Acórdão nº 835/15.0T8LRA.C3.S1 de Supremo Tribunal de Justiça (Portugal), 15 de Maio de 2019

Magistrado ResponsávelRIBEIRO CARDOSO
Data da Resolução15 de Maio de 2019
EmissorSupremo Tribunal de Justiça (Portugal)

Acordam na Secção Social do Supremo Tribunal de Justiça ([1]) 1 - RELATÓRIO AA intentou a presente ação declarativa de condenação com processo comum contra BB, S.A.

, pedindo a condenação desta a pagar-lhe a quantia global de € 75.101,40, a título de danos patrimoniais e não patrimoniais, acrescida de juros de mora à taxa de 4% desde a citação até integral pagamento.

Como fundamento alegou que a longa exposição direta às poeiras provocou-lhe uma pneumoconiose por silicatos que se manifestou desde inícios de 2007. Dirigiu-se, então, à R. a qual preencheu o requerimento de proteção na doença profissional e remeteu-o para o Centro Nacional de Doenças Profissionais, em junho de 2009. A doença profissional só veio a ser identificada a 16 de março de 2012, agravando-se em 2014 encontrando-se a receber uma pensão no valor mensal de € 16,73. Não consegue trabalho em virtude da sua saúde. Foi a violação pela R. de regras de higiene que provocou a doença, a qual lhe causou danos de que pretende ser ressarcida, devendo reparar a redução da capacidade laborativa sofrida, efetuando o pagamento de uma pensão mensal nunca inferior a 30%, desde a data do evento até que complete 65 anos de idade (idade média presumida), pelo que só um capital de € 39.101,40 (€ 557,00 x 0,3 x 13m x 18a), a título de lucros cessantes é que lhe permite estabelecer um quantitativo de rendimentos que recolheria o resto da vida em que laboraria sem a atual incapacidade permanente. Sofreu ainda danos não patrimoniais no valor de € 35.000,00 tendo gasto em saúde € 1.000,00.

A R. contestou alegando que, depois de cessado o contrato de trabalho, a A. dirigiu-se-lhe em junho de 2009 tendo então preenchido o requerimento de proteção na doença e remeteu-o para o Centro Nacional de Doenças Profissionais. Foi nesta data que a A. teve conhecimento de que seria portadora de uma doença profissional e que esse facto se deveria, alegadamente, a inobservância do cumprimento de regras de segurança e higiene no trabalho.

Invocou a caducidade do direito de ação por ter decorrido o prazo previsto no art. 32º da Lei 100/97 de 13/09 (LAT). Por outro lado, sendo o prazo previsto no artigo 498º do Código Civil de 3 anos, a A. teria de avançar com a competente ação, no limite, até junho de 2012, o que não sucedeu, pelo que ocorreu a prescrição do invocado direito da A.

A 1ª instância julgou procedente a exceção da caducidade.

Na apelação intentada pela A. a Relação revogou a decisão da 1ª instância, tendo considerado ser inaplicável o disposto no art. 32º da LAT, declarou improcedente a exceção da caducidade e ordenou o prosseguimento dos autos.

A R. interpôs recurso de revista que, por extemporâneo, não foi admitido.

Regressados os autos à 1ª instância foi na audiência prévia proferida decisão julgando procedente a exceção da prescrição invocada pela R.

Inconformada, a A. apelou tendo a Relação julgado improcedente a exceção da prescrição e, revogando a decisão da 1ª instância, ordenou o prosseguimento dos autos.

A R. recorreu de revista, invocando a nulidade do acórdão por falta de fundamentação e, impetrando a sua revogação, pediu a sua substituição por outro “que julgue a ação totalmente improcedente, por provada a prescrição invocada”.

A Relação pronunciou-se sobre a invocada nulidade julgando-a improcedente.

Cumprido o disposto no art. 87º, nº 3, do CPT, a Exmª Procuradora-Geral-Adjunta emitiu douto parecer no sentido da procedência da revista por violação do princípio do contraditório ínsito no art. 3º, nº 3 do CPC, pese embora na arguição desta nulidade a recorrente devesse ter observado o disposto no art. 77º do CPT, devendo “os autos baixar ao tribunal a quo a fim de ser observado o contraditório e os autos prosseguirem os seus ulteriores termos, ou, quando assim se não entenda, negada a revista”.

Notificadas, apenas a recorrente se pronunciou invocando que, sendo a preterição do princípio do contraditório uma nulidade processual, na sua arguição não tinha que observar o formalismo prescrito no art. 77º do CPT, tendo concluído como nas alegações.

Formulou a recorrente as seguintes conclusões, as quais, como se sabe, delimitam o objeto do recurso ([2]) e, consequentemente, o âmbito do conhecimento deste tribunal: “I. O tribunal a quo levantou unilateralmente a questão de desvendar a modalidade da responsabilidade civil em que se baseia (ou deveria basear) a ação proposta pela Autora, sem que tal questão tivesse sido suscitada por qualquer das partes em momento algum (nem durante o processo, nem em sede de recurso), II. e pronunciou-se sobre a mesma sem ter dado a possibilidade às partes de exercerem o contraditório (art. 3.º, n.º 3 do CPC), violando o disposto na lei de processo (art. 674.º, n.º 1, alínea b) do CPC).

