Acórdão nº 765/15.5T9LAG.E1.S1 de Supremo Tribunal de Justiça (Portugal), 16 de Maio de 2019

Magistrado ResponsávelNUNO GONÇALVES
Data da Resolução16 de Maio de 2019
EmissorSupremo Tribunal de Justiça (Portugal)

O Supremo Tribunal de Justiça, 3ª secção criminal, acorda: I.

RELATÓRIO: O Tribunal Judicial da Comarca de Faro, Juízo Central Criminal de Portimão - Juiz 1, por acórdão de 8 de Março de 2018,condenou o arguido AA, com os demais sinais dos autos, na: - pena de 2 (dois) anos e 6 (seis) meses pela pratica de um crime de ofensas à integridade física grave na forma tentada p. e p. pelo art. 144º, alínea c) do Código Penal; - pena de 1 (ano) ano e 6 (seis) meses pela pratica de cada um dos três crimes de propagação de doença na forma tentada p. e p. pelo art. 283º, nº 1 do Código Penal; - pena de 6 (seis) meses de prisão pela pratica de cada um dos seis crimes de ameaça agravada, p. e p. pelos artigos 153º e 155º, n.º1, do Código Penal; e - em cúmulo jurídico na pena única de 5 (cinco) anos e 6 (seis) meses de prisão.

Inconformado interpõe recurso, circunscrevendo a discordância à medida da pena conjunta, rematando a alegação com as seguintes: -CONCLUSÕES:- 1 - O arguido foi condenado na pena de 1 (um) ano e 6 (seis) meses pela prática de cada um dos três crimes de propagação de doença na forma tentada, p. e. p. pelo art. 283º nº 1 do Código Penal; - na pena de 2 (dois) anos e 6 (seis) meses pela prática de um crime de ofensas à integridade física na forma tentada p. e p. pelo artigo 144º, alínea c) do Código Penal; - na pena de 6 (seis) meses de prisão pela prática de cada um dos seis crimes de ameaça agravada, p. e p. pelos art. 153º e 155º nº 1 do Código Penal; em cúmulo na pena única de 5 (cinco) anos e 6 (seis) meses de prisão.

2 - A pena aplicada pelo Tribunal é desproporcional, excessiva e injusta, violando o disposto nos artigos 40º, 50º 71º, todos do Código Penal.

3 - O Tribunal a quo deu como provados os factos, contudo não atendeu aos princípios e critérios orientadores na escolha e dosimetria da pena, não valorando na justa medida todos os aspectos indispensáveis a uma justa e adequada punição.

4 - E por esse motivo o Recorrente entende que a condenação não poderia ter dado lugar a condenação tão grave como deu -pena de (5) cinco anos e (6) seis meses de prisão efectiva.

5 - O tribunal colectivo bastou-se com a convicção que formou, com base no princípio da livre apreciação da prova, não considerando na aplicação da medida da pena, as circunstâncias que poderiam beneficiar o arguido.

6 - O arguido sofreu já quatro internamentos psiquiátricos, encontra-se a ser acompanhado com alguma regularidade em consultas de psiquiatria desde Abril de 2016 a Dezembro de 2017, e apresenta os seguintes diagnósticos: síndrome de imunodeficiência adquirida, hepatite crónica C, psicose por drogas, transtorno de personalidade, abuso de drogas, abuso de álcool, síndrome dependência de álcool, dependência de droga.

7 - Um dos internamentos psiquiátricos a que o arguido foi sujeito, designadamente o de dia 25/02/2016, ocorre no dia imediatamente a seguir a um dos episódios referidos na acusação, o que demonstra o estado de altercação em que o mesmo deu entrada.

8 - Dos três episódios ocorridos descritos nos autos, tendo em conta o quadro clínico do arguido, é pois credível o estado alterado com que este entrava nas urgências, pelas alterações de comportamento que o mesmo apresentava, só assim se justificando a perseguição e as ameaças aos funcionários da saúde. Já normal não será uma pessoa no seu perfeito estado ter comportamentos como os aqui descritos e ocorridos.

9 - Conforme o próprio acórdão refere: “ … porquanto o arguido é um utente frequente naquela unidade hospitalar e sempre com o mesmo tipo de comportamento”, leva-nos a concluir com especial cautela de que este depende de uma aderência continuada às consultas da especialidade de psiquiatria, da respectiva medicação prescrita e da garantia de manutenção de abstinência de drogas e álcool, motivo pelo qual é fundamental manter o tratamento médico especializado regular.

10 - Tal só será possível no caso de uma redução da pena de prisão com recurso ao mecanismo da suspensão da mesma.

11 - Acresce que ficou provado a dependência das drogas e álcool, problemas de comportamento, transtornos de personalidade, o que não foi correctamente considerado.

12 - Para além de que o Recorrente com a sua conduta posterior, provou estar afastado de situações como as dos presentes autos, apesar de não lhe ser possível infelizmente voltar atrás.

13 - O arguido prestou declarações, declarando não se lembrar dos acontecimentos, no entanto as mesmas não tiveram qualquer relevo, merecendo desvalor a seu favor.

14 - As testemunhas foram unânimes em referir que antes de terem contacto com o arguido já tinha conhecimento da história clínica do mesmo, situação que por si só as coloca de sobre aviso.

