Acórdão nº 246/08.3TYVNG.P1.S1 de Supremo Tribunal de Justiça (Portugal), 02 de Abril de 2019
Magistrado Responsável | CATARINA SERRA |
Data da Resolução | 02 de Abril de 2019 |
Emissor | Supremo Tribunal de Justiça (Portugal) |
ACORDAM NO SUPREMO TRIBUNAL DE JUSTIÇA I. RELATÓRIO Recorrente: AA Recorridos: BB, CCe “DD, Lda.” O autor AA, residente na Av. …, nº …, ..., …, intentou a presente ação declarativa, com forma de processo ordinário, contra os réus BB, CC e sociedade “DD, Lda.”, com sede na Rua …, nº …, Porto, tendo formulado os seguintes pedidos: a) declarar-se transmitida a favor de EE, AA, FF e GG a quota que o falecido DD detinha na sociedade 3ª ré, com o valor nominal de 748.196,85€; b) declarar-se nula ou ineficaz, por insuficiência de título, a transmissão da quota de DD para a 3ª ré com o valor nominal de 748.196,85€; c) ordenar-se o cancelamento, na Conservatória do Registo Comercial, do registo de aquisição da quota a favor da 3ª ré efetuado mediante o depósito nº 268/2007-05-04; d) subsidiariamente, e para o caso de serem julgados improcedentes os pedidos constantes das alíneas anteriores, devem os réus ser condenados a pagar aos sucessores de DD a importância que, em execução de sentença, vier a ser atribuída à quota transmitida em avaliação a ser efetuada para o efeito, à qual acrescerão juros legais contados de acordo com os prazos de pagamento estabelecidos no art. 8º do contrato social da 3ª ré até efetivo e integral pagamento. Citados os réus, apresentaram contestação na qual, entre outra matéria, excepcionaram a ilegitimidade do autor e impugnaram a matéria fáctica alegada na petição inicial, concluindo pela improcedência da ação.
Formularam também reconvenção, pedindo, para a hipótese de procedência do pedido a), a condenação do autor e demais herdeiros a restituírem a quantia já recebida de 398.006,06€ e bem assim as demais quantias que entretanto se vencerem e forem pagas aos herdeiros como valor da quota do falecido. Para a hipótese de procedência do pedido d), deverá a importância apurada como valor da quota ser deduzida das quantias acima referidas e, para a hipótese de se vir a apurar que o valor da quota é inferior ao valor pago pela 3ª ré, deverá a sentença condenar igualmente o autor e demais herdeiros a restituírem o valor excedente que tiver sido por estes recebido.
Pediram ainda a condenação do autor como litigante de má-fé. O autor apresentou réplica e os réus tréplica.
Foi proferido despacho saneador, com selecção da matéria de facto assente e organização da base instrutória.
A excepção dilatória de ilegitimidade activa foi desatendida.
Foi efectuada perícia colegial.
Realizou-se audiência de discussão e julgamento com observância do legal formalismo.
No decurso desta, o autor desistiu do pedido formulado no que concerne às alíneas a), b) e c), ficando a apreciação judicial circunscrita ao pedido constante da alínea d).
Foi proferida sentença, cuja parte decisória se passa a transcrever: “Tudo analisado e sopesado – e no que concerne à sorte do único pedido que subsiste e tão só na medida deste (pedido D)) – julgo a presente acção ordinária procedente e provada, em virtude do que condeno os R.R. no pagamento aos herdeiros do falecido Sr. AA (Sra. D. EE, Sr. AA, Sra. D. FF e Sra. D. GG o montante de €1.467.689,59, valor este acrescido de moratórios juros contados desde a citação até integral e efectivo pagamento na medida em que a liquidação/apuramento do valor social da quota se efectivou no âmbito da presente causa, improcedendo a demanda quanto ao restante peticionado nesta particular sede.
No que tange à admitida reconvenção, julgo a mesma provada e procedendo por relação ao aí pedido, condenando o A. (e demais herdeiros) a deduzir do valor supra assinalado para a quota do falecido Sr. DD a quantia de €933.020,46 entretanto recebidas nos acima provados termos”.
Inconformados com o decidido pelo Tribunal de 1.ª instância, interpuseram recurso de apelação tanto o autor como os réus, pugnando, o primeiro, pela revogação da sentença recorrida na parte em que julgou procedente a reconvenção e os segundos pela sua revogação na parte em que julgou procedente o pedido do autor formulado sob a alínea d) da petição inicial.
