Acórdão nº 334/14.7TCFUN.L1.S1 de Supremo Tribunal de Justiça (Portugal), 16 de Maio de 2019

Magistrado ResponsávelROSA RIBEIRO COELHO
Data da Resolução16 de Maio de 2019
EmissorSupremo Tribunal de Justiça (Portugal)

ACORDAM NO SUPREMO TRIBUNAL DE JUSTIÇA 2ª SECÇÃO CÍVEL I - AA intentou[1] contra BB, Lda., CC, DD e mulher EE, FF e mulher, GG, HH e mulher II, JJ e mulher KK, LL e mulher MM e NN, ação declarativa sob a forma de processo ordinário, pedindo: a) que se declare: - sem eficácia jurídica a promessa de trespasse referida na petição inicial, - a nulidade da promessa de cessão total de quotas referida na petição inicial e, bem assim, a nulidade dos contratos de mútuo igualmente referidos na petição inicial, quando seja entendido que de empréstimos se trata; b) a condenação, em qualquer caso, de todos os sócios da sociedade no pagamento solidário, ao Autor, da quantia total de 14.011.524$00, com juros, à taxa legal, contados desde a citação e até efectivo pagamento ou, quando assim se não entenda, c) a condenação da Ré CC no pagamento, ao Autor, daquela quantia, acrescida de juros, à taxa legal, desde a data da citação e até efetivo pagamento, na qualidade de meeira e sucessora do falecido OO, seu falecido marido, a título de reparação pelos danos por este causados ao Autor.

Alegou, em síntese nossa, que: - Por documento particular, datado de 26 de Julho de 1993, o falecido OO, marido da Ré CC, como representante legal da anterior gerência da sociedade Os BB, Lda., apresentou ao Autor uma proposta definitiva para trespasse do Snack ...... "Os BB"; - O trespasse seria feito pelo preço de 36.000.000$00, a pagar em diversas prestações, valor a que seria deduzida a verba de 3.000.000$00, "referente à escritura e a uma «carrinha»"; - O autor entregou ao falecido OO, como sinal do futuro trespasse, um cheque de 10.000.000$00; - O autor desembolsou, ainda, a importância de 1.321.000$00, para saldo do valor do custo da "carrinha" referida na "proposta de trespasse", assim como o total de 2.960.524$00; - Noutra ação intentada pelo Autor contra a Ré, "Os BB, Lda", esta veio alegar que fora acordado, verbalmente, que a "formalização do negócio" deixava de ser em termos de trespasse para passar a ser em termos de "cessão total" das quotas no respetivo capital; - Nem o trespasse, nem a prometida cessão total de quotas chegaram a verificar-se, com a outorga das correspondentes escrituras; - A escritura de cessão esteve marcada para 29 ou 30 de Setembro de 1993, mas não chegou a realizar-se por falta da ré KK, mulher do réu JJ; nessa altura, o réu JJ disse ao autor que "nada queria com os outros", significando isto que não estava de acordo com o negócio; - Daí que o autor tenha perdido o interesse na aquisição do estabelecimento da Ré, fosse por trespasse, fosse por cessão total das quotas dos respetivos sócios, pelo que comunicou à sociedade Ré, por carta de 07.02.1994, que "dava por revogada e, portanto, rejeitada, a proposta para o trespasse do Snack Bar, Restaurante «Os BB»".

- De resto, a sociedade Ré acabou por cessar completamente as suas atividades e não possui quaisquer bens que possam responder, total ou parcialmente, pelas quantias devidas ao Autor e acima indicadas; - O sócio OO agiu sem poderes de representação da sociedade Ré, para fazer a promessa de trespasse do respetivo estabelecimento, a qua1 não foi ratificada por escrito, não constando do registo comercial a sua designação como gerente da sociedade ré.

Nas contestações apresentadas: - Os réus FF e mulher GG deduziram a sua ilegitimidade e impugnaram factos.

- Os réus Os BB Lda., CC, DD e mulher EE, HH e mulher II, NN, MM e PP, para além de impugnarem factos, deduziram as exceções do caso julgado e da prescrição, tendo ainda, em sede de reconvenção, pedido a condenação do autor a pagar à ré Os BB, Lda., a quantia de 30.000.000$00, acrescida dos juros legais, contados desde a citação, reconhecendo-se o direito de esta fazer suas todas as quantias recebidas daquele como sinal e princípio de pagamento, num total de 14.011.524$00.

Houve resposta do autor.

Por Acórdão datado de 13.12.2001, proferido pelo Tribunal da Relação de Lisboa, foi julgada improcedente a exceção do caso julgado relativamente aos réus pessoas singulares e procedente relativamente à ré sociedade.

