Acórdão nº 158/06.5TCFUN.L1.S1 de Supremo Tribunal de Justiça (Portugal), 19 de Maio de 2010

Magistrado ResponsávelFONSECA RAMOS
Data da Resolução19 de Maio de 2010
EmissorSupremo Tribunal de Justiça (Portugal)

S Privacidade: 1 Meio Processual: REVISTA Decisão: NEGADA A REVISTA DA AUTORA, CONCEDIDA PARCIALMENTE À RÉ Sumário : I) Pese embora o contrato-promessa, art. 410º do Código Civil, ser um contrato-preliminar ele não deixa de ser um contrato completo, podendo ser incumprido e as partes terem interesse no seu cumprimento, mesmo se já tiver sido celebrado o contrato definitivo se com essa celebração não se esgotar o clausulado no pré-contrato.

II) - A para das normas do regime especial do contrato-promessa – arts. 410º, 442º e 830º do Código Civil – são-lhe aplicáveis, na parte compatível as regras gerais dos contratos – mormente os arts. 406º, nº1, 798º, 799º, 801º e 808º do Código Civil.

III) – Se num contrato promessa bilateral, onde foi colocada a cargo de uma das partes a marcação da data da celebração da escritura pública de compra venda, prazo que as partes não demonstraram ser um prazo fixo, peremptório, que, se vencido frustrasse desde logo a utilidade económica do contrato, a simples mora adveniente da não marcação da escritura na data prevista, ou a impossibilidade de pagar o IMT, competisse este pagamento aos compradores (como é usual) ou aos vendedores, não permite afirmar que o atraso na marcação da escritura implique ipso facto incumprimento definitivo.

IV) - Importaria converter a mora em incumprimento definitivo, fosse pela interpelação admonitória – que a promitente compradora não fez – fosse pela alegação e prova de factos que demonstrassem da sua parte, a perda objectiva de interesse na prestação dos promitentes vendedores – arts. 801º e 808º do Código Civil, com fundamento na mora.

  1. Entendem, maioritariamente, a doutrina e a jurisprudência que o pressuposto da execução específica consentida pelo art. 830º, nº1, do Código Civil é a mora.

    VI) Sendo deontologicamente censurável a actuação da Mandatária da Autora, que invocou ser Advogada dos RR. para obter uma certidão fiscal relativa à situação tributária destes, almejando, assim, prova que certificava a existência de dívidas ao Fisco, tendo essa prova sido obtida ilicitamente, tal não implica que os factos certificados nesse documento autêntico, não arguido de falsidade, não possam ser considerados probatoriamente.

    VI) No direito probatório processual civil não vigora, salvo casos excepcionais, o princípio do direito anglo-saxónico denominado “fruits of poisenous tree” – frutos da árvore envenenada, segundo o qual seriam contaminadas todas as provas obtidas com base numa actuação ilícita quanto ao modo como foram obtidas - se a árvore está envenenada, envenenados estão os frutos que produzir.

    Decisão Texto Integral: Acordam no Supremo Tribunal de Justiça AA, Lda., propôs, em 23.2.2006, acção declarativa de condenação seguindo forma ordinária, distribuída à Vara de Competência Mista do Funchal, contra: - BB- Fabricação de Produtos de Betão Unipessoal, Lda., - CC.

    Pedindo se decrete a resolução, por alegado incumprimento das RR., de contrato promessa de compra e venda de diversos prédios rústicos, com aquelas celebrado, e consequente condenação das mesmas a pagar-lhe indemnização equivalente ao dobro do sinal prestado, acrescida de juros, desde a interpelação respectiva.

    Contestaram as RR., imputando à Autora o incumprimento do referido contrato – concluindo pela improcedência da acção e pedindo, em reconvenção, se declare transmitida a propriedade dos prédios em causa, condenando-se a Autora a pagar o resto do preço acordado e, subsidiariamente, na perda, a favor das RR., do sinal entregue.

    Requerida a intervenção, como parte principal, de DD e mulher EE, vieram estes declarar fazer seus os articulados apresentados pelas RR.

    Efectuado julgamento, foi proferida sentença, na qual se consideraram a acção e a reconvenção improcedentes, absolvendo-se A. e RR. dos pedidos formulados.

    Inconformadas, todas as partes apelaram para o Tribunal da Relação de Lisboa que, por Acórdão de 19.11.2009 – fls. 655 a 663 –, negou provimento aos recursos, confirmando a decisão recorrida.

    Inconformados Autora e RR. recorreram para este Supremo Tribunal de Justiça A Autora “AA, alegando, formulou as seguintes conclusões (fls.712 a 713): I) - Dada a matéria de facto provada e assente, às Rés deverão ser imputadas as consequências da não realização da escritura de compra e venda dos prédios objecto do contrato cessão da posição contratual e do contrato promessa.

    II) – Com efeito, provado que a não liquidação do IMT se deveu à existência de dívidas fiscais por parte dos vendedores, aqui Rés, não se pode concluir que a não realização da escritura de compra e venda a eles não é imputável, atendendo a que foi esse facto que obstou à realização das escrituras de compra e venda prometidas.

    III) – A Autora tudo fez para cumprir com o contrato-promessa.

    IV) – A Autora tudo fez, peio menos o que lhe era exigível, para liquidar o IMT.

  2. - Não fazer recair sobre as Rés as consequências da não liquidação do IMT, atendendo a um facto que lhe é imputável, é grave e contratualmente injusto.

