Acórdão nº 6371/15.7T8SNT.L1.S2 de Supremo Tribunal de Justiça (Portugal), 04 de Dezembro de 2018

Magistrado ResponsávelALEXANDRE REIS
Data da Resolução04 de Dezembro de 2018
EmissorSupremo Tribunal de Justiça (Portugal)

Acordam no Supremo Tribunal de Justiça: AA e BB intentaram acção de reivindicação contra BB, pedindo a condenação desta a entregar-lhes o seu prédio por ela ocupado e a indemnizá-los, até efectiva entrega, no montante mensal de 400 €.

A R contestou, alegando, em síntese, ter sempre assumido a posição de arrendatária do prédio, o que foi aceite tacitamente pelos AA, lidando com ela nessa qualidade, e pediu reconvencionalmente a condenação dos AA a pagar-lhe as benfeitorias realizadas.

Foi proferida sentença condenando a R no pedido formulado pelos AA, excepto quanto ao montante indemnizatório, que foi fixado em € 350 mensais, e absolvendo os AA do pedido reconvencional.

A R interpôs apelação da sentença, que a Relação, sem voto de vencido, confirmou na íntegra.

Do acórdão proferido pela Relação, a R interpôs revista excepcional, admitida pela competente Formação, tendo delimitado o objecto do recurso com as seguintes conclusões (sic): «A) R. mantinha o direito de manter vivo o contrato de arrendamento, tratando-se já de um direito: “A R. sempre residiu com os seus pais, CC e DD.”.“...os AA. passaram a tratar com esta, que com aquela vivia, todos os assuntos relacionados com o contrato..

.” (pontos 8 e 9 da matéria dada como provada); B) Ao que verifica-se a subsunção dos factos às normas jurídicas, correlacionadas com o fundo ou mérito da causa, impedindo que a recorrente seja condenada a restituir o imóvel, sem prejuízo do direito de propriedade dos recorridos; C) Existiu durante todos estes anos pela R. um reforço da sua posição de confiança em virtude da prolongada vigência do limiar temporal, que a coloca ao abrigo de um desenraizamento abrupto e forçado, preservando o seu reduto habitacional, elemento nuclear de qualquer plano de vida, não podendo ser ignorado ao abrigo da nova Lei a impossibilidade de desocupação; D) Se, as normas dispõem para o futuro, a norma transitória que deita por terra o direito da R., não deve ser aplicada; E) Ao abrigo do disposto do artigo 204º da CRP deve ser recusada a aplicação da norma com fundamento na respectiva inconstitucionalidade; F) A posição jurídica da R. que adquiriu, de acordo com o regime pregresso, o direito de permanência no local, por efeito do transcurso do prazo fixado no regime pregresso, acolhe os princípios da segurança jurídica e da protecção da confiança na previsibilidade do direito, legítima, que deriva do Estado de Direito Democrático como forma de orientação de vida”: ACS. 330/90, 297/2015, 270/99 e 682/99; G) O locado sempre foi a única e exclusiva residência da R., atualmente com 73 anos de idade; H) A R., com 73 anos de idade, cujo único agregado fami1iar que possuía eram os seus ascendentes, entretanto falecidos, sem meio de subsistência, sendo a sua única fonte de rendimento uma pensão de 365,79€, com a negação de provimento do presente recurso, não terá onde residir, terminando a sua história de vida como sem abrigo, ou algo mais gravoso, quando se retira o único elo de 1igação com a realidade justificando-se o supremo interesse de particular relevância social; I) Existiu durante todos estes anos pela R. um reforço da sua posição de confiança em virtude da prolongada vigência do limiar temporal, que a coloca ao abrigo de um desenraizamento abrupto e forçado, preservando o seu reduto habitacional, elemento nuclear de qualquer plano de vida com clara violação dos princípios da segurança jurídica e da protecção da confiança legítima impostos pelo Estado de direito Democrático, ínsitos no artigo 2º da CRP, o princípio da não retroactividade das leis restritivas de direitos, 1iberdades e garantias consignado no artigo 18º nº 3 da CRP sendo o direito à habitação (art. 65º CRP) configurado como um direito fundamental e o art. 17º CRP prescreve que o regime dos direitos, liberdades e garantias aplica-se aos enunciados no título II e aos direitos fundamentais de natureza análoga.

».

*Importa apreciar e decidir a questão de saber se a R deve ser tida como titular do contrato de arrendamento (celebrado com o seu pai pelo então proprietário do prédio, em Junho de 1951), para o que releva a seguinte matéria de facto tida por provada e não provada pela Relação.

  1. Factos provados: 1- Por escritura pública outorgada em 27/1/2000, os AA adquiriram … o prédio urbano …, descrito na Conservatória do Registo Predial de Agualva Cacém sob o nº 340 (…).

    2- Pela apresentação nº 2 de 31/3/2003, mostra-se inscrita na respectiva Conservatória do Registo Predial, a aquisição, por compra, do prédio aludido ….

    (…) 4- Por contrato de Junho de 1951, com início em 1/7/1951, o anterior proprietário do prédio aludido em 1., deu-o de arrendamento a CC , que o tomou para sua habitação, pelo prazo de seis meses, renováveis nos termos legais, pela renda de 380$00 mensais.

    5- CC divorciou-se da sua esposa, DD, em Julho de 1972 e, por decisão do Tribunal, transmitiu-se para esta o contrato de arrendamento, tendo o senhorio reconhecido a mesma como beneficiária de tal transmissão.

    6- Em 14/8/2014, faleceu DD, com 90 anos de idade, no estado de divorciada de CC .

    7- Antes de DD falecer, esteve acamada durante um período de tempo não concretamente apurado, estando incapacitada fisicamente e perturbada no seu entender e querer.

    8- A R sempre residiu com os seus pais, CC e DD.

    9- Em consequência do estado de saúde de DD mencionado em 7., e a pedido...

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