Acórdão nº 2010/12.6TBGMR-E.G1 de Supremo Tribunal de Justiça (Portugal), 04 de Julho de 2019

Magistrado ResponsávelMARIA JOÃO VAZ TOMÉ
Data da Resolução04 de Julho de 2019
EmissorSupremo Tribunal de Justiça (Portugal)

Acordam no Supremo Tribunal de Justiça, I - Relatório 1. AA e BB intentaram ação declarativa contra CC e DD – fls. 121 a 125.

  1. Alegaram, em síntese, que: - o testamento outorgado por EE, a 26 de Junho de 2005, é nulo na parte em que legou às Rés três prédios, em virtude de o testador não ser dono da totalidade dos legados, conforme foi reconhecido por sentença proferida no processo n.º 000/0000, que correu termos na 2.ª Vara Mista do .............; - os Autores exercem há 15/20 anos posse pacífica, pública, ininterrupta e de boa fé sobre os prédios, pelo que os adquiriram por usucapião; e - a 29 de julho de 1993, por escritura pública, compraram 2/8 indivisos e, a 27 de dezembro de 2010, por escrituras públicas (em número de duas), 6/8 dos referidos prédios, pelo que os adquiriram (também) por contrato de compra e venda.

  2. Formularam os seguintes pedidos: (A) declaração judicial da nulidade ou anulação das disposições do testamento outorgado por EE, a 26 de junho de 2005, constitutivas de três legados (três prédios) a favor das Rés e (B) declaração de que os Autores são donos e proprietários dos referidos – três - prédios.

  3. Citadas, as Rés contestaram e deduziram RECONVENÇÃO – fls. 76 vso. a 92, vso. Alegaram, na parte que ora releva: - EE adquiriu, por partilha homologada em 1960, 3/8 dos referidos prédios; - em 1986, celebrou contrato-promessa de compra e venda, no qual prometeu comprar a todos os demais comproprietários os restantes 5/8, pagando a todos o preço convencionado; - desde então, passou a comportar-se como verdadeiro e único proprietário dos prédios, tendo a posse exclusiva até ..........., data em que faleceu; - na data do decesso, EE havia adquirido a propriedade exclusiva dos prédios por usucapião; - desde tal data, a posse passou a ser exercida pelas Rés, legatárias instituídas por testamento daquele outorgado a 26 de Junho de 2005.

    Formularam os seguintes pedidos: - a ação fosse julgada improcedente e a reconvenção fosse julgada procedente e, por via dela, (A) ordenada a intervenção principal de outras pessoas, (B) corrigido o valor da ação, (C) condenados os Autores a reconhecer que as Rés são donas e possuidoras dos prédios, nas proporções de ¾ e ¼ indiviso, que pertenceram em exclusivo a EE, que os adquiriu por aquisição derivada e por usucapião, (D) condenados os Autores a reconhecer que não adquiriram, nem podiam adquirir, os prédios reivindicados, nem pagaram qualquer preço por qualquer deles ou das suas frações, (E) condenados os Autores a reconhecer que os prédios não pertenciam aos alienantes na data da celebração das escrituras referidas na petição inicial; (F) condenados os Autores a reconhecer que os negócios invocados na petição inicial que pretensamente lhes teriam transmitido a propriedade dos prédios são nulos por simulados ou, a não se entender assim, por não consubstanciarem verdadeiros contratos de compra e venda; (G) a reconhecer a nulidade das vendas que lhes foram feitas, por desrespeitarem a cláusula testamentária imposta pelo Autor.

  4. Os Autores (e os intervenientes), em RESPOSTA à reconvenção, excecionaram o caso julgado formado pela sentença proferida no processo n.º 000/0000, que correu termos na 2.ª Vara Mista do Tribunal de ......, como fundamento de inadmissibilidade dos pedidos reconvencionais – fls. 67 vso. a 75 e fls. 48 a 56.

  5. Foi proferido DESPACHO SANEADOR e julgada parcialmente procedente a exceção de caso julgado quanto aos pedidos reconvencionais formulados em D, E e F na parte em que se referem ao contrato de compra e venda celebrado a 29 de julho de 1993 – fls. 23 a 28, vso.

  6. Os Autores interpuseram recurso de APELAÇÃO – fls. 2 a 11 – e o Tribunal da Relação de ...... decidiu julgar procedente a exceção de caso julgado quanto aos pedidos reconvencionais formulados em C e E, deles absolvendo os Autores, e confirmando o mais decidido na sentença – fls. 296 a 356.

  7. Inconformadas, as Rés recorreram de REVISTA e apresentaram como Conclusões – fls. 374 a 402: “1ª - Através dos presentes autos, os autores AA e mulher BBpretendem a condenação das rés CC e DD a verem declarado nulo um testamento pelo qual o professor EE, falecido em ../../.., deixou às rés a propriedade total de três prédios urbanos situados na freguesia de ......... do concelho de ...... e completamente identificados naquele instrumento, fundando-se a alegada nulidade no facto de os prédios em causa não serem propriedade do testador EE, mas sim desses autores, uma vez que estes os terão adquirido através de escrituras públicas pelas quais “todos os interessados e titulares de direitos de propriedade sobre esses imóveis” lhos transmitiram, conforme documentos que juntaram (cfr. os artigos Io a 8o da petição inicial).