    VI) – Não é igualmente tolerável que atenta aos factos dados como provados, a Autor seja obrigada a cumprir o contrato-promessa, desde logo, à perda de interesse na contratação, e depois pela impossibilidade de concretizar o negócio, o qual ficaram ambos demonstrados.

    VII) – As RR. não cumpriram com as suas obrigações tributárias, nomeadamente as referidas nos artigos 59° e 78° do Código de Procedimento e Processo Tributário.

    VIII) – Assim a decisão, atendendo à matéria dada como provada, deveria ser outra.

    IX) - A de imputar às RR. o não cumprimento culposo do contrato prometido, ou seja, a não outorga da escritura de compra e venda, com as legais consequências.

  3. – A decisão recorrida efectuou inadequado enquadramento do caso sub judice, aos arts. n°442º, n°2, art. 804°, n°2, n°1, art. 808°, 813°, todo do Código Civil, devendo, atendendo aos factos dados como provados, pugnar-se pela condenação das RR. nos termos peticionados na P.I..

    XI) – Mantendo a decisão, desfecha a acção numa flagrante injustiça, premiando as RR. que nada fizeram com vista a celebração do contrato prometido sendo, aliás, por sua culpa a responsabilidade a sua não concretização.

    Termos em que deve ser dado provimento ao presente recurso, e, em consequência, revogar-se a decisão proferida, consequente à resolução do contrato nos termos peticionados.

    Os recorrentes/intervenientes, DD e mulher EE alegando formularam as seguintes conclusões: 1) – Tendo em conta a matéria dada como provada em primeira instância e confirmada pelo douto acórdão, não se pode concluir que a não celebração da escritura de compra e venda não pode ser imputável única e exclusivamente à autora.

    2) – A matéria dos quesitos 9°, 10°, 22°, 23°, 26°, 27°, 28° e 29°, todos da base instrutória, assentam na certidão obtida junto do Serviço de Finanças de Câmara de Lobos e que consta em fls.40 a fls.43 dos autos.

    3) – Tal certidão (a de fls.40 a 43 dos autos) não contém factos reais.

    4) – E a resposta positiva à matéria dos quesitos, 9°, 10° e 22° que (correspondem, respectivamente, às alíneas Z), AA) e MM) dos factos provados e que se encontram discriminados na douta sentença confirmada pelo douto acórdão) assentou na certidão de fls.40 a 43 dos autos.

    5) – A obtenção de tal certidão, constitui uma manifesta violação do sigilo fiscal, protegido pelo artigo 64° da Lei Geral Tributária e pelo n°l do artigo 26° da Constituição da República Portuguesa.

    6) – O Sr. Juiz “a quo”, por diversas vezes, diligenciou junto de diversos Serviços de Finanças e da Direcção Regional dos Assuntos Fiscais, no sentido de, oficiosamente, obter diversas informações.

    7) – Consta averbado nas cadernetas prediais rústicas o nome das Rés e desde, pelo menos, o primeiro trimestre do ano de 2004, sendo que a data prevista para a outorga da escritura seria até ao final do mês de Junho de 2004.

    8) – Os Apelantes consideraram que a resposta aos factos constantes dos artigos 9°, 10°, 22°, 23°, 26°, 27°, 28° e 29°, todos da base instrutória, deveriam ter-se por não escritos, por assentarem em actos proibidos por Lei, violadores de normas jurídicas de ordem pública, tendo o Sr. Juiz “a quo”, violado a 2ª parte da alínea d) do n°l do artigo 668° do Código de Processo Civil, por ter conhecido questões que não podia tomar conhecimento.

    9) – Para além de que constituem matéria conclusiva e contém valorações jurídicas, não quesitáveis.

    10) – Entendem os Apelantes que o Tribunal só teria de se pronunciar sobre factos, nos termos do n°4 do artigo 646° e artigo 653°, ambos do Código de Processo Civil, pelo que a matéria constante em tais quesitos (os quesitos 9°, 10°, 22°, 23°, 26°, 27°, 28° e 29°, todos da base instrutória) não podia ter sido objecto de demonstração.

    11) Os Apelantes colocaram também sob censura, a sentença “a quo” confirmada pelo douto acórdão, pelo facto de terem sido condenadas no pagamento da totalidade das custas do pedido reconvencional.

    12) – De facto, a Autora deduziu o incidente de intervenção principal dos chamados ora Apelantes DD e mulher DD que foi deferido.

    13) – Os referidos DD e mulher EE, ora Apelantes, declararam fazerem seus os articulados apresentados pelas Rés BB e CC 14) — Logo, tendo decaído a Reconvenção, as custas da mesma deverão recair, por uma questão de justiça, proporcionalmente sobre os Apelantes, nos termos, entre outros, do n°l e 2 do artigo 308°; n°2 do artigo 446°, ambos do Código de Processo Civil.

    15) – Os Apelantes entendem que a Apelada demonstrou nos seus articulados, de forma inequívoca e séria, que não pretende cumprir com o que se obrigara, o que justifica o recurso à execução específica dos contratos promessa de compra e venda e da cessão da posição contratual.

    16) – Tal vontade séria em não cumprir constitui uma manifesta interpelação admonitória.

    17) – Ambos os contratos admitem expressamente a possibilidade da sua execução específica, tal como consta dos factos assentes.

    18) – A Apelada não fez o que devia ter feito para...

Para continuar a ler

PEÇA SUA AVALIAÇÃO
3 temas prácticos
3 sentencias

VLEX uses login cookies to provide you with a better browsing experience. If you click on 'Accept' or continue browsing this site we consider that you accept our cookie policy. ACCEPT