Acórdão nº 3831/15.3TBLRA.L1.S1 de Supremo Tribunal de Justiça (Portugal), 15 de Janeiro de 2019

Magistrado ResponsávelHELDER ALMEIDA
Data da Resolução15 de Janeiro de 2019
EmissorSupremo Tribunal de Justiça (Portugal)

Revista n.º 3831/15.3T8LRA.L1.S1[1] Acordam no Supremo Tribunal de Justiça[2] I – RELATÓRIO[3] 1. AA e mulher, BB, intentaram, no Tribunal Judicial da Comarca de ..., a presente acção declarativa sob a forma de processo comum contra o Banco CC, S.A., peticionando a condenação do R. a restituir-lhes a quantia de €103.920,96, acrescida de juros à taxa supletiva legal para as operações comerciais, contados sobre €100.000,00, desde a data da citação até integral e efectivo pagamento.

Para tanto, alegam, em síntese, que tinham aplicado no banco R., num depósito a prazo, a quantia de €50.000,00. No entanto, seduzido pela conversa dos funcionários do Banco/R., o A.-marido, subscreveu, em 24 de Outubro de 2004, o boletim de subscrição de uma Obrigação DD, no valor de €50.000,00, que foi colocado à sua frente, já preenchido, limitando-se a assiná-lo, julgando que se tratava de uma variante de um depósito a prazo, só que mais remunerado.

Nesse mesmo dia, resgatou o supra referido depósito a prazo e, novamente seduzido pelos funcionários do banco R., em 4 de Novembro de 2005, aplicou a mesma quantia na subscrição de uma outra Obrigação DD, no valor unitário de €50.000,00, por endosso de outro cliente do banco, o que fez com base na confiança que tinha na relação bancária estabelecida com os funcionários dos R. , que lhe afiançaram que se tratava de um sucedâneo de um depósito a prazo, mas com melhor remuneração.

Sendo que se soubesse que perdia o controlo do dinheiro, que só poderia ser reembolsado a partir de Outubro de 2014 e se tivesse sido informado das características do produto, nomeadamente "REEMBOLSO ANTECIPADO" e "GARANTIAS E SUBORDINAÇÃO", nunca teria aceitado efectuar essa operação.

Entretanto, a "EE, SGPS S.A.", hoje denominada "FF SGPS, S.A.." não pagou as obrigações na data do seu vencimento, em 24 de Outubro de 2014, apenas tendo pago os juros semestrais em Outubro de 2014 e em Abril de 2015, após o que apresentou no Tribunal da Comarca de Lisboa em Processo Especial de Revitalização Pretendem, assim ser ressarcidos dos prejuízos sofridos por força da actividade do R. como entidade bancária e intermediário financeiro, nos termos dos artigos 73.°, 74.°, 75.° e 78.° do Regime Geral das Instituições Financeiras e Sociedades de Crédito (doravante RGIFSC), aprovado pelo Dec.-Lei n.° 298/1992, de 31 de Dezembro e dos artigos 304.°, 7.°, n.° 1 e 312.°, n.° 1, do Código dos Valores Mobiliários, aprovado pelo Dec.-Lei n.° 486/99, de 13 de Novembro.

  1. Citado, veio o R. contestar, por excepção, invocando a incompetência territorial do tribunal, e por impugnação, contrapondo, em substância, que os funcionários do Banco/R. agiram sempre de acordo com a vontade expressa pelos AA. - subscrever Obrigações EE -, tendo explicado as características do produto e que, após a subscrição das Obrigações DD, o A. sempre recebeu um extracto mensal onde lhe apareciam as obrigações como integrando a sua carteira de títulos, assim como receberam os AA., semestralmente, a remuneração dos juros dos respectivos cupões, com a indicação de que diziam respeito às Obrigações EE.

    Foi explicado ao A.- marido que a única forma de liquidar o produto de forma unilateral e antecipada seria transmitindo as obrigações a um terceiro interessado, mediante endosso, dado que o seu reembolso antecipado apenas seria permitido a partir do quinto ano, por iniciativa da EE e com o acordo do Banco de Portugal.

    Alegou, ainda, que a responsabilidade pelo pagamento da Obrigação aquando do vencimento era da inteira responsabilidade da entidade emitente, no caso, a EE, SGPS, S.A, posto que em momento algum o Banco/R. garantiu o pagamento desta emissão de Obrigações.

    E que a interposição da presenta acção 7 anos após a nacionalização do Banco/R., dez após a subscrição, bem como o facto de os AA. terem aguardado o desenrolar das assembleias de obrigacionistas que se seguiram (sem olvidar o facto de a FF ter apresentado um PER) para tomar a decisão de tentar obter o pagamento junto do Banco/R. demonstra a consciência que os mesmos tinham e têm do produto que subscreveram.

