Acórdão nº 2222/11.0TBVCT.G1.S1 de Supremo Tribunal de Justiça (Portugal), 23 de Maio de 2019

Magistrado ResponsávelHELDER ALMEIDA
Data da Resolução23 de Maio de 2019
EmissorSupremo Tribunal de Justiça (Portugal)

Acordam no Supremo Tribunal de Justiça[1] I – RELATÓRIO 1.

AA instaurou a presente acção declarativa com processo ordinário destinada à efectivação de responsabilidade civil emergente de acidente de viação contra a BB - Companhia de Seguros, S.A.

, pedindo a condenação desta a pagar-lhe a quantia global líquida de € 512.249,85, acrescida de juros de mora à taxa legal de 4% ao ano, contados desde a data da propositura da acção até efectivo e integral pagamento, bem como a indemnização que vier a ser fixada em decisão ulterior, por força dos internamentos, intervenções, consultas, exames, tratamentos, auxiliares de locomoção, próteses, veículo apropriado e adaptação da habitação de que ainda irá necessitar.

2.

Para tanto alegou, em suma, que ocorreu um embate em que foram intervenientes o motociclo de matrícula ...-...-RS, por si conduzido, e o veículo automóvel de matrícula ...-...-TF, seguro na Ré, sendo certo que a ocorrência do sinistro ficou a dever-se a culpa exclusiva do condutor do aludido veículo automóvel.

Mais invocou a existência de danos patrimoniais e não patrimoniais, cuja reparação reclama, em virtude das lesões sofridas no embate dos autos.

3.

A Ré apresentou contestação, alegando a sua versão do acidente, mais impugnando a existência de prejuízos e respectivos montantes, concluindo que a acção deverá ser julgada totalmente improcedente.

4.

O A. apresentou, por sua vez, réplica, mantendo o alegado na petição inicial.

5. Ocorreu entretanto o falecimento do A., tendo sido habilitados, como seus únicos herdeiros e sucessores legais, os filhos CC, DD, e EE.

6.

Seguindo os autos os seus normais trâmites, teve lugar a audiência de julgamento culminada com sentença, finda com o seguinte dispositivo: - “Pelo exposto, julgo parcialmente procedente a acção e, em consequência, condeno a ré Companhia de Seguros FF, S.A.. a pagar aos sucessores habilitados de AA: - quantia de € 80.027,48 (oitenta mil vinte e sete euros e oitenta e quarenta e oito cêntimos), acrescida de juros de mora, à taxa legal de 4%, contados desde a citação até integral pagamento; e - a quantia de € 60.000,00 (sessenta mil euros), acrescida de juros de mora a contar da data desta sentença até integral pagamento; absolvendo-a do restante peticionado…”.

7.

Não se conformando com o assim decidido, a Ré interpôs o competente recurso de apelação, a que os AA./habilitados deduziram contra-alegações, acompanhadas de recurso subordinado.

8.

Pela Relação foi proferido douto Acórdão – fls. 1141 e ss.‑, findo com o decisório que segue: - Pelo exposto, julga-se parcialmente procedente a Apelação e altera-se a decisão recorrida, condenando-se a ré a pagar aos AA/habilitados: - a quantia de € 42.142.41, a título de danos patrimoniais (correspondente essa quantia a 70% do total da indemnização devida, depois de abatida a quantia de € 5.000,00 adiantada ao A. pela ré seguradora), acrescida de juros de mora, à taxa anual de 4%, contados desde a citação e até integral pagamento; - a quantia de € 56.000,00, a título de danos não patrimoniais (correspondente essa quantia a 70% do total da indemnização devida), acrescida de juros de mora, à taxa anual de 4%, contados desde a data da sentença da 1ª instância e até integral pagamento.

9.

