Acórdão nº 4064/14.1T8STB.E1.S2 de Supremo Tribunal de Justiça (Portugal), 26 de Novembro de 2019

Magistrado ResponsávelFÁTIMA GOMES
Data da Resolução26 de Novembro de 2019
EmissorSupremo Tribunal de Justiça (Portugal)

Acordam no Supremo Tribunal de Justiça I - Relatório 1. Na Comarca de ...

corre acção declarativa comum, pela qual AA, BB, CC, e DD, demandam EE e FF, pedindo se declare:

  1. INOFICIOSO O LEGADO A FAVOR DA 1ª R., PELA OPERAÇÃO DE REDUÇÃO DE LIBERALIDADES, DEIXANDO O MESMO DE INTEGRAR O SEU PATRIMÓNIO E PASSANDO A PERTENCER INTEGRALMENTE AOS HERDEIROS LEGITIMÁRIOS, ORA AA; b) PARCIALMENTE INOFICIOSA A DOAÇÃO, AQUI BEM 16 E, NÃO SENDO JÁ POSSÍVEL A REDUÇÃO NOS TERMOS DO ART. 2174.º CC, SER A DONATÁRIA, AQUI 1.ª R., CONDENADA A PREENCHER AS LEGÍTIMAS DOS AA. EM DINHEIRO (ART. 2175.º CC) NO VALOR € 70.663,30; c) SEREM PERTENCENTES À HERANÇA AS VERBAS DOS PONTOS 8 E 10 E, EM CONSEQUÊNCIA, SEREM CONDENADAS AS RR. A DEVOLVER À HERANÇA AS QUANTIAS QUE FIZERAM SUAS E QUE MANTÊM, ILEGITIMAMENTE NA SUA POSSE, ACRESCIDAS DE JUROS DE MORA À T...A LEGAL DE 4%, DESDE A DATA DAS RESPECTIVAS OPERAÇÕES DE BANCÁRIAS (20 E 21 DE ABRIL DE 2011) ATÉ EFECTIVA E INTEGRAL DEVOLUÇÃO.

    Em sustentação da pretensão afirmam, os autores, em síntese: - São filhos e herdeiros legitimários de GG, que faleceu no dia ...; - O falecido instituiu legado e fez uma doação a favor da 1ª R., com quem viveu maritalmente durante anos, disposições que ofendem a respectiva legítima; - Ambas as rés, mãe e filha, levantaram dinheiro de contas tituladas conjuntamente com o falecido e embora as contas fossem solidárias, foram providas em exclusivo com dinheiro do de cujus.

    2.

    Citadas, as rés vieram contestar invocando, em síntese: - Existência de erro na forma do processo, defendendo que a pretensão dos autores, deveria ter sido formulada em sede de inventário e não em processo comum, como ocorreu; - O saldo da conta titulada conjuntamente com a 2.ª ré, foi-lhe doado pelo falecido, em vista da relação de proximidade afectiva (paternal/filial) que entre eles existiu; - O levantamento que a 1ª ré realizou, justifica-o com a necessidade de fazer face a despesas de economia do casal, acrescidas com a doença que acometeu o falecido nos últimos tempos da sua vida, estando devidamente acreditada para esse ato, por via de procuração passada pelo de cujus; - O valor dos bens deixados pelo falecido, não é aquele que os autores lhes atribuíram; - Existem bens não relacionados, objecto de vendas simuladas, com o propósito de os sonegar à herança, sendo nulos tais actos translativos.

    Concluindo, pedem a anulação do processo por erro na sua forma, ou, assim não suceder, a sua absolvição do pedido e a condenação dos autores como litigantes de má-fé, em multa e no pagamento de uma indemnização de € 10.000,00 pelos danos morais causados e ainda no pagamento dos honorários do seu mandatário, no valor de 12.300,00 € e demais despesas do processo, alegando que sentiram sofrimento e revolta face à propositura da acção, que fez a 1ª ré sentir-se injustiçada e considerada como oportunista e porque os autores omitiram factos fundamentais, reclamando o que sabem não ter direito, ao que acresce a premeditação da venda à mãe da propriedade que o pai lhes havia disponibilizado.

    1. Na sequência do óbito da autora AA, foi habilitada como sua sucessora a sua filha HH, que passou a figurar como autora.

    2. Os autores responderam à excepção de erro na forma do processo, pugnando pela sua inexistência e bem assim à invocada nulidade dos actos translativos.

    3. Foi realizada audiência prévia, no âmbito da qual se proferiu despacho saneador, declarando-se a inexistência de erro na forma do processo.

    4. Realizada audiência final veio a ser proferida sentença com o seguinte dispositivo: “Em face do exposto, vistas as já indicadas normas jurídicas e os princípios expostos o tribunal julga: 1.

