Acórdão nº 524/13.0TBTND-A.C1.S1 de Supremo Tribunal de Justiça (Portugal), 24 de Janeiro de 2019

Magistrado ResponsávelROSA TCHING
Data da Resolução24 de Janeiro de 2019
EmissorSupremo Tribunal de Justiça (Portugal)

ACORDAM NO SUPREMO TRIBUNAL DE JUSTIÇA 2ª SECÇÃO CÍVEL I. Relatório 1. AA, S.A. instaurou ação executiva, com forma de processos comum, para pagamento da quantia de € 1.490.181,35, contra os executados BB, CC, DD, Unipessoal, Lda, EE, Lda, FF - Gestão Imobiliária, Lda e GG Limited, com base numa livrança subscrita por FF, Lda e avalizada por HH, BB e CC, no valor de € 1.329.332,16, emitida em 24/9/2010, com data de vencimento em 15/10/2010, a favor do Banco II, S.A., e de que é portadora mercê do contrato de cessão de créditos celebrado entre ela e o Banco JJ, S.A., anteriormente denominado Banco II, S.A.

  1. Vieram, então, os executados BB e CC deduzir oposição por embargos de executado, alegando, em síntese, a inoponibilidade da cessão de créditos entre o II, por nunca lhe ter sido notificada, a prescrição da ação cambiária, por a execução ter sido instaurada em 18.10.2013, quando já haviam decorrido três dias após a data de vencimento da livrança exequenda, o preenchimento abusivo desta livrança bem como o pagamento da quantia nela titulada por compensação.

  2. Contestou a exequente/embargada, sustentando a improcedência das invocadas exceções.

  3. Foi proferido despacho saneador, no âmbito do qual foi julgada improcedente a invocada exceção de inoponibilidade.

  4. Realizada audiência de julgamento, foi proferida sentença que julgou procedentes os embargos e extinta a execução.

  5. Inconformada com esta decisão, dela apelou a exequente para o Tribunal da Relação de Coimbra, que, por acórdão proferido em 5 de junho de 2018, julgou procedente a apelação e, revogando a sentença recorrida, julgou improcedentes os embargos e executado e ordenou o prosseguimento dos autos.

  6. Inconformadas com esta decisão, os embargantes CC e marido, BB dela interpuseram recurso de revista para o Supremo Tribunal de Justiça, terminando as suas alegações com as seguintes conclusões, que se transcrevem: «1a Não se pode confundir constrangimentos técnicos do Citius com o ignorar por parte da exequente das regras processuais vigentes àquela data e que determinaram que a presente execução só viesse a dar entrada em Tribunal em 18 de Outubro de 2013.

    2a O diploma que consagrou a invocação desses impedimentos técnicos só entrou em vigor a 14 de Outubro de 2014 (embora reportados os seus efeitos à data de 26-08-2014) e, por isso, em data posterior à da entrada da execução em juízo, que veio a ser distribuída em 18 de Outubro de 2013.

    3a A incorrecta qualificação da forma do processo, também não pode servir como pretexto para a invocação de constrangimentos técnicos do Citius.

    4a O mandato conferido pela exequente tem como data o dia 11.02.2011, como decorre da procuração junta com o requerimento executivo.

    5a A prescrição do título em causa só ocorreu ao fim de 3 anos (em 15.10.2013) e o mandato dos autos foi conferido cerca de 30 meses antes de tal prescrição ter ocorrido (em 11.02.2011).

    6a Sempre estaríamos no domínio do abuso de direito se se permitisse que 30 meses depois da outorga do mandato, se viesse a permitir um regime excepcional de alargamento do prazo para instauração de uma execução, porque a exequente, por sua inércia e desleixo, deixou que o prazo se esgotasse, para depois vir invocar uns eventuais constrangimentos técnicos.

    7a Contrariamente ao que consta do Acórdão do Tribunal da Relação de Coimbra, não houve quaisquer constrangimentos técnicos do Citius relativamente a esta execução, sendo certo que não se pode estender as situações excepcionais porventura ocorridas em outros processos com os da presente execução (artigo 11° do Código Civil).

    8a Após a entrada da execução, a referência de pagamento ao agente de execução que determina o prosseguimento da execução, só está ativa no dia seguinte, como foi o caso desta execução, sendo este um procedimento que existia e existe e nada tem a ver com os constrangimentos técnicos a que se faz referência no DL 150/2014 de 13/10.

    9a A execução entrou cerca de dez meses antes da produção dos efeitos do DL 150/2014 de 13/10, pelo que se verifica existir um incorrecto enquadramento temporal do indicado Decreto-Lei no presente processo, por parte do Tribunal da Relação de Coimbra e, nessa medida, não sendo o mesmo aplicável a esta execução, deverá ser revogado tal acórdão, mantendo-se a decisão proferida pela 1a Instância. SEM CONCEDER: 10a Por virtude da perda da eficácia cambiária da livrança a AA não estava dispensada do ónus da respectiva prova de proceder à cabal identificação e contabilização do seu crédito, de modo a permitir aos executados que se desincumbissem do ónus probatório que sobre eles recaia.

    11a Se os embargantes impugnam o montante aposto na livrança por excessivo, justificando-o com sentença e com articulados da própria credora a confessar outros valores, ao exequente incumbe a alegação e prova de como chegou a tal valor, enquanto ao executado incumbe a prova do teor do pacto de preenchimento bem como de que o preenchimento foi efetuado em contrário do acordado.

