Acórdão nº 385/18.2T8PVZ.P1.S1 de Supremo Tribunal de Justiça (Portugal), 01 de Outubro de 2019

Magistrado ResponsávelFÁTIMA GOMES
Data da Resolução01 de Outubro de 2019
EmissorSupremo Tribunal de Justiça (Portugal)

Acordam no Supremo Tribunal de Justiça I. RELATÓRIO 1.

"AA, Lda." propôs a presente acção declarativa condenatória, com processo comum, contra "BB, Lda." e "CC", formulando os seguintes pedidos: "a) Ser a 1ª a R. condenada a pagar à A., ao abrigo do "instrumento particular de parceria sobre os direitos económicos do vínculo desportivo de atleta profissional de futebol", da quantia de 36.000,00 € a título de direitos económicos do jogador DD, mais IV A à taxa legal em vigor, acrescidos de juros de mora desde a citação até integral e efectivo pagamento; b) Subsidiariamente, para o caso do "instrumento particular de parceria sobre os direitos económicos do vínculo desportivo de atleta profissional de futebol", alegado em 40 a 170 e junto como documento 3, vir a ser julgado nulo, ineficaz ou inexequível, e não obter vencimento o supra alegado em 33° a 42° desta p.i., mais deve: b.l) Declarar-se que a A. tem o direito de exigir da l .ª R. a restituição da quantia de 36.000,00€, mais IVA à taxa legal em vigor, a título de enriquecimento sem causa, acrescidos de juros de mora à taxa legal em vigor desde a citação até integral e efectivo pagamento; b.2) Ser a 1ª R. condenada a reconhecer o pedido formulado em b.1 ); b.3) Ser a 1ª R. condenada a pagar à A. a quantia de 36.000,00€, mais IVA à taxa legal em vigor, a título de enriquecimento sem causa, acrescidos de juros de mora à taxa legal desde a citação até integral e efectivo pagamento; c) Subsidiariamente, para o caso do supra alegado em 24° a 27° e 30° a 42° e 43º a 53° (por referência à 1 a R.) não resultar provado. e não forem julgados procedentes os pedidos supra formulados em a) e b), mais deve o 2ª R. ser condenado a pagar à A., ao abrigo do "instrumento particular de parceria sobre os direitos económicos do vínculo desportivo de atleta profissional de futebol", da quantia de 36.000,00€, mais IVA à taxa legal em vigor, a título de direitos económicos do jogador DD, acrescidos de juros de mora desde a citação até integral e efectivo pagamento; d) Subsidiariamente, para o caso do "instrumento particular de parceria sobre os direitos económicos do vinculo desportivo de atleta profissional de futebol", alegado em 4° a 17º e junto como documento 3, vir a ser nulo, ineficaz ou inexequível, por referência ao 2° R. e não obter vencimento o supra alegado em 59º a 70º desta p.i., nem for julgado provado e procedente o pedido c) supra formulado, mais deve: d.l) Declarar-se que a A. tem o direito de exigir do 2ª R. a restituição da quantia de 36.000,00€, mais IVA à taxa legal em vigor, a título de enriquecimento sem causa, acrescidos de juros de mora à taxa legal desde a citação até integral e efectivo pagamento; d.2) Ser a 2ª R. condenado a reconhecer o pedido formulado em d.l ); d.3) Ser a 2ª R. condenado a pagar à A. a quantia de 36.000,00€, mais IVA à taxa legal em vigor, a título de enriquecimento sem causa, acrescidos de juros de mora à taxa legal desde a citação até integral e efectivo pagamento".

Alegou, para tanto, ter celebrado com o segundo réu um contrato, que reduziram a escrito e denominaram de "instrumento particular de parceria sobre os direitos económicos do vincula desportivo de atleta de futebol", mediante o qual aquele cedeu a este 20% dos direitos económicos decorrentes de qualquer futura transferência do atleta DD, jogador contratado por este clube, e que, tendo em 3 de Julho de 2015 sido constituída a primeira ré e cedidos a esta a posição no contrato de trabalho e os direitos económicos do jogador e vindo este a ser transferido em Maio de 2016, nenhum dos réus procedeu ao pagamento à autora daquela percentagem no valor da transferência de 180.000,00€. Mais alegou ter promovido e participado nas reuniões entre os responsáveis da primeira ré e do clube para o qual o jogador foi transferido, sustentando, por isso, que caso se considere aquele contrato nulo, é-lhe devida a mesma quantia a título de enriquecimento sem causa.

O "CC" apresentou também contestação, defendendo-se por impugnação. Assentou a sua defesa no facto de não ter recebido qualquer valor da transferência do jogador e, nessa medida e apesar de ter celebrado o aludido contrato com a autora, nenhum valor poder com esta repartir.

A Autora exerceu o contraditório quanto aos fundamentos de defesa dos réus.

  1. Foi proferido saneador-sentença que julgou a acção procedente e condenou a "CC Futebol BB, Lda." a pagar à Autora a quantia de 36.000,00€, acrescida de juros calculados à taxa de 4% ao ano desde 10 de Março de 2018 até efectivo e integral pagamento, bem como o valor IVA calculado à taxa legal em vigor à data da liquidação do imposto.

  2. Inconformada com a sentença, a l.ª Ré interpôs recurso, que foi conhecido pelo TR e que veio a decidir: “Pelo exposto, acordam as Juízas que constituem este Tribunal da Relação do Porto em julgar improcedente o recurso, e em consequência, confirmam a sentença.” 5.