Pelo Ministério Público foi interposto recurso obrigatório para o Tribunal Constitucional do segmento da decisão proferida no Acórdão ora em foco, julgando inconstitucional a norma contida no art. 64.º, n.º 7[2], do D.L. n.º 291/2007, de 21 de Agosto [Regime Jurídico do Seguro Obrigatório de Responsabilidade Civil Automóvel], recurso a que o dito Tribunal, por pertinente douto Acórdão – fls. 1348 e ss.‑ negou provimento.

10.

De novo irresignados, os AA/habilitados interpuseram o vertente recurso de revista, o qual encerram cos as seguintes conclusões: 1ª – O acórdão recorrido é nulo nos termos do disposto no artº. 615º, nº 1 do Cód. Proc. Civil, pois não conheceu do recurso subordinado interposto pelos AA./habilitados da decisão do tribunal de 1ª instância, limitando-se a apreciar o recurso de apelação interposto pela Ré “GG - Companhia de Seguros, S.A.”.

  1. – Pelo que deverá ser declarado nulo, ordenando-se a remessa dos autos ao tribunal “a quo” para que o mesmo aprecie e decida o recurso subordinado interposto pelos AA..

  2. – Ao decidir que existiu concorrência de culpas na eclosão do sinistro - fixando em 70% a culpa do condutor do veículo ...-...-TF, segurado na Ré seguradora, e de 30% para o A. AA – o tribunal “a quo” fez errada apreciação da factualidade provada e proferiu uma errada decisão sobre a culpa na eclosão do sinistro.

  3. – Com efeito, face à factualidade dada como provada, o tribunal “a quo” deveria ter considerado que o condutor do veículo segurado na Ré “GG - Companhia de Seguros, S.A.” foi o único culpado na eclosão do sinistro, por violação do disposto nos artº.s 13º, nº 1 e 3, artº. 18º, nº 1 e 2, artº. 24º, nº 1 do Cód. da Estrada.

  4. - Resulta dos pontos 3, 4, 8, 10, 11, 13, 14, 15, 16, 17, 18, 19, 21, 22, 24, 25, 26, 28 29, 30, 31, 32, 33, 34, 35, 36, 37 e 38 dos “Factos provados” que o condutor do veículo de matrícula ...-...-TF, segurado na Recorrida seguradora, circulava pela hemi-faixa de rodagem direita da A28, a qual era perfeitamente iluminada por candeeiros públicos que estavam ligados e permitiam ver ao longo de toda a faixa de rodagem e das bermas.

  5. - O segurado da Recorrida seguia numa posição atrás do AA e, não obstante o motociclo por este tripulado estar dotado de farolins reflectores e de cor vermelha e o capacete vermelho – cfr. alínea N) dos Factos Assentes, que prevalecem - por ele utilizado ter na sua rectaguarda uma substância reflectorizante, aquele segurado não se apercebeu do abrandamento do motociclo conduzido pelo pai dos Recorrentes a não ser quando se encontrava a uma distância de apenas 16,50 metros (tendo travado e deixado um rasto de travagem de 79,30 metros)! 7ª - Por essa razão, o condutor do veículo segurado da “GG - Companhia de Seguros, S.A.” não imobilizou o veículo que conduzia no espaço livre e visível disponível à sua frente, nem se desviou do mesmo, nem passou pela largura da faixa que tinha disponível, tendo antes embatido contra o AA quando o mesmo circulava pela faixa de rodagem da A28.

  6. - Perante esta factualidade que resultou provada, deveria o tribunal “a quo” ter decidido que o condutor segurado da Recorrente violou, entre outras, as disposições dos artº.s 13º, nº 1 e 3, artº. 18º, nº 1 e 2, artº. 24º, nº 1 do Cód. da Estrada.

  7. – Acresce que ficou provado que o veículo de matrícula ...-...-TF era propriedade de HH e, na altura do sinistro, era conduzido por II.

  8. - Verifica-se, assim, a relação comitente-comissário, tal como é configurada no artº. 503º, nº 3 do Cód.. Civil.

