Acórdão nº 106503/16.1YIPRT.P1.S1 de Supremo Tribunal de Justiça (Portugal), 16 de Maio de 2019

Magistrado ResponsávelCATARINA SERRA
Data da Resolução16 de Maio de 2019
EmissorSupremo Tribunal de Justiça (Portugal)

ACORDAM NO SUPREMO TRIBUNAL DE JUSTIÇA I. RELATÓRIO Massa Insolvente de AA, S.A.

, com sede na Rua …., Nº 61 - …, instaurou a presente acção declarativa sob a forma de processo comum (inicialmente procedimento de injunção) contra BB Portuguesa, S.A.

, com sede na Quinta …, Est. Nacional, …, …, …, peticionando a condenação da ré no pagamento da quantia de 34 662,83 € e juros moratórios no valor de 13 107,96 €.

Alegou para o efeito, em síntese, que se dedicava com escopo lucrativo à construção civil e obras públicas, tendo a sede social na Rua …, …, …, e que, no exercício da sua atividade, celebrou com a ré, BB Portuguesa, S.A., um contrato de empreitada para a “ampliação de Pavilhão Industrial, a executar em … – … - …", no âmbito da qual foram emitidas facturas juntas aos autos referentes ao 5.º e 6.º auto de trabalhos contratuais (factura F09….6 no valor de 69.597,79€ e factura F09 …4, no valor de 9.065,04€), as quais, conforme acordado pelas partes, se venciam na data da emissão. A ré, contudo, da factura F09 …6 apenas liquidou o valor de 44.000,00€, permanecendo por liquidar, até hoje, a quantia de 25.597,79€, não tendo pago qualquer valor quanto à factura F09 …4. Alegou ainda que apesar de, por diversas vezes, ter sido interpelada para proceder ao cumprimento da sua obrigação pecuniária, a ré tem vindo a eximir-se ao cumprimento.

Devidamente citada, contestou a ré, invocando cumprimento defeituoso pela autora, com excepção de não cumprimento, na medida em que o auto de recepção provisória da obra foi assinado no dia 13 de Março de 2009, tendo sido verificadas três anomalias durante a vistoria, todas no Pavilhão Principal e que diziam respeito a fissuras no pavimento, infiltrações na cobertura e aos painéis da fachada, junto ao cunhal da torre do silo, as quais estava a autora obrigada a reparar mas sem que o tenha feito. Acresce, alega, ter ficado acordado, na Cláusula Sétima do contrato de empreitada, que durante o prazo de garantia, a autora estaria obrigada a executar todos os trabalhos que fossem indispensáveis para assegurar a perfeição e o uso normal da obra nas condições previstas, porém a obra nunca foi entregue sem os defeitos mencionados no auto de recepção provisória.

Invoca ainda que para além dos defeitos identificados no auto de recepção provisório, posteriormente surgiram outros, em Julho de 2011, nomeadamente ao nível do revestimento do pavilhão, que saltou da sua fixação, do que foi dado conhecimento à autora e que chegou a ser reparado, porém após essa reparação verificaram-se problemas de infiltrações devido à chuva, nomeadamente papos nas chapas, chão com fendas, infiltrações em diversos locais e uma infiltração na caleira, que também foi dado conhecimento à autora, mas sem que esta o tivesse reparado.

A ré sustenta ainda que, por ter sido decretada a insolvência da autora em 25.10.2011, se torna impossível a esta proceder ao cumprimento mediante a eliminação dos defeitos, ou seja, ocorre o incumprimento definitivo e culposo do contrato, o qual é fundamento da resolução do contrato, ficando a ré desonerada da prestação, mas assistindo-lhe o direito a ser indemnizada pelos prejuízos causados por esse incumprimento, correspondentes ao custo das obras de eliminação dos defeitos, efectuadas ou a realizar por terceiro.

A final proferiu-se a seguinte decisão: “Nestes termos e com base nos fundamentos supra: 1) Julga-se a ação totalmente improcedente e, em consequência, absolve-se a Ré do pedido formulado; 2) Julga-se procedente a exceção de caducidade dos pedidos reconvencionais e, em consequência, absolve-se a Reconvinda dos referidos pedidos.

3) Absolvem-se Autora/Reconvinda e Ré/Reconvinte dos deduzidos incidentes de litigância de má fé”.

