Acórdão nº 199/14.9PLLSB-A.S1 de Supremo Tribunal de Justiça (Portugal), 19 de Julho de 2019

Magistrado ResponsávelRAUL BORGES
Data da Resolução19 de Julho de 2019
EmissorSupremo Tribunal de Justiça (Portugal)

O cidadão nacional, AA, arguido preso em cumprimento de pena no Estabelecimento Prisional de Lisboa, à ordem do processo comum singular n.º 199/14.9PLLSB, do Juízo Local Criminal de Lisboa – Juiz 10, vem, nos termos dos artigos 222.º, n.º 1, alínea a) e 223.º do Código de Processo Penal, apresentar providência de habeas corpus, nos termos e pelos seguintes fundamentos: 1. Por decisão transitada em julgado no dia 14.03.2019, pela prática do crime de condução de veículo sem habilitação legal, previsto e punido pelo artigo 3º n.º 1 e 2 do Dec. Lei 2/98, de 3 de Janeiro, na pena de prisão efetiva de 1 anos e 2 meses.

  1. O arguido foi detido no dia 27/06/2019 no âmbito de um Mandado de Detenção ao abrigo dos presentes autos, encontrando-se em cumprimento de pena no Estabelecimento Prisional de Lisboa.

  2. Esse mandato tem como data de sentença a 31.01.2019 e que a mesma transitou em julgado a 14.03.2019, ora compulsados os autos, e atendendo à decisão do Tribunal da Relação de Lisboa, cujo acórdão se encontra datado de 27 de fevereiro de 2019, é notório que as datas constantes do mandato de detenção se encontram incorretas.

    Mais, 4. O arguido no dia da sua detenção encontrava-se em cumprimento duma outra pena em prisão em regime de permanência na habitação com vigilância eletrónica, ao abrigo do processo 225/17.0pwlsblisboa – Juízo Local Pequena Criminalidade - juiz 2, com data de trânsito também a 14.03.2019.

  3. Salvo o devido respeito, deve-se dizer que o cumprimento desta pena de prisão efetiva no âmbito do processo 199/14.9PLLSB, é manifestamente ilegal.

    Senão vejamos, 6. Com a entrada em vigor da Lei n.º 115/2009, de 12-09-2009, que criou o CEPMPL (Código da Execução das Penas e Medidas Privativas da Liberdade), a competência, material, para o acompanhamento das penas e fiscalização destas, pertence ao (Tribunal da Execução das Penas), e não ao tribunal da condenação.

  4. Alias, o tribunal da condenação destes autos, sobrepôs-se a uma outra decisão, ao fazer cumprir o mandado de detenção, deter o recorrente, tendo os OPC contactado os serviços da DGSP para procederem ao desligamento do aparelho eletrónico, e mandar conduzir o recorrente para um estabelecimento Prisional, quando este estava em cumprimento de pena ao abrigo do processo 225/17.0PWLSB LISBOA - JL P. CRIMINALIDADE - JUIZ 2.

    Ora, 8. O n.º 2 do art.º 138.º do Código de Execução de Penas deve ser interpretado criticamente, que prescreve o seguinte: “2 - Após o trânsito em julgado da sentença que determinou a aplicação de pena ou medida privativa da liberdade, compete ao tribunal de execução das penas acompanhar e fiscalizar a respectiva execução e decidir da sua modificação, substituição e extinção, sem prejuízo do disposto no artigo 371.º-A do Código de Processo Penal. (sublinhado nosso).

  5. Temos então que, havendo cumprimento sucessivo de penas, como é o caso, caberia ao Tribunal de Penas que no âmbito das atribuições materiais especificamente atribuídas, o acompanhamento e fiscalização da pena de prisão, e bem assim da modificação, substituição e extinção, da mesma, tudo sem prejuízo do disposto no artigo 371.º-A do CPP, norma esta que, perante a entrada em vigor de lei mais favorável, faculta ao condenado a reabertura da audiência de modo a possibilitar a aplicação do novo regime substantivo penal.