    Novamente inconformada, a recorrente (1.ª R) interpôs recurso de revista, na qual formula as seguintes conclusões (transcrição): “A – Versa o presente recurso sobre o acórdão do Tribunal da Relação do Porto, que com fundamentação diferente do que havia sido a fundamentação do Tribunal de 1ª instância, concluiu pela condenação da 1ª R.

    B – Com o devido respeito, crê-se que ao condenar a 1ª R. no pedido, com fundamento na sub-rogação legal do contrato de trabalho desportivo, considerando o acordo celebrado entre a A. e o 2º R como obrigação decorrente da relação laboral, o Tribunal não fez a mais criteriosa apreciação das circunstâncias em análise nos autos e não fez adequada interpretação da questão sub judice, nem o melhor enquadramento legal.

    C – A transferência ope legis do contrato de trabalho desportivo celebrado entre o 2º R. e o Jogador DD, para a 1ª R. por força da criação desta ao abrigo do DL nº 10/2013 de 25 de Janeiro, conforme decorre do artigo 24º, não acarreta a transmissão para a 1ª R. das obrigações decorrentes do acordo celebrado entre a A. e o 2º R. quanto à repartição dos direitos económicos que o 2º R. viesse a obter com a transferência do jogador ou indemnização pela cessação do contrato.

    D – Em primeiro lugar, dir-se-á que o acordo entre o A. e o 2ª R. pelo qual este cedeu aquele determinada percentagem dos direitos económicos do jogador DD foi celebrado para vigorar APENAS e SÓ enquanto perdurasse o contrato de trabalho entre esse atleta e o 2º R. e/ou qualquer das suas renovações.

    E – Aliás, isso resulta da própria natureza dos direitos cedidos (direitos económicos), que conforme resulta do contrato, mais não são que a mera expectativa patrimonial decorrente da contrapartida financeira proveniente da transferência onerosa do Jogador ou indemnização pela cessação do contrato de trabalho desportivo.

    F - O mesmo é dizer que o 2º R. só havia de repartir a percentagem que viesse a auferir com a A., se DURANTE a execução do contrato de trabalho entre o 2º R. e o Jogador se verificassem aquelas condições susceptíveis de gerar uma mais valia financeira.

    H – No espírito do contrato, se houvesse uma qualquer vicissitude contratual que determinasse a circunstância de o 2º R. deixar de ser entidade empregadora daquele jogador sem auferir qualquer quantia, nada havia a repartir com a A.

    I – A transferência ope legis do contrato de trabalho desportivo não gerou qualquer provento financeiro para o 2º R., que deixou de ser entidade empregadora do contrato de trabalho desportivo celebrado com o Jogador DD.

    J – Assim interpretado o contrato celebrado entre a A. e o 2º R. só uma interpretação errónea do mesmo pelo Tribunal pôde levar ao resultado que consta da decisão recorrida, pois tal significa atribuir efeitos ao contrato o mesmo já havia sido transferido para a 1ª R.

    K – A correcta análise do contrato à luz dos direitos que o 2º R. detinha e a cessão de créditos que acordou permitem concluir que com a transferência ope legis do contrato, sem qualquer contrapartida, nada haveria para repartir com a A.

    L - A tese de uma transição para a 1ª R. do acordo que havia sido celebrado entre o 2º R. e a A., a pretexto da transição do contrato de trabalho desportivo, não tem razão de ser, nem suporte legal.

    M - A questão dos direitos económicos do jogador é um direito eventual, falando-se a este respeito em “germe de direito”, em “direito nascituro que pode surgir e pode ainda abortar”.

    N - Existe uma panóplia de situações em que não há qualquer receita para a entidade empregadora em decorrência do contrato de trabalho desportivo: pense-se nas hipóteses em que o Jogador cumpre integralmente o contrato até ao seu termo, vindo o mesmo a expirar por caducidade, ou ainda numa revogação por mútuo acordo entre a entidade empregadora e jogador ou como sucedeu no caso presente, a transferência ope legis do contrato de trabalho desportivo por força da criação da sociedade desportiva.

    O - NÃO EXISTE norma legal que determine a transferência de quaisquer direitos e obrigações do contrato de repartição dos direitos económicos que foi celebrado entre a A. e o 2.º R., que só existiu porque havia um contrato de trabalho desportivo, MAS só enquanto o mesmo perdurasse.

    P - Aqui não se trata de obrigações do 2º R. enquanto entidade empregadora, que foram transferidos para a 1ª R. por força da “sub-rogação legal do contrato” como refere a decisão recorrida.

    R – A decisão recorrida não acolhe a causa de pedir invocada pela A. ao abrigo da qual sustentava a condenação da 1ª R. por força do artigo 22º do DL 10/2013 de 25 de Janeiro, pois o mesmo apenas se refere às entradas em espécie e não indica substracto legal para a condenação legal da 1ª R. no pedido.

    S – Com a transferência ope legis do contrato de trabalho desportivo, gerou-se ex novo na esfera jurídica da 1ª R. a expectativa de obter uma quantia pela transferência do jogador ou obter uma indemnização pela cessação injustificada do contrato.

    T – Estamos perante uma perspectiva meramente civilista, que nada tem a ver com a perspectiva laboral...

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