A autora apelou desta decisão para o Tribunal da Relação do Porto, pugnando pela sua revogação e alegando que ela deixava a ré em posição de manifesto enriquecimento sem causa.

Por Acórdão de 22.10.2018, os Exmos. Juízes daquele Tribunal decidiram: “Nestes termos, dá-se provimento ao recurso e, em consequência, revoga-se o decisão recorrida e condena-se a ré BB Portuguesa, SA, a pagar à autora Massa insolvente de AA, SA, a peticionada quantia de € 34.662,83 acrescida dos juros vencidos no montante de € 13.107,96 e dos vincendos até efectivo e integral pagamento”.

Inconformada, é agora a ré BB Portuguesa, S.A. quem recorre para o Supremo Tribunal de Justiça, pretendendo que seja revogado o Acórdão do Tribunal da Relação do Porto, seja julgada procedente a excepção de não cumprimento do contrato e absolvida do pedido deduzido pela autora.

Formula a ré / ora recorrente, mais precisamente, as seguintes conclusões: “A. O acórdão recorrido é nulo por excesso de pronúncia de acordo com o disposto na al. d) do n.º 1 do artigo 615.º do CPC, aplicável ex vi do n.º 1 do artigo 666.º na medida em que (apenas) se pronuncia sobre uma matéria que não foi suscitada pela Recorrida nos autos.

  1. A Recorrida não invocou em qualquer fase do processo a caducidade dos direitos da Recorrente previstos nos artigos 1220.º e seguintes do C.C e, nomeadamente, do direito à eliminação dos defeitos da obra, sendo certo que esta matéria, por não estar excluída da disponibilidade das partes, não é de conhecimento oficioso, tendo de ser alegada para que o Tribunal dela possa conhecer (cfr. artigos 303.º e 333.º/2 do CC).

  2. Tampouco suscitou a Recorrente a questão da caducidade dos direitos do dono da obra no recurso interposto, sendo que, é pelas conclusões que se afere o objecto do recurso, ao qual o Tribunal fica vinculado, não sendo lícito, por sua própria e exclusiva iniciativa, e sob pena de violação do princípio da igualdade e do contraditório, conhecer de questões não alegadas pelas partes.

  3. Deve, por isso, se declarada a nulidade do acórdão recorrido, prevalecendo o entendimento do Tribunal de 1.ª Instância quanto à questão em causa nos autos, com as devidas e legais consequências.

  4. Sem prescindir, sempre se dirá que o acórdão recorrido não tem fundamento, assentando na errónea convicção de que a obra em questão já se encontrava concluída e, como tal, que já se encontrava em curso o prazo para o exercício dos direitos da Recorrente.

  5. No entanto, e conforme resulta provado nos autos (factos provados 3, 4, 5, 7, 12 e 14) a obra contratada nunca foi concluída pela Recorrida, pois que foram verificadas - e nunca reparadas - três anomalias aquando da sua recepção (sendo que, nos termos do contrato, a obra só se consideraria concluída decorridos 6 meses da data constante da recepção provisória, que não contivesse indicação de qualquer defeito).

  6. Ora, no seguimento do entendimento explanado em 1.ª Instância, que se dá por integralmente reproduzido, como é manifesto, não pode a Recorrida reclamar o pagamento do valor de trabalhos que nunca chegou a concluir, tendo a Recorrente legitimidade para recusar tal pagamento.

  7. Motivo pelo qual deverá improceder o entendimento expresso no acórdão recorrido.

    I. Sem prescindir, ainda que assim não fosse (o que não se admite), sempre se dirá que a Recorrente não aceita, porque tal não resulta da lei, que exista um prazo para a sua dedução. Neste sentido, o ac. da Relação de Coimbra de 21-02-2018: «...em relação à exceptio propriamente dita não se deteta que exista legalmente qualquer prazo de “caducidade” na sua invocação/exercício, antes e apenas um prazo de “prescrição...».

  8. E a Recorrente, para além de denunciar os defeitos (factos 4, 8 e 9), solicitou à Patrícios a sua reparação (factos 9, 10 e 11) e lançou ainda mão, extrajudicialmente, da excepção de não cumprimento (facto 12), assim cumprindo, a par do demais exigido, todos os requisitos de que depende a procedência desta excepção.

  9. Com efeito, e porque a eventual...

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