Acórdão nº 574/16.4PBAGH.S1 de Supremo Tribunal de Justiça (Portugal), 21 de Novembro de 2018
Magistrado Responsável | MANUEL AUGUSTO DE MATOS |
Data da Resolução | 21 de Novembro de 2018 |
Emissor | Supremo Tribunal de Justiça (Portugal) |
Acordam no Supremo Tribunal de Justiça: I - RELATÓRIO 1.
Em processo comum, com intervenção do tribunal colectivo, o Ministério Publico acusou: AA, [...], Imputando-lhe a prática, em autoria material, na forma consumada e em concurso real, de um crime de violência doméstica, previsto e punido pelo artigo 152.º, n.º 1, alínea b), n.º 2, n.º 4 e n.º 5, do Código Penal, de dois crimes de violação, previstos e punidos pelo artigo 164.º, n.º 1, alínea a), do Código Penal, de um crime de violação de domicílio agravado, previsto e punido pelo artigo 190.º, n.ºs 1 e 3, do Código Penal, de um crime de dano, previsto e punido pelo artigo 212.º, n.º 1, do Código Penal, de dois crimes de ofensa à integridade física simples, previstos e punidos pelo artigo 143.º, n.º 1, do Código Penal, e de dois crimes de detenção de arma proibida, previstos e punidos pelo artigo 86º, nº 1, alínea d), da Lei nº 5/2006, de 23/02, com referência aos artigos 2º, nº 1, alínea m) e artigo 3º, nº 1, e nº 2, alíneas d), f) e g), da referida Lei.
2.
Realizado o julgamento, por acórdão proferido em 15 de Fevereiro de 2018 no Juízo Central Cível e Criminal de ... – Comarca dos ..., foi deliberado, após alteração dos factos e da qualificação jurídica, julgar a acusação parcialmente procedente, por provada, tendo o arguido sido absolvido da prática de um crime de violação, previsto e punido pelo artigo 164.º, n.º 1, alínea a), do Código Penal, e da prática de dois crimes de detenção de arma proibida, previstos e punidos pelo artigo 86.º, n.º 1, alínea d), da Lei 5/2006, de 23/02.
Tendo sido condenado: Pela prática, em autoria material e na forma consumada, de um crime de violência doméstica, previsto e punido pelo artigo 152.º, n.º 1, al. b) e n.º 2, do Código Penal, na pena de 2 (dois) anos e 6 (seis) meses de prisão; Pela prática, em autoria material e na forma consumada, de um crime de violação, previsto e punido pelo artigo 164.º, n.º 1, al. a), do Código Penal, na pena de 4 (quatro) anos de prisão; Pela prática, em autoria material e na forma consumada, de um crime de violação de domicílio agravado, previsto e punido pelo artigo 190.º, n.ºs 1 e 3, do Código Penal, na pena de 5 (cinco) meses de prisão; Pela prática, em autoria material e na forma consumada, de um crime de dano, previsto e punido pelo artigo 212.º, n.º 1, do Código Penal, na pena de 6 (seis) meses de prisão; Pela prática, em autoria material e na forma consumada, de um crime de ofensa à integridade física simples, previsto e punido pelo artigo 143.º, n.º 1, do Código Penal, na pena de 1 (um) ano de prisão; Pela prática, em autoria material e na forma consumada, de um crime de ofensa à integridade física simples, previsto e punido pelo artigo 143.º, n.º 1, do Código Penal, na pena de 1 (um) ano e 1 (um) mês de prisão; Em cúmulo jurídico das penas referidas, foi o arguido condenado na pena única de 6 (seis) anos de prisão.
Foi decidido ainda: - «[Não se aplicar], nos termos do art. 152.º, n.ºs 4 e 5, do Código Penal, ao Arguido AA as penas acessórias de proibição de contacto com a vítima, de proibição de uso e porte de armas ou de frequência de programas específicos de prevenção da violência doméstica»; - «[Não se reconhecer] «nos termos do art. 21.º, n.º 4, da Lei 112/2009, de 16 de Setembro, o actual direito de a ofendida BB a retirar da residência onde coabitou com o arguido, sita na ...., quaisquer outros bens»; - «[Não se fixar], nos termos do art. 21.º, n.º 2, da Lei 112/2009, de 16 de Setembro, e 82.º-A, do Código Penal, em favor de BB, indemnização reparadora da vítima de violência doméstica.» 3.