    12a A isso não obsta a existência de uma cessão do crédito do primitivo credor a favor da exequente, uma vez que a cessão representa uma simples transferência da relação obrigacional pelo lado activo, sendo que o devedor cedido pode valer-se, em face do cessionário (novo credor), dos meios directos de defesa que lhe era lícito opor ao cedente (antigo credor), excepto os que provenham de facto posterior ao conhecimento da cessão (cfr. art. 585° do C. Civil).

    13a Resulta dos embargos deduzidos que foi impugnado o crédito da exequente AA e alegado expressamente o preenchimento abusivo da Livrança, não tendo sido considerado como devia ter sido:

    1. A petição inicial do Banco II, SA, no âmbito do processo n° 1173/10.0TBVIS do extinto … Juízo Cível do Tribunal Judicial de … a peticionar a Insolvência dos executados CC e de BB, junta com os embargos sob o doc. 1 do apenso A, onde consta que à data de 17 de Abril de 2010, o II confessava no artigo 2o, que o valor do seu crédito era de 738.379,57 €.

    2. A sentença há muito transitada em julgado e proferida pelo Tribunal Judicial de … - …Juízo Cível, processo nº 1173/10.0TBVIS, junta com os embargos do Apenso A sob o doc. 2, que constitui força probatória plena.

    3. O documento 5 junto com a petição de embargos do Apenso A com data de 2010-09-24 em que era o próprio II, quem, relativamente àquele denominado "contrato de mútuo" se arrogava ser titular de um crédito de 1.134.689,54 € e solicitava à aqui embargante o seu pagamento até ao dia 15 de Outubro de 2010.

    14a Considerando a regra da inseparabilidade da cessão de créditos que resulta do disposto no citado artigo 582° do CC, resulta por demais evidente e provado por sentença proferida pelo extinto Tribunal Judicial de …, confirmada por douto acórdão do Tribunal da Relação de Coimbra (sentença essa e trânsito em julgado aceites pela AA) que, em 17 de Abril de 2010 os embargantes do Apenso A eram credores do II.

    15a A alegação e junção de uma sentença com trânsito em julgado, constituindo esta força probatória plena, é mais do que bastante para prova de um facto que impede/extingue o direito que a exequente pretendia fazer valer no processo.

    16a A comunicação da intenção de preenchimento da livrança corporizada no documento 5 junto com a petição de embargos do Apenso A com data de 2010-09-24 em que era o próprio II, quem, relativamente àquele denominado "contrato de mútuo" se arrogava ser titular de um crédito de 1.134.689,54 € e solicitava o seu pagamento até ao dia 15 de Outubro de 2010, ainda mais adensa e evidencia tal preenchimento abusivo da livrança pelo valor de 1.329.332,16 €.

    17a Nenhuma prova foi produzida em Audiência que justificasse a existência de qualquer crédito da exequente, pois nenhuma outra prova foi apreciada que pudesse destruir os efeitos probatórios daqueles documentos (donde resulta o trânsito em julgado de uma sentença e a sua força probatória plena e, ainda, a confissão do credor), ou que, de algum modo, pudesse fundamentar a prova de tal facto 3).

    18a A decisão do Tribunal da Relação de Coimbra é contra todas as regras da lógica e da matemática ao acolher a tese de que um crédito que em 17 de abril de 2010 era de 738.379,77 €, passou a ser em 15 de Outubro de 2010 de 1.329.332,16 €, quando existiam aplicações financeiras geradoras de rendimentos, ascendendo os valores aplicados a 400.000€, 225,000€, 625,000€.

    19a Existe contradição insanável entre os factos provados pelo Tribunal "quo" designadamente entre os pontos 3), 4) e 7) da fundamentação de facto, uma vez que se afirma no ponto 4) que o valor do empréstimo em 20/06/2008 foi de 1.748.500,00 €, referindo-se no ponto 7) que os executados não devolveram à exequente o capital mutuado e os juros vencidos sobre esse capital, mas concluindo-se no ponto 3) que o valor em dívida em 15/10/2010 era de 1.329.332,16 €.

    20a Nunca se poderia ter dado como provado que o valor do crédito da exequente era de 1.329.332,16€ e deveria terem sido julgados inteiramente procedentes e provados os embargos deduzidos.

    21a Foram violados designadamente e entre outros, os seguintes normativos legais: artigos 2o e 6o do Dec. Lei 150/2014 de 23 de Outubro, 11°, 342°, 344°, n° 2, 352°, 371°, 522°, 531°, 582°, 585°, 586° do Código Civil, 615° n° 1, alínea b), c) e d) do CPC.

    Nestes termos, deve revogar-se o douto Acórdão proferido pelo Tribunal da Relação de Coimbra, julgando-se inteiramente procedentes os embargos de executado e a execução julgada extinta».

  7. A exequente/embargada respondeu, terminando as suas contra alegações com as seguintes conclusões, que se transcrevem: «1.ª Alegam os Recorrentes que o Tribunal da Relação de Coimbra efetuou um incorreto enquadramento temporal do Decreto-Lei 150/2014 de 13/10 no presente processo, pelo que, não lhe sendo aplicável, deverá o acórdão ser revogado.

    1. Ora, o douto acórdão considerou justificado o impedimento alegado pela Exequente e, assim, instaurada a ação executiva em 9 de Outubro de 2013, pelo que a...

Para continuar a ler

PEÇA SUA AVALIAÇÃO
1 temas prácticos
1 sentencias

VLEX uses login cookies to provide you with a better browsing experience. If you click on 'Accept' or continue browsing this site we consider that you accept our cookie policy. ACCEPT