Acórdão nº 799/15.OJABRG.S1 de Supremo Tribunal de Justiça (Portugal), 23 de Maio de 2018

Magistrado ResponsávelLOPES DA MOTA
Data da Resolução23 de Maio de 2018
EmissorSupremo Tribunal de Justiça (Portugal)

ACÓRDÃO Acordam na Secção Criminal do Supremo Tribunal de Justiça: I. Relatório 1.

AA, arguido no processo acima identificado, interpõe recurso do acórdão de 3 de Novembro de 2017, do Juízo Central Criminal de Braga, que procedeu ao cúmulo jurídico das penas aplicadas neste processo e nos processos 350/15.1GBBCL e 1115/14.3GBBCL e o condenou na pena única de 16 (dezasseis) anos de prisão.

  1. Alegando, em síntese, e no essencial, que a pena é excessiva, pois que não foram levadas em devida conta as suas condições pessoais, nomeadamente a sua história de vida e estar a caminhar no sentido da sua socialização, a circunstância de os factos praticados não radicarem na sua personalidade, que não foi devidamente considerada, e que não foram devidamente ponderadas as finalidades de prevenção especial, o recorrente motiva o recurso concluindo nos seguintes termos (transcrição): «I. O presente recurso tem como objeto toda a matéria da sentença de cúmulo jurídico proferida nos presentes autos.

    II. Ponderando todos os parâmetros já analisados no acórdão recorrido, não desmazelando que a aplicação das penas tem como primígena finalidade a confiança na eficácia do próprio sistema jurídico-penal, certo é que, a aplicação da pena não deve – nem pode – ultrapassar o grau de culpa manifestado pelo agente.

    III. Salvo melhor entendimento, efetuado o cúmulo jurídico das penas a que o arguido fora condenado, somos a crer que a pena única aplicada ao arguido não é de ter por adequada ao caso sub judice.

    IV. Pelo que, uma diminuição da pena única que aqui se questiona se mostraria mais equilibrada e proporcional à defesa do ordenamento jurídico.

    V. A pena única resultante do cúmulo jurídico deverá ser reformada e substancialmente reduzida.

    VI. Foram assim violados os artigos 40.º e 71.º do Código Penal, bem como o disposto no n.º 5 do artigo 29.º da Constituição da República Portuguesa.» 3.

    Notificado nos termos e para os efeitos do disposto no artigo 413.º, n.º 1, do CPP, respondeu o Ministério Público, através da Exma. Procuradora da República, concluindo assim, no sentido da improcedência do recurso (transcrição): «1 – A moldura abstracta da pena do cúmulo jurídico a realizar in casu situa-se entre os 6 (seis) anos e os 25 (vinte e cinco) anos de prisão; 2 – Tendo em consideração todos os elementos que depõem contra e a favor do condenado – art.º 71.º do Código Penal -, designadamente, que a ilicitude dos factos que é intensa; as consequências dos mesmos; o número de vezes que o arguido agiu sobre as vítimas; o dolo na modalidade mais grave: directo; e as especiais exigências de prevenção geral e especial, mostra-se justa e adequada a pena concreta aplicada resultante do cúmulo jurídico realizado; 3 – Na verdade, inexistem circunstâncias favoráveis ao condenado que possam mitigar as circunstâncias que levaram à determinação da medida concreta da pena, por forma a que a mesma fosse fixada num limite inferior àquele que o Tribunal aplicou – 14 anos de prisão.

    Pelo que a decisão recorrida deve ser mantida na íntegra por ter feito uma correcta integração dos factos e aplicação do direito.» 4.

    Recebidos, foram os autos com vista ao Ministério Público, nos termos e para os efeitos do disposto no artigo 416.º, n.º 1, do CPP, tendo o Exmo. Procurador-Geral Adjunto emitido parecer concordante com a improcedência, nos seguintes termos: «I. A única questão submetida a reexame é a medida da pena única, fixada em 16 anos de prisão.

    Fazendo apelo às suas traumatizantes condições pessoais e familiares, pretende em suma, a redução substancial da pena, beneficiando, assim, de uma «derradeira oportunidade».

    1. A Exma. Procuradora da República, na sua resposta (1844-1849), defendeu a improcedência do recurso, considerando que a pena fixada mostra-se justa e adequada, tendo em conta a intensidade da ilicitude dos factos, as consequências dos mesmos, o número de vezes que agiu sobre as vítimas, o dolo na modalidade mais grave e as exigências de prevenção geral e especial.

    2. Acompanhamos a pormenorizada e completa fundamentação do acórdão recorrido no que respeita à dosimetria da pena, à qual nada se nos oferece acrescentar».

  2. Notificado para responder, nos termos do artigo 417.º, n.º 2, do CPP, o arguido nada disse.

  3. Colhidos os vistos e não tendo sido requerida audiência, o recurso é julgado em conferência – artigos 411.º, n.º 5, e 419.º, n.º 3, alínea c), do CPP.

    Nada obsta ao conhecimento do recurso, o qual tem por objecto um acórdão proferido pelo tribunal colectivo que aplicou uma pena de prisão superior a 5 anos e visa exclusivamente o reexame de matéria de direito, da competência deste tribunal (artigos 432.º, n.º 1, al. c), e 434.º do CPP).

    Cumpre decidir.

    1. Fundamentação 7.

    A decisão recorrida encontra-se fundamentada nos seguintes termos: 7.1. De facto «II.