III. O douto acórdão recorrido entende que a responsabilidade imputada à Ré se verifica no âmbito da execução de um contrato, enquadrando-se, portanto, numa situação de responsabilidade contratual, concluindo que "o prazo de prescrição é o ordinário, ou seja, 20 anos de acordo com o disposto no artº 309º do CC" (p. 21 do acórdão recorrido) e, como tal, não estando ainda prescrito o alegado direito da Autora.

IV. Ora, não se pode, de todo, concordar com esta sua conclusão, já que, em contexto laboral, é aplicável o prazo prescricional de «um ano a partir do dia seguinte àquele em que cessou o contrato de trabalho» previsto no art. 337.º, n.º 1 do CT.

V. Portanto, considerando que o contrato de trabalho vigorou até ao dia 31-12-2008, a Autora sempre teria que propor a ação de responsabilidade civil até à data de 31-12-2009, o que não fez, de modo que sempre teria prescrito o seu pretenso direito.

VI. Por mera cautela de patrocínio: ainda que se entendesse que o prazo prescricional previsto no art. 337.º n.º 1 do CT se iniciou não no "dia seguinte àquele em que cessou o contrato de trabalho" (como resulta da letra da norma), mas na data da comunicação à Autora da decisão do CNPRP, sempre estaria o direito da Autora prescrito, já que prescreveria em 16-03-2013, tendo sido dada entrada à presente ação no dia 09-03-2015.

VII. Deste modo, o tribunal a quo violou a lei substantiva, errando na determinação da norma aplicável (art. 674.º, n.º 1, alínea a) do CPC).

VIII. Por último, o douto tribunal a quo concluiu que o direito à alegada indemnização não prescreveu mesmo que se entenda que a responsabilidade civil é a extracontratual, porquanto considera que a Autora, até à notificação do CNPRP, em 16-03-2012, tinha um conhecimento parcial/incompleto/insuficiente dos elementos necessários para demandar a Ré, pelo que não se começou a contar o prazo prescricional antes dessa data. Contudo, IX. o douto acórdão nunca especifica concretamente que pressupostos necessários desconhecia a Autora antes da notificação do CNPRP; e X. tampouco especifica que pressupostos passou a conhecer com essa notificação.

XI. Curiosamente, o tribunal reconhece, na p. 23 da decisão recorrida, que, à data da apresentação do requerimento ao CNPRP, em 2009, a Autora tinha conhecimento dos danos ["padecia de lesões"], do concreto facto causador do dano ["exposição às poeiras resultantes do trabalho que executava"] e do nexo de causalidade entre este facto e aqueles danos ["lesões provocadas pela exposição às poeiras"], XII. para logo de seguida dizer que não concorda com a afirmação de que «a autora "logo em 2009, tomou conhecimento e deparou-se com todos os pressupostos necessários ao exercício do direito de acção ressarcitória"», XIII. concluindo que «só com a notificação do CNPRP a autora ficou na posse de todos os elementos necessários para poder demandar a ré, designadamente, a concreta doença de que padecia e o nexo de causalidade entre essa concreta doença e as condições de trabalho em que laborava» (p. 24).

XIV. Perante isto mantém-se a questão: Que pressupostos, em específico, identifica o tribunal a quo cujo conhecimento era indispensável para a propositura da ação judicial e que a Autora desconhecia à data da apresentação do requerimento ao CNPRP mas que passou a conhecer com a notificação deste Centro Nacional? XV. O Acórdão não logra responder a esta questão e não avança quaisquer fundamentos de facto, limitando-se apenas a fazer considerações genéricas e abstratas acerca do "conhecimento completo sobre os pressupostos da responsabilidade civil" e a tecer reflexões de direito sem delas colher conclusões úteis e concretas para a factualidade.

XVI. Como tal, aquele acórdão do tribunal a quo não especifica os fundamentos de facto que justificam a decisão, pelo que é nulo nos termos do art. 615.º, n.º 1, alínea b) do CPC.” E em sede de nulidade do acórdão arguiu: “Em cumprimento do disposto no art. 77º do Código de Processo do Trabalho, argui-se a nulidade do acórdão recorrido por falta de especificação dos fundamentos de facto que justificam a decisão (art. 615.º, n.º 1, alínea b) do CPC): i) No domínio da responsabilidade extracontratual, o tribunal decidiu que, até à notificação do CNPRP em 16-03-2012, a Autora tinha um conhecimento parcial/ incompleto/ insuficiente dos elementos necessários para demandar a Ré, pelo que não se começou a contar o prazo prescricional até então. Porém, ii) o douto acórdão nunca especifica concretamente que pressupostos necessários desconhecia a Autora antes da notificação do CNPRP; iii) tampouco especifica que pressupostos passou a conhecer com essa notificação.

iv) Não são especificados quaisquer fundamentos de facto que justifiquem a sua decisão e as poucas considerações fácticas que se verificam são contraditórias.

” Em resposta a recorrida formulou as seguintes conclusões: “1ª Adere-se totalmente à fundamentação e decisão do Tribunal da Relação.

  1. Não sufragando tal posição, a recorrente, invoca, por um lado, que, "em contexto laboral, é aplicável o prazo prescricional de «um ano a partir do dia seguinte àquele em que cessou o contrato de trabalho» previsto no art. 337º, n.º 1 do CT» e não o prazo de 20 anos previsto no art...

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