Acórdão nº 98/16.0T8BGG-A.G1.S1 de Supremo Tribunal de Justiça (Portugal), 06 de Junho de 2019
Magistrado Responsável | ILÍDIO SACARRÃO MARTINS |
Data da Resolução | 06 de Junho de 2019 |
Emissor | Supremo Tribunal de Justiça (Portugal) |
Acordam no Supremo Tribunal de Justiça I - RELATÓRIO AA, autor nos autos principais em que são réus BB e CC, em 22-07-2018, interpôs recurso extraordinário de revisão da sentença proferida nos autos em 02-08-2016, que absolveu os réus dos pedidos e condenou o autor como litigante de má fé.
Por acórdão de 19-01-2017, tal sentença foi confirmada pelo Tribunal da Relação de Guimarães, “quer no que concerne à improcedência da acção, quer à incontornável condenação do autor, ora recorrente, como litigante de má fé”.
Através do presente recurso de revisão, interposto ao abrigo do disposto no artigo 696º alª b) do CPC, pretende o recorrente que se proceda à revisão da decisão proferida, ordenando que os autos prossigam os termos necessários para a presente causa ser novamente instruída e julgada, aproveitando-se a parte do processo que o fundamento da revisão – depoimento de DD – não tenha prejudicado.
Nas suas alegações concluiu que: 1. Ocorreu falsidade de depoimento que determinou a decisão dos presentes autos, a rever.
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Com efeito, a testemunha DD prestou depoimento falso nos presentes autos.
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Tal depoimento formou a convicção deste tribunal para a prolação da decisão sobre o julgamento da matéria de facto.
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Porque se verifica fundamento para a revisão da decisão transitada em julgado nos presentes autos, deve julgar-se o presente recurso procedente, revogando-se a decisão recorrida e ordenando-se que se sigam os termos necessários para a causa ser novamente instruída e julgada, aproveitando-se a parte do processo que o fundamento da revisão – depoimento de DD – não tenha prejudicado.
Finaliza, pedindo seja concedido provimento ao recurso.
Ofereceu como meio de prova a produzir, uma certidão da sentença proferida no processo que correu termos sob o n.º 13514/16.1T9PRT, no Tribunal Judicial da Comarca de … – Juízo Local Criminal de … .
Notificados pessoalmente os requeridos para responder, nos termos do disposto no artigo 699º nº 2 do Código de Processo Civil, não foi apresentada resposta.
A Relação de Guimarães, por acórdão de 10 de Janeiro de 2019, julgou improcedente o recurso de revisão.
Não se conformando com tal acórdão, dele recorreu o autor, ora recorrente, tendo formulado as seguintes CONCLUSÕES: 1ª - O autor/recorrente não se conforma com o douto acórdão proferido nos presentes autos que entendeu que não se verifica um nexo de causalidade entre o vício e o teor da decisão revidenda.
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- É certo que o depoimento da testemunha DD serviu de fundamento para a decisão proferida.
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- Pois, conforme consta da decisão recorrida "a versão constante da contestação, para além de se revestir do pertinente suporte documental, encontra-se robustamente comprovada pela generalidade dos depoimentos prestados pelas testemunhas arroladas pelos RR., a saber (...) DD" e que "também os depoimentos das testemunhas EE e DD (...) A segunda, por seu turno, também teve conhecimento dos factos através da testemunha FF e do próprio autor, porquanto era amiga e pessoa das relações próximas deste dissolvido casal".
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- Ora, tal testemunha prestou depoimento falso, o qual formou a convicção do tribunal e o julgamento da matéria de facto.
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- Esta testemunha mentiu, pelo menos, acerca das datas a partir das quais conhecia o autor, bem como, do conhecimento de factos que relatou e que seriam impossíveis de conhecer, uma vez que não poderia, na altura, a testemunha ter tido conhecimento do empréstimo ocorrido nas datas em causa nos autos.
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- Este depoimento foi considerado para a fixação da matéria de facto provada, conforme também alegado nas alegações de recurso apresentadas no douto tribunal a quo.
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- Deverá ser tido em consideração e validado o facto de a testemunha ter prestado falsas declarações, bem como, o motivo pelo qual o fez.
