Acórdão nº 107/15.0GAMTL.E1.S2 de Supremo Tribunal de Justiça (Portugal), 11 de Dezembro de 2019

Magistrado ResponsávelLOPES DA MOTA
Data da Resolução11 de Dezembro de 2019
EmissorSupremo Tribunal de Justiça (Portugal)

Acordam na Secção Criminal do Supremo Tribunal de Justiça: I. Relatório 1.

No Juízo Local Criminal de …, da Comarca de …, foi a arguida AA, identificada nos autos, condenada por sentença de 10 de Outubro de 2017, pela prática, em autoria material e sob a forma consumada, de dois crimes de homicídio negligente, p. e p. pelos artigos 137.º, n.º 1, e 69.º, n.º 1, alínea a), do Código Penal, nas penas de 1 (um) ano e 5 (cinco) meses de prisão por cada um deles, e, em cúmulo jurídico, na pena única de 2 (dois) anos e 2 (dois) meses de prisão suspensa na sua execução por igual período de tempo e na inibição temporária da faculdade de conduzir pelo período de 1 (um) ano.

  1. Pelos assistentes BB, por si e em representação dos seus filhos menores CC e DD, e EE, filhos da vítima, e por FF, em representação dos seus filhos menores CC e DD, foi deduzido de pedido de indemnização civil contra “GG Seguros”, pedindo a condenação desta no pagamento dos montantes de: - €10.000,00, a título de danos patrimoniais, pela perda total do veículo automóvel conduzido pelo falecido HH no momento do acidente, a atribuir em partes iguais aos demandantes filhos; - €150.000,00 pelos danos morais do demandante BB; - €150.000,00 pelos danos morais do demandante EE; - €100.000,00 pelos danos morais do demandante CC; - €50.000,00 pelos danos morais da demandante DD, no total de € 470.000,00, acrescido dos respectivos juros de mora à taxa legal, contados desde a data da notificação desde a data de citação até integral pagamento.

    Pela sentença proferida em 1.ª instância, foi, quanto a estes pedidos, decidido (transcrição): «f) julgar parcialmente procedente o pedido de indemnização civil formulado por BB por si e em representação dos seus filhos menores CC e DD, FF em representação dos seus filhos menores CC e DD e EE, e condenar a demandada GG Seguros, a pagar a cada um dos demandantes BB e EE a quantia de € 30.000,00 (trinta mil euros), a título de danos não patrimoniais sofridos pelos demandantes, acrescida de juros moratórios computados à taxa legal desde a data da presente sentença até pagamento integral e efectivo; g) absolver a demandada do mais peticionado».

  2. Inconformados com o decidido no acórdão do tribunal de 1.ª instância quanto à matéria cível, recorreram os demandantes cíveis para o Tribunal da Relação de Évora, o qual, por acórdão proferido a 8 de Maio de 2018, decidiu alterar o ponto 4 da matéria de facto não provada, acrescentar o facto enumerado como ponto 28.ºB à descrição da matéria de facto provada e, quanto aos pedidos cíveis: - Condenar a demandada “GG Seguros”, «a pagar a cada um dos demandantes BB e EE a quantia de € 60.000,00 (sessenta mil euros), a título de danos não patrimoniais sofridos pelos demandantes, acrescida de juros moratórios computados à taxa legal desde a data da sentença até pagamento integral e efectivo»; - Condenar a demandada “GG Seguros”, «a pagar a CC e DD, filhos de BB e sua companheira, as quantias de € 30.000,00 (trinta mil euros) e € 15.000,00 (trinta mil euros), respectivamente, a título de danos não patrimoniais sofridos pelos demandantes, acrescida de juros moratórios computados à taxa legal desde a data da sentença até pagamento integral e efectivo».

  3. Inconformada com o acórdão do Tribunal da Relação de Évora, veio a demandada civil “GG Seguros, S.A”., interpor recurso para o Supremo Tribunal de Justiça, quanto à condenação no pedido de indemnização, pedindo que fosse arbitrado a cada um dos Demandantes civis BB e EE, a quantia de €50.000, para compensação do dano de natureza não patrimonial por cada um deles sofrido em consequência da morte de seus pais; e pedir a absolvição da demandada quanto às quantias arbitradas aos menores CC e DD a título de compensação pelos danos de natureza não patrimonial por eles eventualmente sofridos em consequência da morte de seus avós.

  4. Os demandantes civis responderam ao recurso, pedindo a manutenção do decidido no Acórdão do Tribunal da Relação.

  5. O Supremo Tribunal de Justiça, mediante acórdão proferido a 20 de Março de 2019, decidiu:

    1. Julgar improcedente o recurso interposto pela demandada civil “GG Seguros, S.A.” quanto à indemnização civil fixada a favor dos demandantes BB e EE, e, em consequência, manter a condenação da demandada civil no pagamento do montante indemnizatório fixado, de 60.000€ (sessenta mil euros), por danos não patrimoniais, a cada um deles.

