Acórdão nº 6295/15.8T8SNT.L1.S1 de Supremo Tribunal de Justiça (Portugal), 16 de Dezembro de 2020
Magistrado Responsável | MARIA DA GRAÇA TRIGO |
Data da Resolução | 16 de Dezembro de 2020 |
Emissor | Supremo Tribunal de Justiça (Portugal) |
Acordam no Supremo Tribunal de Justiça 1. AA intentou contra N Seguros, S.A.
a presente acção declarativa de condenação, sob a forma de processo comum, pedindo a condenação da R. a pagar-lhe a quantia de € 99.584,46, acrescida de juros legais em dobro, vencidos e vincendos.
Alega, em síntese, que: - No dia … de Maio de 2012 ocorreu um acidente entre o veículo seguro na R. e o motociclo do A., conduzido pelo próprio; - Ao pretender ultrapassar o veículo, que se encontrava estacionado, foi aberta a porta direita da frente deste, originando o embate do A. na porta e entre esta e a sua perna; - Do embate resultaram ferimentos para o A.; - A R. aceitou a responsabilidade pelo sinistro, tendo o A. sofridos danos patrimoniais e não patrimoniais que contabiliza no valor peticionado: €66.195,00 (sessenta e seis mil cento e noventa e cinco euros) pelos danos futuros provenientes da IPP de que ficou a padecer; €27.500,00 (vinte e sete mil e quinhentos euros) pelos danos não patrimoniais suportados.
A R. contestou, impugnando, para o que ora importa, os factos alegados pelo A. que sustentam os montantes peticionados.
Em … de Dezembro de 2019 9 foi proferida sentença que julgou a acção parcialmente procedente e, em consequência, condenou a R. a pagar ao A. as seguintes quantias: «I. A título de danos patrimoniais a quantia de €25.510,96 (vinte e cinco mil quinhentos e 10 euros e noventa e seis cêntimos).
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A título de danos não patrimoniais a quantia de 7.500,00 (sete mil e quinhentos euros).
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Às quantias indemnizatórias fixadas acrescem de juros de mora, contabilizados desde … de Dezembro de 2019, à taxa legal civil de 4% ao ano, ou às sucessivas taxas civis, até efectivo e integral pagamento.» Inconformado, o A. interpôs recurso para o Tribunal da Relação …, o qual, por acórdão de … de Julho de 2020 foi julgado parcialmente procedente, fixando o valor da indemnização por danos não patrimoniais em €25.000 (vinte e cinco mil euros).
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Vem a R. interpor recurso para o Supremo Tribunal de Justiça, formulando as seguintes conclusões: «1. Vem o presente recurso interposto do douto Acórdão proferido a fls._ no âmbito do processo supra identificado, o qual julgou parcialmente procedente a ação judicial intentada pelo A., AA, revertendo a decisão proferida pelo douto Tribunal de 1.ª instância, e ampliando o montante indemnizatório fixado por aquele Tribunal a título de danos não patrimoniais, com o qual a Ré, agora Apelante, salvo o devido respeito, não se poderá conformar.
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É contra o referido montante indemnizatório arbitrado no douto Acórdão a título de danos não patrimoniais que a ora Recorrente agora se insurge, nomeadamente por considerar que o montante indemnizatório atribuído ao Autor a título de danos não patrimoniais afigura-se manifestamente desajustado, por excessivo, atenta a factualidade julgada provada (e não provada) nos autos, e bem assim os critérios jurisprudenciais atualmente seguidos pela nossa jurisprudência, encontrando-se, nessa medida, incorretamente interpretadas e/ou aplicadas as normas legais previstas nos artigos 494.º, 496.º, n.ºs 1 e 4, 562.º, 563.º e 566.º, n.º 3 do Código Civil.
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Ora, entendeu o Venerando Tribunal da Relação o seguinte: “Por todo o exposto, acorda-se em julgar parcialmente procedente o recurso de apelação interposto pelo Autor e, consequentemente, alterando nessa parte a decisão recorrida: a) Quantificam o valor da indemnização devida pela Ré ao Autor, por danos não patrimoniais, em 25.000€ (vinte e cinco mil euros).”. (negrito nosso) 4. No entender da Recorrente, o montante arbitrado encontra-se fora das margens definidas pela Jurisprudência proferida pelos Tribunais superiores, desrespeitando o padrão referencial que vem sendo seguido pela jurisprudência.
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É consensual a ideia de que só são indemnizáveis os danos não patrimoniais que afetem profundamente os valores ou interesses da personalidade física ou moral, medindo-se a gravidade do dano por um padrão objetivo, embora tendo em conta as circunstâncias do caso concreto, mas afastando-se os fatores subjetivos, suscetíveis de sensibilidade exacerbada, particularmente embotada ou especialmente requintada, e apreciando-se a gravidade em função da tutela do direito; o dano deve ser de tal modo grave que justifique a concessão de uma satisfação de ordem pecuniária ao lesado – cf. Antunes Varela, in Das Obrigações em Geral, vol. I, pág. 576.
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A medida, no caso de danos não patrimoniais, é sempre fixada equitativamente pelo Tribunal, tendo em atenção, em qualquer caso, as circunstâncias referidas no artigo 494.º do Código Civil (CC).