Inconformado, interpõe o arguido recurso directo para o Supremo Tribunal de Justiça, rematando a respectiva motivação com as conclusões que se transcrevem[1]: CONCLUSÕES 1- Foi o recorrente condenado pela prática, em autoria material e na forma consumada, de: 1 (um) crime de violência doméstica, p. e p. pelo art. 152.º, n.º 1, al. b) e n.º 2, do Código Penal, na pena de 2 (dois) anos e 6 (seis) meses de prisão; 1 (um) crime de violação, p. e p. pelo art. 164.º, n.º 1, al. a), do Código Penal, na pena de 4 (quatro) anos de prisão; 1 (um) crime de violação de domicílio agravado, p. e p. pelo art. 190.º, n.ºs 1 e 3, do Código Penal, na pena de 5 (cinco) meses de prisão; 1 (um) crime de dano, p. e p. pelo art. 212.º, n.º 1, do Código Penal, na pena de 6 (seis) meses de prisão e 2 (dois) crimes de ofensa à integridade física simples, p. e.p. pelo art. 143º, n.º 1, do Código Penal, numa pena de 1 (um) ano e 1 (um) ano e 1 (um) mês de prisão, respectivamente e em cúmulo jurídico numa pena única de 6 (seis) anos de prisão.
2- Ora, o recorrente não se conforma com os quantitativos das penas parcelares aplicadas, e, consequentemente, na pena única em que foi condenado, sem a possibilidade da mesma ser suspensa, na sua execução, por ser superior a 5 anos (art. 50.º, n.º 1 do Código Penal).
3- O Tribunal “ a quo”, condenou o recorrente, pela prática, em autoria material e na forma consumada, de um crime de violência doméstica, p. e p. pelo art. 152.º, n.º 1, al. b) e n.º 2 do C.P., na pena de 2 anos e 6 meses de prisão e pela prática, em autoria material e na forma consumada, de um crime de violação, p. e p. pelo art. 164.º, n.º 1, al. a) do C.P., na pena de 4 anos de prisão.
4- Salvo o devido respeito, entende o recorrente que é errada a conformação jurídica da douta decisão.
5- Pois, e quanto ao tipo legal do crime de violência doméstica, inexiste, no caso sub judice, fundamento para autonomizar os dois crimes em questão, punindo o recorrente pela sua prática, em concurso real, mas antes devendo o mesmo ser punido, pela prática do crime de violência doméstica, com a pena aplicável ao crime de violação, em concurso aparente – marcado por uma relação de subsidiariedade que o crime de violência doméstica apresenta perante os restantes tipos de crime.
6- Por outro lado, e no que à “ofensa sexual” diz respeito, dada como provada, pela douta sentença recorrida, no caso sub judice, entende o recorrente que não praticou nenhuma ofensa sexual na pessoa da ofendida, mas caso assim não se entendesse a sua conduta apenas se subsumiria ao artigo 164º, nº 2, alínea a) do Código Penal.
7- Os factos integrantes deste tipo de crime não se encontram devidamente, e salvo o devido respeito, preenchidos.
8- O recorrente e ofendida, como consta da matéria de facto assente, viveram cerca de 14 anos juntos, tinham uma filha, não eram dois estranhos que se conheceram naquele dia, ou naquele momento, o que implica uma relação profundamente intima relacionada com a actividade sexual de um casal heterossexual que vive maritalmente.
9- A ofensa sexual exige imputação a título de dolo, e para que se verifique o elemento intelectual do dolo é necessário que o recorrente (agente) tenha conhecimento da ilicitude ou ilegitimidade da prática da cópula.
10- O que no caso em apreço, não se verificou, pese embora, o Tribunal “a quo” tenha irrelevado, nessa parte, as declarações do recorrente (fls. 18 do douto acórdão) que : “ refere ter ocorrido com o consentimento da vítima após sua insistência, vencendo uma relutância inicial da mesma”(sublinhado nosso).
11- A convicção do Tribunal recorrido, nessa parte, fundamentou-se apenas nas declarações da ofendida, não existindo qualquer exame do foro médico-ginecológico que verificasse a obtenção forçada do coito vaginal.
12- As penas parcelares aplicadas a cada um dos crimes, salvo o devido respeito, excedem a medida permitida pela culpa e a necessária para satisfazer as finalidades da punição, em violação do disposto no artigo 71.º do Código Penal.