  6. Dito por outras palavras, compete ao TEP acompanhar e fiscalizar o cumprimento de pena, o que não foi feito nos presentes autos.

  7. E pese embora, a emissão de mandados de detenção contra condenado em pena de prisão, por sentença com trânsito em julgado pertencer ao Tribunal da condenação, esta emissão só poderia ser feita e concretizada, após o desligamento da pena de Prisão em regime de permanência na habitação com vigilância eletrónica no âmbito do processo 225/17.0PWLSB Lisboa - JLP criminalidade - juiz 2, que o recorrente estava a cumprir.

    Pelo que, 12. O habeas corpus é uma providência excecional que visa garantir a liberdade individual contra os abusos de poder consubstanciados em situações de detenção ou prisão ilegal, com suporte no artigo 31° da CRP, que o institui como autêntica garantia constitucional de tutelada liberdade.

  8. No caso em apreço, conhece aplicabilidade o fundamento da alínea a) - Ter sido efetuada ou ordenada por entidade incompetente 14. O habeas corpus tem, em sede de direito ordinário, como fundamentos, que se reconduzem todos à ilegalidade da prisão: a incompetência da entidade donde partiu a prisão; a motivação imprópria; e o excesso de prazos, sendo ainda necessário que a ilegalidade da prisão seja atual, atualidade reportada ao momento em que é apreciado aquele pedido.

  9. Em sede de previsão constitucional, o acento tónico do habeas corpus é posto na ocorrência de abuso de poder, por virtude de prisão ilegal, na proteção do direito à liberdade, constituindo uma providência a decretar apenas nos casos de atentado ilegítimo à liberdade individual - grave e em princípio grosseiro e rapidamente verificável - que integrem as hipóteses de causas de ilegalidade da detenção ou da prisão taxativamente indicadas nas disposições legais que desenvolvem o preceito constitucional.

  10. Atendendo ao caso concreto verifica-se um abuso de poder, por virtude de prisão ilegal e por atentado ilegítimo à liberdade individual, verifica-se claramente que o Tribunal da emissão do mandado de detenção e condução a E.P., não tinha competência para proceder à emissão de mandatos de detenção sem que houvesse um mandado de desligamento por parte do Juiz 2- Local P. Criminalidade de Lisboa.

  11. Assim sendo, não pode deixar de se reconhecer fundamento à presente providência de habeas corpus.

    Nestes termos e nos mais de direito que v. Exa mui doutamente suprirá, deverá a presente Petição HABEAS CORPUS ser julgado procedente, por provada, e em consequência determinar-se a imediata restituição do Arguido à sua situação anterior, nos termos do processo 225/17.0PWLSB.

    Pelo exposto, requer-se a V.as Ex.as o deferimento do peticionado habeas corpus, declarando ilegal a prisão e ordenando a imediata restituição do Arguido à sua situação anterior, e se fará JUSTIÇA! *** Os autos foram instruídos de acordo com o consignado no despacho de fls. 7 verso, com junção de certidão das peças processuais pertinentes à apreciação do pedido.

    *** No Juízo Local Criminal de Lisboa – Juiz 10, da Comarca de Lisboa, foi exarada pela Exma. Juíza titular do processo a informação a que alude o artigo 223.º, n.º 1, do CPP, a fls. 6 a 7 verso destes autos, nestes termos: «Em obediência ao que se dispõe no art.º 223º/1 do Cód. Proc. Penal, informa-se que:

    1. Por sentença proferida e depositada informaticamente no dia 14.09.2017 o arguido foi condenado, pela prática de um crime de condução de veículo sem habilitação legal, previsto e punido pelo art.º 3.º, n.ºs 1 e 2 do Decreto-lei n.º 2/98, de 3 de Janeiro, na pena de 1 (um) ano e 2 (dois) meses de prisão.

    2. Desta sentença o arguido recorreu e, por acórdão de 31.01.2018, transitado em julgado o TRL declarou nula a sessão de audiência realizada a 14.09.2017 e subsequente leitura pública da sentença, e determinou o...

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