Por Acórdão datado de 16.01.2003, proferido pelo STJ, foi o Acórdão da Relação revogado parcialmente, decidindo o Supremo pela improcedência do caso julgado, também, relativamente à ré sociedade.

Por decisão de 11.02.2004, foram os requeridos, GG e QQ, julgados habilitados para contra eles, no lugar do réu FF, entretanto falecido, a ação prosseguir seus termos.

Em sede de despacho saneador foi julgada improcedente a exceção da prescrição, tendo-se ainda entendido que a excepção da ilegitimidade se prendia, já, com a procedência da acção, tratando-se de uma questão de mérito, pelo que o seu conhecimento foi relegado para a decisão final.

Realizado o julgamento, foi proferida sentença[2] que, julgando a ação parcialmente procedente, declarou a nulidade, por falta de forma, do contrato celebrado entre o Autor e a Ré sociedade, representada pelo falecido sócio OO e absolveu os réus do pedido.

E, julgando a reconvenção improcedente, absolveu o autor do pedido que contra ele fora formulado.

Recorreram o autor e a ré Os BB, Lda., o primeiro pugnando pela procedência integral da acção e a segunda sustentando que deve ser alterada a decisão proferida sobre o ponto 36 da base instrutória e ser declarado que a recorrente tem direito a fazer suas as quantias que recebeu do Autor AA a título de sinal, no montante de € 63.300,07, devendo ainda o recorrido ser condenado a pagar àquela o montante de € 149.639,36, a título de indemnização pela perda do estabelecimento “Os BB”.

Na Relação de Lisboa foi proferido acórdão que julgou improcedente o recurso do autor e parcialmente procedente o recurso de Os BB, Lda., revogando a sentença na parte em que absolveu AA do pedido reconvencional e condenando-o a pagar à sociedade “Os BB, Lda.”, o valor do estabelecimento que lhe foi entregue.

Inconformado o autor trouxe a presente revista, tendo apresentado alegações onde formulou as conclusões que passamos a transcrever: I) - A decisão deve ser congruente, tanto no juízo veramente judicativo ou decisório, como nos fundamentos da ação. A decisão deve conter-se dentro dos limites do direito rogado e em congruência com os factos alegados e as provas apresentadas pelas partes.

II) - Se a condenação da ré acabou por ser retirada apesar de ter mantido a argumentação que sustentava essa mesma condenação, a nova decisão, só por isso, et pour cause, ficou incongruente, não podendo impor-se na ordem jurídica a todos os intervenientes no litígio levado ao proscénio da justiça.

III) - Denota-se aqui um desvio na estrutura lógico-formal da decisão, cujos fundamentos vão ou apontam num sentido e a decisão caminha para outro que lhe é desarmónico ou antagónico, constituindo a nulidade de sentença prevista no artigo 615°, n° 1, c), 1a parte, do CPC.

IV) - Tal oposição determinará a nulidade da sentença ou do acórdão.

  1. - Não tendo o 2o grau suprido a nulidade, a decisão do mesmo também é nula, por omissão de pronúncia, conforme o preceituado na alínea d), do n° 1, 1a parte, do inciso atrás citado.

    VI) - Por outro lado, se a ação foi julgada parcialmente procedente, a sentença não podia deixar de condenar as partes, ou algumas delas, a devolver ao autor o por ele desembolsado.

    VII) - Mas se o autor não impetrou a condenação da ré, isso não implicou que ele não tivesse que a demandar, para, em sua substituição, poder exigir que os sócios e igualmente réus entrassem com o dinheiro que não entraram aquando da escritura que titulou a aumento do capital social de 5 para 40 milhões de escudos.

    VIII) - Neste caso, a sociedade é a devedora sub-rogada e o autor, o credor sub-rogante que é titular de um direito de crédito sobre a devedora sub-rogada, compreendendo a possibilidade de uma atuação judicial ou extrajudicial contra os sócios da sociedade ré.

    IX) - Pois só depois da satisfação dessas entradas é que a sociedade ficaria apta a devolver o dinheiro ao autor.

  2. - A lei confere aos credores da sociedade a faculdade de a substituírem, concedendo-lhes do mesmo passo, o poder de exigirem dos sócios as entradas não satisfeitas, que foi quanto o autor colocou em pauta com a propositura dos presentes autos.

    XI) - Ora, o Tribunal da Relação, na sequência do decidido na 1a instância, não chegou a pronunciar-se sobre a temática precedente, que fazia como faz parte do thema deddendum.

    O 2o grau limitou-se a enunciá-la.

    XII) - Julga-se que também por isto a decisão da Relação é nula por omissão de pronúncia, nos termos do já várias vezes citado artigo 615°, n° 1...

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