  2. Em resposta, os AA. pugnaram pela procedência da excepção dilatória de incompetência territorial invocada, e pela subsequente remessa do processo para o Tribunal da Comarca de ....

  3. Julgada procedente esta excepção, foram os autos remetidos à Comarca de ..., onde foram distribuídos à Instância Central — 1.ª Secção Cível - J....

  4. Seguindo o processo os seus ulteriores trâmites, foi proferida sentença, julgando a acção totalmente improcedente, por não provada, e absolvendo o R. do pedido.

  5. Não se conformando com esta decisão, dela apelaram os AA. para a Relação de Lisboa, a qual proferiu Acórdão – fls. 299 e ss. -, a julgar, na procedência da apelação e consequente revogação da sentença recorrida, a acção parcialmente procedente por provada, condenando o Banco CC, S.A. a restituir aos AA. a quantia de €100.000,00 (cem mil euros), acrescida de juros de mora contados à taxa de 4% ao ano, desde 30/04/2015 até efectivo e integral pagamento.

  6. Discordando do assim decidido, o R. interpôs o vertente Recurso de Revista, cuja alegação encerra com as seguintes conclusões: 1. A decisão recorrida, tendo revisto a decisão sobre a matéria de facto vem depois a condenar o Banco-R. por responsabilidade civil na qualidade de intermediário financeiro, por prestação de informação falsa, concretamente a constante daquele facto, na colocação de instrumento financeiro junto dos AA.

  7. Para tanto, o douto aresto verifica o cumprimento dos gerais pressupostos da responsabilidade civil, e concretamente a ilicitude - que identifica com a dita falsidade de informação -, a culpa - que se presume nos termos gerais do artº 799º do CCiv. e 314º do CdVM -, e o dano - correspondente ao valor da prestação não cumprida pela entidade emitente! 3. Já quanto ao nexo de causalidade, o douto acórdão, caracterizando esta como uma responsabilidade contratual, limita-se a invocar a sua presunção, por extensão da presunção de culpa do artº 799º, aliás, a par da presunção também da ilicitude - na esteira de posição do Prof. Menezes Cordeiro.

  8. Olvida o Tribunal recorrido que tal posição doutrinária assenta na aproximação à solução histórica francesa da faute, quando o sistema acolhido no nosso Código Civil tem origem germânica, e portanto em pouco toca aqueloutro.

    Mais, 5. Do texto do art. 799º nº 1 do C.C. não resulta qualquer presunção de causalidade. E, de resto, nos termos do disposto no art? 344º do Código Civil, a inversão de ónus depende de presunção, ou outra previsão, expressa da lei! 6. E não se alcançam razões (que o acórdão recorrido também não adianta...) que justifiquem que a presunção própria da censura ético-jurídica da conduta do agente deva ser estendida à relação consequencial entre o facto e o dano.

    Ainda que se admitisse a solução de extensão de presunção de culpa à causalidade, 7. A verdade é que uma tal solução não é adequada aos casos de incumprimento de prestações contratuais acessórias, apesar do cumprimento da prestação principal.

  9. Prestação principal será aquela que é típica de um contrato, que o define enquanto figura contratual.

  10. No âmbito do contrato de execução de intermediação financeira de recepção e transmissão de ordens por conta de outrem, a prestação principal não pode deixar de ser só a boa recepção da ordem e sua retransmissão a fim de ser executada nos termos ordenados.

  11. A prestação de informação exaustiva, suficiente, clara sobre o produto em causa constitui já uma prestação daquela secundária, destinada a complementar ou tornar perfeita aquela prestação principal.

  12. De todo o modo, no âmbito da responsabilidade contratual, presumindo-se a culpa, caberá a quem alega o direito demonstrar a ilicitude, o nexo causal e o dano, que em caso algum se presumem! Acresce que, Mesmo que se admitisse a dita presunção, 12. A douta decisão recorrida afirma que "quando na presença de acordo entre o banqueiro e o seu cliente [caso em que a «falta do resultado normativamente prefigurado implica presunções de culpa, de ilicitude e de causalidade»] a mera falta de informação responsabiliza, automaticamente, o obrigado (...)" 14. Estamos perante uma situação em que e configuram dois contratos distintos e autónomos entre si: por um lado, (i) um contrato de execução de intermediação financeira, e por outro, (ii) a contratação de um empréstimo obrigacionista do cliente a entidade terceira ao primeiro contrato.

  13. Fica por determinar, de forma expressa, qual o resultado normativamente prefigurado a que se refere no caso, a douta decisão sob recurso.

  14. O único resultado relevante será o referente ao reembolso do investimento efectuado. Mas" neste caso...

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