O Tribunal da Relação do Porto decidiu, por Acórdão de 11.09.2018, julgar improcedente o recurso do autor e procedente o recurso dos réus, tendo sido o teor da decisão o seguinte: “Nos termos expostos, acordam os juízes que constituem este tribunal em julgar procedente o recurso de apelação interposto pelos réus BB, CC e “DD, Lda.” e, em consequência:
-
Revoga-se a sentença recorrida que se substitui por outra que julga improcedente a ação no que toca ao pedido formulado sob a alínea d) da petição inicial, dele se absolvendo os réus; b) Considera-se prejudicado o conhecimento do pedido reconvencional deduzido pelos réus apenas para o caso de procedência do pedido deduzido na alínea d) e também do recurso interposto pelo autor relativamente a tal pedido reconvencional”.
Face a isto, vem agora o autor interpor recurso para o Supremo Tribunal de Justiça, preconizando a revogação e a substituição do Acórdão por outro que julgue a acção procedente, por provada, quanto ao pedido subsistente e, por consequência, condene os Réus a pagarem aos herdeiros de DD, entre os quais o Autor, a quantia de €1.467.689,59, acrescida do montante de €120.000,00 e de juros de mora desde a citação até efectivo e integral pagamento.
São as seguintes as conclusões formuladas pelo autor: A.
O acto jurídico donde resultou a obrigação de pagamento do valor da quota detida pelo falecido sócio DD na sociedade DD, Lda. aos seus herdeiros, entre os quais o Autor, foi a amortização da quota, tal como deliberado na referida Assembleia Geral e plasmado na acta n.º 100[1].
B.
Apesar de o Autor ter desistido dos pedidos de declaração de inexistência, nulidade e ineficácia da amortização da quota que era detida pelo seu pai, em momento algum e de forma alguma, aceitou o valor que foi atribuído pelos Réus à referida quota ou sequer desistiu de discutir nos presentes autos o valor devido por essa quota.
C.
Nesse sentido, o Autor desistiu de vários dos pedidos que havia formulado, mas não desistiu do pedido que inicialmente formulou a título subsidiário, no qual pede que “devem os Réus ser condenados a pagar aos referidos sucessores de DD a importância que em execução de sentença vier a ser atribuída à quota transmitida, em avaliação a efectuar para o efeito, à qual acrescerão os juros legais contados de acordo com os prazos de pagamento estabelecidos no artigo 8.º do contrato social da 3.ª Ré, até efectivo e integral pagamento”.
D.
O Autor conformou-se com o facto de a quota que era detida pelo seu pai não se ter transmitido para os herdeiros deste, mas não aceitou e, por isso, não desistiu do direito de receber o valor que os Réus estavam obrigados a pagar em virtude da amortização dessa quota - são direitos diferentes, com fundamentos, quer de facto, quer de direito, diferentes.
E.
Dos artigos 225.º, n.ºs 1, 2 e 5, e 233.º, n.º 1, do CSC decorre que são actos com relevo e consequências jurídicas distintas a amortização da quota e o pagamento da contrapartida devida em virtude dessa amortização.
F.
A sociedade pode deliberar amortizar a quota de um dos seus sócios, mesmo sem o consentimento deste, desde que essa possibilidade esteja consagrada no contrato social; o artigo 236.º, n.º 1, do CSC, refere-se a esta amortização como “compulsiva”, com a qual o sócio cuja quota é objecto de amortização não tem que aceitar ou concordar, ficando antes num estado de sujeição face à decisão de amortização compulsiva tomada pela sociedade.
G.
O facto de o sócio cuja quota foi amortizada (ou os seus herdeiros) não impugnar a existência, validade ou eficácia dessa amortização, não o impede de exigir que lhe seja paga a contrapartida devida.
H.
Para o caso específico de amortização de quota por morte de um sócio, o artigo 225.º, n.º 5, do CSC prescreve que os interessados poderão escolher entre a efectivação do seu crédito - caso não lhes tenha sido paga a contrapartida ou caso o valor desta tenha sido inferior ao devido - ou a ineficácia da alienação, com o que deixa claro que o direito ao recebimento da contrapartida devida pela amortização é diferente e não se confunde com a própria amortização.
I.
Ao contrário do que o Tribunal a quo refere, o Autor não está já a reclamar o pagamento da quota amortizada com...
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