Acórdão nº 73/18.0YFLSB de Supremo Tribunal de Justiça (Portugal), 21 de Março de 2019

Magistrado ResponsávelALEXANDRE REIS
Data da Resolução21 de Março de 2019
EmissorSupremo Tribunal de Justiça (Portugal)

Acordam no Supremo Tribunal de Justiça (Secção do Contencioso): AA, Juíz ..., intentou esta acção administrativa de impugnação contra o Conselho Superior da Magistratura (CSM), pedindo que seja declarada nula ou, pelo menos, anulada a sua deliberação – que disse ser de 3‑07‑2018 –, respeitante à aprovação do “Movimento Judicial Ordinário de 2018”, com que o desafectou do ... e ... (da Comarca de ...) e o colocou no “Quadro Complementar de Juízes de ...”.

Sustenta, em suma, que a deliberação violou o artigo 183º nº 5 da LOSJ e os princípios constitucionais da legalidade, da igualdade, da proporcionalidade, da boa-fé, da unicidade estatutária dos juízes, das suas inamovibilidade e independência e da tutela da confiança.

O R contestou, invocando a inexistência do objecto da impugnação porque na data referida pelo A (3-07-2018) apenas foi publicitado um projecto de “Movimento Judicial Ordinário”, sendo a aprovação deste tomada por deliberação de 11‑07‑2018, e concluindo, à cautela, pela improcedência da pretensão formulada pelo A.

Foram produzidas alegações pelo A, pelo R e pelo Ministério Público.

* Cumpre apreciar e decidir as questões suscitadas pelo A.

Previamente, porque se alcança da substância da matéria alegada na petição que a deliberação cuja impugnação o A visa foi realmente tomada em 11‑07‑2018, defere‑se a sua pretensão rectificativa, consignando-se ser essa a data da mesma, com a consequente improcedência da excepção deduzida pelo R, sem que se imponham mais considerandos sobre o assunto.

* Relevam os seguintes elementos fácticos extraídos do autos:

  1. Conforme aviso publicado no Diário da República, 2ª série, de 15-05-2018, o CSM deliberou realizar o “Movimento Judicial Ordinário” na subsequente sessão do seu Plenário de 11-07-2018, subordinado, nomeadamente, aos seguintes termos e critérios: «(...) 19) As notações a considerar no âmbito do processamento do presente movimento judicial, são as que estiverem em vigor, forem deliberadas ou homologadas, sem reclamação ou impugnação dos interessados, à data da sessão do Conselho Plenário e Permanente Ordinário de 12 de junho de 2018, sendo igualmente esta a data a considerar nos termos e para os efeitos previstos no artigo 183º da LOSJ, designadamente para contabilização da antiguidade e da aferição da perda de requisitos a que alude o nº 5 deste artigo.

    20) Os juízes que se encontrem na situação a que alude o nº 5 do artigo 183º da LOSJ deverão apresentar requerimento ao presente movimento judicial.

    (...) 23) Não são, todavia, renovados, os destacamentos de juízes auxiliares colocados há 2 ou mais anos em Instâncias Centrais (atuais juízos de competência especializada Central Cível, Central Criminal, de Instrução Criminal, de Trabalho, de Família e Menores, de Execução, de Comércio), em Tribunais de Competência Territorial Alargada e em Juízos Locais especializados, que não reúnam os requisitos de tempo de serviço e notação previstos no nº 1 e 2 do artigo 183º da LOSJ.

    33) O prazo para o envio dos requerimentos eletrónicos inicia-se na data de publicação do presente aviso no Diário da República e termina no dia 31 de maio de 2018».

  2. Em 30-05-2018, o despacho do Vice-Presidente do CSM de 29-05-2018 foi submetido à divulgação do seguinte teor (extracto): «1. A aprovação da notação, independentemente da proximidade do movimento judicial, obedece sempre à tramitação prevista no Regulamento dos Serviços de Inspeção do CSM (…) aqui se prevendo – art. 17.º, n.º 8 – a possibilidade do inspecionado se pronunciar quanto ao seu relatório inspetivo, sendo que, caso se preveja alteração da notação proposta no relatório inspetivo, é sempre cumprida a audição prévia do inspecionado, a qual tem lugar no processo tendente à aprovação da notação, inexistindo qualquer audição adicional quanto aos efeitos da notação que resultem da lei.

    1. A aprovação da notação e a perda do lugar nunca ocorrem em simultâneo, porquanto a última notação a considerar será a que estiver em vigor, for deliberada ou homologada, sem reclamação ou impugnação dos interessados, até à data de 12-06-2018, enquanto a aprovação do projeto do movimento judicial (incluindo perdas de lugar) só ocorrerá em 11-07-2018; 3. Contudo, porque da sequência de datas (termo do prazo para apresentação de requerimento para movimento – 31-05-2018 – e termo do prazo para envio de requerimento de desistência – 11-06-2018) poderá resultar um obstáculo para os magistrados que se vejam colocados na situação a que alude o art 183.º, n.º 5, da LOSJ, (…), atenta a urgência do prazo em curso, foi autorizada a admissão de requerimentos de desistência do MJO 2018, que sejam apresentados pela via prevista, até às 23.59 h. do dia 14-06-2018.

    2. Mais se informa que, em qualquer caso, serão admitidos requerimentos condicionais, nas situações passíveis de verificação da perda de requisitos a que alude o artigo 183.º, n.º 5, da LOSJ devendo, para o efeito, os Magistrados interessados apresentar requerimento genérico, através do JUDEX, no prazo para apresentação de requerimento ao Movimento Judicial, manifestando o carácter condicional do respetivo requerimento ao Movimento.