    1. - As rés, ora recorrentes, contestaram a ação alegando que os prédios em questão eram, à morte do testador, propriedade exclusiva deste, porque o testador, inicialmente dono apenas de 3/8 partes dos prédios, viria, no entanto, a comprar os restantes 5/8 aos demais contitulares, sendo proprietário, afinal, da totalidade dos prédios porque adquiriu as restantes quotas dos mesmos de 5/8 partes, na sequência de um contrato promessa de compra e venda, celebrado em 03/11/1986, no qual outorgaram como promitentes vendedores todos os demais interessados, ficando, em consequência, a ser dono da totalidade dos prédios por usucapião, uma vez que se encontrava desde há mais de 15 anos na sua posse única e exclusiva, adquirida sem violência, na convicção de não lesar direitos de outrem, de modo contínuo e ininterrupto, à vista de toda a gente e com ânimo de usa e frui coisas próprias e no seu próprio nome, uma vez que era ele quem pagava as contribuições devidas, o único reconhecido como senhorio e proprietário pelos locatários dos imóveis e, como tal, também reconhecido pelos serviços públicos (cfr. os artigos 6º, 10°, 12°, 43°, 47°, 49° da contestação), facto que, tendo ocorrido inversão do título de posse, pelo menos desde 03/11/1986, justificava também que as rés fossem donas dos indicados prédios por usucapião que invocaram (cfr. art. 50° da contestação).

    2. - Em consequência, as rés deduziram reconvenção, alegando a aquisição derivada e por usucapião dos referidos prédios (arts. 77.° a 80.° que aqui se dão por integralmente reproduzidos para todos os efeitos legais), e pedindo a condenação dos autores, entre o mais que ora desinteressa, a: “c) reconhecerem que as rés são donas e possuidoras nas proporções indicadas (3/4 indivisos para a CC, e 1/4 indiviso para a DD) dos prédios supra referidos, que pertenceram em propriedade exclusiva ao professor EE que como tais os adquiriu por aquisição derivada e por usucapião; e) reconhecerem que esses prédios já não pertenciam aos pretensos alienantes na data das respetivas escrituras referidas na iniciar.

    3. - Os autores alegaram, em resposta, que tais questões não podiam ser decididas por estarem cobertas pela autoridade do caso julgado formada por uma ação precedente tramitada entre eles próprios, enquanto réus, e o professor EE, enquanto autor, ação essa que terminou por sentença transitada em julgado, produzida em 13/11/2004, na qual os aqui autores foram condenados a ver declaradas falsas as declarações que prestaram numa escritura de justificação notarial através da qual pretendiam adquirir a propriedade dos referidos bens, bem como a verem cancelada a inscrição da propriedade em seu nome e a reconhecerem que não são donos nem possuidores dos referidos prédios e nunca estiveram na sua posse, e na qual se “declarou” (sic) que os donos e possuidores dos prédios em causa eram o professor EE e os seus filhos e descendentes destes, na proporção de 3/8, e a irmã FF e sucessores desta, na proporção de 3/8.

    4. - Essa alegação dos autores foi julgada improcedente no despacho saneador, por inverificado o alegado caso julgado, ante o que os autores interpuseram recurso de apelação para o Tribunal da Relação, que foi julgado parcialmente procedente com a consequência de ser revogada a decisão recorrida “na parte em que nela não se julgou procedente a excepção dilatória do caso julgado em relação ao pedido reconvencional deduzido na al. c) e apenas se julgou parcialmente procedente essa excepção quanto ao pedido reconvencional deduzido sob a al. e) declarando-se substituída essa decisão por outra que julgou procedente a excepção do caso julgado quanto a esses dois pedidos, e, em consequência, os apelantes foram deles absolvidos, da instância, entenda-se.

    5. - Para assim decidir, o acórdão recorrido considerou que “é apodítico que os pedidos reconvencionais deduzidos pelas reconvintes-apeladas sob a al. c) da reconvenção (...) e bem assim sob a al. e) (...) postergam o decidido na sentença transitada em julgado nos autos de ação n.° 000/0000 da extinta 2.ª vara mista de ......, o que, nos termos do disposto nos arts. 576°, n.°s 1 e 2, 577, al .j), 580° e 581° do CPC, configura excepção dilatória que obsta a que o tribunal conheça do mérito da reconvenção quanto a esses concretos pedidos e dá lugar à absolvição da instância reconvencional dos apelantes-reconvintes quantos aos mesmos”, porquanto, não obstante entre os pedidos reconvencionais formulados sob as als. c) e e) e a respetiva causa de pedir não exista total coincidência de pedido e de causa de pedir com aquela outra ação, o objeto desses pedidos reconvencionais já está contido naquela ação n.° 000/0000 (...) e nela já se encontra definido por sentença transitada em julgado no sentido de que EE não é proprietário pleno dos identificados prédios, mas apenas de uma quota-parte destes, pelo que não pode essa questão ser novamente discutida nos presentes autos.” 7ª- O assim decidido é absolutamente inaceitável por mais do que uma razão: a) A causa de pedir da presente ação é complexa, pois alega-se que o professor EE era inicialmente proprietário dos prédios, conjuntamente com a sua estirpe familiar, na proporção de 3/8 partes, por aquisição derivada translativa, na medida em que...

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