Acórdão nº 94/18.2YRPRT.S3 de Supremo Tribunal de Justiça (Portugal), 26 de Junho de 2019

Magistrado ResponsávelLOPES DA MOTA
Data da Resolução26 de Junho de 2019
EmissorSupremo Tribunal de Justiça (Portugal)

ACÓRDÃO Acordam na Secção Criminal do Supremo Tribunal de Justiça: I. Relatório 1.

AA, identificada nos autos, recorre para o Supremo Tribunal de Justiça do acórdão do Tribunal da Relação do Porto de 22.5.2019, proferido na sequência da decisão do acórdão deste Supremo Tribunal de Justiça de 12.12.2018 que, conhecendo de anterior recurso do acórdão do mesmo tribunal proferido neste processo, declarou a nulidade do julgamento e, em consequência, declarou a nulidade do acórdão recorrido, determinando: «devendo o tribunal a quo: c) Proceder a novo julgamento, com a composição exigida artigos 12.º, n.º 4, do CPP e 56.º, n.º 1, ex vi artigo 74.º, n.º 1, da Lei n.º 62/3013, de 26 de Agosto, para conhecer dos motivos de recusa de execução do MDE a que se referem as alíneas b) e h.i) do n.º 1 do artigo 12.º da Lei n.º 65/2003, expressamente invocados na oposição, com a produção dos meios de prova necessários, apresentados ou ordenados nos termos do artigo 340.º do CPP, incluindo, se for caso disso, as informações suplementares a que se refere o artigo 22.º, n.º 2, da Lei n.º 65/2003, d) Proferindo, a final, novo acórdão, que, em conformidade com o que vier a ser apurado, conheça dos motivos de recusa invocados, pronunciando-se sobre e execução do MDE e sobre a entrega da pessoa procurada, bem como, sendo caso disso, sobre as condições desta».

  1. Pelo acórdão agora recorrido, que deu cumprimento ao decidido por este Tribunal, o tribunal da Relação decidiu: «- Julgar improcedente a oposição à execução do Mandado de Detenção Europeu; - Deferir a execução do MDE emitido pelas autoridades judiciárias do Reino de Espanha no âmbito do processo do Juiz de Instrução 5 de ..., e em consequência ordenar a entrega da requerida AA, - unicamente com vista ao apuramento e responsabilização dos factos descritos no mesmo MDE, e com a condição de, em caso de condenação em pena privativa de liberdade, poder cumprir em Portugal a pena ou a medida de segurança que eventualmente lhe for aplicada».

  2. Da motivação que apresenta, em que expressa discordância com «considerações» do acórdão recorrido – «não podemos concordar com algumas considerações que foram feitas pelos Exmos. Srs. Desembargadores», diz-se na motivação –, extrai a recorrente as seguintes conclusões, que se transcrevem: «1º - Não foram observadas e cumpridas as instruções dadas pelo STJ no acórdão datado do dia 12 de dezembro de 2018, 2º - A notificação da Requerida para comparecer em audiência, foi mal feita, 3º - Não foi feita a produção de prova apresentada com a oposição ao MDE; 4º - Foi solicitado informações ao Reino de Espanha, e para tal, foi dado um prazo de 30 dias no máximo, 5º - Que foi ultrapassado, 6º - Pelo que a resposta do Reino de Espanha deverá ser considerada extemporânea, porque a resposta é de 21 de janeiro de 2019, emitida pelo reno de Espanha, ultrapassou os 30 dias, ou seja, a resposta do Reino de Espanha veio ao 45 dia, 7º - Foi feita resposta por parte da Mandataria da Requerida a tal resposta do Reino de Espanha, 8º - Fora, levantadas questões, e não foram obtidas resposta, 9º - Tal resposta de Espanha altera substancialmente os fundamentos do MDE, 10º - Requeremos para ter acesso às escutas telefónicas, 11º - e seu conteúdo, 12º - não obtivemos resposta, 13º - Prazo esgotado, para cumprir o MDE, ou seja, o MDE foi emitido para ser cumprido em 18 de abril de 2018, 14º - até ao dia 15 de maio de 2019, já tinham passados 393 dias, ou seja, refere o n.º 2 do artigo 26º da Lei n.º 65/2003, que a decisão definitiva sobre a execução do MDE deve ser tomada no prazo de 60 dias apos a detenção da pessoa procurada.

    1. - Logo achamos, salvo melhor opinião de que este MDE não deve ser cumprido, porque entendemos que foi ultrapassado o prazo de validade.

    2. - Encontram-se esgotados todos os prazos fixados na Lei n.º 65/2003 17º - Pelo que poderá o Estado Português recusar a entrega da requerida, 18º - Recusando assim o cumprimento o MDE.» 4.