  9. - Pelo que, sobre o condutor do veículo de matrícula ...-...-TF impende, assim, uma presunção legal de culpa que a Ré “GG” não logrou ilidir – artº. 503º, nº 3 do Cód. Civil.

  10. - Ao decidir de forma diversa, o tribunal “a quo” fez errada interpretação e aplicação dessas mesmas disposições aos factos provados.

  11. - Pelo que deverá a decisão ser alterada, decidindo-se que o condutor segurado na Recorrida “GG - Companhia de Seguros, S.A.” é o único e exclusivo responsável pela eclosão do sinistro.

  12. – Nessa medida, a Recorrida deverá ser condenada a pagar a totalidade – 100% - das indemnizações por danos patrimoniais e não patrimoniais que se considerem equitativas, e não apenas 70% das mesmas.

  13. - As quantias arbitradas pelo tribunal “a quo” para ressarcimento dos danos patrimoniais e não patrimoniais sofridos pelo AA é manifestamente insuficiente.

  14. - A quantia de € 42 142,41 fixada pelo tribunal “a quo” para ressarcimento dos danos patrimoniais sofridos pelo AA, é manifestamente insuficiente para ressarcimento de todos os danos por aquele sofridos.

  15. – Resultou provado que o AA teve as seguintes despesas e prejuízos em consequência do sinistro sub-judice: 1.

    DESPESAS:

    1. Medicamentos € 281,77 b) Taxas moderadoras € 654,30 c) Deslocações de táxi € 614,15 d) Deslocações em viatura própria € 250,00 e) Deslocações em ambulância dos Bombeiros € 120,00 f) Parques de estacionamento € 4,30 g) Refeições € 591,00 h) Vestuário inutilizado € 400,00 € 2 915,52 (pontos 50, 98, 99, 100, 101, 102, 103 e 104 dos Factos provados) 2.

      DANOS RESPEITANTES AO MOTOCICLO DE MATRÍCULA ...-...-RS:

    2. Custo de reparação do ...-...-RS € 6 287,93 b) Desvalorização do ...-...-RS € 1 500,00 € 7 787,93 (pontos 40 e 42 dos Factos provados) 18ª - Para além destas quantias, o AA sofreu ainda uma perda de rendimentos – dano futuro - em consequência da incapacidade de que ficou a padecer para o trabalho.

  16. – O AA ficou a padecer de um défice funcional permanente da integridade física e psíquica de 30 pontos, auferia um rendimento de trabalho de € 800,00 e, desde a data do acidente até à data da sua morte, nunca mais trabalhou, tendo deixado de auferir aquele rendimento (pontos 93, 95 e 96 dos Factos provados).

  17. – Pelo que, tendo em conta que entre a data do acidente (25.12.2006) e a data da morte do AA (16.10.2012) decorreram 70 meses, a perda de rendimento deste cifrou-se em (70 meses x € 800,00) € 56 000,00 (cinquenta e seis mil euros).

  18. - Assim, o valor global de danos patrimoniais sofridos pelo AA em consequência do sinistro foi de (€ 2 915,52 + € 7 787,93 + € 56 000,00) € 66 793,45.

  19. - Pelo que, deduzida a essa quantia o montante de € 5 000,00 adiantado pela Recorrida ao AA, deveria a Recorrida “GG - Companhia de Seguros, S.A.” ter sido condenada a pagar aos AA./habilitados, a título de danos patrimoniais, a quantia de € 61 793,45 (sessenta e um mil setecentos e noventa e três euros e quarenta e cinco cêntimos), acrescida de juros de mora.

  20. - Ao decidir de forma diversa, o tribunal “a quo” violou o disposto nos artº.s 562º, artº. 564º, nº 1 e 2 e artº. 566º, nº 2 do Cod. Civil.

  21. – Pelo que deve a decisão recorrida ser nessa parte ser revogada, substituindo-se por outra que condene a Recorrida a...

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