Acórdão nº 114/14.0JACBR-A.S1 de Supremo Tribunal de Justiça (Portugal), 21 de Novembro de 2018

Magistrado ResponsávelLOPES DA MOTA
Data da Resolução21 de Novembro de 2018
EmissorSupremo Tribunal de Justiça (Portugal)

ACÓRDÃO Acordam na Secção Criminal do Supremo Tribunal de Justiça: I. Relatório 1.

AA, arguido, com a identificação que consta dos autos, interpõe recurso do acórdão proferido pelo tribunal colectivo da Comarca de ..., de 5 de Dezembro de 2017, que, realizando o cúmulo jurídico das penas correspondentes aos crimes em concurso, lhe aplicou a pena única de 5 (cinco) anos e 6 (seis) meses de prisão, em resultado da condenação nas seguintes penas:

  1. No processo nº 112/14.3GASPS, por acórdão datado de 20-03-2015, transitado em julgado no dia 28-04-2015, por factos praticados entre 28-03-2014 e 09-05-2014, numa pena de 1 ano e 6 meses de prisão e cinco penas de 2 anos e 8 meses de prisão, pela prática de seis crimes de burla qualificada, previstos e punidos pelos artigos. 217.º, n.º 1, e 218.º, n.º 2, als. b) e c), do Código Penal; efectuado o cúmulo jurídico, foi o arguido condenado, nesse processo, na pena única de 5 anos de prisão, suspensa na respectiva execução pelo mesmo período, com regime de prova.

  2. Neste processo (nº 114/14.0JACBR), por acórdão datado de 04-11-2016, transitado em julgado no dia 06-12-2016, por factos praticados no dia 25-03-2014, na pena de 1 ano e 9 meses, suspensa na respectiva execução pelo mesmo período, pela prática de um crime de roubo, previsto e punido pelo artigo 210.º, n.º 1, do Código Penal.

  1. Apresenta motivação de que extrai as seguintes conclusões (transcrição): «1 - O Acórdão de que ora se recorre emerge de audiência de discussão e julgamento que visava, em sede de cúmulo jurídico, a fixação de uma pena única ao ora recorrente. Em causa estavam: - a pena proferida nos presentes autos (Proc. 114/14.0JACBR-A) - a pena proferida no Proc. 112/14.3GASPS 2 - Discutida a causa, foi o arguido ora recorrente condenado, na pena única de 5 (cinco) anos e 6 (seis) meses de prisão. Necessariamente efectiva.

    3 - O arguido ora recorrente delimita o seu recurso a 1 (uma) questão: 4 - A punição infligida é severa, exagerada e não encontra explicação fácil, coerência ou razão que a sustente.

    5 - Deverá ser fixada, em cúmulo, uma pena não superior a 5 (cinco) anos de prisão suspensa na sua execução.

    6 – A presente Motivação contém toda a cronologia dos acontecimentos 7 - É de vária índole a perplexidade – e inconformismo – do ora recorrente.

    8 - 1ª nota O arguido ora recorrente foi julgado, como já se referiu atrás, no processo comum, com intervenção do Tribunal Singular, nº 53/12.9GCRMZ, do Juízo Local de ... do Tribunal Judicial da Comarca de ..., e condenado numa pena de 1 ano e 3 meses de prisão, suspensa na respetiva execução pelo mesmo período, pela comissão de um crime de furto qualificado, previsto e punido pelo art. 204º do Código Penal.

    Tal pena foi englobada no cúmulo jurídico anterior que fixou a pena conjunta em 5 anos e 3 meses de prisão, revogada pelo Tribunal da Relação de Coimbra e fixada em 5 anos de prisão suspensa na sua execução subordinada ao pagamento de 150,00 € trimestrais.

    Ora, tal pena veio agora a ser declarada extinta, nos termos do disposto no art. 57º do Código Penal, “pelo que não será considerada na presente decisão”, dado que na pena única a determinar não devem ser consideradas as penas suspensas já declaradas extintas nos termos do disposto no art. 57º, nº 1, do Código Penal, uma vez que o art. 78º, nº 1, desta codificação, apenas manda considerar as penas cumpridas, sendo certo que a extinção da pena suspensa prevista no art. 57º, n.º 1, do C.P., não resulta do cumprimento da pena de prisão subjacente à suspensão, mas de não ter ocorrido durante o respetivo período alguma das circunstâncias referidas no art. 56º: Logo, tal pena, já extinta mas sem ser pelo cumprimento, nunca poderia ser descontada na pena única, nos termos do art. 78º, n.º 1, do Código Penal – neste sentido, cfr. o Ac. do S.T.J. de 20-01-20101.

    Isto é, foi ordenada a realização de uma audiência de cúmulo jurídico que veio a fixar uma pena única de 5 anos e três meses (o anterior cúmulo) sendo que uma das penas se encontrava extinta.

    9 - Valeu a decisão do Tribunal da Relação de Coimbra que fez reverter tal decisão (não com este fundamento) pois, de outro modo, a pena fixara-se em 5 anos e três de prisão efectiva.

    10 - 2ª nota: O arguido ora recorrente, sempre que julgado, em 1ª instância, “beneficiou” de penas suspensas na sua execução. O mesmo aconteceu no Acórdão proferido pelo Tribunal da Relação de Coimbra.

    O arguido ora recorrente, sempre que julgado, para fixação de cúmulo jurídico, foi condenado em penas efectivas.

    Vejamos: O Colectivo da Instância Central de ... foi o mesmo (nos julgamentos dos 2 processos e nos 2 julgamentos visando a fixação de cúmulo jurídico; O Colectivo de Juízes é o mesmo, com excepção, crê-se de um dos membros.

