Acórdão nº 2288/08.0TBPTM.E1.S1 de Supremo Tribunal de Justiça (Portugal), 26 de Novembro de 2019

Magistrado ResponsávelMARIA CLARA SOTTOMAYOR
Data da Resolução26 de Novembro de 2019
EmissorSupremo Tribunal de Justiça (Portugal)

Acordam no Supremo Tribunal de Justiça: I - Relatório 1. AA propôs a presente ação declarativa, com processo comum sob a forma ordinária, contra BB, CC e DD, pedindo a condenação das rés a pagarem, aos autores, a quantia de € 94.771,16, nos termos do artigo 442.º, n.º 2, do Código Civil, a título de restituição em dobro do sinal prestado, acrescida de juros de mora, à taxa legal, desde a data dos factos até efetivo e integral pagamento. A autora requereu a intervenção principal provocada de EE, como seu associado.

As rés contestaram, pugnando pela improcedência da ação. Contudo, para a hipótese de procedência da ação, as rés deduziram reconvenção, pedindo a condenação dos autores: 1) Como litigantes de má-fé, em multa e indemnização não inferior a € 7.500; 2) A reconhecerem como validamente resolvido pelas rés o contrato-promessa junto à petição inicial e o sinal passado, seja no montante de € 39.903,88, seja no montante de € 47.385,80, pertença delas, rés; 3) A pagarem às rés a quantia de € 40.000, que estas entregaram aos autores em 16.05.2005; 4) A pagarem às rés juros legais sobre a quantia de € 40.000, contados desde 16.05.2005 até integral embolso, sendo os vencidos até 16.05.2008 no montante de € 5.200; 5) A pagarem às rés a quantia de € 12.100 como compensação pelo gozo e fruição do prédio prometido vender no período de Abril de 2001 a Novembro de 2004, acrescido de juros legais desde a notificação da contestação; 6) Subsidiariamente, no caso de se entender que as rés não resolveram validamente, a pagarem a estas as quantias referidas em 1, 3, 4 e 5. As rés pediram ainda que se ordene, em qualquer caso, a compensação, até aos respetivos limites, com o montante que elas forem, eventualmente, condenadas a pagar aos autores.

A autora replicou, respondendo à exceções suscitadas pelas rés e pugnando pela improcedência da reconvenção.

As rés responderam às exceções suscitadas pela autora à matéria da reconvenção.

A intervenção principal provocada de EE, como associado da autora, foi admitida, tendo o interveniente declarado fazer seus os articulados desta última.

Após a realização de audiência preliminar, foi proferido despacho saneador, no qual, além do mais, foi admitido o pedido reconvencional com exceção da parte respeitante à condenação dos autores como litigantes de má-fé. Procedeu-se à seleção da matéria de facto assente e à elaboração da base instrutória.

Realizou-se a audiência final, na sequência da qual foi proferida sentença que, julgando a ação procedente, condenou as rés a pagarem à autora a quantia de € 94.771,16, a título de restituição de sinal em dobro nos termos do n.º 2 do artigo 442.º do Código Civil, acrescida de juros de mora contados desde a data da citação até integral pagamento. A reconvenção foi julgada totalmente improcedente.

  1. As rés recorreram da sentença, tendo o Tribunal da Relação de Évora, por acórdão datado de 28 de fevereiro de 2019, decidido o seguinte: «Acordam os juízes da 2.ª Secção Cível do Tribunal da Relação de Évora em julgar o recurso parcialmente procedente, anulando a sentença recorrida nos termos do artigo 615.º, n.º 1, al. d), 1.ª parte, do CPC, e julgando a acção e a reconvenção parcialmente procedentes nos seguintes termos:

    1. Condena-se o recorrido EE a pagar a quantia de € 16.307,10 às recorrentes, sendo € 5.435,70 a cada uma delas; B) Condena-se cada uma das recorrentes a pagar a quantia de € 7.897,63 à recorrida AA; C) Sobre as quantias referidas em A) e B) são devidos juros de mora, à taxa supletiva legal, desde as datas em que os respectivos devedores foram citados até integral pagamento; D) No mais, vão as recorrentes e os recorridos absolvidos dos pedidos contra eles formulados.

    Custas da acção e da reconvenção, incluindo as do presente recurso, a cargo das recorrentes e dos recorridos, na proporção do respectivo decaimento».

  2. Insatisfeita, interpõe recurso de revista, a autora, AA, formulando na sua alegação de recurso as seguintes conclusões: «1º-A questão principal do presente recurso consiste em saber se do incumprimento do contrato promessa pelas Rés, deriva responsabilidade civil em relação à Recorrente.

    1. - No caso concreto, foi celebrada uma revogação entre um dos promitentes compradores e as Rés.

    2. - A A, ora Recorrente, não interveio pessoalmente ou através de representante e , por isso, não poderá conforme resulta claro, ser afectada pela revogação .

    3. - Tem o direito a que se mantenha inalterada a situação jurídica que para si resultou da celebração do contrato promessa de compra e venda.

    4. - Resulta bem explícito, que a Autora foi alheia a revogação efetuada, não teve conhecimento da mesma e nem das cláusulas combinadas entre as Rés e o EE logo não poderá vir a ser prejudicada pela mesma.

