Acórdão nº 2922/17.0T8LSB.L1.S1 de Supremo Tribunal de Justiça (Portugal), 14 de Março de 2019

Magistrado ResponsávelABRANTES GERALDES
Data da Resolução14 de Março de 2019
EmissorSupremo Tribunal de Justiça (Portugal)

I - AA instaurou a presente ação declarativa de condenação, sob a forma de processo comum, contra BB, Ldª, e CC, S.A.

, pedindo a sua condenação no pagamento da quantia de € 42.000,00, sendo € 26.648,12 a cargo da 1ª R. e € 17.351,88 da 2ª R., acrescida do IVA e dos juros à taxa legal, desde a citação até efetivo pagamento.

Alegou que as RR. celebraram entre si um contrato de consórcio com o objetivo de renovação e/ou remodelação de um prédio. Como representantes dos membros desse consórcio, integrando o respetivo Conselho de Orientação e Fiscalização, foram nomeados os advogados Dr. DD, pela 1ª R., e o A., pela 2ª R., tendo as sociedades consorciadas acordado em pagar a cada um, pelo exercício de tais funções, a remuneração mensal de € 1.000,00, a que acresceria IVA.

Ficou acordado no contrato de consórcio que os encargos comuns eram encargo das consorciadas na proporção das respetivas comparticipações, ou seja, de 586,86/1000 para a 1ª R., e de 413,14/1000 para a 2ª R.

O A. emitiu as faturas através da sociedade de advogados de que é sócio, tendo sido todas pagas até à emitida em 1-10-09 correspondente à remuneração do mês de Agosto de 2009. A partir dessa data, nada mais foi liquidado pela RR., apesar de o A. ter permanecido nas referidas funções até Abril de 2013.

A 1ª R. contestou e negou que o A. tenha prestado quaisquer funções, pelo menos a partir de Setembro de 2009, uma vez que o consórcio não executou nenhum dos objetivos para que foi constituído, tendo ficado sem atividade.

A 2ª R. invocou a exceção de prescrição presuntiva e, por impugnação, negou que tivesse sido estabelecida qualquer remuneração para o A., além de que o consórcio, desde 2009, deixou de exercer qualquer atividade, pelo que se terá que considerar extinto. Mais alegou que, desde 2010, pediu ao A. para formalizar a extinção do consórcio, o que ele não fez. Todos os serviços que lhe foram prestados pelo A. foram pagos mediante uma avença mensal no montante de € 700,00.

Mais requereu a apensação a esta ação da ação com processo especial de prestação de contas com o nº 2922/17.0T8LSB-A que o A. instaurou contra as RR., requerimento que foi deferido, sendo determinado que a ação de prestação de contas seria tramitada, de forma unitária, nos presentes autos.

O A. respondeu à matéria da exceção.

No despacho saneador foi julgada improcedente a exceção de prescrição.

Realizada a audiência final, foi proferida sentença que absolveu as RR. do pedido de € 42.000,00. Já relativamente à prestação de contas, apurou-se um saldo a favor do A. valor global de € 1.410,80, sendo condenada a 1ª R. a pagar-lhe a quantia de € 827,94 e a 2ª R. a quantia de € 582,86.

Foi interposto recurso de revista per saltum formulando o A. a seguinte síntese conclusiva: a) Por força da confissão expressa feita por ambas as RR. nas respetivas contestações e face ao disposto nos arts. 352º, 355º e 358º, nº 1, do CC e 46º do CPC, deve ser incluída na matéria de facto provada todo o conteúdo da cláus. 2ª do contrato de consórcio e o do nº 3 da respetiva cláus. 7ª; b) Uma vez que a 1ª R. o confessou na sua contestação, deve considerar-se provado que a R. BB, Ldª, deu o seu acordo a que o Dr. DD e o A., pelo exercício das funções para que foram nomeados, aufeririam, cada um, uma remuneração mensal de € 1.000,00, a que acresceria IVA, tendo ambos expressamente deliberado nesse sentido; c) O A. e o Dr. DD, como representantes das consorciadas no Conselho de Orientação e Fiscalização (COF), dispunham de poderes (que até incluíam o de alterar o contrato de consórcio) para fixar o pagamento a cada um deles pelo exercício daquelas funções, impondo-se essa sua deliberação quer ao chefe de consórcio quer às consorciadas; d) A obrigação de pagamento daquela remuneração ao A. que para o cargo fora definitivamente nomeado manteve-se até à data da sua renúncia às funções de membro de COF, ocorrida em 16-4-13, não tendo até então ocorrido qualquer facto extintivo do consórcio, nomeadamente os previstos no art. 11º, nº 1, do DL nº 231/81 de 28/7; e) A ação deve ser julgada procedente condenando-se as RR. no pagamento ao A. das quantias objeto das als. a) e b) do art. 24º da petição, nas permilagens ali estabelecidas; f) Ainda que não proceda o sustentado na anterior al. e) deverá a R. BB, Ldª, ser condenada a pagar ao A., na proporção estabelecida na al. a) daquele art. 24º, as quantias ali invocadas.

Foram apresentadas contra-alegações pelas RR.

Cumpre decidir.

II – Questão prévia: 1.

Estamos em sede de um recurso de revista per saltum, o qual, nos termos do art. 678º, nº 1, al. c), do CPC, integra apenas questões de direito. Quando sejam suscitadas questões de facto, a impugnação da decisão da 1ª instância deve ser feita através da interposição de recurso de apelação. Por esse motivo, sempre que num recurso de revista per saltum sejam suscitadas questões de facto, deve ser rejeitado e remetido para o Tribunal da Relação, nos termos do art. 678º, nº 4.

No caso concreto, aparentemente esta seria a solução, na medida em que o A. começou por suscitar nas suas alegações a ampliação da matéria de facto, a partir do documento que integra o contrato de consórcio e de uma alegada confissão resultante dos articulados.

Foi este o entendimento da Mº Juíza da 1ª instância que, ao admitir o recurso, determinou a sua remessa para a Relação (fls. 332). Já nesta instância, foi considerado que o objeto do recurso não contrariava os pressupostos do recurso de revista per saltum, por estarem em causa unicamente questões de direito.

Assim é, na verdade.

A previsão do recurso de revista per saltum tem em mente a possibilidade de “saltar” um dos graus de jurisdição, verificados os requisitos cumulativos do nº 1 do art. 678º do CPC, no pressuposto de que esteja estabilizada a decisão da matéria de facto dependente da apreciação por partes das instâncias. Pelos mesmos motivos, não deve impedir-se esse atalho recursório quando a fixação da matéria de facto provada e não provada dependa unicamente da resolução de questões de direito.

Afinal, o art. 682º, nº 1, do CPC, estabelece que o Supremo aplica definitivamente o direito aos factos materiais fixados pelo tribunal recorrido, mas não lhe veda a recolha de factos que se encontrem plenamente provados, por documento com força probatória plena ou por confissão expressa ou ficta (nº 3 do art. 674º), o que constitui uma questão de direito probatório material cuja apreciação não sofre qualquer interferência de juízos decisórios sustentados na livre apreciação de meios de prova.

  1. A primeira questão que o A. suscitou liga-se à insuficiência da enunciação dos factos relacionados com o contrato de consórcio.

    Tal contrato foi reduzido a escrito e sobre o seu teor não existe qualquer diferendo...

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