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- Não é possível ao autor/recorrente demonstrar a falsidade de todos os depoimentos, mas o certo é que todas as testemunhas são família dos réus, que têm interesse na causa.
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- Para que seja julgado procedente o recurso é necessário que a falsidade do depoimento possa ter determinado a decisão a rever, o que se verifica nos presentes autos, pois o mesmo, inequivocamente, influenciou a decisão recorrida, caso se admita que não foi determinante.
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- Pelo que se deverá revogar o douto acórdão recorrido, ordenando-se seja proferida decisão que, julgando procedente este recurso, ordene que sigam os termos necessários para a causa ser novamente instruída e julgada, aproveitando-se a parte do processo que o fundamento da revisão não tenha prejudicado.
Termina, pedindo que seja concedido provimento ao recurso.
Não houve contra-alegações.
Colhidos os vistos, cumpre decidir.
II - FUNDAMENTAÇÃO
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Fundamentação de facto A Relação considerou assentes os seguintes factos: 1º - Nos autos de que estes constituem apenso teve lugar julgamento e foi proferida sentença que decidiu julgar improcedente a acção interposta pelo autor AA e consequentemente, absolver os réus dos pedidos formulados e condenar o autor AA como litigante de má-fé.
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- Desta decisão foi interposto recurso de apelação pelo autor, tendo sido proferido acórdão que julgou improcedente a apelação, confirmando a sentença recorrida.
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- Tal acórdão transitou em julgado.
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- No Tribunal Judicial da Comarca de … – Juízo Local Criminal de … correu termos o processo n.º 13514/16.1T9PRT, em que era arguida DD, no qual foi proferida sentença, cuja cópia foi junta pelo recorrente, que condenou a arguida pelo crime de falsidade de declarações, previsto no artº 360º nºs 1 e 3 do Cód. Penal, cometido no âmbito do processo 98/16.0T8BGC.
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- Tal sentença está datada de 2-05-2018 e transitou em julgado.
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Fundamentação de direito A decisão recorrida delimita o objecto do recurso (artigo 663º nº 2 do CPC); e é nesse âmbito que as conclusões do recorrente circunscrevem depois o mesmo objecto (artigo 635º nº 4 e 639º nºs 1 e 2 do CPC).
Nesse enfoque, a hipótese dos autos pode assim ser enunciada: A falsidade do depoimento da testemunha DD determinou a decisão a rever, pois o mesmo, inequivocamente, influenciou a decisão recorrida? Assim, a questão jurídica que nos compete apreciar, à luz das conclusões da minuta recursória consiste em saber se a decisão deve ser revogada e substituída por outra que julgue integralmente procedente o recurso extraordinário de revisão de sentença.
Cumpre decidir.
O recurso de revisão previsto no artigo 696º e seguintes do Código de Processo Civil, e consagrado igualmente noutros sistemas jurídicos, constitui um atentado à intangibilidade do caso julgado formado pela sentença revidenda e, deste modo, à segurança ou à certeza jurídicas que aquele envolve, só justificável por razões de justiça impostas pelo evoluir da consciência jurídica dos povos civilizados e mais conformes à feição social do direito hoje preponderante.
No ensinamento de Rodrigues Bastos[1], constituindo a revisão uma impugnação da força e autoridade do caso julgado, capaz nalguns casos de abalar o prestígio, não só da decisão como dos próprios tribunais, só deve ser franqueada depois de provados os graves factos que lhe servem de fundamento.
O mesmo autor, em anotação ao correspondente artigo 771º alª b) do anterior CPC,[2] ensina que tem de existir um nexo de causalidade entre a falsidade constatada e a decisão que se pretende rever.
O recurso extraordinário de revisão visa destruir a intangibilidade do caso julgado a que estão ligadas inquestionáveis razões de certeza e segurança do Direito com a inerente repercussão na paz social.
Manuel de Andrade[3], alude a “razão de certeza ou segurança...
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...podendo averiguar-se na fase rescindente do recurso». Finalmente, Ac. do STJ, de 06.06.2019, Ilídio Sacarrão Martins, Processo n.º 98/16.0T8BGG-A.G1.S1, onde se lê que a «prova da efectiva falsidade não é requisito prévio da admissibilidade do recurso de revisão (cfr. preâmbulo do decreto-l......
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