    Informação Social 11 - Da informação social entretanto junta aos autos resulta que: 12 - À data dos factos, AA residia com sua companheira em ..., num apartamento arrendado pelo pai dela.

    13 - Nessa época, encontrava-se na dependência do pai da companheira, dado o desenraizamento geográfico e ausência de rendimento próprios.

    14 - Em fase anterior, o condenado vivia em casa de seus pais, em ..., onde era essencialmente vendedor ambulante, junto com a família de origem, localidade onde se encontra atualmente, desde abril de 2016.

    15 - Presentemente, reside com a companheira e um filho com oito meses, num espaço sem condições habitacionais, junto da sua família de origem. Neste contexto vivencial, subsiste com uma prestação de R.S.I., no valor de € 376, subsídio familiar do menor de € 145, e um subsídio de formação do condenado.

    16 - AA iniciou, em setembro de 2017, curso de formação, que versa a aquisição de conhecimentos de matemática, português e noções básicas de informática, com vista a uma certificação facilitadora da procura/inserção no mercado de trabalho. Esta formação foi-lhe proposta no âmbito das obrigações do R.S.I. e do Centro de Emprego da área de residência.

    17 - Ao nível familiar, a dinâmica vivenciada é descrita e avaliada, pelas instituições intervenientes, como gratificante e estabilizadora da sua conduta pessoal e social.

    18 - No que respeita ao acompanhamento em curso no âmbito dos processos em apreço, tem decorrido dentro dum padrão expectável, com boa adesão do condenado aos objetivos propostos em sede de plano de reinserção social.

    19 - Do contacto com os O.P.C. do local de residência, AA não se encontra indiciado nem é indagado noutras investigações criminais em curso.

    20 - Do trajeto de vida de AA, salienta-se um indivíduo integrado no seu meio sócio comunitário, tendo este sido controlador do seu estilo de vida até à data dos factos.

    21 - No entanto, após as condenações, regressou ao meio de origem, onde, até à presente data, não constam fatores disruptivos do seu quotidiano.

    22 - Tem revelado adesão aos objetivos estabelecidos nos P.R.S. e na interação com outras instituições intervenientes na sua organização pessoal e social.

    23 - Temos, portanto, sem margem para dúvidas, uma decisão – esta mesmo – que comporta e encerra uma difícil contradição.

    24 - Se por um lado, este mesmo Colectivo de Juízes (que já julgou o arguido 2 vezes em 1ª instancia e 2 vezes em audiência de cumulo jurídico) confere ao recorrente um amplo voto de confiança e estabelecimento de uma prognose favorável (basta ler a fundamentação dos Acórdãos), confiança essa, aliás, que o recorrente fez por merecer (não há noticia de qualquer outro contacto com o Sistema) sempre que o julga em audiência de cúmulo retira-lhe toda essa confiança – sem que nada o justifique – nem a Lei, atirando-o para a agressividade de um estabelecimento prisional.

    25 - Isto é, o Colectivo diz e desdiz 26 - Ou melhor, deixou-se submeter, violando a sua própria consciência – e convicção – que antes, mas ainda actual, formulara ….. pela imposição de uma soma aritmética, fria, sem emoções, na emergência simples de 2 (duas) penas em presença.

    27 - Mas nem este facto é suficiente para explicar a pena que foi proferida.

    Com efeito, c) A pena conjunta não pode ser inferior à mais elevada das penas parcelares; d) Não pode ser superior à soma material das penas parcelares; 28 - Não se compreende que, atentas as razões que determinaram a suspensão da execução da pena, defendida calorosamente por este mesmo Colectivo de Juízes, (também pelo Tribunal de ..., também pela Relação de Coimbra) agora se diga e justifique o contrário e se remeta o arguido recorrente para a cadeia.

    Em suma: 29 - O Tribunal de ... entendeu que a pena de 5 anos aplicada ao arguido ora recorrente no Proc. 112 devia ser suspensa na sua execução. São claros (e recentes) os argumentos e razões a este respeito defendidos.

    30 - E quanto ao Proc.114 pensou e defendeu o mesmo raciocínio e a mesma solução.

    31 - Ambos os Tribunais (o Colectivo é o mesmo) entenderam ser aquela solução a que melhor serve as finalidades da punição.

    32 - Inexplicavelmente, um desses Tribunais, o mesmo Colectivo, impôs ao arguido uma pena de prisão efectiva de 5 anos e 6 meses de prisão, contrariando tudo o que antes defendera.

    33 - A pena conjunta do arguido não deve exceder os 5 (anos) de prisão.

    34 - E deve ser suspensa na sua execução sob pena de todas as considerações que o defenderam serem agora uma palavra vã.

    Termos em que: Deve ser designado dia e hora para a realização de audiência nos termos do disposto no nº 5 do artigo 411º do CPP e em consequência: a) Deve o presente recurso ser considerado procedente e a pena em que o ora recorrente foi condenado, em cúmulo jurídico ser reduzida para pena não superior a 5 (cinco) anos de prisão; b) Deve a pena ser suspensa na sua execução, ainda que subordinada a qualquer injunção como já decretado anteriormente pelo Tribunal da Relação de Coimbra.» 3.

    Respondeu o Ministério Público, dizendo (transcrição): « (…) 1- A medida da pena única aplicada ao arguido mostra-se excessiva, devendo ser reduzida a cinco anos de prisão e suspensa na sua execução? Afigura-se-nos, salvo o devido...

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