15 - As testemunhas referiram haver indícios de que o arguido não estaria no seu estado normal, aparentando sinais de descontrolo, havendo uma razoável probabilidade para este se encontrar sob a influência do álcool.

16 - O arguido tem antecedentes criminais, contudo os ilícitos tem natureza distinta da dos presentes autos.

17 - O arguido detém enquadramento familiar efectivo, é acompanhado pela Equipa da DGRSP e efectua terapêutica.

18 - Comportamentos como os descritos nos autos, só podem ter como base um pensamento e um estado mental muito alterado, reveladores de significativa perturbação, o que por si só afastará a culpa.

19 - Adequado e justo seria condenar o arguido a uma pena não superior a cinco anos, determinando a suspensão da execução com regime de prova e vigilância tutelar dos serviços de reinserção social, ficando tal suspensão sujeita ao preenchimento, pelo arguido, de condições que passariam pela estrita manutenção do seu estado de saúde e mental.

20 - Com estes fundamentos, afirmamos que a escolha da pena infligida ao arguido se afigura desadequada e desproporcional, pelas suas consequências, as suas circunstâncias pessoais, e até mesmo perante as necessidades de prevenção geral, prevenção especial e de justiça que o caso de per si reclama, devendo, pois, ser alterada em conformidade.

21 - O Tribunal violou assim os critérios contidos nas disposições conjugadas dos art. 40º, 70º, 71º, todos do Código Penal.

Pugna pela redução da pena única pedindo que seja fixada em medida não superior a cinco anos de prisão, e que se suspenda a “execução acompanhada de regime de prova assente num plano de reinserção social, executado com vigilância e apoio dos serviços de reinserção social”.

* O Ministério Publico respondeu defendendo a improcedência total do recurso, rematando a alegação com as seguintes: - CONCLUSÕES-: 1- O âmbito do recurso retira-se das respectivas conclusões as quais por seu turno são extraídas da motivação da referida peça legal, veja-se por favor a título de exemplo o sumário do douto Acórdão do STJ de 15-4-2010, in www.dgsi.pt,Proc.18/05.7IDSTR.E1.S1.

2- “Como decorre do artigo 412.º do CPP, é pelas conclusões extraídas pelo recorrente na motivação apresentada, em que resume as razões do pedido que se define o âmbito do recurso. É à luz das conclusões da motivação do recurso que este terá de apreciar-se, donde resulta que o essencial e o limite de todas as questões a apreciar e a decidir no recurso, estão contidos nas conclusões, exceptuadas as questões de conhecimento oficioso”.

3- São as conclusões, que fixam o objecto do recurso, artigo 417º, nº3, do Código de Processo Penal.

4- O arguido tem antecedentes criminais.

5- Questiona o recorrente a medida da pena, e diz a propósito da medida da pena: o Prof. Germano Marques da Silva [Direito Penal Português, 3, pág. 130], que a pena será estabelecida com base na intensidade ou grau de culpabilidade (...). Mas, para além da função repressiva medida pela culpabilidade, a pena deverá também cumprir finalidades preventivas de protecção do bem jurídico e de integração do agente na sociedade. Vale dizer que a pena deverá desencorajar ou intimidar aqueles que pretendem iniciar-se na prática delituosa e deverá ressocializar o delinquente”.

6- Ou como se diz no Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça: ”II- Culpa e prevenção constituem o binómio que preside à determinação da medida da pena, art. 71.º, n.º 1, do CP. A culpa como expressão da responsabilidade individual do agente pelo facto, fundada na existência de liberdade de decisão do ser humano e na vinculação da pessoa aos valores juridicamente protegidos (dever de observância da norma jurídica), é o fundamento ético da pena e, como tal, seu limite inultrapassável – art. 40.º, n.º 2, do CP.

III- Dentro deste limite, a pena é determinada dentro de uma moldura de prevenção geral de integração, cujo limite superior é oferecido pelo ponto óptimo de tutela dos bens jurídicos e cujo limite inferior é constituído pelas exigências mínimas de defesa do ordenamento jurídico, só então entrando considerações de prevenção especial, in www.dgsi.pt, Proc. nº 315/11.2JELSB.E1.S1, 1-7-2015.

7- Cometeu o recorrente factos muito graves os quais suscitaram alarme social e causaram prejuízos a outrem, para além da dependência de álcool e estupefacientes que o próprio recorrente admite.

8- Há no caso em análise imperativos de prevenção geral e especial a salvaguardar e não estão reunidas as condições para reduzir as penas parcelares e única em que o arguido foi condenado em 1ª instância.

9- O Tribunal “a quo” não suspendeu a execução a pena de prisão aplicada ao arguido desde logo por imposição do limite temporal previsto no artigo 50º, nº1, do Código Penal:”1 - O tribunal suspende a execução da pena de prisão aplicada em medida não superior a cinco anos se, atendendo à personalidade do agente, às condições da sua vida, à sua conduta anterior e posterior ao crime e às circunstâncias deste, concluir que a simples censura do facto e a ameaça da prisão realizam de forma adequada e suficiente as finalidades da punição”.

10- Não obstante o recorrente o reivindicar o Tribunal “ a quo” não suspendeu a pena de prisão a que foi condenado em 1ª instância, uma vez que não foi possível nas...

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