13- Na aplicação da medida concreta da pena dever-se-á atender aos critérios fixados nos artigos 70.º e 71.º, ambos do Código Penal, os quais estabelecem que, se ao crime forem aplicáveis penas alternativas, deverá ser dada preferência a uma pena não privativa da liberdade, conquanto estejam asseguradas, de modo adequado as finalidades da punição, as quais estão determinadas no artigo 40.º, n.º 1 do Código Penal.
14- Na verdade, o recorrente é primário quanto a crimes desta natureza, com excepção do crime de dano, em que o recorrente foi alvo de uma condenação por factos praticados no ano de 2012.
15- Os crimes de violação de domicílio, dano e ofensas à integridade física, ocorreram no mesmo contexto espácio-temporal, nos dias 19, 20 e 21 de Julho de 2016, em circunstâncias temporais determinadas, num contexto de exaltação de ânimos, envolvendo pessoas acabadas de vivenciar uma relação de ruptura conjugal.
16- Porém, o lapso de tempo entretanto decorrido e a conduta posterior do recorrente, que nunca mais perturbou os ofendidos, mostrou-se arrependido, no presente mantém contactos adequados com a ex companheira, mantém uma ligação próxima com a filha menor, é tido como um bom vizinho, trabalhador, educado e respeitador no meio social onde se insere e concluindo que está integrado a nível social, profissional e familiar, justificaria que a medida das penas parcelares fosse menos excessiva.
17- Nestes termos, deveria o Tribunal a quo ter optado pela aplicação ao recorrente de penas não privativas da liberdade, com excepção do crime de violência doméstica.
18- E quanto ao crime de violência doméstica, face aos factos dados como provados na douta sentença e às circunstâncias que a favor do recorrente militam, da qual destacamos: “ a ilicitude da sua conduta, com uma prática de violência ao longo apenas dos últimos dois anos da vivência em comum, sobretudo actuando ao nível verbal e psicológico (embora com algumas actuações físicas), mas sem grandes consequências na vítima”.
19- Deveria o Tribunal a quo, ter aplicado uma pena de prisão próxima do seu limite mínimo e suspensa na sua execução, nos termos e para os efeitos do artigo 50.º, n.º 1 do Código Penal, porquanto as necessidades de prevenção geral e especial são medianas.
20- As “finalidades da punição” são, de acordo com o artigo 40.º, n.º 1, do Código Penal “, a...
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Acórdão nº 771/16.2TELSB.E1 de Tribunal da Relação de Évora, 06 de Outubro de 2020
...1993, pág. 334 [25] Neste sentido, cf., entre outros, Ac.s do STJ de 12/09/2012, proc. n.º 1221/11.6JAPRT.S1 e de 21/11/2018, proc. n.º 574/16.4PBAGH.S1, ambos acessíveis no endereço www.dgsi.pt. [26] Cf. Prof. Figueiredo Dias, Direito Penal Português – Das Consequências Jurídicas do Crime,......
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Acórdão nº 12/19.0GBGLG.E1 de Tribunal da Relação de Évora, 28 de Abril de 2020
...caso dos autos. [12] Neste sentido, cf., entre outros, Ac.s do STJ de 12/09/2012, proc. n.º 1221/11.6JAPRT.S1 e de 21/11/2018, proc. n.º 574/16.4PBAGH.S1, ambos acessíveis no endereço www.dgsi.pt. [13] O homicídio simples, na forma tentada, é punível com pena de 8 a 16 anos de prisão (cf. a......
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Acórdão nº 771/16.2TELSB.E1 de Tribunal da Relação de Évora, 06 de Outubro de 2020
...1993, pág. 334 [25] Neste sentido, cf., entre outros, Ac.s do STJ de 12/09/2012, proc. n.º 1221/11.6JAPRT.S1 e de 21/11/2018, proc. n.º 574/16.4PBAGH.S1, ambos acessíveis no endereço www.dgsi.pt. [26] Cf. Prof. Figueiredo Dias, Direito Penal Português – Das Consequências Jurídicas do Crime,......
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Acórdão nº 12/19.0GBGLG.E1 de Tribunal da Relação de Évora, 28 de Abril de 2020
...caso dos autos. [12] Neste sentido, cf., entre outros, Ac.s do STJ de 12/09/2012, proc. n.º 1221/11.6JAPRT.S1 e de 21/11/2018, proc. n.º 574/16.4PBAGH.S1, ambos acessíveis no endereço www.dgsi.pt. [13] O homicídio simples, na forma tentada, é punível com pena de 8 a 16 anos de prisão (cf. a......