      Parcialmente procedente por parcialmente provado o pedido formulado pelos autores sob a al. a) e em consequência, declara-se inoficioso o legado, contante da verba do ponto 12-a). Atendendo a que o valor da redução excede metade do valor do legado, condenam-se os autores a pagar à 1ª R. a respectiva diferença: € 2.223,90, em ordem a operar a referida inoficiosidade.

      2. Improcedentes por não provados os demais pedidos formulados pelos autores, de que se absolvem as rés.

      3. Mais se declara que não se verifica litigância de má-fé por parte dos autores, que assim vão absolvidos dos pedidos nela radicados.

      Custas da acção, na proporção de 6/8 para os autores e 2/8 para as rés.

      ” Por não se conformarem com a sentença vieram as rés interpor recurso de apelação, que veio a culminar com a prolação de acórdão que confirmou a senten 7.

      Interposto recurso de apelação pelas RR veio a ser confirmada a sentença por acórdão do Tribunal da Relação de Évora. Nesse recurso, os AA. disseram que pretendiam uma ampliação do objecto do recurso, de carácter subsidiário, se as RR. lograssem vencimento da apelação.

      O TR não conheceu das questões suscitadas na ampliação do recurso de apelação, por as ter considerado prejudicadas pela solução dada.

    5. Interposto novamente recurso de revista excepcional pelas RR., veio o mesmo a ser admitido por acórdão da for... a que se reporta o art.º 672.º do CPC.

      Nas conclusões da revista figuram as seguintes conclusões (transcrição): “

  2. Com a presente acção os AA.

    peticionavam que fosse reconhecida e declarada a inoficiosidade das liberalidades feitas pelo seu falecido pai a favor da ora recorrente e que as mesmas fossem reduzidas na medida do necessário à salvaguarda das suas legitimas.

  3. Nos termos do disposto no art.° 2162° do C.

    C., na determinação, para efeitos da verificação da inoficiosidade, do valor da quota disponível, ter-se-á de atender ao valor dos bens existentes à data da morte do "de cujus" e ao valor das liberalidades que este tenha feito em vida ou por morte.

  4. Os AA.

    sonegaram a existência de um prédio, no valor de 1.320.825,00 €, que, usando uma procuração que lhes havia sido conferida pelo “de cujus", uma das AA.

    ficticiamente vendeu à mãe de todos, aliás representada no acto por outra delas, com o fito de ocultarem aquele bem a data da morte, que já se adivinhava próxima, de seu pai.

  5. As instâncias, embora reconhecendo e dando como provada a existência de tal negocio ficcionado e ainda que tal ficção constituía uma nulidade por simulação, não consideraram, contudo, o valor de tal bem sonegado para determinar o valor da quota disponível, por entenderem que não tinha sido ainda declarada nem pedida a declaração de nulidade desse negócio, pedido que, aliás, reconheciam ser impossível neste processo, por não estar em juízo a adquirente.

  6. Para além de tal inequívoca impossibilidade de declaração, no presente processo, com forca de caso julgado geral da eventual nulidade daquele ficcionado negócio, a recorrente não tinha nem tem qualquer legitimidade para suscitar essa declaração, já que não tem qualquer interesse legítimo de que o bem objecto desse negócio translativo, regresse ao património do “de cujus”, apenas tendo interesse, e a isso se limitava a sua pretensão, em que o valor de tal bem ficticiamente negociado fosse considerado, por aplicação do disposto no art° 2162° do C C., na determinação do valor da quota disponível.

  7. E tendo as instâncias conhecido e comprovado a existência de tal negócio simulado, não poderiam, embora sem declarar com força de caso julgado geral a sua nulidade, deixar de a ter em conta exclusivamente para os efeitos em causa nos presentes autos da determinação do valor da quota disponível, decidindo de acordo com a comprovação de tal simulação, embora unicamente com efeito caso julgado dentro do presente processo, como era exigência do disposto no art.° 91° do C.

    P.C..

  8. Efectivamente, dever-se-á entender que o conhecimento da invocada simulação da venda do bem aqui em causa, enquanto questão incidental para correcta aplicação do direito relativamente ao objecto principal da acção, podia ser conhecida nos presentes autos ainda que nele não concorressem os pressupostos processuais em matéria de legitimidade (quer activa quer passiva) que seria necessário reunir caso a decisão dessa questão fosse o objecto principal, e não meramente incidental, do processo.

  9. O que deverá considerar-se corresponder a um princípio geral de natureza jurídico-processual - cujo esclarecimento justifica a presente revista para permitir uma melhor aplicação do direito - de que a nulidade ou anulabilidade de um contrato, embora não sendo a sua declaração o objecto, quer por via do pedido quer por via da reconvenção, do processo, pode nele ser resolvida e conhecida a título incidental, embora apenas por força de caso julgado dentro do próprio processo e para os efeitos desse processo, ainda que nele não estejam preenchidos todos os pressupostos processuais que seria necessário estarem coligidos para a sua apreciação a título não meramente...

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