Acórdão nº 5189/17.7T8GMR.G1.S1 de Supremo Tribunal de Justiça (Portugal), 30 de Maio de 2019

Magistrado ResponsávelTOMÉ GOMES
Data da Resolução30 de Maio de 2019
EmissorSupremo Tribunal de Justiça (Portugal)

Acordam na 2.ª Secção do Supremo Tribunal de Justiça: I – Relatório 1. AA (requerente) instaurou, em 27/09/2017, contra BB (requerida) uma ação especial, sob a forma de processo de jurisdição voluntária para atribuição da casa de morada de família, ao abrigo do disposto no artigo 990.º do CPC conjugado com o disposto nos artigos 1105.º e 1793.º do CC, aqui aplicáveis por força do 4.º da Lei n.º 7/2001, de 11-05, na redação dada pela Lei n.º 23/2010, de 30-08, alegando, em resumo, o seguinte: .

Requerente e requerida viveram em união de facto durante sete anos entre 2007 e dezembro de 2014, altura em que se separaram; .

Dessa união nasceu, em …/…/2009, a sua filha CC cujas responsabilidades parentais se encontram atribuídas em conjunto a ambos os progenitores; .

Após a separação, o requerente ficou a residir na casa que fora morada da família com a sua nova companheira e com a filha CC nos períodos em que esta está com ele; .

A referida casa está arrendada em nome da requerida, como arrendatária, a qual se tem recusado a alterar o arrendamento para o nome do requerente, apesar das insistências deste; .

A requerida, quando saiu de casa em meados de dezembro de 2014, foi viver para o … com o novo companheiro e reside atualmente com a mãe; .

O requerente tem várias dificuldades económicas, sendo ele quem suporta a totalidade das despesas com a filha CC, assim como a renda mensal da habitação, no valor de € 22,97. Concluiu o requerente a pedir que lhe fosse atribuída a casa de morada da família e, por consequência, transmitido o direito ao respetivo arrendamento.

  1. Frustrada a tentativa de conciliação, a requerida apresentou contestação a sustentar, no essencial, que: .

    A requerida tem a seu cargo a filha CC, no regime de guarda partilhada com o requerente, e uma filha menor fruto de outro relacionamento; .

    Até fevereiro de 2018, esteve empregada numa fábrica de … em … que dista 1 quilómetro da casa de morada da família; .

    Quando terminou o contrato, a entidade empregadora comunicou-lhe a pretensão de contratá-la, sendo que, não tendo carta de condução automóvel, pode fazer aquele percurso a pé; .

    Atualmente encontra-se desempregada, sem auferir qualquer rendimento, tendo a seu cargo, além da CC, outra filha menor; .

    A requerida está a residir com a mãe, na casa desta, por não ter outra casa onde morar; .

    Na semana em que a sua filha CC está à sua guarda, a requerida poderá levá-la à escola a pé, sem necessidade de utilizar os transportes públicos, já que a escola fica a cerca de 200 metros da casa de morada da família em causa; .

    Por sua vez, o requerente trabalha por conta própria, dedicando-se à organização e animação de eventos, auferindo, nos meses de julho e agosto, em média, € 650,00 por mês, fora os restantes eventos que tem ao longo do ano.

    Concluiu a requerida que tem uma necessidade da casa de morada da família superior à do requerente, pelo que tal casa lhe deve ser atribuída.

    3.

    Realizada a audiência final, foi proferida a sentença de fls. 72 a 84, datada de 08/10/2018, a julgar a ação procedente, decidindo-se: a) – Declarar dissolvida a união de facto entre o requerente e a requerida; b) – Atribuir a casa de morada da família exclusivamente ao requerente; c) – Determinar que, após o trânsito em julgado da decisão, esta fosse comunicada ao Instituto da Habitação e da Reabilitação Urbana – IHRU, IP, na qualidade de senhorio, nos termos e para os efeitos do artigo 1105.º, n.º 3, do CC, aplicável por força do disposto no art.º 4.º da Lei n.º 7/2001, de 11-05, na redação dada pela Lei n.º 23/2010, de 30-08.

  2. Inconformada, a requerida interpôs recurso para o Tribunal da Relação de Guimarães, no âmbito do qual foi proferido o acórdão de fls. 109 a 119, datado de 31/01/2019, a julgar a apelação procedente, alterando a sentença recorrida no sentido de conceder à requerida o direito a habitar a casa que fora morada da família, conforme o contrato de arrendamento em vigor em nome dela.

    5.

    Desta feita, vem agora o requerente pedir revista, formulando, no que aqui mais releva, as seguintes conclusões: 1.ª – O acórdão recorrido incorreu em erro de avaliação dos critérios constantes dos artigos 1105.º, n.º 2, e 1793.º, n.º 1, do CC, procedendo a uma incorreta análise dos fatos dados como provados em conjugação com aqueles normativos; 2.ª - Começando pela análise do contrato de arrendamento junto aos autos, decidindo-se no acórdão recorrido que: «logo de concluir, ainda que de forma indiciária, que sendo a Requerida operária.

    fabril e mãe de duas menores, esse fator terá sido já determinante na atribuição a si pelo IHUR IP, do arrendamento em causa, sobretudo do valor da renda apoiada acima referida.

    ".

