Acórdão nº 291/18.0T8AGH.L1.S2 de Supremo Tribunal de Justiça (Portugal), 04 de Julho de 2019

Magistrado ResponsávelMARIA OLINDA GARCIA
Data da Resolução04 de Julho de 2019
EmissorSupremo Tribunal de Justiça (Portugal)
  1. RELATÓRIO 1.

“AA – ..., Ldª”, com sede no ..., ..., ... (Açores) propôs, em 23.03.2018, no Juízo Central Cível e Criminal de … (do Tribunal Judicial da Comarca dos Açores), processo especial de revitalização, indicando como valor da ação € 811.725,42.

  1. O referido tribunal declarou a sua incompetência material e indeferiu a petição, por ter entendido que, não existindo Juízo de Comércio nos Açores, os processos de insolvência e os processos especiais de revitalização não correm nos Juízos Centrais. E entendeu ser competente para conhecer do caso concreto, nos termos do art.130º, n.1, al. a) da LOSJ, o Juízo de Competência Genérica de São Roque do Pico.

  2. Inconformada com tal decisão, a autora interpôs recurso de apelação para o Tribunal da Relação de Lisboa.

  3. A segunda instância entendeu que: «(…) uma vez que estamos perante uma ação especial, é competente para a sua tramitação o juízo local ou genérico do município onde a requerida tem sede, não o sendo o juízo central cível e criminal de Angra do Heroísmo, como bem decidiu o tribunal recorrido. Consequentemente, aquele juízo é materialmente incompetente para a tramitação dos presentes autos, verificando-se, assim, a existência de uma exceção dilatória, a qual é de conhecimento oficioso (cfr. arts. 577º, al. a) e 578º, ambos do CPC), que acarreta a absolvição do réu da instância ou o indeferimento em despacho liminar, quando o processo o comportar, nos termos do art. 99º, n. 1 do CPC.

    E concluiu: «serem os juízos centrais cíveis incompetentes para o presente processo especial de revitalização, como bem decidiu o tribunal recorrido, sendo correta a forma como o tribunal apreciou tal questão, improcedendo, assim, a apelação».

    5. A autora/recorrente, não se conformando com aquela decisão, dela interpôs recurso de revista excecional, em cujas alegações formulou as conclusões que se transcrevem: 1 - A Recorrente apresenta recurso de revista excepcional, estribada na alínea c) do n.1 do art. 672° do CPC.

    2 - Foi decidido no Acórdão recorrido que "nos tribunais de comarca onde não existe juízo de comércio, a competência para o processo especial de revitalização pertence aos juízos locais cíveis ou, na existência destes, aos juízos de competência genérica".

    3 - O Acórdão do Tribunal da Relação de Lisboa de 26 de Março de 2015 no Proc. n.702/14.4T8PDL.L1-8, eleito como Acórdão fundamento, já devidamente transitado em julgado, no âmbito do mesmo quadro normativo, decidiu a mesma questão de direito em termos diametralmente opostos.

    4 - Foi decidido no Acórdão fundamento que "nas comarcas onde não existam secções especializadas, pertence às secções cíveis da instância central a competência para as acções nas quais seriam competentes as secções de comércio".

    5 - O Tribunal da Relação de Lisboa em situações manifestamente idênticas e que visam exactamente a mesma realidade, neste caso a organização judiciária e respectiva competência material na Região Autónoma dos Açores para tramitação das acções cuja competência competiria aos tribunais de comércio, decidiu de forma diversa e completamente oposta.

    6 - Estamos perante uma contradição manifesta entre o Acórdão ora em crise e exarado pelo douto Tribunal da Relação de Lisboa e o Acórdão fundamento oriundo do mesmo Tribunal e já transitado em julgado, no domínio da mesma legislação e sobre a mesma questão fundamental de direito, não havendo sobre o assunto qualquer acórdão uniformizador de jurisprudência.

    7 - Encontra-se, desta forma, inteiramente preenchido o requisito enunciado na alínea c) do n. 2 do art. 672° do CPC, tornando, desta via, admissível a revista excepcional.

    8 - Foi decidido no Acórdão recorrido que, na falta de juízos de comércio, os processos de insolvência ou os processos especiais de revitalização não correm nos Juízos Centrais das comarcas; 9 - Não se concorda com tal entendimento do Acórdão recorrido que contradiz o teor do Acórdão Fundamento; 10 - Entendeu o Acórdão recorrido que apenas compete às Secções da Instância Central Cível o conhecimento das acções cíveis de processo comum de valor superior a € 50.000,00 e que a matéria em causa nos presentes autos não se encontra estatuída na previsão do n. 1 do art. 117º LOSJ, por se tratar de forma de processo especial; 11 - No entanto, a RLOSJ, introduzida pelo DL 49/2014, de 27 de Março, criou o Tribunal Judicial da Comarca dos Açores (art. 64°), não tendo criado, nenhuma secção de comércio (nem nas Instancia Central, nem Local); 12 - F. Salazar Casanova in Notas Breves Sobre a Lei da Organização do Sistema Judiciário, Revista da Ordem dos Advogados, Ano 73, Vol. II/III (Abril/Setembro -2013), pág. 468 entende que "se não for criada no tribunal de instância central uma secção de comércio, a lei prescreve (art. 117º, 2) que para as causas que deviam correr na secção de comércio, se existisse, é extensivo o disposto no art. 117º, 1 que visa a competência da instância cível central. A secção cível estende a sua competência em razão da matéria para todas as causas que se deveriam tramitar na secção de comércio se esta existisse"; 13 - É claro o problema de interpretação da lei e nos termos do art. 9º do Código Civil é de presumir, na fixação do sentido e alcance da lei, "que o legislador consagrou as soluções mais acertadas e soube exprimir o seu pensamento em termos adequados."; 14 - Entende-se que da conjugação das normas do n.1 e n.2 do artigo 117°, da LOSJ, decorre que nas comarcas onde não haja secção de comércio, a competência da...

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