Acórdão nº 5762/13.2TBVFX-A.L1.S1 de Supremo Tribunal de Justiça (Portugal), 04 de Julho de 2019

Magistrado ResponsávelJOSÉ RAINHO
Data da Resolução04 de Julho de 2019
EmissorSupremo Tribunal de Justiça (Portugal)

Acordam no Supremo Tribunal de Justiça (6ª Secção): I - RELATÓRIO AA veio deduzir embargos à execução com processo especial por alimentos que contra ele foi instaurada pela ex-mulher BB Alegou para o efeito, em síntese, que, contrariamente ao alegado na execução, pagou as prestações de alimentos devidas até dezembro de 2008.

Quanto às prestações subsequentes a essa data, Embargante e Embargada chegaram a acordo em que a pensão deixasse de ser paga, comprometendo-se a Embargada a diligenciar pela formalização desse acordo.

Quando o Embargante questionou a Embargada sobre a falta de tal formalização, a Embargada foi justificando a sua omissão dizendo sempre ao Embargante que não se preocupasse, porque não lhe iria pedir mais nada, que já não precisava.

Comportamento este que tranquilizou o Embargante, que se convenceu de que nada mais devia de alimentos e que o assunto estaria definitivamente resolvido.

E em contactos posteriores que existiram entre as partes, a Embargada nunca manifestou qualquer necessidade de dinheiro.

Pelo que, ao instaurar a execução, a Embargada está a litigar de má-fé e em claro abuso do direito.

Mais invocou a prescrição das prestações de alimentos vencidas entre junho de 2003 e novembro de 2010.

+ A Embargada contestou, concluindo pela improcedência dos embargos.

+ Em audiência prévia, foi proferido despacho saneador, onde foi julgada procedente a exceção de prescrição em relação aos alimentos anteriores a 05 de novembro de 2008.

Foi identificado o objeto do litígio e foram enunciados os temas da prova.

+ Seguindo o processo seus devidos termos, veio, a final, a ser proferida sentença (Juízo de Família e Menores de Vila Franca de Xira) que declarou procedente a oposição e extinta a instância executiva.

Inconformada com o assim decidido, apelou a Embargada.

Fê-lo com êxito, pois que a Relação de Lisboa, embora com voto de vencido, determinou o prosseguimento da execução para pagamento das prestações de alimentos vencidas nos meses de novembro de 2008 e seguintes e até à cessação da pensão de alimentos, que foi entretanto declarada no apenso B.

+ É agora a vez de o Embargante dissentir do que foi decidido, pedindo revista.

