso iure com a declaração de falência, com restituição ao promitente-comprador do dobro do sinal prestado.

    12- Ora, tendo o legislador do CIRE fixado um regime geral para os efeitos da declaração de insolvência sobre os negócios em curso ao qual atribui natureza imperativa (salvo as excepções consagradas no próprio CIRE) e tendo tomado a opção expressa de não consignar qualquer regime especial ou de excepção (de entre os elencados nos art°s 103° a 118°) para o contrato-promessa sem eficácia real (com ou sem traditio), é aplicável ao contrato-promessa sem eficácia real o regime geral do art° 102º.

    13- E assim, o promitente-comprador sem eficácia real tem, como crédito indemnizatório de natureza comum, o direito ao recebimento...

Para continuar a ler

PEÇA SUA AVALIAÇÃO
1 temas prácticos
1 sentencias

VLEX uses login cookies to provide you with a better browsing experience. If you click on 'Accept' or continue browsing this site we consider that you accept our cookie policy. ACCEPT