Acórdão nº 189/13.9TBALQ.L1.S1 de Supremo Tribunal de Justiça (Portugal), 07 de Março de 2019

Magistrado ResponsávelABRANTES GERALDES
Data da Resolução07 de Março de 2019
EmissorSupremo Tribunal de Justiça (Portugal)

I - AA, S.A.

, intentou contra BB, S.A.

, ação declarativa pedindo a condenação no pagamento da quantia de € 223.538,75 e juros sobre o capital de € 220.065,44 desde 9-2-13 até integral pagamento.

Alegou que é arrendatária da R., sendo o locado um complexo industrial com diversos pavilhões cuja cobertura carecia de reparação para evitar infiltrações de águas pluviais, obras que recaíam sobre a R. enquanto proprietária.

A R., contudo, recusou realizar tais reparações, o que motivou que a A. o tivesse feito a expensas suas, devendo ser reembolsada das despesas e dos prejuízos que as infiltrações provocaram.

A R. contestou alegando que do contrato de arrendamento e do Regulamento anexo resulta que incumbe à A. a obrigação de conservação e reparação dos telhados dos edifícios que integram a sua parte privativa.

Efetuado o julgamento, foi proferida sentença julgando a ação improcedente.

Interposto recurso de apelação, a Relação revogou a sentença e condenou a R. no pagamento da quantia de € 223.538,75 e juros de mora sobre € 220.065,44, desde 9-2-13, até pagamento.

A R. interpôs recurso de revista suscitando as seguintes questões: - Nulidade do acórdão por obscuridade, contradição e falta de fundamentação; - Errada apreciação dos meios de prova, devendo ser mantida a sentença da 1ª instância a respeito da matéria de facto; - Violação quer do art. 405º do CC sobre o princípio da liberdade contratual, quer o art. 1111º sobre a responsabilidade pelas obras de conservação, devendo concluir-se, por interpretação do contrato de arrendamento e do Regulamento de Gestão do Polo Industrial, que as obras de reparação da cobertura dos pavilhões arrendados à A. são da sua responsabilidade.

Houve contra-alegações.

Colhidos os vistos, cumpre decidir.

II - Factos provados: 1. Com data de 2-1-10, a A. celebrou com a R. um acordo denominado “contrato de arrendamento não habitacional”, o qual consta de fls. 42 a 47; 2. Nos termos desse contrato, e com a EEção de 30 anos, a contar de 30-6-09, a R. deu de arrendamento à A. 4 módulos espaciais com a área coberta de 32.301 m2, na Quinta ... (conf. planta anexa ao contrato - Anexo I); 3. Como contrapartida do gozo e fruição do espaço arrendado, a A. obrigou-se a proceder ao pagamento de uma renda mensal, inicial, de € 52.030,00; 4. O locado destina-se ao exercício da atividade comercial da A. que, para o efeito, poderia fazer as obras interiores para instalação dos seus serviços, com recurso a material de fácil desmontagem e remoção e respeitando a estrutura e segurança do imóvel, bem como proceder à alteração do posicionamento das chaminés, sempre que necessário para o desenvolvimento da sua atividade.

Nos termos da Cláus. 5ª do contrato: “A Segunda Outorgante [a ora A.] poderá fazer no local arrendado as obras interiores convenientes à instalação dos seus serviços, com recurso a material de fácil desmontagem e remoção, respeitando a estrutura e segurança do imóvel, sem prejuízo de qualquer formalidade prevista na lei, bem como proceder à alteração do posicionamento das chaminés sempre que for necessário para o desenvolvimento da sua atividade.

Todas as outras obras, ou seja, as incidentes sobre a estrutura do imóvel, dependem de prévia autorização escrita da Primeira Outorgante [a ora R.], a prestar por escrito no prazo de 60 dias a contar da receção do pedido, e depois de realizadas pela Segunda Outorgante ficarão a pertencer ao locado, sem direito a qualquer indemnização ou retenção”.

5. Nos termos da Cláus. 2ª, nº 4, “constitui parte integrante do presente contrato o «Regulamento Interno de Gestão do Polo Industrial do ...», que as Partes se obrigam a cumprir e a fazer cumprir, pelo qual são definidas as regras de funcionamento de todo o imóvel, incluindo as áreas ocupadas pela própria Senhoria, os arruamentos internos e as áreas e espaços envolventes às áreas cobertas”.

6. Como Anexo II ao contrato, a A. e a R. acordaram ainda as regras de convivência no espaço industrial e comercial no qual se insere o locado, uma vez que o mesmo é ocupado por diversas entidades, no documento intitulado “Regulamento Interno” que consta a fls. 328 a 336; 7. Diz-se nesse documento (em “1.1. - Enquadramento Geral”) que: “O Regulamento Interno destina-se a todos os ocupantes do Polo, quer sejam proprietários, inquilinos ou de qualquer forma ocupantes e/ou utentes de qualquer espaço do Polo, doravante todos designados genericamente por ocupantes.

Define e regulamenta o funcionamento e a utilização do Polo: os direitos e as obrigações dos mesmos ocupantes, os encargos e a sua forma de repartição, a administração das zonas comuns e rotinas de manutenção referentes à vigilância, limpeza e manutenção dos diversos equipamentos e espaços.” 8. Desse "Regulamento Interno" consta, para além do mais, o seguinte: “1.2. Delimitação de Áreas do Polo O Polo divide-se em zonas privativas e em zonas comuns.

