Acórdão nº 857/08.7TVLSB.L1.S2 de Supremo Tribunal de Justiça (Portugal), 19 de Dezembro de 2018

Magistrado ResponsávelMARIA DO ROSÁRIO MORGADO
Data da Resolução19 de Dezembro de 2018
EmissorSupremo Tribunal de Justiça (Portugal)

Acordam no Supremo Tribunal de Justiça I – Relatório 1. AA, BB e CC instauraram ação declarativa sob a forma de processo comum contra BANCO DD, S.A.

. pedindo que: a) - Se declare verificada uma alteração anormal das circunstâncias em que os autores e a ré negociaram as condições do contrato de mútuo e se condene a ré a reduzir a prestação de juros para o valor que a mesma teria se tivesse sido aumentada, em cada ano, por aplicação do coeficiente que o Governo utilizou na atualização dos vencimentos dos funcionários públicos, procedendo ao recalculo dos agravamentos que fez operar a 11.01.06, 11.07.06, 11.01.07, 11.07.07 e 11.01.08 e todos aqueles que venha a introduzir até ao trânsito em julgado da decisão que ponha termo a causa; b) - Se condene a ré a abster-se de aplicar novos agravamentos da prestação de juros superiores àqueles que resultarem da aplicação, em cada ano que se verifique subida da taxa de juro, do coeficiente que for utilizado na atualização dos vencimentos dos funcionários públicos, não podendo haver agravamentos nos anos em que não se verificar subida da taxa de juro, nem mais do que um agravamento em cada ano; c) - Se condene a ré a restituir aos autores todas as quantias que já debitou e aquelas que venha a debitar nas suas contas como resultado dos agravamentos, nesta altura no valor global de € 7.056,27; d) - Se condene a ré a restituir aos autores todas as quantias que debitou e aquelas que venha a debitar nas suas contas a titulo de comissão de liquidação de prestações, já nesta altura no valor global de € 39,05; e) - Se condene a ré a reduzir, em 11 de Junho de cada ano, o prémio de seguro de vida na proporção do valor do capital amortizado nos últimos 12 meses, e a restituir aos autores as quantias que debitou a mais por não ter efetuado a redução a 11.07.06 e 11.07.07, nesta altura no valor global de € 4,56; Subsidiariamente ao pedido formulado em a), e cumulativamente com os formalizados em b) a e): f) - Sejam declaradas proibidas, abusivas e nulas, ou apenas nulas, as cláusulas referidas em 48°, 49°, 56° a 62° e 64°, da petição inicial, porque as mesmas não puderam ser negociadas pelos autores, estabelecem para estes obrigações vagas, sem limites, imprecisas e de conteúdo, à partida, indeterminável e atestam conhecimentos que os mesmos não possuíam nem podiam possuir; Subsidiariamente a todos os pedidos: g) – Se condene a ré a proceder ao recálculo dos agravamentos referidos em 77° a 81° da petição inicial, com base no arredondamento para a décima, por excesso, em vez do arredondamento para o oitavo, por excesso, e a restituir aos autores as quantias que já debitou a mais e aquelas que venha a debitar nas contas dos autores; h) - Na procedência de qualquer um dos anteriores pedidos, seja a ré condenada a pagar juros de mora à taxa legal sobre as quantias peticionadas.

Para tanto, alegam, em síntese, que: No dia 11 de Março de 2005, a autora AA dirigiu-se a uma agência da ré, a fim de se inteirar da possibilidade de lhe vir a ser concedido um empréstimo para aquisição de casa própria, no valor de € 249.399,00, esclarecendo que tinha 19 anos de idade, era estudante, não tinha rendimentos próprios, e que o pagamento das prestações mensais com vista à amortização do mesmo seria efetuado pelos seus pais; A funcionária do Banco ré que a atendeu, efetuou a respectiva simulação e disse-lhe que a taxa de juro base do empréstimo seria de 2,25%, o "spread" seria de 0,8%, a taxa de juro nominal seria de 3,05%, sendo de 3,254% a taxa anual efetiva; Mais a informou do valor da prestação mensal a pagar para amortização do empréstimo, logo adiantando que, as condições que acabava de lhe expor, eram insusceptíveis de ser negociadas ou modificadas a seu favor; A autora AA não foi informada do que significava "taxa de juro base", "Spread", "taxa de juro nominal" ou "taxa anual efetiva", sendo que ainda hoje nenhum dos autores sabe o que querem dizer tais expressões; A autora AA deu conhecimento aos seus pais do teor das informações obtidas junto do ré, os quais deram o seu acordo à contração do empréstimo, o qual veio a ser aprovado; No dia 24.6.2005, foi celebrada escritura pública de compra e venda e mútuo com hipoteca e fiança, nos termos da qual, além do mais, EE declarou vender a AA, pelo preço de € 374.062,00, a fração autónoma correspondente às letras "AH" do prédio identificado na p.i., bem como, pelo preço de EUR 15.000,00, o direito a 1/66 avos indivisos, da fração individualizada pela letra "A".

Nessa escritura, a autora AA confessou-se devedora ao DD da quantia de EUR 249.399,00, a liquidar nos termos constantes desse documento.

Como garantia, a autora AA constituiu, a favor do Banco hipoteca sobre a fração "AH", constituindo-se os autores BB e CC fiadores, com expressa renúncia ao benefício da excussão prévia.