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Além disso, importa ter presente que nas decisões que proferir, o julgador terá em consideração todos os casos que mereçam tratamento análogo, a fim de obter uma interpretação e aplicação uniformes do direito (artigo 8.º, n.º 3, do CC), sempre num juízo que equilibre a equidade do caso concreto e a uniformidade decisória, que não podem ser contraditórias.
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Ora, tendo em conta o que supra se encontra explanado, não se compreende o motivo pelo qual o Venerando Tribunal condenou a ora Recorrente na quantia de € 25.000,00 pelos danos não patrimoniais sofridos pelo A.
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A indemnização por danos não patrimoniais fixada para o A. extravasa os padrões comuns da nossa jurisprudência.
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Acrescendo o seguinte: «Na fixação dos montantes relativos às compensações por danos não patrimoniais emergentes de acidentes com veículos abrangidos pelo seguro obrigatório, há que atender fundamentalmente à gravidade das lesões e respetivas sequelas, em conjugação com os valores que vêm sendo fixados pelos tribunais.» - Ac. do STJ de 07.05.2014, no âmbito do processo n.º 436/11.1TBRGR.L1.S1.
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Ora, tendo em conta a matéria dada como provada perante os danos não patrimoniais sofridos pelo A., afigura-se-nos que o montante de € 7.500,00 a título de ressarcimento por esse dano é no caso em apreço justo e equitativo, conforme havia sido arbitrado na douta sentença recorrida.
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Nos termos do disposto no artigo 496.º, n.ºs 1 e n.º 4, primeira parte do C.C., só os danos não patrimoniais graves são indemnizáveis, merecendo, nessa medida, a tutela do direito.
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Trata-se, apenas de dar ao lesado uma satisfação ou compensação do dano sofrido, uma vez que este, sendo não patrimonial, não é susceptível de equivalente, e, por isso, possível é apenas uma espécie de reparação, na forma de uma indemnização pecuniária, a determinar, por indicação expressa da lei, segundo juízos de equidade.
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Para que possa ser atribuída uma indemnização por danos não patrimoniais é necessário que a conduta do lesante seja apta a provocar danos graves; e essa gravidade há-de ser aferida objectivamente, ou seja, em função de um padrão médio de sensibilidade, e não da especial susceptibilidade do visado (cfr., por exemplo, os acórdãos do Supremo Tribunal de Justiça, de 27de Setembro de 2007 e de12 de Março de 2009, disponíveis em www.dgsi.pt nos procs. nºs 07B2528 e 08B2972, respectivamente).
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Tendo presente que a compensação por danos não patrimoniais é fixada equitativamente pelo tribunal, tendo em atenção, em qualquer caso, as circunstâncias referidas no artigo 494º do Código Civil (primeira parte do n.º 3 do artigo 496.º do Código Civil) para a determinação da compensação por dano não patrimonial, afigura-se que a compensação arbitrada pelo Tribunal a quo, atendendo à factualidade em apreço nos autos, afigura-se manifestamente excessiva.
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Salvo o devido respeito, ao decidir do modo como decidiu, violou o douto Tribunal a quo as normas legais previstas nos artigos 494.º, 496.º, n.ºs 1 e 4, 562.º, 563.º e 566.º, n.º 3 do Código Civil, não se encontrando, de facto, demonstrados nos autos factos passíveis de conduzir à atribuição do montante de € 25.000,00, a título de danos não patrimoniais ao Autor, afigurando-se o mesmo (salvo o devido respeito) manifestamente desajustado, por excessivo, devendo assim tal pedido improceder totalmente ou, alternativamente, caso assim não se entenda (o que por mera cautela de patrocínio se concebe), deverá o montante indemnizatório a arbitrar a título de danos não patrimoniais fixar-se no montante máximo de € 7.500,00, o qual se considera, de todo o modo, mais ajustado e adequado, face aos padrões e critérios jurisprudenciais atualmente prosseguidos pelas Instâncias Superiores.
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Assim, salvo melhor opinião, fez o Venerando Acórdão do Tribunal da Relação …, uma incorreta aplicação do disposto nos artigos 494.º, 496.º, 562.º, 563.º, 564, n.º 2 e 566.º, n.º 3 do Código Civil, devendo o mesmo ser alterada Lusitânia 670 quanto à fixação do quantum indemnizatório arbitrado para ressarcimento dos danos não patrimoniais.» O Recorrido contra-alegou, concluindo nos termos seguintes: «I. Não existe censura à decisão proferida pelo tribunal a quo.
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A decisão proferida pelo tribunal a quo está devidamente fundamentada em conformidade com os factos provados e jurisprudência de casos análogos.
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Os factos provados nestes autos são seriamente graves e justificam plenamente a indemnização de 25.000,00€ a título de danos não patrimoniais.
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Repugna equacionar que 7.500,00€ compense o lesado de um acidente de mota em que a culpa recai exclusivamente sobre o outro condutor que lhe causa 2 fraturas, 2 intervenções cirúrgicas com implementação e extração de material, parafusos, 3 meses com tala gessada e imobilização, deambular com canadianas, fisioterapia, grau de dor física e psíquica no grau 5 em 7, dano estético no grau 4 em 7 e ficou para sempre com dores no joelho, dor na perna esquerda e por vezes dificuldade em dobrar o joelho esquerdo e ainda dores lombares quando anda! V. As indemnizações fixadas em acidentes de viação devem atender também aos sucessivos aumentos de prémios de seguro e à tendência ao nível da União...
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