Acórdão nº 261/16.3T8CSC.E1.S1 de Supremo Tribunal de Justiça (Portugal), 04 de Julho de 2019

Magistrado ResponsávelMARIA DOS PRAZERES PIZARRO BELEZA
Data da Resolução04 de Julho de 2019
EmissorSupremo Tribunal de Justiça (Portugal)

Acordam, no Supremo Tribunal de Justiça: 1. AA transportes, Lda., que se dedica ao transporte rodoviário de mercadorias, instaurou uma acção contra BB, Lda. e CC - Seguros, S.A., pedindo a sua condenação no pagamento de € 80.569,66 com juros contados desde a citação até ao integral pagamento, “a título de indemnização pelos danos patrimoniais sofridos”.

Para o efeito, e em síntese, alegou que, no exercício da sua actividade profissional, ocorreu um acidente que envolveu um veículo pesado de mercadorias, composto pelo conjunto dos veículos ...-BN-...

(tractor) e C-6...

(semi-reboque), conduzido por um motorista “sob as ordens e direcção” suas, que se despistou, o que provocou a perda total da mercadoria transportada; que não interveio qualquer outro veículo no acidente; que, com a perda da mercadoria, sofreu danos no montante de € 95,314,08; que tem a sua responsabilidade civil transferida para a seguradora DD Seguros, S.A..

Alegou ainda ter acordado com a ré BB, Lda a gestão dos seus contratos de seguro e que em 1 de Junho de 2012 celebrou com DD Seguros, S.A.

“diversos contratos de seguro no âmbito da sua actividade de transportador” – “nomeadamente, seguro de responsabilidade civil (auto frota – apólice nº 000015…/000), seguro de mercadorias transportadas de âmbito nacional (apólice nº 0…/0010…) e seguro de mercadorias transportadas de âmbito internacional (apólice nº 0…/0010… –, “válidos e eficazes em 03.07.2013”, data em que ocorreu o acidente; que o acidente foi comunicado a DD Seguros, S.A., por BB, Lda,”ao abrigo da apólice de C.M.R. nº 0…/0010…”; mas que a Companhia de Seguros recusou assumir a responsabilidade pelos danos decorrentes do acidente “por o semi-reboque com a matrícula C-6... não estar incluído na apólice de CMR nº 0…/0010…”, inclusão de que a ré BB assegura ter tratado.

E alegou que, anteriormente a esta acção, tinha demandado DD, Seguros, SA, pedindo o pagamento dos danos causados pelo acidente, € 95.314,08, mas que a acção foi julgada improcedente, por decisão transitada em julgado. Foi dado como provado que BB não havia solicitado “a inclusão do semi-reboque com a matrícula C-6... na apólice de CMR, de âmbito nacional ou internacional, mas tão somente na apólice frota ou de responsabilidade civil.

Ora, nos termos do artigo 17º da Convenção CMR, a autora é responsável pela perda da mercadoria transportada perante o seu proprietário, a empresa EE, SL; empresa que por razões várias, reduzira para € 71.287,41 a indemnização que pediu à autora.

Assim, a autora pede agora a condenação da ré BB, Lda no pagamento dessa quantia, acrescida dos juros de mora e prémios pagos, num total de 80.569,66, por não ter incluído o semi-reboque no seguro, em violação dos deveres de conduta a que estava obrigada.

As rés contestaram separadamente. A ré BB, Lda, para além de impugnar uns factos e aceitar outros, invocou as excepções de ilegitimidade activa, por entender que só a proprietária da mercadoria é que teria legitimidade para pedir uma indemnização pela respectiva perda, de ilegitimidade passiva, porque os prémios pagos pela autora deviam ter sido reclamados à Companhia de Seguros DD e de litispendência e caso julgado, que conduziam a que não fosse já possível pedir a devolução dos prémios pagos e não devidamente requeridos.

Quanto aos danos cobertos, a ré BB observou que se reduzem à carga e que, quanto a esta, que “aceita(va) a confissão da A de que o valor do danos da carga ascende a 71.287,41” euros, quantia à qual teria ainda de ser deduzida a franquia de € 7.128,74.

Disse também não estar vinculada pela sentença proferida na acção proposta pela autora contra DD, Seguros, SA, e que, em seu entender o seguro CMR internacional foi validamente celebrado mas que, à data do sinistro, “estava sem validade por falta de pagamento” do prémio; que essa falta de pagamento havia sido solucionada por sua intervenção, sendo reposto o seguro, com conhecimento do sinistro por parte da Companhia DD, Seguros, SA; e, portanto, que, “para a R, a apólice tinha cobertura”, devendo ser absolvida do pedido.

A ré CC Seguros, SA começou por dizer que são oponíveis à autora “quer a limitação contratual (…) decorrente do (…) capital máximo garantido pela apólice e da franquia contratualmente aplicável, quer as exclusões constantes da mesma”, referindo-se ao contrato de seguro de responsabilidade civil profissional celebrado com a ré BB; sustentou que a sua segurada BB não tinha cometido qualquer acto ou omissão profissional danosa e que, portanto, não havia fundamento para que o seguro tivesse sido accionado, devendo ser absolvida do pedido. Todavia, e para o caso de assim se não entender, a ré fez notar que o prejuízo real da autora só pode ser de € 71,287,41 e que a essa quantia deve ser deduzida a franquia contratual de 10%.

