Acórdão nº 2123/17.8T8LRA.C1.S1 de Supremo Tribunal de Justiça (Portugal), 09 de Outubro de 2019

Magistrado ResponsávelFERREIRA PINTO
Data da Resolução09 de Outubro de 2019
EmissorSupremo Tribunal de Justiça (Portugal)

Processo n.º 2123/17.8T8LRA.C1.S2 – Revista (4ª Secção)[1] Acordam na Secção Social do Supremo Tribunal de Justiça I Relatório[2]: AA instaurou, em 08.05.2017, no Tribunal Judicial da Comarca ... – Juízo do Trabalho ... – Juiz 3, a presente ação, com processo especial, de impugnação judicial da regularidade e licitude do seu despedimento, que lhe foi promovido por "BBS. A.” pedindo que seja declarada a ilicitude ou irregularidade do mesmo, com as legais consequências.

***** Realizada audiência de partes, na qual não foi possível obter conciliação, e notificada que foi a Entidade Empregadora, apresentou esta o seu articulado, alegando, em síntese, que devido ao comportamento culposo da Trabalhadora a despediu com justa causa no final do respetivo procedimento disciplinar, concluindo pela procedência do articulado.

***** A Trabalhadora apresentou contestação, excecionando a caducidade e invalidade do processo disciplinar, por: - Não ter o procedimento disciplinar se iniciado nos 60 dias subsequentes ao conhecimento das infrações; - O inquérito não ter sido iniciado nos 30 dias seguintes à suspeita dos comportamentos irregulares e por, o mesmo, não ter sido conduzido de forma diligente; - A decisão disciplinar não se encontrar devidamente fundamentada; - Por, na decisão, ter sido apreciado o seu passado disciplinar, factos que não constavam da nota de culpa, não tendo, pois, sido ouvida sobre tais factos; - Os factos provados não consubstanciam justa causa para o seu despedimento.

E deduziu pedido reconvencional, pretendendo, por esta via: a. A anulação das sanções disciplinares que lhe foram anteriormente aplicadas – de suspensão por 30 dias e por 90 dias com perda de retribuição e antiguidade – por decisões de 15.02.2016 e 12.01.2017; b. A condenação da Empregadora no pagamento dos montantes retributivos que deixou de auferir por aplicação de tais sanções disciplinares – de € 2.054,41 e € 3.081,62; c. A sua condenação também no pagamento: i. de uma indemnização em substituição da reintegração, em montante não inferior a 60 dias por cada ano completo de antiguidade (que calcula em € 92.544,13); ii. de uma indemnização por danos não patrimoniais causados em virtude da aplicação da sanção de despedimento, em montante não inferior a € 2.300,00; iii. nos juros de mora devidos, à taxa legal, desde a data da citação até integral pagamento.

***** A Empregadora (reconvinda) apresentou resposta à contestação, concluindo pela validade e pela não caducidade do procedimento disciplinar e pela improcedência do pedido reconvencional.

***** Em sede de despacho saneador, foi parcialmente admitida a reconvenção deduzida pela Trabalhadora [com exceção dos pedidos 1) e 2), acima identificados]. Dispensou-se a fixação da matéria de facto assente, bem como a seleção da base instrutória.

***** Realizada a audiência de julgamento, foi proferida, em 27.03.2018, sentença que julgou a ação parcialmente procedente e, em consequência: a) “Declarou ilícito o despedimento da Trabalhadora AA, quer por invalidade do processo disciplinar quer por falta de justa causa, pela Entidade Empregadora “BB, SA”, considerando-se este como efetivado em 23.03.2017; b) Condenou a Entidade Empregadora a pagar à Trabalhadora, a título de retribuições intercalares, a quantia mensal correspondente à sua remuneração base (de € 2054,41) desde a data do despedimento até ao trânsito em julgado desta sentença, acrescida de juros de mora, à taxa legal, contados desde tal data (do trânsito em julgado) até efetivo e integral pagamento, deduzindo-se as quantias previstas no art.º 390º, nº 2, do CT; c) Condenou a Entidade Empregadora a pagar à Trabalhadora, a título de indemnização por antiguidade, a quantia correspondente a 30 dias de retribuição base por cada ano completo ou fração de antiguidade, considerando-se que esta remonta a 01 de Setembro de 1994, acrescida de juros de mora, à taxa legal, desde a data da notificação da Entidade Empregadora da Contestação-Reconvenção deduzida pela Trabalhadora; d) Condenou a Entidade Empregadora a pagar à Trabalhadora, a título de danos não patrimoniais, a quantia de € 2.000,00 (dois mil euros), acrescida de juros de mora, à taxa legal, desde a notificação da Entidade Empregadora da Contestação-Reconvenção deduzida pela Trabalhadora; e) Absolveu a Entidade Empregadora do demais peticionado pela Trabalhadora.” Para o efeito considerou o seguinte: “Quanto à invocada falta de fundamentação da decisão disciplinar, mormente no que toca à descrição dos factos imputados (nas circunstâncias de tempo e modo), e suas consequências, em nada se comprova qualquer violação do direito de defesa da trabalhadora, que respondeu a cada um deles.

