Acórdão nº 50/07.6TBCRZ.P1.S1 de Supremo Tribunal de Justiça (Portugal), 23 de Fevereiro de 2021

Magistrado ResponsávelFERNANDO SAMÕES
Data da Resolução23 de Fevereiro de 2021
EmissorSupremo Tribunal de Justiça (Portugal)

Processo n.º 50/07.6TBCRZ.P1.S1[1] * Acordam no Supremo Tribunal de Justiça – 1.ª Secção[2]: I. Relatório No processo especial de inventário por óbito de AA, falecida em 2/1/1999, requerido em 15/3/2007, em que exerce o cargo de cabeça de casal o seu filho BB, apresentada a relação de bens e resolvidas as questões suscitadas susceptíveis de influir na partilha e determinados os bens a partilhar, depois de várias vicissitudes, iniciou-se a conferência de interessados, no dia 22/9/2016.

Nessa conferência, em que estiveram todos presentes e/ou representados, foi, além do mais, submetido à aprovação dos interessados o passivo relacionado, tendo este sido aprovado apenas pelo cabeça-de-casal, manifestando os demais interessados oposição a essa aprovação. Após essas manifestações, foi proferido o despacho que, na parte que aqui interessa, decidiu o seguinte: «… No que concerne às despesas referidas na verba número um, despesas do funeral, as quais se encontram documentadas a fls. 284 e 285, constando ainda a fls. 383 a informação da Caixa Geral de Aposentações quanto ao montante recebido pelo cabeça de casal a título de subsídio de funeral, também quanto a esta se afirma que, pese embora a factura e o recibo estejam emitidos ao cabeça de casal, nada nos autos resulta que tal despesa tenha sido suportada por si. Por estas razões concluímos que a questão não pode ser resolvida com segurança pela análise dos documentos apresentados pelo que se decide não reconhecer o passivo relacionado, o qual apenas será imputado ao cabeça de casal na sua quota-parte - artºs 1354º, 1355º e 1356º do C. P. Civil de 1961.» Na sessão seguinte da conferência de interessados, realizada em 21/3/2018, todos os interessados procederam à licitação de alguns dos bens da herança, ficando por licitar vários bens imóveis e móveis.

Na respectiva acta, consta que: «[…] tiveram início as respectivas licitações, com o seguinte resultado final: Os bens móveis constantes das verbas 1-A a 1-N, da relação de bens de fls. 758 a 768, não foram licitados, ficando em comum, sem determinação de parte ou direito para todos os interessados na proporção dos seus quinhões, pelo valor global de €855,00.

» A seguir consta a indicação dos bens que foram licitados, por quem e por que valor, e dos 14 bens imóveis que não foram licitados.

Após, refere-se que: «… pela Mma. Juiz foi proferido o seguinte despacho: Relativamente aos bens não licitados os mesmos serão adjudicados em comum, sem determinação de parte ou direito a todos os interessados na proporção dos seus quinhões, pelo valor da relação de bens. […] Notifique.

» Segue-se a menção de que «todos os presentes foram devidamente notificados, do que disseram ficar bem cientes, sendo de seguida encerrada a presente conferência de interessados.

» Após a dita conferência, o cabeça-de-casal juntou aos autos um requerimento que termina pedindo: «(i) devem ser notificados os interessados, nos termos do art.º 1373º/1, com referência ao art.º 1348º/1 do CPC, na redacção anterior à Lei nº 41/2013, para serem ouvidos sobre a forma da partilha; (ii) devem ser anulados os despachos … [refere-se aos segmentos da acta da conferência de interessados antes assinalados], por preterição de formalidades prévias prescritas na lei de processo, que influenciam o exame e decisão da causa, no caso a notificação e audição prévia dos interessados sobre a forma da partilha (art.ºs 195º/1 do novo CPC e 1373º/1 do velho CPC).» Este requerimento foi indeferido, com o fundamento de que na prolação de tais despachos não foi cometida qualquer nulidade e ainda não era chegado o momento da notificação requerida.

O cabeça-de-casal apresentou ainda recurso dos despachos proferidos na conferência, recurso que não foi admitido por se ter entendido que tais decisões apenas podiam ser impugnadas no recurso da sentença homologatória da partilha.

Seguidamente, foi ordenada e realizada a notificação dos «interessados nos termos e para os efeitos do disposto no art.º 1373.º, n.º 1 do Código de Processo Civil de 1961».

O cabeça-de-casal pronunciou-se sobre a forma à partilha, manifestando, entre outras coisas, que «os bens licitados são adjudicados ao respectivo licitante - art.º 1374º, a) do velho Código de Processo Civil» e que «não existindo situação subsumível à al. b), os bens restantes não licitados serão adjudicados a todos os interessados, em comum, mas na proporção necessária ao integral preenchimento dos respectivos quinhões.

