Acórdão nº 61/11.7TBAVV-B.G1.S1 de Supremo Tribunal de Justiça (Portugal), 16 de Maio de 2019

Magistrado ResponsávelROSA TCHING
Data da Resolução16 de Maio de 2019
EmissorSupremo Tribunal de Justiça (Portugal)

ACORDAM NO SUPREMO TRIBUNAL DE JUSTIÇA 2ª SECÇÃO CÍVEL I. Relatório 1. Nos autos de Execução Comum que AA moveu contra BB e CC foi penhorado o prédio urbano composto de cave e rés-do-chão, para habitação, sito no lugar de …, da freguesia de …, concelho de …, descrito na Conservatória do Registo Predial de … sob o nº 532/… e inscrito na respetiva matriz urbana sob o artigo 327.

  1. Por apenso aos referidos autos, o Banco Comercial DD, S.A., reclamou a quantia de € 52.314,71 (cinquenta e dois mil trezentos e catorze euros e setenta e um cêntimos), por empréstimo concedido aos executados, acrescida dos juros respetivos e eventuais despesas, alegando ainda a existência de hipoteca que garante a invocada dívida.

  2. Na sequência de tal reclamação, não foi deduzida qualquer impugnação.

  3. Foi de seguida proferida sentença de verificação e graduação de créditos, cujo segmento decisório é o seguinte: « Por todo o exposto: a) julgo reconhecidos os créditos reclamados; b) graduo os créditos ora reconhecidos, nos seguintes termos: - em primeiro lugar, o crédito reclamado pelo credor Banco DD, SA, garantido pela hipoteca até ao montante especificamente indicado no registo e incluindo os juros e as cláusulas penais que tenham sido acordadas para o caso de incumprimento apenas até aos últimos três anos; - em segundo lugar, o crédito exequendo».

  4. Inconformado com esta decisão, dela apelou o exequente para o Tribunal da Relação de Guimarães, que, por acórdão proferido em 27.09.2018, julgou a apelação procedente e alterou a decisão recorrida, reconhecendo o direito de retenção invocado pelo exequente e reformulando a graduação dos créditos nos seguintes termos: «1. Em primeiro lugar o crédito exequendo e 2. Em segundo lugar o crédito do reclamante Banco DD, SA» 6. Inconformado com esta decisão, dela interpôs o credor reclamante, Banco DD, SA para o Supremo Tribunal de Justiça, concluindo as suas alegações com as seguintes conclusões que se transcrevem: «1 - O Recorrente não foi citado, nem notificado, do direito de retenção invocado pelo Exequente no requerimento executivo.

    2 - Pelo que não podia o credor Reclamante, ora Recorrente, impugnar um direito invocado pelo exequente que desconhecia de todo.

    3 - Resulta, pois, que existe uma nulidade processual, nos termos do disposto no artigo 201º do CPC, por falta de citação do credor para impugnar o direito invocado.

    4 - Impõe-se ao exequente que no requerimento executivo dirigido ao juiz, exponha sucintamente os factos que fundamentam o pedido, quando não constem do título executivo, art. 724º n.º 1 al. e) do CPC, sendo que às partes cabe alegar os factos essenciais que constituem a causa de pedir e aqueles em que se baseiam as execuções invocadas, art. 5º n.º 1 do CPC.

    5 - Dos factos invocados pelo exequente não foi alegado qualquer facto essencial que se possa concluir pela existência do direito de retenção que se arroga.

    6 - Antes, e apenas em declarações complementares, que não fazem de todo parte dos factos essenciais que devem ser invocados pelas partes, veio o exequente referir que goza de um direito de retenção, nos termos do disposto no artigo 754º do código Civil, sobre o imóvel penhorado 7 - Da sentença junta não resulta o reconhecimento de qualquer direito de retenção, 8 - Nem sequer o mesmo foi peticionado 9 - Nem tão pouco alegado no requerimento executivo nos factos tidos como essenciais.

    10 - Cabia, pois, ao exequente que alegar o direito de retenção sobre o imóvel penhorado nos autos, fazer prova dos factos constitutivos do direito alegado, nos termos do disposto no artigo 342º do CC, sendo que caso dúvidas houvesse quanto à realidade dos factos e sobre a repartição do ónus da prova, deveria resolver-se contra a parte a quem aproveita e nunca contra o credor Reclamante, ora Recorrente, artigo 414º do CPC.

    11 - Tratando-se de um facto essencial que constitui a causa de pedir o mesmo devia ter sido alegado e provado no requerimento executivo. O que não FEZ!! 12 - Pelo que não podiam os Meritíssimos Juízes Desembargadores reconhecer um direito que não foi alegado, nem provado, violando o princípio inscrito no disposto do artigo 615º do CPC.

    13 - Sendo, por isso, completamente desadequado determinar que o exequente goza de um direito de retenção, facto esse que nunca foi alegado pelo exequente, como resulta por demais evidente, da análise dos factos que constituem a causa de pedir no requerimento executivo apresentado, nem sequer provado tendo em conta a decisão junta.

    14 - A decisão recorrida é nula porque enferma de nulidade processual, nos termos do disposto no artigo 201º do CPC devendo, pois, ser substituída por outra o que expressamente se requer 15 - E, caso assim não se entenda, é nula também, por força da 2ª parte da alínea d) do nº 1 do artigo 615º porquanto assenta a respectiva fundamentação em factos que não foram alegados pelo Exequente, nem provados, violando, claramente, o disposto nos artigos 724º alínea e) e 5.º n.º 1 ambos do CPC, artigo 342.º n.º do Código Civil e 414º do CPC, pelo que deve a mesma ser substituída por outra, o que expressamente se requer.