    Respondeu o Senhor Procurador-Geral Adjunto no Tribunal da Relação, defendendo a improcedência do recurso e assim concluindo: «

    1. Os prazos previstos no artigo 26.º, da Lei n.º 65/2003, de 23 de agosto, para a decisão definitiva não são prazos perentórios que impliquem necessariamente a caducidade da execução do mandado, no caso de não serem cumpridos; b) Não se verifica qualquer irregularidade ou nulidade decorrente da não da inquirição das testemunhas arroladas pela recorrente com a oposição, nem esses meios de prova poderiam ser admitidos por não se mostrarem necessários à boa decisão da causa (artigo 340.º do CPP ex vi artigo 34.º da Lei n.º 65/2003), sendo certo que essa é questão decidida, com trânsito em julgado, pelo STJ, no seu acórdão de 30 de maio de 2018, constante de fls. 190/209; c) Num caso como o presente, à autoridade judiciária de execução do MDE não cabe exercer controlo sobre as provas que sustentam a indiciação que é imputada à requerida, nem sobre o mérito da decisão da autoridade do estado de emissão em persegui-la criminalmente; d) A decisão recorrida indica os factos e os crimes imputados à requerida, que motivaram a emissão do MDE e o pedido de entrega, estando, portanto, salvaguardada a regra da especialidade, como limite da ação penal e garantia da recorrente de que não será perseguida por crimes diversos daqueles (artigo 7.º, da Lei n.º 65/2003); e) O MDE em causa – emitido pelas autoridades judiciárias do Reino de Espanha, no âmbito do Processo de Diligências Prévias n.º 2068/17, pendente no Juízo de Instrução n.º 5 de ... – obedece a todos os requisitos legais, está traduzido em português, contém todas as informações exigidas pelo artigo 3.º, da Lei n.º 65/03, de 23 de agosto, e a recorrente foi devidamente informada da sua existência e do seu conteúdo, não se verificando, por isso, qualquer vício que obste à sua imediata execução; f) Não existindo, como não existe, qualquer fundamento de recusa, quer obrigatória quer facultativa, deverá a recorrente AA ser entregue ao Estado emitente do presente mandado.

    » 5.

    Colhidos os vistos, cumpre apreciar e decidir (artigo 25.º da Lei n.º 65/2003).

    1. Fundamentação 6.

    Detida em execução do MDE e apresentada no Tribunal da Relação do Porto, foi a recorrente informada da existência do MDE e do seu conteúdo, tendo declarado que não consentia na sua entrega à autoridade de emissão, pelo que solicitou prazo para deduzir oposição, nos termos do disposto no artigo 21.º da Lei n.º 65/2003, de 23 de Agosto.

    Consta do acórdão recorrido que esta, na oposição, alegou, em síntese, que: « - tem nacionalidade portuguesa e reside em Portugal; tem 2 filhos, um deles é doente e a família depende da sua actividade profissional de contabilista certificada, que exerce em estabelecimento estável situado em território português, onde está inserida, e cujos serviços que foram contratados pelos co-investigados, limitando-se a verificar, classificar e lançar toda a documentação, para efeitos de entregas das obrigações fiscais, inerentes à actividade empresarial das empresas, quando estas o solicitavam e/ou ordenavam, tendo todas as facturas e têm correspondência com transferências bancárias, efectuadas de e para as empresas que constam do MDE, nunca tendo tido qualquer responsabilidade na actividade dessas empresas seja a nível de compras ou de vendas nem nunca teve qualquer responsabilidade na gestão das empresas; - não tem antecedentes criminais e sempre pautou a sua conduta no estrito cumprimento das normas e leis em ...r; não tem meios económicos para se ausentar do país, nem tem familiares ou amigos a residir fora do território nacional, e comprometeu-se a colaborar com as autoridades judiciárias, quer de Portugal, quer de Espanha, no apuramento dos factos de que está indiciada; — o artigo 32.º da Lei 144/99 exclui a extradição quando a pessoa reclamada tiver nacionalidade portuguesa e/ou o crime tiver sido praticado em Portugal, e no caso não está em causa qualquer crime que permita sem mais a extradição de um cidadão português e residente em Portugal; os crimes imputados ainda se encontram em fase de investigação, não tendo ainda sido deduzida acusação, podendo a investigação ser efectuada consigo em Portugal; — os factos de que vem acusada – criação de empresas com o intuito de fraude fiscal - foram praticados em Portugal, pelo que nos termos da alínea i) do artigo 12.º da Lei 65/2003 o mandato poderá ser recusado se tiver por objecto infracção que segundo a lei portuguesa tenha sido cometida, no todo ou em parte, em território nacional ou a bordo de navios ou aeronaves portuguesas; sendo que o cumprimento da pena em Portugal, só pode ter vantagens para a sua reintegração na sociedade, ao invés de ser enviada para um país estranho, com o qual não tem qualquer afinidade – que implicará, forçosamente, a dissolução da família; — a omissão da prova indiciária, por insuficiência formal de oposição e de prova inviabiliza a execução do MDE; — e considerando o lugar dos factos, quanto à sua comparticipação, o “modus operandi”, o facto de existir em Portugal um processo onde tudo indica se estejam a investigar os mesmos factos, permite concluir que será aqui que deve ser investigada e julgada, sob pena de violação do princípio da dupla incriminação; — Em função do que invoca: o art.º 18.º da Lei 144/99 e o artigo 6.º C Penal, para a recusa do pedido de extradição, considerando a idade, motivos familiares e falta de contacto com o Estado requerente, e o art.º 32.º/1 e 2 alíneas a) e b) da Lei 144/99 por não permitir a extradição de quem se ache em Portugal há mais de 6, 7, 8, 10 anos, e interpretação contrária atenta conta a CRP, e o Estado português pode, assim, recusar a entrega, por violação dos artigos 8.º, 13.º/2, 15.º/1, 32.º e 203 da CRP e 40 .º C Penal.» 7.

    O acórdão recorrido, proferido pelo tribunal colectivo constituído nos termos legalmente previstos, após realização de audiência, suprindo a nulidade anteriormente declarada, encontra-se fundamentado...

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