» O interessado CC pronunciou-se igualmente sobre a forma à partilha defendendo, entre outras coisas, que «a composição dos quinhões deverá ser efectuada de acordo com o resultado das licitações, adjudicando aos interessados os bens que respectivamente licitaram, sendo que quanto aos bens não licitados, de harmonia com o determinado durante a conferência de interessados, deverão ser adjudicados em comum sem determinação de parte ou direito a todos os interessados e na proporção dos respectivos quinhões pelos valores (actualizados) da Relação de bens; o crédito/dinheiro deverá ser adjudicado aos interessados na proporção dos respectivos quinhões.» Foi proferido despacho determinativo da partilha, onde, quanto ao preenchimento dos quinhões, se determinou somente a sua realização «de acordo com as licitações e o demais decididos na conferência de interessados – cfr. atas da conferência de interessados».

Foi elaborado mapa informativo com a alegação de que face ao modo como se ordenou o preenchimento dos quinhões existem herdeiros que receberão bens de valor superior à respectiva quota, tornando-se devedores de tornas.

Notificado desse mapa e do despacho determinativo da partilha, o cabeça-de-casal apresentou arguição de nulidade do mesmo por omissão de pronúncia sobre as questões por si levantadas sobre o modo de preenchimento dos quinhões.

Esta arguição de nulidade foi desatendida com o fundamento de que «as questões nas quais este suporta a invocação de tal vício foram resolvidas na conferência de interessados, conforme a acta que documenta tal acto o atesta e aí o cabeça-de-casal não levantou qualquer objecção.

» Foi reclamado o pagamento das tornas e os devedores das mesmas foram notificados para as depositarem, não o tendo feito.

Foi ordenada a elaboração do mapa da partilha, o qual foi elaborado e, de seguida, posto em reclamação.

Por fim, em 14/11/2019, foi proferida sentença homologatória da partilha constante daquele mapa, «…adjudicando aos interessados os respetivos bens ali aformalados e condenando os devedores de tornas no seu pagamento aos interessados credores.

Custas a cargo dos interessados, nos termos do art.º 1383.º do Código de Processo Civil.

Registe e notifique».

Inconformado, o cabeça-de-casal apresentou recurso de apelação, dizendo fazê-lo da sentença homologatória da partilha e ainda das seguintes decisões: a) despacho proferido em 22-09-2016, durante a conferência de interessados, que não aprovou o passivo da herança reclamado a título de despesas de funeral; b) despachos proferidos em 21-03-2018, durante a conferência de interessados, sobre a distribuição dos bens não licitados; c) despacho proferido em 03-05-2018 que indeferiu a arguição de nulidade dos despachos proferidos em 21-03-2018; d) despacho determinativo da partilha proferido em 04-09-2018.

O Tribunal da Relação …. admitiu o recurso interposto e, por acórdão de 14/7/2020, os Ex.mos Juízes Desembargadores que integram o respectivo colectivo deliberaram julgar o mesmo parcialmente procedente, pelo que: “

  1. Declaram verificada, para efeitos do presente inventário, a existência das despesas da herança reclamadas pelo cabeça-de-casal a que se reporta a factura e o recibo respeitantes a despesas com o funeral; b) Determinam que o preenchimento dos quinhões com os bens móveis e imóveis não licitados se faça através da definição de lotes e realização de sorteios conforme acima especificado; c) Determinam a anulação do processado a partir do mapa determinativo da partilha, o qual deverá ser reformulado em função do ora decidido, praticando-se a seguir os restantes actos processuais previstos na lei.

    Custas do recurso pelo recorrente e pelos recorridos na proporção de metade.” Ainda não conformado, o cabeça de casal BB interpôs recurso de revista e apresentou a correspondente alegação que terminou com as seguintes conclusões: “

    1. O Acórdão recorrido deliberou, sob a al. b) do dispositivo, conjugado com remis-são para fls. 18 e 19 do Acórdão, que o preenchimento dos quinhões dos interessados, todos eles licitantes em valor insuficiente ao limite dos respetivos quinhões, deverá ser feito mediante a definição de 2 lotes com os bens não licitados e realização de sorteios.

    2. No caso do Recorrente, titular de um quinhão de metade da herança, tal significa-rá a atribuição de metade dos bens não licitados, o preenchimento excessivo do quinhão e a repetição da criação de avultada dívida de tornas, em situação semelhante à já ocorrida na partilha realizada em 1ª instância, esta que decidiu adjudicar os bens não licitados em co-propriedade, na proporção do quinhão de todos os interessados, tendo levado ao preenchimento excessivo do quinhão do Recorrente e uma dívida de tornas de € 59.085,05.

    3. Na fundamentação, a fls. 15, o Acórdão recorrido enunciou que o objectivo pri-mordial da composição dos quinhões deve ser a igualação dos quinhões de cada um dos interessados, isto é, deve assegurar que cada um deles comparticipa na medida da sua quota, de bens de diversas natureza e espécie que integram a herança; a fls. 18, que todos os herdeiros licitaram bens e nenhum excedeu o respetivo quinhão.

    4. Assim, a esta fundamentação opõe-se a decisão ora recorrida, já que aparente-mente, a solução alcançada quanto à partilha - de adjudicação de metade dos bens não licitados ao Recorrente - irá conduzir automaticamente ao preenchimento manifestamente excessivo do respetivo quinhão e criação de avultada dívida de tornas.

    5. Acresce que, a deliberação sob a al. b) do...

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