+ Da respetiva alegação extrai o Recorrente as seguintes conclusões: A. No presente recurso são suscitadas as seguintes questões: 1) da nulidade do acórdão por excesso de pronúncia (ao ter sido modificada oficiosamente a decisão quanto à matéria de facto) e da nulidade do acórdão por se verificar ambiguidade naquela parte da decisão que a torna ininteligível; 2) do erro de julgamento ao não aplicar ao caso o instituto do "abuso de direito"; 3) do erro de julgamento ao não considerar procedente a oposição à execução quanto às pensões vencidas em novembro e dezembro de 2008, 4) subsidiariamente, do erro de julgamento ao aplicar ao caso a norma ínsita na alínea g), do artigo 729.° do código de processo civil; 5) e, subsidiariamente, da nulidade do acórdão por violação do princípio do contraditório; B. No que respeita à primeira questão suscitada (que na verdade são duas (nulidades) distintas, que se abordam no mesmo ponto atendendo à conexão das temáticas e dos efeitos da sua procedência), o Tribunal a quo decidiu alterar, oficiosamente, e sem ouvir as partes, a decisão proferida pelo Tribunal da lª instância quanto à matéria de facto, o que fez de forma ininteligível atento o confronto entre a fundamentação de tal parte da decisão com a matéria de facto que, de seguida, decide ser a considerar, ficando-se, sem perceber, com exactidão quais os factos efectivamente a considerar como provados, sendo que tal ambiguidade/obscuridade naquela parte da decisão torna-a ininteligível e, consequentemente, nula, nos termos do disposto na alínea c), do n.º 1, do artigo 615.°, por força do artigo 666.°, n." 1, ambos do Código de Processo Civil, nulidade essa que se invoca para todos os efeitos legais; C. A acrescer, tal alteração da decisão quanto à matéria de facto, foi efectuada ao arrepio da Lei, já que, fora das situações previstas no n.º 2, do artigo 662.°, do Código de Processo Civil, em que o Tribunal da Relação pode, independentemente de tal ter sido invocado e/ou requerido pelo Apelante no seu recurso de apelação, oficiosamente, fazer aplicar o disposto naquele n.º 2, apenas pode (e deve) alterar a decisão da matéria de facto, nos termos do n.º 1 do mesmo artigo, se a prova produzida ou um documento superveniente impuserem uma decisão diversa, mas sempre dentro dos limites do recurso de apelação e atento o modo como o Apelante cumpriu o ónus de alegação regulado no artigo 640.°, quando interpôs aquele recurso; D. Tal conclusão é, aliás, decorrência, conforme tem sido repetidamente afirmado, de que são as conclusões da motivação que definem e delimitam o âmbito do recurso, ou seja, as questões que o recorrente quer ver discutidas no tribunal superior; E. Verifica-se, assim, excesso de pronúncia face ao tema a decidir, com a conformação que lhe havia sido dada pela ora Recorrida, extravasando o Acórdão recorrido os limites da vinculação temática, do concreto objecto de recurso submetido a reapreciação, do quadro temático submetido à cognição proposta pela ora Recorrida e que era o único apresentado ao ora Recorrente; F. Tal excesso de pronúncia consubstancia nulidade do Acórdão recorrido, nos termos do artigo 615.°, n.º I, alínea d), segmento final, por força do artigo 666.°, n.º I, ambos do Código de Processo Civil; G. Em consequência, deve o Tribunal ad quem, ao abrigo do disposto no n." 1, do artigo 684.° do Código de Processo Civil, suprir a nulidade, declarar em que sentido a decisão deve considerar-se modificada e conhece dos restantes fundamentos do recurso, sendo certo que, salvo melhor opinião, a decisão recorrida deve ser modificada no sentido de ser mantida a matéria de facto dada como provada pelo Tribunal da 1ª Instância; H. Quanto à segunda questão suscitada no presente recurso, decidiu mal o Tribunal a quo ao não aplicar ao caso em discussão nos autos, a figura do abuso de direito, prevista no artigo 334.° do Código Civil, uma vez que resulta da matéria de facto dada como provada (pelo Tribunal de lª instância e que deverá ser mantida como tal por via do presente recurso) que estão reunidos, in casu, os pressupostos de aplicação daquele instituto; I. Entendimento esse que se sempre seria de se manter, mesmo que se entendesse que a alteração da decisão quanto à matéria de facto preconizada pelo Tribunal a quo seria de manter, por estarem, ainda assim, verificados os pressupostos de aplicação daquele instituto; J. Assim, ao não aplicar ao caso o disposto no artigo 334.°, do Código Civil, o Tribunal a quo incorreu em erro de julgamento, violando aquela norma; K. Quanto à terceira questão levantada no presente recurso, no que respeita às pensões vencidas em Novembro e Dezembro de 2008, mantendo-se a decisão da lª instância quanto à matéria de facto (conforme preconizado no presente recurso), forçoso é concluir, pela procedência da oposição no que respeita às pensões vencidas em Novembro e Dezembro de 2008, em virtude de ter sido dado como provado que as mesmas foram pagas pelo Recorrente à Recorrida (factos provados n.º 2 e 3), pelo que se extingue a obrigação do pagamento das mesmas, por efeito do cumprimento de tal obrigação.

L. Quanto à quarta questão, levantada a título subsidiário, o Tribunal recorrido, para fundamentar a sua decisão sobre a alteração oficiosa da matéria de facto, sustentou, em síntese, que sendo os fundamentos invocados na oposição à execução pelo ora Recorrente factos extintivos da obrigação de alimentos (pagamento e abuso de direito), a prova dos mesmos, nos termos do disposto no artigo 729.°, alínea g), do Código de Processo Civil, só poderia ser feita por documento, não sendo admissível prova testemunhal, por declarações (e, acrescentamos nós...

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