Acórdão nº 21112/16.3T8LSB-A.L1.S1 de Supremo Tribunal de Justiça (Portugal), 07 de Março de 2019

Magistrado ResponsávelABRANTES GERALDES
Data da Resolução07 de Março de 2019
EmissorSupremo Tribunal de Justiça (Portugal)

I - AA, S.A.

, veio intentar a presente ação declarativa com processo comum contra BANCO BB, CC, S.A. (anteriormente designada por DD, S.A., e EE, pedindo a condenação solidária dos RR. no pagamento da quantia que resultar da diferença entre o montante que seja recuperado pela A. em resultado da liquidação da entidade emitente do instrumento financeiro “Fiduciary Time USD. 2,9% 08.05.2014-07.11.2014 ESBP PN (155928)”, com data de vencimento a 7-11-14, e o montante de USD 11.000.000,00 (aproximadamente € 9.858.490,00) que foi investido pela A., acrescido dos juros convencionados à taxa de 2,9%, no valor de € 285.896,21, e dos juros vencidos e vincendos, à taxa legal desde13-8-14 até integral pagamento.

A A. indicou € 30.000,01 como sendo o valor da ação, o qual não foi impugnado por nenhum dos RR.

Notificada judicialmente para esclarecer o valor que atribuiu, a A. veio alegar que, à data da propositura da ação, não conseguia quantificar a importância da indemnização a pagar pelos RR. e, por isso, formulou um pedido genérico, em consonância com a al. b) do art. 556º, nº 1 do CPC e do art. 569º do CC. Referiu ainda que, embora pretenda obter uma quantia certa em dinheiro, não é ainda possível definir a utilidade económica imediata do pedido, pelo que terá de ser atribuído à ação o valor da alçada da Relação e mais € 0,01 que dá acesso ao Supremo Tribunal de Justiça.

Foi proferido despacho que fixou em € 10.144.386,21 o valor da ação, desatendendo ao “critério” invocado pelo A.

A A.

apelou e a Relação confirmou a decisão recorrida.

A A. interpôs recurso de revista, que foi admitido ao abrigo do art. 629º, nº 2, al. d), do CPC, uma vez que se verificava uma contradição entre o acórdão recorrido e outro acórdão da Relação sobre a mesma questão de direito em torno do critério de fixação do valor do processo num caso em tudo semelhante.

Importa, pois, verificar se, na data em que foi fixado por despacho do juiz de 1ª instância, o valor processual deve corresponder ao indicado pela A. - € 30.000,01 - ou ao que foi fixado pelas instâncias - € 10.144.386,21.

II – Decidindo: 1.

Argumenta a A. que o valor que atribuiu à ação resulta do facto de não ser possível a sua quantificação imediata, uma vez que a utilidade económica que está em causa depende de circunstâncias que só serão determinadas no futuro e, concretamente, de se apurar se a A. irá recuperar ou não na liquidação da entidade emitente algum do dinheiro que investiu. Considera que esse valor deve ser fixado em € 30.000,01, sem embargo de a liquidação posterior revelar um valor diverso.

Os RR. não se opuseram a esta pretensão que, a ser consentida, determinaria para todos, e essencialmente para a A., a solução ideal, ou, de outra forma, “o melhor dos dois mundos”: por um lado, a garantia do acesso a toda a cadeia de recursos ordinários, considerando que aquele valor supera a alçada da Relação; por outro lado, a benefício de que, enquanto outro valor não fosse fixado, a mobilização do aparelho judiciário bastar-se-ia com o pagamento de uma taxa de justiça calculada a partir do referido valor de € 30.000,01.

  1. O sistema tem evoluído no sentido de impedir os efeitos de estratégias processuais com os contornos da referida, que se traduziu na indicação de um valor processual inferior ao que emerge dos critérios legais, mas que, noutros casos, aposta na sobreavaliação com o objetivo de ultrapassar os obstáculos que a regra das alçadas coloca à recorribilidade das decisões, nos termos do art. 629º, nº 1, do CPC.

    Nem uma nem outra opção quadram com os dispositivos legais que induzem à objetividade e legalidade na fixação do valor processual, em consonância com a natureza publicística das normas de processo, já que tal elemento da instância é suscetível de interferir em diversos aspetos relevantes e que ultrapassam os meros interesses subjetivos das partes.

    Vejamos: A toda a causa deve ser atribuído um valor, a indicar na petição inicial, sob pena de esta não ser recebida pela secretaria (arts. 305º, nº 3, 552º, nº 1, al. f), e 558º, al. e), do CPC).

    Tal elemento é suscetível de influir designadamente na forma de processo (art. 550, nº 2, al. d)), na competência do tribunal (art. 66º e LOSJ), na obrigatoriedade ou não de patrocínio judiciário (art. 40º) ou mesmo em alguns segmentos da tramitação processual (arts. 597º, 468º, nº 5, 511º, nº 1 e 604º, nº 5). É ainda a partir desse dado objetivo que, em regra, se afere a recorribilidade das decisões (art. 629º, nº 1) e se determina o valor tributário (art. 296º, nº 3, do CPC e art. 11º do RCP) que, por seu lado, serve de padrão à liquidação da taxa de justiça que cada parte deve pagar em diversos momentos processuais.

    A diversidade e o relevo das implicações do valor processual, designadamente quando interfere na intervenção de tribunais hierarquicamente superiores ou no montante da taxa de justiça, explicam a necessidade de o mesmo se ajustar aos critérios legais, evitando a sua manipulação em função de meros interesses particulares. Ainda que não deixe de...

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