    2. Declarar a nulidade por falta de fundamentação do acórdão recorrido quanto à condenação da demandada civil “GG Seguros, S.A.” na indemnização civil aos demandantes CC e DD, nos termos do disposto no artigo 379.º, n.º 1, alínea a), e n.º 2, correspondentemente aplicável ex vi artigo 425.º, n.º 4, do CPP, e no art. 403.º, n.º 3 do mesmo diploma, devendo, em consequência, ser proferido, quanto a este segmento, novo acórdão pelo Tribunal da Relação para suprimento dessa nulidade.

  6. Na sequência do acórdão proferido pelo Supremo Tribunal de Justiça, o Tribunal da Relação de Évora, mediante acórdão proferido em 11 de Julho de 2019, decidiu: «conceder parcial provimento ao recurso interposto e, em consequência condena-se a demandada GG Seguros, a pagar a CC e DD, filhos de BB e sua companheira, as quantias de € 30.000,00 (trinta mil euros) e € 15.000,00 (quinze mil euros), respectivamente, título de danos não patrimoniais sofridos pelos demandantes, acrescida de juros moratórios computados à taxa legal desde a data da sentença até pagamento integral e efectivo.» 8.

    Inconformada com o agora decidido no acórdão do Tribunal da Relação de Évora, veio a demandada civil “GG Seguros, S.A.”, novamente interpor recurso para o Supremo Tribunal de Justiça, quanto à condenação no pedido de indemnização civil a pagar aos demandantes civis CC e DD, apresentando motivação em que conclui nos seguintes termos (transcrição): «Ao ter condenado a ora Demandante a pagar aos menores CC e DD as quantias de €30.000 e €15.000 respetivamente, para compensação pelos danos de natureza não patrimonial por eles eventualmente sofridos em consequência da morte de seus avós, sobrevivendo a estes os Demandantes BB e EE, seus filhos, o douto acórdão recorrido violou o disposto no nº 2 do artº 496, do código Civil, pelo que deverá ser substituído por outro que, a tal título não condene a Demandada ora Recorrente a pagar aos referidos menores qualquer montante, e antes a absolva quanto a tal.» 9.

    Os demandantes civis responderam ao recurso, nos seguintes termos (transcrição): «(…) Entendem os demandantes que o recurso interposto pela demandada deve ser julgado improcedente.

    A indemnização por danos não patrimoniais cabe naturalmente às pessoas que o legislador entendeu mais ligadas aos falecidos por laços afetivos. Isto é, ao elenco enunciado no n.º 2 do artigo 496º, do Código Civil, aí se incluindo, no caso, os menores CC e DD.

    Com efeito, o legislador estabeleceu que a indemnização daquela natureza, reportada à lesão de bens ou interesses de ordem eminentemente pessoal, deve necessariamente reverter, em bloco, para quem, como resultou provado, está numa relação familiar ou afetiva de particular intensidade com os defuntos, como é o caso dos menores CC e DD.

    A interpretação que a demandada faz do disposto no n.º 2 do artigo 496.º do Código Civil vai ao arrepio do entendimento (cfr., o acórdão do STJ de 30/4/2015, proc.º 1380/13.3T2AVR.C1.S1) de que, no caso da morte da vítima, a titularidade do direito à indemnização por danos não patrimoniais pela perda da vida é atribuída ex lege aos familiares ali referidos, afastando a lei a aplicabilidade do regime sucessório, como a demandada pretende.

  7. Em conclusão: Perante a matéria de facto fixada, o acórdão recorrido, na determinação dos montantes indemnizatórios fixados aos menores pelos danos não patrimoniais sofridos em consequência da morte de seus avós, fez correta aplicação do comando normativo inscrito no artigo 496.º, n.º 2, do Código Civil, pelo que o recurso da demandada deve ser julgado improcedente, confirmando-se o ali decidido.» 10.

    O Ministério Público junto do Tribunal da Relação apresentou resposta, dizendo: «O objecto do Recurso versa exclusivamente sobre matéria cível enxertada na acção penal e apenas afecta os interesses particulares dos assistentes e demandante civil, os quais se encontram devidamente representados por Mandatários Forenses.

    Deste modo, o Ministério Público não se encontra especialmente legitimado para ponderar questões que não afectam os interesses cuja defesa e tutela lhe estão legalmente consagrados.

    Todavia, sempre dirá, que o douto Acórdão proferido pelo Tribunal da Relação de Évora deverá ser mantido in totum, improcedendo o recurso interposto, já que, perante a matéria de facto fixada, o Acórdão ora posto em crise na fixação dos montantes indemnizatórios fixados aos demandantes e aos menores pelos danos não patrimoniais sofridos em consequência da morte dos respectivos pais e avós...

Para continuar a ler

PEÇA SUA AVALIAÇÃO

VLEX uses login cookies to provide you with a better browsing experience. If you click on 'Accept' or continue browsing this site we consider that you accept our cookie policy. ACCEPT