    5. - Consta da matéria dada como assente que as Rés, depois da morte do marido da R. BB, passou a ser assessorada juridicamente, pelo que decorre da lógica comum que tenham sido assessoradas.

    6. - Ora, sendo assim, como efetivamente é , para mais encontrando-se devidamente assessoradas por Advogado , deveriam ter adotado todos os cuidados que a situação requeria, o que não fizeram , como é manifesto.

    7. - Ainda antes de terem procedido à revogação do contrato firmado com a A., nestes autos recorrida, venderam o imóvel a terceiros , só depois efetuaram unilateralmente a revogação do contrato com o Interveniente Acidental, o que colide com a conduta que um bom pai de família adotaria .

    8. - O procedimento posterior adotado pelas Rés e que consiste na entrega de uma verba a um dos contraentes, in casu, interveniente Acidental, faz com que caia pela base, a tese de que não seria exigível das Rés outra conduta .

    9. -Ao longo desse moroso processo sempre a Autora e o Interveniente Processual, enviaram em nome próprio missivas aos mandatários das Rés, o que não é um procedimento usual num casal que viva sem conflitos, pelo que teria sido diligente que as Rés se tivessem certificado que o EE tinha poderes para vincular a A. ou autorização daquela.

    10. - Porque durante esses anos todos, ambos, ou seja quer a A., quer o EE, sempre se fizeram representar por si próprios, pelo que o cidadão médio colocado na posição das Rés, teria estranhado quando aquele se apresentou em nome do casal e teria necessariamente sido diligente no sentido de verificar os poderes do EE e se a A. estava devidamente informada.

    11. -Se as Rés tivessem sido diligentes teriam feito constar do Acordo de Revogação a assinatura de ambos os promitentes compradores, o que efetivamente não sucedeu.

    12. - Pelo que as Rés foram negligentes e não foram diligentes, pelo que o seu comportamento é gerador de responsabilidade contratual, aliás o comportamento censurável do EE aliado ao comportamento negligente das Rés, não pode nem deve prejudicar os direitos da A., a não ser assim, estaríamos a premiar quer o EE (que se apresentou em nome de ambos pese embora sem poderes) , quer os das R., que não diligenciaram a verificar se efectivamente aquele tinha ou não poderes de representação da A.

    13. - Ao que acresce, por outro lado, que a revogação contratual levada a cabo nos moldes sobreditos, não poderá de em todo, ser entendível como um acto de administração praticado por um dos cônjuges em nome do outro, para mais quando já não eram casados um com o outro.

    14. - Se a ora Recorrente foi completamente alheia quer a revogação efectuada pelo EE com as Rés quer ao acordado entre aqueles, nenhuma culpa a Recorrente deverá ser assacada.

    15. - Ao invés as Rés deveriam ser diligentes e actuar como um Bom Pai de Família era ter diligenciado pela assinatura do acordo de revogação com as rés ou terem verificado se efectivamene o EE tinha autorização da Recorrente ou se aquele tinha poderes em nome daquela.

    16. - O desconhecimento da lei em nada poderá aproveitar às Rés, sendo certo que da matéria dada como provada resulta claro e evidente que em todo este moroso e longo processo aquelas (rés) foram sempre assessoradas por mandatário judicial pelo que decorre do senso comum que para um acordo de revogação com a entrega do montante de € 40 mil euros, o tenham sido.

    17. -O acordo da entrega dos 40 mil euros foi feito entre as Rés e o EE e pese embora aquele tenha afirmado agir em nome próprio e da Autora, o certo é que aquele não estava munido de poderes para o fazer, facto que não poderia ser alheio às Rés.

    18. - Da matéria dada como provada resulta que a A. tinha informado que o EE não tinha poderes para a representar, então competiria às rés terem sido diligentes e terem verificado junto da ora Recorrente se a mesma concordava com os termos do Acordo da Revogação.

    19. - Era exigível as Rés terem verificado se o EE dispunha de poderes para vincular a A., o desconhecimento da lei, reafirma-se, em nada poderá beneficiá-las .

    20. - Contrariamente ao que vem mencionado no Acórdão da Relação de Évora, todo o contexto factual que se encontra largamente descrito nos presentes autos, era propício para que as Rés fossem diligentes nesse sentido.

    21. - Pelo que a conduta das mesmas será de censurar, à luz do critério de um bom pai de família, tendo em conta as circunstâncias que se encontram dadas como provadas, em que a Recorrente já tinha informado que EE não a representava e onde quer a Recorrente quer o EE, enviavam em nome próprio correspondência às Rés e nunca em representação do outro.

    22. - Advogado, primeiro, o Sr. Dr. FF e, depois, o Sr. Dr. GG, portanto, conhecedores do regime jurídico das declarações negociais, do mandato sem representação e da representação sem poderes, não há nada que justifique ou que possa aceitar como explicação adequada, aquela que a ré BB de, quando foi ouvida em declarações, na audiência de discussão e julgamento, ou seja, a de que desconhecia que o interveniente principal e autora se tinham divorciado.

    23. - É que se o contrato-promessa havia sido celebrado com dois promitentes-compradores, não havia razão alguma para as rés concluírem que, para revogarem tal negócio jurídico, bastaria que apenas um...

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