Acórdão nº 2741/16.1T8PTM.L1.S1 de Supremo Tribunal de Justiça (Portugal), 14 de Maio de 2019

Magistrado ResponsávelANTÓNIO MAGALHÃES
Data da Resolução14 de Maio de 2019
EmissorSupremo Tribunal de Justiça (Portugal)

Acordam na 1.ª Secção Cível no Supremo Tribunal de Justiça: * AA, Lda, intentou no Tribunal da Comarca de Faro acção declarativa com processo comum contra o Banco BB, S.A., alegando, em síntese: que no segundo semestre de 2007 celebrou com o R. um contrato de mútuo comercial, com hipoteca, na modalidade de abertura de crédito, tendo em vista o financiamento da construção de um edifício no Porto, até ao máximo de € 9 500 000,00; que durante as negociações do contrato o R. tentou convencer a A. da conveniência em celebrar um contrato de permuta de taxa de juros (contrato de swap), tendo em vista proteger a mutuária de um alegado sério risco de subida da taxa de juros aplicável, que estava indexada à Euribor; que já após ter sido celebrado o contrato de mútuo e de o R. ter entregue à A. parte da quantia a mutuar, o R. declarou à A. que só lhe entregaria as restantes verbas que se obrigara a mutuar, se a A. assinasse o dito contrato de permuta de taxa de juros; a A., que já iniciara a construção do dito edifício e carecia das ditas verbas para prosseguir a sua construção, viu-se, assim, obrigada e coagida a celebrar o aludido contrato, o que ocorreu um mês após a celebração do contrato de mútuo, ou seja, em 30.11.2007; conjuntamente com a subscrição do contrato de permuta de taxa de juros, a A. assinou o contrato quadro para operações financeiras e seus anexos; na referida data de 30.11.2007 a A. também assinou um documento denominado “Confirmação de contrato de permuta de taxa de juro”, que lhe foi entregue pelo R., sendo que todos estes documentos foram entregues à A. pelo R., previamente preenchidos, não tendo a A. tido tempo para os analisar devidamente; que não foi permitido à A. que negociasse o teor de tais documentos; por outro lado, para a A. foi determinante, na celebração do contrato de “swap”, a convicção, em que o R. a fez incorrer, de que a operação não tinha risco para si; acresce que as cláusulas dos documentos assinados pela A. não foram adequadamente comunicadas e explicadas à A.; sucede que, fruto da acentuada baixa das taxas de juro que sobreveio, no final do 12.º semestre de vigência do contrato de swap a A. já suportara um prejuízo no total de € 372 429,16.

Pelo supra exposto, sustenta a autora, que o contrato de swap é nulo ou, quando assim não se entenda, é anulável. Além disso, o dito contrato não cobre um risco, mas tem natureza meramente especulativa, constituindo uma aposta. Ora, como o R. não podia deixar de saber, a administração da A. não tinha competência para outorgar um tal contrato.

A A. terminou formulando o seguinte pedido: “…Deverá a presente ação ser julgada procedente por provada e em consequência I – Declarar-se: A)– a nulidade do contrato de permuta de taxas de juro celebrado entre a Autora e Réu, por ofensa da ordem pública, do artº 1425º do Código Civil, do art.º 5 do DL n.º 446/85 de 25.10.85, do art.º, 6, n.º 2 do art.º 373, art.º 406 e al. b) do n.º 1 do art.º 411, todos do CSC. A) Caso inesperadamente não se entenda, a anulabilidade do contrato de permuta de taxas de juro celebrado entre a Autora e Réu nos termos dos arts. 247 e 251 do CC. II – Condenar-se o R. a: A) - Restituir e pagar à Autora a quantia de € 372.518,42, acrescida de juros à taxa legal desde 3.12.2010, o que, hoje, ascende ao montante de 89.241,13€, perfazendo o total de 461.759,55 €. B) Pagar á Autora juros moratórios à taxa legal, a contar da citação e até efectivo e integral pagamento, incidentes sobre esta quantia de 461.759,55€. C) Pagar custas de parte e honorários aos mandatários dos Autores, nos termos do regulamento de Custas Judiciais.” O R. contestou a acção, por excepção e por impugnação.

Por excepção, arguiu a incompetência do tribunal quanto ao território e, bem assim, arguiu a preterição de tribunal arbitral, por existência de cláusula compromissória, pedindo a remessa dos para o Juízo Central Cível da Comarca de Lisboa e depois a absolvição do R. da instância.

Caso assim não se entendesse, deveria ser julgado improcedente, por não provado, o pedido de declaração de nulidade do contrato de swap, absolvendo-se o R. de todos os pedidos formulados pela A. e, bem assim, deveria a exceção de caducidade do pedido subsidiário de anulabilidade do contrato por erro sobre o objeto ser julgada procedente, absolvendo-se o R. do pedido.

Em 19.9.2017 foi proferido despacho em que o tribunal se julgou incompetente, quanto ao território, para julgar o litígio, tendo os autos sido remetidos para a Comarca de Lisboa.