As zonas privativas são as áreas afetas ao uso exclusivo das empresas que nelas desenvolvem as suas atividades comerciais/industriais, doravante designadas ocupantes, nomeadamente a AA, a BB, a CC, a DD, a FF, a EE e a Thula.

As zonas comuns do Polo são todas as que não estejam atribuídas ao uso exclusivo dos ocupantes, designadamente, Portaria, Balneários, Central de águas quentes, Posto Médico, Central de rede de incêndios, Ecopontos, ETAR’s, Postos de Seccionamento e Postos de Transformação de Energia Elétrica e Gás, Ar Comprimido, furos de água e depósitos, arruamentos, jardins, parques de estacionamento e zonas de cargas e descargas, mata de eucaliptos, pinhal, depósito de combustível e estação de tratamento de água.

As plantas anexas identificam as zonas comuns (Anexo I) [fls. 335] e as zonas privativas (Anexo 2) [fls. 336] neste caso com a delimitação da área afeta a cada ocupante.

1.3. Uso das zonas privativas Cada ocupante tem direito de usufruir do seu espaço privativo e dele dispor, na condição de não prejudicar os direitos dos restantes ocupantes, alterar o fim a que se destina ou prejudicar o aspeto geral do Polo.

(…) 1.5. Gestão das zonas comuns A gestão das zonas comuns é da responsabilidade do ocupante com a maior permilagem, adiante designado por Gestora.

Todos os custos inerentes à gestão das zonas comuns são repartidos pelos ocupantes de acordo com o princípio do «utilizador/pagador» e na exata proporção da efetiva utilização … (…)” 9. Ainda no mesmo "Regulamento Interno", mas no capítulo sobre “Regras de Funcionamento e de Utilização Específicas das Zonas Comuns”, consta o seguinte: “… 2.2. Circulação e segurança nas zonas comuns … Os acessos às coberturas das naves e edifícios são de acesso exclusivo às equipas cuja responsabilidade de atuação é da Gestora. Nenhuma outra pode aceder a tais coberturas sem autorização expressa da Gestora e nenhum objeto pode ser colocado nas coberturas dos edifícios e de quaisquer construções no Pólo sem autorização prévia e escrita da Gestora. O mesmo se aplica relativamente á colocação de quaisquer cargas na face inferior da estrutura que suporta essas coberturas”.

(…) E no Capítulo sobre as “Regras de Funcionamento e utilização específicas das zonas privativas” consta que: 3.1. Obras nas Zonas Privativas do Polo Cada Ocupante poderá modificar, a seu cargo, a disposição interna dos seus espaços privativos, desde que sejam respeitadas as condições específicas de arrendamento ou qualquer outra forma de ocupação que legitimam a utilização do respetivo espaço.

A Gestora terá plenos poderes para autorizar ou impedir a realização ou a continuação de quaisquer obras, desde que se verifique que as mesmas violam as condições referidas no parágrafo anterior ou constituam, de qualquer forma, risco para a segurança, em geral, do Polo, ou para qualquer uma das suas componentes, quer privativa quer comum.

A gestora poderá realizar, ou autorizar a realização, de obras nas coberturas para viabilizar a colocação de quaisquer equipamentos, que sejam necessários ao desenvolvimento da sua própria atividade industrial/comercial, ou a mesma atividade de qualquer dos ocupantes.

3.2 Conservação e Manutenção Zonas Privativas Cada Ocupante assegurará a conservação e manutenção das suas zonas privativas.

(…).

O Anexo I (fls. 335) do Regulamento corresponde a uma Planta na qual surgem identificadas as “zonas comuns” e o Anexo II (fls. 336) identifica as “zonas privativas”, nele se referindo que à A. AA correspondem 32.301 m2 (88,4%) de um total de 36.527 m2 (100%), sendo que a TCAP ocupa 4.202 m2 (11,5%) e a DDbody 24 m2 (0,1%).

10. Desde a instalação da A. no locado (anterior à celebração do contrato referido no ponto 1.

), a R. suportou despesas relativas às reparações das coberturas e limpeza de algerozes, de que são exemplos os docs. de fls. 59 a 63 (facto alterado pela Relação).

11. No final do ano de 2010, ocorreram diversas infiltrações de águas pluviais rias nas instalações afetas à A., nomeadamente, na zona ocupada pela subarrendatária If FF, nos escritórios centrais, na If DPAB e na If Auto.

12. Em 16-2-11, a R. fez deslocar às instalações da A. um técnico da Cosiga (o Sr. Eng. ...) para avaliar a situação reportada.

13. Em 17-5-11, ocorreu uma grande inundação das instalações da A.

14. Os eventos referidos nos pontos 11.

e 13.

foram reportados pela A. à R. através de várias mensagens eletrónicas.

15. Em 18-5-11, a A. enviou email à R. comunicando-lhe o seguinte: «Reportámos a 21 de Janeiro os problemas graves que temos de infiltrações nas áreas do escritório e nas áreas das oficinas, conforme emails abaixo. A GG, Eng. ..., já veio fazer um levantamento dos problemas em Fevereiro/Março.

Até hoje e apesar de já ter solicitado, ainda não recebemos qualquer informação sobre o início das reparações sendo que as mesmas são absolutamente urgentes.

Ontem tivemos mais uma grande inundação nos nossos escritórios, ver foto abaixo. Este facto que se tem repetido algumas vezes nos últimos tempos é grave a carece de correção imediata.

Além do enorme desconforto para as...

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