Acórdão nº 21768/16.7T8PRT.P1.S1 de Supremo Tribunal de Justiça (Portugal), 12 de Novembro de 2019

Magistrado ResponsávelJOSÉ RAINHO
Data da Resolução12 de Novembro de 2019
EmissorSupremo Tribunal de Justiça (Portugal)

Acordam no Supremo Tribunal de Justiça (6ª Secção): I - RELATÓRIO AA, demandou, pelo Tribunal Judicial do Porto e em autos de ação declarativa com processo comum, BB e CC peticionando que (i) seja reconhecido e declarado que o autor não é filho do 1º réu e, em consequência, que seja ordenada a eliminação da paternidade constante do seu assento de nascimento, bem como a respetiva avoenga paterna, e que (ii) seja reconhecida e declarada a paternidade do autor relativamente ao 2º réu, devendo, em consequência, ordenar-se o respetivo averbamento no seu assento de nascimento.

Alegou para o efeito, em síntese, que nasceu em ..., tendo sido registado como filho do réu AA, isto na sequência de perfilhação levada a efeito por tal réu. O referido réu sempre constituiu para o autor a sua figura paterna pois foi ele que o educou, alimentou e com quem criou laços de afetividade entre pai-filho. Porém, há cerca de seis meses o autor começou a suspeitar que a pessoa que sempre considerou como pai não seria afinal o seu pai biológico, tendo confrontado a mãe com a questão da sua paternidade. Esta confessou que, efetivamente, o pai biológico do autor era o réu CC, o qual, à data da concepção e nascimento do autor, era marido da mãe do autor e a única pessoa com que a mãe mantinha relações sexuais. A mãe do autor só começou a namorar com o réu AA, com quem depois veio a casar, após a dissolução do casamento com o réu CC. O réu AA, por sua iniciativa, propôs-se assumir a paternidade do autor, perfilhando-o.

O réu CC contestou a ação, negando a paternidade que lhe foi imputada e concluindo pela improcedência da ação.

Alegou, em síntese, que a mãe do autor se relacionava sexualmente com outros homens, razão pela qual o respetivo casamento entrou em rutura, acabando o casal por se separar em Junho de 1980, não tendo havido entre eles mais qualquer contacto íntimo.

O réu AA não contestou formalmente, mas veio ao processo declarar que os factos alegados pelo autor são verdadeiros e que não se opõe ao respetivo pedido.

Seguindo o processo seus termos, veio, a final, a ser proferida sentença que julgou estar caduco o direito de ação do autor, absolvendo os réus do pedido.

Inconformado com o assim decidido, apelou o autor.

Fê-lo com êxito, pois que a Relação do Porto revogou a sentença, declarando que o autor não é filho do réu AA, mas sim do réu CC, ordenando as correspondentes consequências registrais.

É agora a vez do réu CC, insatisfeito com o decidido, pedir revista.

Da respetiva alegação extrai as seguintes conclusões: A. Vem o presente recurso da circunstância do Réu, aqui Recorrente, não se conformar com o douto Acórdão do Tribunal da Relação do Porto proferido nos presentes autos, que conclui que nenhum dos pedidos/direitos formulados pelo Autor se encontra caducado, porquanto, o autor pode «instaurar a todo o tempo ação de impugnação da paternidade resultante de perfilhação inscrita no respeito registo de nascimento, o autor ainda dispunha de três anos, após o sucesso desta e o subsequente cancelamento do registo da perfilhação, para instaurar a ação de investigação da paternidade do seu pai biológico».

B. Sucede que, salvo o devido e merecido respeito que é muito, não poderá o ora Recorrente aceitar uma tal decisão, entendendo, ao invés, e perfilhando o entendimento explanado na primeira decisão proferida (pelo Juízo de Família e Menores do Porto) - a qual, no nosso modesto entendimento, não merecia qualquer reparo ou correção, encontrando-se, quer em termos de facto quer em termos de direito, em plena conformidade com o direito e a justiça - o direito do Autor em ver reconhecido que o 2.º Réu é que é o seu pai, e não o 1.º Réu, caducou, extinguiu-se.

C. Isto porque, atendendo aos factos dado como provados em sede de sentença e que não foram sequer colocados em causa pelo Insigne Tribunal da Relação do Porto, designadamente nos pontos 1, 13 e 21: o Autor, tendo nascido no dia ..., completou 18 anos e, consequentemente, atingiu a maioridade, no dia ...; a presente ação de impugnação e investigação da paternidade foi intentada em 04 de Novembro de 2016, ou seja, decorridos mais de dez anos sobre a maioridade do Autor; o Autor teve conhecimento de que o 1.º Réu (BB) não era o seu verdadeiro pai já no verão do ano de 2012 (sendo este o momento relevante a partir do qual se pode começar a contar o prazo de caducidade da ação).

D. Pelo que, facilmente se constata que, de igual forma, se mostra ultrapassado o prazo de três anos previsto no n.º 3 do referido artigo 1817.º, por referência à sua alínea b), sendo que a ação deveria ter sido proposta até ao verão do ano de 2015.

Outrossim, E. No que respeita à invocada inconstitucionalidade dos n.ºs 1 e 3 do artigo 1817.º do Código Civil, a jurisprudência maioritária, atual e dominante é clara: antes de tudo o mais, o Tribunal Constitucional, no Acórdão n.º 401/2011, do seu Plenário de 22 de Setembro de 2011, com a entrada em vigor da Lei n.º 14/2009, de 01 de Abril que veio alargar os prazos (estabelecidos no artigo 1817.º n.ºs 1, 2 e 3 do Código Civil) de caducidade para a propositura da ação de investigação, decidiu não julgar inconstitucional tal norma.

F. No mesmo sentido, a jurisprudência do Tribunal Europeu dos Direitos do Homem também já teve oportunidade de se pronunciar, tendo entendido que existe compatibilidade entre as limitações temporais ao exercício do direito de investigação da paternidade com os princípios da Convenção Europeia dos Direitos do Homem, designadamente com o direito ao respeito da vida privada e familiar, consagrado no artigo 8.º da Convenção.

G. Por sua vez, o mesmo entendimento tem vindo a ser perfilhado por este Egrégio Supremo Tribunal de Justiça. A propósito, vide os recentes Acórdãos proferidos em 13/03/2018 (proferido no âmbito do Processo n.º 2947/12.2TBVLG.P1.S1), 03/05/2018 (proferido no âmbito do Processo n.º 454/13.5TVPRT.P1.S3) e 05/06/2018 (proferido no âmbito do Processo n.º 65/14.8T8FAF.G1.S1), todos disponíveis in www.dgsi.pt.

H. Assim como as últimas decisões dos vários Tribunais das Relações, tais como: Acórdão do Tribunal da Relação de Évora de 11/01/2018 (proferido no âmbito do Processo n.º 1885/16.4T8TMR.E1), Acórdão do Tribunal da Relação do Porto de 10/05/2018 (proferido no âmbito do Processo n.º 6554/15.0T8MAI.Pl), Acórdão do Tribunal da Relação de Lisboa de 17/05/2018 (proferido no âmbito do Processo n.º 1731/16.9T8CSC.Ll), Acórdão do Tribunal da Relação de Coimbra de 05/06/2018 (proferido no âmbito do Processo n.º 7412/16.6T8CBR.C1), e Acórdão do Tribunal da Relação de Guimarães de 18/10/2018 (proferido no âmbito do Processo n.º 503/18.0T8VNF.Gl), todos disponíveis in www.dgsi.pt.

Por todo o exposto, I. Sufragando a tendência atual da jurisprudência, entende o aqui...

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