Foi proporcionado à A. o exercício do contraditório quanto à exceção da preterição de tribunal arbitral, tendo a A. pugnado pela improcedência de tal excepção.

Em 03.01.2018 foi proferido despacho no qual se declarou a incompetência absoluta do tribunal por preterição de tribunal arbitral e se absolveu o R. da instância.

A A. apelou da sentença, pedindo que a decisão recorrida fosse revogada, improcedendo a excepção de preterição do tribunal arbitral.

Na Relação foi proferido acórdão que concluiu o seguinte: “Pelo exposto, julga-se a apelação improcedente e consequentemente mantém-se a decisão recorrida, embora com sanação de nulidade, por omissão da discriminação da matéria de facto tida por relevante.

As custas da apelação são a cargo da apelante, que nela decaiu (art.º 527.º n.ºs 1 e 2 do CPC).” A decisão foi tomada por maioria, com o voto de vencido de um dos Juízes Desembargadores adjuntos.

De novo inconformada, a A. interpôs recurso de revista, que rematou com as seguintes conclusões: “1. O douto Acórdão recorrido, apesar de reconhecer a existência da nulidade na sentença de 1ª instância consistente na omissão de elencar a matéria factual, procedeu ao suprimento da mesma, substituindo-se ao tribunal a quo (art.º 665.º n.º 1 do CPC).

  1. O artº 665º nº 2 CPC apenas permite que a Relação proceda ao suprimento das questões que a 1ª instância não conheceu, quando a Apelação proceda.

    3. O acórdão recorrido fez mau uso dos poderes conferidos pelo artº 665º nº 2 CPC, o que é sindicável pelo Supremo.

    4. Ora, a Relação deveria ter julgados assentes os seguintes factos e que não o fez: que o contrato swap foi o primeiro a ser assinado e celebrado, dias antes da assinatura do contrato-quadro, embora ambos com data do mesmo dia.

    5. A prova por confissão e a prova documental (consistente no teor dos próprios contratos, que as partes aceitam, reconhecem e não impugnaram) impõem que sejam assentes alguns factos que a Relação desconsiderou ao elencar a matéria de facto que julgou provada.

    6. E a sentença recorrida não curou de se pronunciar sobre essa questão, decidindo de imediato a excepção sem ponderar a questão levantada pela Recorrente da nulidade do contrato e da convenção arbitral.

    7. O douto Acórdão recorrido decidiu que não existe dessintonia entre o contrato quadro, em que está prevista a cláusula compromissória, e o contrato swap, e, subsidiariamente, a nulidade da cláusula, decorrente quer do caráter genérico da dita cláusula, quer da nulidade do próprio contrato de swap.

    8. Outrossim, com o fundamento de que as nulidades invocada não eram manifestas.

    9. Sucede que esta parte decisória do Acórdão recorrido, concordante com a sentença de 1ª instância, releva do facto de esta última decisão não ter procedido ao elenco da factualidade provada.

    10. Isto porque, se o tivesse feito, a factualidade apurada facilmente evidenciaria que o contrato quadro datado de 30.11.2007 não refere o contrato de swap datado de 3.12.2007, não lhe é aplicável.

    11. Deveria ter ficado provado, quer por prova documental, quer por confissão do Recorrido Banco BB que o contrato swap foi o primeiro a ser assinado e celebrado dias antes da assinatura do contrato-quadro, embora ambos com data do mesmo dia.

    12. Estes factos assentam na prova documental do próprio teor do contrato de swap (permuta de taxa de juro) celebrado com data de 30.11.2007 e entregue pelo Banco BB à Recorrente em 27.11.2007, o qual, na sua última página, in fine, contém um quadro que o reconhece.

    13. O que prova que o contrato swap foi o primeiro a ser assinado e celebrado, embora no mesmo dia.

  2. Estes factos assentam na seguinte prova por confissão judicial do Recorrido expressa no teor dos artºs 126.º, 127.º, 128º, 137º, 144º, 145º, 155º, 156.º, 157º, 158º, 170º, 171º da contestação, nos quais confessa que não existe uma inter-relação ou relação relevante económica entre o contrato-quadro e o contrato de swap.

    15. O contrato quadro não menciona o celebrado contrato de swap e menciona, outrossim, as relações contratuais futuras entre as partes. 16. O que sucede expressamente e em todas as passagens, designadamente no texto dos pontos 1, 3, 4 e 5 da referida cláusula 1ª do contrato quadro.

    17. O contrato quadro refere-se a operações financeiras a realizar no futuro.

    18. Ora, os contratos de swap e o de confirmação foram celebrados dias antes do contrato-quadro, embora com data do mesmo dia, portanto, anteriormente ao contrato quadro e não no futuro. 19. O teor do contrato de swap (permuta de taxa de juro) celebrado com data de 30.11.2007 (entregue assinado pelo banco BB à Recorrente em 27.11.2007) consta na sua última página, in fine um quadro escrito que demonstra que o Contrato Quadro Para Operações Financeiras não existia no momento da...

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