Notificada para responder, querendo, a autora pronunciou-se no sentido da improcedência das excepções invocadas pelas rés.

Pelo despacho de fls. 203, o tribunal de Cascais (Instância Central Cível) julgou ser territorialmente incompetente e determinou a remessa do processo para a Instância Central Cível do Tribunal de Évora, tribunal que, por despacho de fls. 209, julgou ser competente o Juízo Central Cível do Tribunal de Comarca de Lisboa Oeste (Cascais). O conflito foi resolvido por despacho do Vice-Presidente do Supremo Tribunal de Justiça, no sentido de ser competente a Instância Central, Secção Cível e Criminal, de Évora.

  1. A acção foi julgada parcialmente procedente pela sentença de fls. 403, que condenou a ré BB, Lda. a pagar à autora a quantia de € 6.415,87 e a ré CC - Seguros, S.A. (entretanto designada por FF, S.A., em consequência da fusão com a Companhia de Seguros GG, S.A., com alteração da firma) no pagamento de € 57.742,80, em ambos os casos com juros de mora contados à taxa legal desde a citação até integral pagamento.

    Em síntese, o tribunal considerou ter havido negligência por parte da ré BB, Lda. na não inclusão do reboque no contrato de seguro e que cabia à FF, S.A. o pagamento de 90% dos danos (dedução da franquia de 10%), em virtude do contrato celebrado com BB, Lda., danos esses correspondentes ao pagamento acordado com a proprietária das mercadorias perdidas, €71.287,41.

    Ambas as rés recorreram. Pelo acórdão do Tribunal da Relação de Évora de fls. 532, foi concedido provimento a ambos os recursos. A sentença foi revogada, sendo a acção julgada improcedente e as rés absolvidas do pedido.

    Segundo o Tribunal da Relação de Évora, a cobertura do seguro CMR, contratado entre a autora e a Companhia de Seguros DD, incluía o semi-reboque em causa nesta acção; “a falta de ressarcimento dos danos à autora não proveio de actuação” da mediadora BB, “mas sim de incumprimento, por banda da Seguradora DD, do contrato de seguro em causa”.

    A autora deveria ter demandado também a BB, Lda. na acção que propôs contra a Seguradora DD, como ré subsidiária (artigo 39º do Código de Processo Civil), ou, posteriormente, ter provocado a sua intervenção principal (nº 2 do artigo 316º do Código de Processo Civil. Não o tendo feito, o caso julgado ali formado não a vincula.

  2. A autora recorreu para o Supremo Tribunal de Justiça.

    Nas alegações de recurso, formulou as conclusões seguintes: «

    1. Ambas as Instâncias, Tribunal Judicial da Comarca de Évora e Tribunal da Relação de Évora, decidiram divergentemente no que se refere à verificação dos pressupostos de que depende a verificação da responsabilidade civil do mediador, a ré BB, nomeadamente no que concerne ao estabelecimento do nexo de causalidade entre o facto e o dano.

    2. O Tribunal Judicial da Comarca de Évora, decidiu no sentido de ter sido o lapso cometido pela funcionária HH, funcionária da ré BB, que esteve na origem dos factos que culminaram no declínio de responsabilidade pela seguradora DD por não ter sido, em qualquer momento, incluído o semi-reboque com a matrícula C-6... na apólice de CMR.

    3. O Tribunal da Relação de Évora decidiu no sentido inexistir fundamento legal para considerar que os danos sofridos pela aqui recorrente foram causados pela conduta da ré BB, por ausência de facto ilício e censurável, bem como da necessária conexão causal dos danos com essa omissão.

    4. Conclui-se que a decisão proferida pelo Tribunal da Relação de Évora incorre em erro de julgamento, por incorreta apreciação e aplicação da lei, mormente do disposto no art.º 237º [227º?] e 483º do C.C., por se impor entendimento diverso, ou seja, no sentido em que foi decido pelo Tribunal da 1ª Instância, E) razão pela qual se justifica a admissão do presente recurso de revista, nos termos e para os feitos do disposto no art.º 674º n.º 1 do C.P.C.

    5. Decidiu o Tribunal de 1ª Instância que a recorrente celebrou com a ré BB, um contrato de mediação de seguros, mediante a qual esta se comprometeu a diligenciar no sentido de, aquela, ver os riscos decorrente da sua atividade de transporte de mercadorias, cobertos, mediante a celebração de um contrato de seguro com a companhia de seguros DD.

    6. A recorrente solicitou à ré BB a transferência de todos os seguros que tinha numa outra seguradora para a seguradora DD e que era de sua vontade, vontade essa transmitida à ré BB e que esta compreendeu, que o risco do transporte nacional e internacional das mercadorias, também fosse assegurado.

    7. Tendo ocorrido o sinistro, a companhia de seguros DD recusou-se a indemnizar os danos sofridos pela recorrente decorrentes da perda da carga transportada, alegando que o veículo interveniente no acidente não fazia parte da apólice que cobria o transporte de mercadorias (CMR), na medida em que era um reboque e, apenas o trator que o puxava estava coberto por aquela mesma apólice.

    8. Dando-se por preenchido o pressuposto de nexo de causalidade entre o facto e o dano por via do lapso cometido pela sua funcionária HH, que não incluiu o semi-reboque na apólice de CMR aquando da contratação do seguro e, também, não o incluiu aquando da revalidação da apólice porquanto esta foi feita...

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