Na data da realização dessa escritura, o Banco não esclareceu os autores sobre o significado das expressões "taxa anual efetiva", "Euribor de referência", "média aritmética das taxas Euribor a 6 meses dos dias úteis do mês anterior".

A ré inseriu tais cláusulas, assim como a de arrendamento para o oitavo, por excesso, sem o conhecimento e o consentimento dos autores, os quais não tiveram qualquer possibilidade de as discutir e recusar, tendo sido surpreendidos com as mesmas na altura em que a escritura foi lida e assinada, sendo-lhes, dado o circunstancialismo, impossível negociá-las ou recusá-las, até porque o representante da ré naquele ato, não dispunha de poderes para tal; Os autores também não leram, nem lhes foi comunicado o teor do documento complementar que faz parte integrante daquela escritura, pelo desconheciam o seu conteúdo na altura em que o assinaram; Sucede que, em dois anos e meio, a ré agravou em cerca de 75,40% a parcela de juros da prestação mensal com vista à amortização do empréstimo, alterações que a ré não comunicou a qualquer dos autores, das quais apenas foram tendo conhecimento à medida que iam consultando os extratos bancários.

  1. A ré contestou, impugnando o alegado pelos autores na petição inicial e, em conclusão, pediu a sua absolvição do pedido.

  2. Os autores apresentaram articulado superveniente (cf. fls. 204), alegando que a ré, em Julho e em Agosto, voltou a aumentar a prestação relativa a juros.

  3. A ré respondeu a este articulado (cf. fls. 210/213).

  4. Realizado o julgamento, foi proferida sentença que, julgando a ação parcialmente procedente: - Condenou a ré a restituir aos autores todas as quantias que debitou e que venha a debitar nas contas dos autores, a título de comissão de liquidação de prestações, com referência ao contrato de "compra e venda, mútuo oneroso com hipoteca e fiança", que constitui objeto da presente ação; - Sobre cada uma das quantias debitadas mensalmente pelo ré nas contas dos autores, a título de comissão de liquidação de prestações, com referência ao contrato de "compra e venda, mútuo oneroso com hipoteca e fiança", que constitui objeto da presente ação, nos termos referidos em 5.1, acrescem juros de mora à taxa legal, contados desde a data de cada um dos respectivos débitos mensais; - Absolveu a ré de todos os demais pedidos que contra ele são formulados pelos autores nesta ação.

    No essencial, a decisão da 1ª instância considerou não estarem verificados os pressupostos previstos no art. 437º, do CC e, com esse fundamento, julgou improcedentes os pedidos formulados de a) a d)[1], da p.i..

    De igual modo, julgou improcedentes os pedidos formulados em e), por a autora ter autorizado o Banco a debitar na sua conta os valores acordados com a seguradora; em f), dado que nem o contrato dos autos é um «contrato de adesão», nem as cláusulas invocadas padecem do vício apontado pelos autores; g), por o Banco ter respeitado a legislação em vigor, no que respeita aos «arredondamentos». Considerou apenas procedente o pedido formulado sob a al. d), da p.i., com base na falta de prova de acordo das partes que permita ao Banco debitar aos autores «comissões de liquidação de prestações».

  5. Desta decisão apelaram ambas as partes, tendo o Tribunal da Relação de … proferido acórdão a confirmar a sentença.

  6. De novo irresignados, vieram os autores interpor recurso de revista excecional, dizendo, em conclusão: “1. Ao não conhecer do pedido formulado nas als. c) e h) da petição inicial, com base na causa de pedir consubstanciada na não informação aos autores dos elementos utilizados na determinação dos novos valores resultantes dos agravamentos da prestação mensal, e do pedido subsidiário formulado na al. g), a Relação desobedeceu ao disposto no arts. 660º, nº 2, pelo que cometeu duas nulidades previstas no arts, 668º, nº 1, al. d), ambos do CPC.

  7. Verifica-se existir uma primeira contradição entre os factos provados descritos nos pontos 65) e 76), na medida em que os primeiros são inconciliáveis com os segundos, e uma segunda contradição entre os factos constantes dos pontos 14) a 16), 23), 64), 65) e 67) a 72) e os descritos nos pontos 66), 73) e 76) dos Factos Provados, como mais desenvolvidamente se expõe logo no início de 2.3, devendo as mesmas ser removidas.

  8. Não é correta a forma de indicar "os factos provados" que consiste em dar por reproduzidos os documentos contidos nos autos, porque os mesmos não são factos mas meio de prova, pelo que o acórdão, ao dar por reproduzidos os documentos de fls. 174 a 179 e 181 a 186, sem indicar os factos que se destinavam a provar, violou os arts. 264º, nº l, 511º, nº 1, e 659º nº 2, todos do CPC, pelo que aqueles não podem ser tidos em conta, devendo ter-se por não escrito, no ponto 65) dos Factos Provados, o segmento "devidamente elucidada do montante que as prestações mensais podiam sofrer, caso existissem variações do indexante da taxa de juro".

  9. O trecho "os autores tiveram acesso a todas as cláusulas integrantes do 'contrato' e àquelas que constam do documento complementar", sem se especificar quando, onde e de que modo, encerra uma conclusão jurídica, pelo que a resposta ao...

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