    16 - Com base nessas nulidades, a decisão recorrida deve assim ser revogada no seu todo».

    Termos em que requer seja revogado o acórdão recorrido.

  5. O exequente respondeu, terminando as suas contra-alegações com as seguintes conclusões que se transcrevem: «1. As questões das pretensas nulidade da sua citação/notificação, da falta de alegação de factos essenciais no requerimento executivo e da falta de reconhecimento judicial do direito de retenção levantadas pela Recorrente nas suas alegações de Recurso deveriam ter sido, mas não foram suscitadas perante a 2.ª Instância, de cuja decisão agora recorre, quando, manifestamente, poderiam tê-lo sido.

  6. Constituindo as matérias das pretensas nulidade da citação/notificação, da pretensa falta de alegação de factos essenciais no requerimento executivo e da falta de reconhecimento judicial do direito de retenção suscitadas pela recorrente na suas motivação/conclusões do recurso, inquestionavelmente, questões novas, não submetidas à apreciação da Relação, não devem ser apreciadas pelo Supremo Tribunal, porque, por força do artigo 627.º n.º 1 do CPC, porque escapam ao fim do reexame previsto para o recurso.

  7. Desconhece o Recorrido se, de facto, a Recorrente foi sido citada ou notificada do direito de retenção invocado no requerimento executivo.

  8. A junção da reclamação de crédito ao processo executivo, acompanhada da procuração outorgada à sua ilustre mandatária, constitui uma intervenção (acto judicial) relevante que faz pressupor o conhecimento do processo que a procuração permite, de modo a presumir-se que a Recorrente prescindiu conscientemente de arguir a falta de citação/notificação.

  9. E esta presunção decorre, também, do facto da Recorrente ter optado por não responder às alegações de recurso de Apelação intentado pelo Exequente quando é óbvio que tinha também aí a possibilidade de alegar tal nulidade.

  10. Em conformidade com o preceituado no artigo 189.º do CPC, a pretensa nulidade, a existir, o que só por cautela de raciocínio se admite, acabou, assim, por sanar-se, 7. O Recorrido alegou os factos consubstanciadores do direito de retenção de que se arroga, no espaço constante do requerimento executivo denominado “DECLARAÇÕES COMPLEMENTARES” 8. O anexo “declarações complementares” (anexo C7) faz parte do requerimento executivo onde os factos que fundamentam o pedido que não constem do título executivo devem ser expostos, pelo que o Exequente, aqui Recorrido, cumpriu os termos do disposto no artigo 724.º n.º 1 al. D) do CPC, uma vez que este apenas obriga que tais factos constem “no requerimento executivo”.

  11. Do anexo I, constante da Portaria n.º 282/2013, de 29 de agosto, resulta que o anexo “declarações complementares” visa “prestar declarações complementares a qualquer dos restantes anexos”. Ora a “exposição de factos” consta precisamente de um anexo: o anexo C4 10. O próprio anexo I, constante da versão original constante da Portaria n.º 282/2013, de 29 de Agosto inclui como exemplo de utilização das declarações complementares a falta de espaço no anexo C4.

  12. É lícito ao Exequente “prestar declarações complementares”, ou seja, expor outros factos no anexo C7 complementares ao anexo C4, ou seja, á exposição de factos.

  13. O anexo C4 destina-se á exposição dos factos essenciais relacionados com a obrigação exequenda e não com a garantia que onera o bem cuja penhora o Exequente requereu no anexo P1.

  14. Os factos consubstanciadores do direito de retenção são também complementares do anexo P1 (destinado à nomeação pelo Exequente de bens imóveis à penhora), pelo que deveriam ter sido, como foram, alegados no anexo C7, destinado á prestação de declarações complementares.

  15. Assim, carece de razão o Recorrente quando afirma que o Exequente não alegou “qualquer facto essencial de que se possa concluir pela existência do direito de retenção de que se arroga”, uma vez que o fez no Requerimento Executo, no espaço/Anexo destinado para o efeito.

  16. O Recorrente em sede de reclamação de créditos, não obstante ter sido notificado em conformidade com o art. 789.º n.º 3 do CPC, não deduziu qualquer impugnação ao crédito do Exequente ou ao direito de retenção por este invocado, conforme lhe competia e com base em qualquer outro fundamento, para além dos elencados nos artigos 729º e 730 do CPC.

  17. Não tendo impugnado o crédito, nem o direito de retenção invocado pelo Exequente/recorrido, deve-se ter como aceite pelo Recorrente, não só direito de retenção invocado sobre o imóvel penhorado, como o crédito por este garantido e graduá-lo em conformidade com os nºs 2 e 4 do art. 791 do CPC, tendo em conta o preceituado no art. 759 nº 2 do C. Civil.

  18. A decisão judicial aqui sindicada julgou procedente o fundamento do recurso de apelação em que o aqui recorrido defendeu que a não impugnação, pelo credor reclamante, do invocado direito de retenção associado ao credito...

Para continuar a ler

PEÇA SUA AVALIAÇÃO
3 temas prácticos
3 sentencias

VLEX uses login cookies to provide you with a better browsing experience. If you click on 'Accept' or continue browsing this site we consider that you accept our cookie policy. ACCEPT