    » c) Por deliberação do Plenário do CSM de 12-06-2018, a prestação de serviço do A entre 1-01-2017 e 12-12-2017 foi classificada de “suficiente", sendo a sua notação, até então, de “muito bom”, que lhe tinha sido atribuída por deliberação de 19-09-2017.

  3. Mediante a deliberação impugnada (de 11-07-2018), o A foi obrigatoriamente movimentado e colocado no “Quadro Complementar de Juízes de Lisboa”.

    * O direito.

    1. a 3.

      O “ponto 19 do Aviso” e os princípios da legalidade, da igualdade, da proporcionalidade e da boa-fé.

      O A impugna a sua colocação – por perda de requisitos (notação) – no “Quadro Complementar de Juízes de Lisboa”, por considerar: «os critérios fixados no ponto 19 do Aviso quanto ao facto de que as notações a considerar para efeitos do MJO 2018 são as notações atribuídas até à data de 12 de junho de 2018, o que no caso do A. corresponde à notação de “Muito Bom” – e já não as afixadas a partir desta data – e o facto de que, ainda assim, a baixa de notação só tem efeitos no movimento judicial seguinte (cf. nº 5 do artigo 183º da LOSJ)».

      Sustenta que a interpretação que o CSM fez do critério contido no aludido item é manifestamente ilegal, violando o princípio da proteção da confiança ínsito no princípio do Estado de Direito (artigo 2º da CRP), porquanto, só podendo considerar para efeitos do MJO de 2018 a notação que lhe estivesse atribuída até 12‑06‑2016, esse órgão atendeu à que foi fixada nessa data, antes mesmo de ter sido notificado da baixa da sua classificação, impedindo-o de reclamar ou impugnar, porque, ainda que o tenha feito, tal não obstou à sua colocação noutro lugar, por força de uma alteração não definitiva.

      Entende o A que a deliberação, ao estabelecer que a já referida data de 12‑06‑2018 seria a atendível nos termos e para os efeitos previstos no artigo 183º da LOSJ, também violou o disposto neste normativo, na medida em que o mesmo, respeitando o princípio da tutela da confiança, determina que só se produza «no movimento judicial seguinte» o efeito da colocação do lugar a concurso, advindo da perda dos requisitos exigidos na lei, e não no movimento judicial em curso (presente), como no caso sucedeu.

      O A também defende que a deliberação impugnada é manifestamente contrária aos princípios da igualdade, da proporcionalidade e da boa-fé porque: i) coloca o A numa posição igual aos demais candidatos quando, na verdade, por imposição, quer dos parâmetros fixados no Aviso, quer do disposto no nº 5 do art. 183º da LOSJ, não o deveria fazer no Movimento Judicial de 2018; ii) a posição jurídica do A é gravemente afectada, atendendo a que a notação ainda não é definitiva e a que a notação a ter em consideração seria a notação de “muito bom”, à data de 12.06.2018; iii) a interpretação do CSM sobre o ponto 19 do Aviso e nº 5 do art. 183º da LOSJ, coartando ao A o seu direito de reclamar ou impugnar, é reveladora de falta de vinculatividade da actuação administrativa.

      E, adita, a referida interpretação do CSM é também inconstitucional porque, de facto, o CSM, «ainda que só para casos de exceção», tem entendido aplicar medidas de gestão face a pedidos de magistrados que perderam os seus lugares de efectivos, como sucedeu em relação ao pedido formulado, em 9-07-2018, pela Sra. Juíza BB, que foi deferido pelo Senhor Vice-Presidente do CSM, com a invocação de que «deverá prolongar-se a aplicação de uma medida de gestão de exceção às situações ocorridas em ambos os referidos movimentos» por a norma referente à perda de requisitos permitir «projetar um entendimento de dilação de efeitos no tempo».

      No entanto, a tese do recorrente não tem apoio no regime legal dos movimentos judiciais, tal como este emerge dos arts. 38º e 39º do EMJ (Lei nº 21/85, de 30/7), nem nos princípios que conclama.

      Em conformidade com o disposto no art. 17.º do Regulamento dos Serviços de Inspeção do Conselho Superior da Magistratura, o processo inspectivo contempla uma entrevista final onde o inspeccionado é informado da notação que irá ser proposta pelo inspector (n.º 5). Elaborado o relatório (n.º 7), este é notificado ao inspeccionado para poder juntar elementos e/ou requerer as diligências que entender (n.ºs 8 a 10). Em qualquer caso, a proposta de notação contida no relatório que seja elaborado no termo do processo inspectivo – sempre notificado ao interessado – é apresentada ao CSM, a cujo Conselho Permanente cabe a deliberação sobre classificação de serviço de juízes de 1ª instância [nos termos do arts. 151.º, al. d), e 152.º, n.º 2, da Lei 21/85].

      Da decisão do Conselho Permanente cabe reclamação, com efeito suspensivo, para o Plenário do Conselho Superior da Magistratura (cf. arts. 165.º, e 167-A, ambos da Lei 21/85). Uma vez tomada a decisão pelo Plenário, desta cabe recurso para o Supremo Tribunal de Justiça, embora sem efeito suspensivo (cf. arts. 168.º...

Para continuar a ler

PEÇA SUA AVALIAÇÃO

VLEX uses login cookies to provide you with a better browsing experience. If you click on 'Accept' or continue browsing this site we consider that you accept our cookie policy. ACCEPT