    1. Factos provados 1. O arguido sofreu as seguintes condenações (datas dos crimes, das condenações e penas aplicadas): a) neste processo n.º 799/15.0JABRG do Juízo central criminal de Braga, por decisão de 3.5.2016, transitada em julgado após acórdão proferido pelo TRG e do STJ a 8.5.2017: - data dos factos: de 12 e 15 de Agosto de 2015; - tipo de crime: um crime de ofensa à integridade física simples, p. e p. pelo art. 143.º, n.º 1, do Código Penal, dois crimes de sequestro, p. e p. pelo art. 158.º, n.º 1, do Código Penal, um crime de violação, p. e p. pelo art. 160.º, n.º 1, al. a), do Código Penal, três crimes de coacção agravada, p. e p. pelos arts. 154.º, n.º 1 e 155.º, n.º 1, al. a) do Código Penal; - penas: respectivamente de 1 (um) ano e 3 (três) meses de prisão, 1 (um) ano e 2 (dois) meses de prisão, 1 (um) ano e 2 (dois) meses de prisão, 6 (seis) anos de prisão, 1 (um) ano e 10 (dez) meses de prisão, 1 (um) ano e 10 (dez) meses de prisão, 1 (um) ano e 10 (dez) meses de prisão, e pela prática dos sete crimes em concurso e operando o cúmulo jurídico das penas supra referidas, na pena única de 10 (dez) anos de prisão.

    O arguido prestou declarações mas negou a prática dos factos.

    Neste processo provou-se que: No dia 11/08/2015, por intermédio da “CC”, o arguido arrendou um quarto no apartamento sito na ..., habitação onde já residiam, em outros quartos também arrendados, a BB, o DD e o EE, pessoas que aquele, só nesse dia, conheceu.

    Ainda no referido dia 11/08/2015, o arguido começou logo a insinuar-se junto da BB, então com 57 anos de idade (nascida a ....1957), no sentido de manterem um relacionamento íntimo, o que foi recusado por aquela.

    No dia 12/08/2015, pelas 4h30m, quando o DD se encontrava a dormir no seu quarto, o arguido, por motivos não apurados, decidiu ali entrar para o agredir.

    Ao aperceber-se que a porta estava fechada à chave por dentro, o arguido começou a desferir pontapés e empurrões na mesma, até conseguir, deste modo, rebentar a fechadura e abri-la, entrando de seguida no quarto do DD, onde lhe desferiu vários murros, provocando-lhe uma hemorragia nasal.

    Verificando que o chão do quarto tinha ficado cheio de sangue, o arguido pegou numa navalha, de características não apuradas, de que previamente se havia munido e apontando-a na direcção do DD, obrigou-o a limpar o chão, para que não ficassem ali quaisquer vestígios da agressão que havia perpetrado, o que aquele fez, por recear que o arguido o agredisse com aquela navalha.

    Face à gravidade do sucedido e temendo ser alvo de novas agressões, o DD decidiu, nesse mesmo dia, abandonar aquela habitação, tendo o arguido, nessa altura, advertido o ofendido de que o mataria se o mesmo o denunciasse às autoridades policiais pelas agressões por ele perpetradas.

    Não obstante a BB ter recusado tal relacionamento íntimo, mesmo assim, desde o dia 11/08/2015 até ao dia 14/08/2015, o arguido continuou com aquela postura para com ela, pedindo-lhe inclusive o seu número de telemóvel.

    A partir do momento em que, de forma não apurada, o arguido obteve o número da ofendida, começou a enviar-lhe mensagens para o telemóvel, manifestando o seu interesse e a preocupação que sentia por ela.

    No dia 15/08/2015, cerca das 5h00m, enquanto a BB se encontrava a dormir, o arguido decidiu entrar no quarto dela, com o propósito de, mesmo contra a vontade dela, manterem relações sexuais.

    Na concretização deste seu desígnio e tendo verificado que a porta do quarto da ofendida se encontrava trancada à chave, o arguido decidiu aceder àquela divisão pela varanda exterior, comum a todos os quartos da casa.

    Para tal efeito, pelo seu quarto, situado ao lado do da ofendida (melhor ilustrado na fotografia n.º 4 de fls. 25), o arguido passou para a referida varanda e ali transpôs a divisória existente e que separa aquele espaço do da varanda do quarto da BB (melhor ilustrado nas fotografias n.º 9 e n.º 10 de fls. 26).

    Uma vez aí, forçou e levantou a persiana da porta do quarto da BB, que se encontrava descida e, nessas circunstâncias, o arguido passou pela porta que se encontrava parcialmente aberta para o interior do quarto da ofendida (melhor ilustrado nas fotografias n.º 5 e n.º 6 de fls. 25), que, entretanto, acordou com o barulho da persiana a ser levantada.

    Assustada, a BB começou a gritar e exigiu ao arguido, que imediatamente reconheceu, que saísse do seu quarto, caso contrário chamaria a polícia.

    Foi, então, que o arguido ordenou à ofendida que se calasse, dizendo-lhe que tinha sido ela quem lhe tinha aberto a porta do quarto para que ele entrasse.

    De seguida, verificando que naquela porta, que antes constatou estar fechada, se encontrava colocada a chave, o arguido destrancou-a, retirando de seguida a chave, que guardou consigo, e percebendo pelo barulho e os gritos da BB, que o EE ali acorreria, abriu a porta, querendo, desta forma, fazer crer ao mesmo que a ofendida tinha permitido a sua entrada no quarto dela.

    Tanto assim que, logo a seguir, o EE assomou ao corredor de acesso aos quartos e, apercebendo-se que o arguido se encontrava no interior do quarto da ofendida, disse-lhe, em tom alto: “que estás aí a fazer, deixa-a...

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