Já não assim quanto à mencionada imputação de novos factos, verificando-se outrossim que a decisão final alude a processos e sanções disciplinares anteriores, omitidos na Nota de Culpa e utilizados para fundamentar a gravidade da culpa da Trabalhadora.

A invocação de tais factos, que não atenuam a sua responsabilidade, torna o procedimento disciplinar inválido, nos termos previstos nos artºs. 357º, n.º 4 e 382º, n,º 2, al. d) do CT, logo ilícito - cf. art.º 382º, n.º 1 CT” (sublinhado nosso).

II Inconformada a Empregadora com esta decisão, interpôs recurso de apelação, arguiu, expressa e separadamente, a nulidade da sentença por omissão de pronúncia, nos termos da alínea d), do n.º 1, do artigo 615º, CPC, impugnou a decisão proferida sobre a matéria de facto, pugna pela validade do procedimento disciplinar alegando que a nota de culpa cumpre os requisitos legais [a existência de anteriores processos e sanções disciplinares não traduzem nenhum comportamento nem constituem factos integradores de infração, mas apenas a escolha da sanção disciplinar a aplicar] e que, além do mais, é entendimento da nossa jurisprudência, que a consequência da imputação de um facto que não conste da nota de culpa nunca poderá ser a invalidade do processo disciplinar.

Em consequência, diz ter havido justa causa para o despedimento da Trabalhadora.

***** Por acórdão proferido, em 28 de novembro de 2018, pelo Tribunal da Relação de Coimbra, foi a apelação julgada totalmente improcedente com integral confirmação da sentença impugnada.

Para o efeito, teve-se em consideração o seguinte: “No que concerne à questão do despedimento, ou melhor, à questão de saber se ocorreu ou não justa causa, há que atentar no facto de nas ações de apreciação judicial do despedimento, o empregador apenas pode invocar factos e fundamentos constantes da decisão de despedimento comunicada ao trabalhador (n.º 3 do art.º 387º do CT); e nesta decisão não podem ser invocados factos não constantes da nota de culpa ou da resposta do trabalhador, salvo se atenuarem a responsabilidade (n.º 4 do art.º 357º do CT).

De salientar ainda que só os factos com relevo ou interesse para a decisão, segundo as diversas soluções plausíveis da questão de direito, devem ser objeto de reapreciação, sob pena de se estar a praticar atos inúteis.

No caso em apreciação, há a dizer que o despedimento foi declarado ilícito, como acima ficou consignado, por duas razões, a saber: por se ter considerado inválido o procedimento disciplinar e por não ter ocorrido justa causa.

Apesar de ter declarado ilícito o despedimento por invalidade do PD, a 1ª instância apenas abordou a questão da justa causa porque assim a lei o exige (no n.º 4 do art.º 387 do CT que dispõe que “em casos de apreciação judicial de despedimento por facto imputável ao trabalhador, sem prejuízo da apreciação de vícios formais, o tribunal deve sempre pronunciar-se sobre a verificação e procedência dos fundamentos invocados para o despedimento”).

Esta (nova) exigência que “sem benefício para os interessados, implica um acréscimo desnecessário de trabalho para os juízes sempre que haja motivos formais para decretar a ilicitude do despedimento” – Código do Trabalho, anotado de Pedro Romano Martinez e outros, 8ª edição 2009, p. 993, anotação de P. Romano Martinez - apenas tem utilidade na situação em que o despedimento é irregular por terem ocorrido vícios procedimentais de segunda linha, não invalidantes a que se refere o n.º 2 do art.º 389º do CT, ou seja, quando o empregador omite ilicitamente as diligências probatórias a que aludem os nºs 1 e 3 do art.º 356º do mesmo código.

Nestes casos, apesar da omissão dessas diligências, torna-se importante ou relevante indagar sobre verificação de justa causa, porquanto se esta vier a ser declarada (se forem declarados procedentes os motivos invocados para o despedimento, ainda que o despedimento tenha sido declarado ilícito por questões procedimentais ou de forma) o trabalhador apenas tem direito à indemnização por despedimento e, ainda assim, reduzida a metade da prevista no art.º 391º do CT.

Não tem direito, nestes casos, aos salários ditos intercalares ou à indemnização por danos não patrimoniais.

Tudo isto para concluir que, não sendo processualmente admissível a prática de atos inúteis, da conjugação do disposto nos n.º 4 do art.º 387º com o n.º 2 do art.º 389º ambos do CT, o n.º 4 daquela primeiro preceito deve ser interpretado restritivamente no sentido de que, no caso de despedimento declarado ilícito por razões de vícios formais, apenas se exige que o tribunal se pronuncie sobre a procedência ou improcedência de justa causa quando estejam também em causa as irregularidade fundadas em deficiência de procedimento por omissão de diligências probatórias previstas no nºs 2 e 3 do art.º 356º do CT.

Ora, no nosso caso, nenhuma dessas irregularidades se suscita ou suscitou no âmbito dos presentes autos.

O que acontece é que na nota de culpa (cf.. facto 9) se omitiu por completo qualquer alusão ao passado disciplinar da trabalhadora, às sanções disciplinares que lhe foram aplicadas. Todavia, na decisão final, no que concerne à aplicação da sanção, ponderou-se “que a trabalhadora tem sanções disciplinares registadas, sendo reincidente nos comportamentos descritos...

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