    1. - A mencionada análise indiciária está completamente incorreta, assentando numa mera presunção, pois no ano de 2013 a Requerida apenas tinha uma filha a menor CC, nascida a …/ …/2009, filha do ora Recorrente, até porque a segunda filha da Requerida nasceu posteriormente, fruto de outra relação.

    2. - Além do mais, o arrendamento foi atribuído aos dois, outorgado por ambos, conforme resulta do ponto 23 dos factos dados como provados para a decisão da causa em 1.ª Instância, razão pela qual o arrendamento se mantêm até à atual data, encontrando-se o nome de ambos conforme descrição a negrito que consta do referido contrato.

    3. - Em caso de incumprimento contratual, o Recorrente é também ele responsável pelo pagamento da respetiva renda.

    4. - Quanto à matéria dada como provada no que concerne à situação de carência económica da Requerida que, segundo o tribunal recorrido afirma, se mantém atualmente, ainda mais agravada, pois ela continua com as duas filhas menores a cargo, desempregada e a viver em casa da mãe", convém analisar corretamente esta matéria dada como provada, já que a realidade económica da Requerida está bem longe daquela que foi dada como provada, como se demonstrará adiante.

    5. - Facto que só é possível comprovar e impugnar à luz da análise e conjugação da presente ação com o Proc. n.º 981/16.2T8 GMR, que corre termos no Tribunal Judicial da Comarca de Braga, Juízo de Família e Menores de … - Juiz …, e com o Apenso A do mesmo processo, pois a Requerida avança uma versão sócio-económica diferente nos referidos processos de modo a obter o resultado pretendido em cada um deles.

    6. - Nos presentes autos, a Requerida alegou que estava desempregada, numa situação de carência, omitiu, por completo, os rendimentos do agregado familiar, pois o mesmo é composto pela Requerida e pela mãe e pai desta, dado que é com eles que reside, conforme Relatório Social junto ao Apenso A, do Proc. n.º 981/16. 2T8GMR; 9.ª - Consta do referido Relatório que a Requerida trabalha na empresa DD, Lda,, auferindo um vencimento base de € 605,00, recebendo a título de prestações sociais o valor de € 141,22, € 100,00 - pensão de alimentos da filha EE, auferindo o valor total mensal de € 846,22, auferindo anualmente o valor total de € 11.847,08, não se encontrando, portanto, desempregada como alega na presente ação.

    7. - Acresce que a Requerida reside com os seus pais cujo rendimento consta do referido Relatório Social, auferindo o pai dela uma pensão de invalidez no valor de € 1.026,26 mensal (€ 14.367,64, anuais), sendo a mãe da Requerida trabalhadora independente; ou seja, anualmente o agregado familiar da Requerida aufere no total € 26.214,72; 11.ª - Enquanto que foi dado como provado pela 1.ª Instância que o agregado familiar do Recorrente apenas possui a título de rendimentos, o rendimento anual no valor de € 2.000,00, auferido pelo Recorrente - cfr. ponto 13 da matéria dada como provada - para a decisão da causa em 1.ª Instância, a companheira do Recorrente trabalha e aufere o salário mensal de cerca de € 580,00 - ponto 14.º da referida fundamentação: ou seja, anualmente auferem o total de € 10.120,00.

    8. - Confrontando os valores não restam dúvidas que o Recorrente possui uma maior carência económica do que a Requerida, pois o valor total dos rendimentos anuais do Recorrente correspondem a um terço dos rendimentos anuais do agregado familiar da Requerida, rendimentos esses omitidos por esta nos presentes autos, de modo a obter vantagem em relação ao Recorrente.

    9. - No entanto, as incongruências no alegado pela Requerida não ficam por aqui, conjugando os presentes autos com o proc. n.º 981/16.2T8GMR, e com o apenso A do mesmo processo, consta outra versão dos factos, pois o Apenso A, conforme o teor da ata de conferência de pais de 07-04-2016, a Requerida naquela data não reunia “as necessárias condições para assumir integralmente a guarda e cuidados da sua filha CC, pretendendo assim que a menor seja entregue à guarda e cuidados dos avós maternos...”, mais alegou que “reside e trabalha no …, designadamente na área da restauração...”.

    10. - Não restam dúvidas de que a Requerida saiu da casa de morada de família em dezembro de 2014, foi para a cidade do … viver com o companheiro que possuía na época, do qual tem uma filha, deixou a menor CC a cargo do Recorrente e pediu a guarda para os avós matemos no âmbito do Proc. n.º 981/16.2 T8GMR, nunca quis a guarda para si, nunca desde então até á presente data solicitou a casa de morada de família, só o fez porque, aquando da propositura da presente ação, o Recorrente propôs ação de alteração da regulação das responsabilidades parentais, correspondendo ao Apenso A do 981/16.2T8GMR.

    11. – Na análise do Relatório Social, verifica-se na descrição do quotidiano da menor CC que, na semana que passa com a mãe/Requerida, quem efetivamente cuida e possui a guarda da menor de facto na semana da mãe, desde então até à atualidade, são os avós matemos, e não a Requerida.

    12. - Tal como já foi exposto e resulta dos pontos 20 e 21 da Fundamentação da sentença da 1.ª Instância: “Por sentença proferida no dia 22-03-2017, no processo n.º 981/16.2T8GMR, que correu termos neste Juízo de Família e Menores de …, transitada em julgado a 16-04-2017, foi homologado o regime de exercício das...

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