Acórdão nº 71/16.8GCASL.S1 de Supremo Tribunal de Justiça (Portugal), 04 de Outubro de 2018
Magistrado Responsável | LOPES DA MOTA |
Data da Resolução | 04 de Outubro de 2018 |
Emissor | Supremo Tribunal de Justiça (Portugal) |
Acordam na Secção Criminal do Supremo Tribunal de Justiça: I. Relatório 1.
AA, identificado nos autos, interpõe recurso do acórdão proferido pelo tribunal colectivo da Comarca de Setúbal, de 22 de Março de 2018, pelo qual foi condenado:
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Pela prática de um crime de homicídio, na forma tentada, p. e p. pelos artigos 131.º, 22.º, n.º 2, al. b), e 23.º do Código Penal, na pena de 6 anos e 4 meses de prisão; b) Pela prática de um crime de detenção de arma proibida p. e p. pelo art.º 86.º, n.º 1, alínea d), e n.º 4, da Lei n.º 5/2006, de 23 de Fevereiro, na pena de 2 anos de prisão; c) Em cúmulo jurídico, na pena única de 7 anos de prisão.
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Apresenta motivação de que extrai as seguintes conclusões (transcrição): «
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Do quantum das penas 1ª – O recorrente considera que tanto as penas parcelares, como a pena única resultante do cúmulo jurídico daquelas, pecam por excessivas.
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– Resulta do texto da decisão recorrida, mormente da rubrica factos provados, que a favor do ora recorrente militam as seguintes atenuantes: a) É primário; b) Admitiu ter efectuado o disparo; c) Tratou-se de acto ocasional e irreflectido na vida do arguido, que actuou no calor de uma altercação entre dois grupos, quando o ofendido BB se dirigiu para socorrer a ofendida CC; d) O arguido encontra-se plenamente inserido na sociedade; e) É tido como pessoa respeitada na comunidade em que se insere, e granjeou por parte dos seus clientes reconhecimento pelos serviços prestados, sendo considerado uma pessoa de confiança.
f) Se e quando restituído à liberdade, irá viver para zona geográfica distinta daquela onde vivia aquando da prática dos factos, 3ª - Em face de tais atenuantes, e dentro da moldura penal abstracta aplicável ao crime de homicídio simples, na forma tentada, a pena concreta a que chegou o Tribunal “a quo”, 6 anos e 4 meses, é elevada, pois corresponde a mais do quadruplo do mínimo legal.
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- Por outro lado, os argumentos aduzidos para a fixação da medida concreta da pena, nuns casos são dúbios, noutros não se repercutem na pena concreta aplicada.
Vejamos: 5ª - Afirma-se que as exigências de prevenção geral ou são médias ou elevadas, não as duas coisas ao mesmo tempo, sendo certo que em face do contexto específico em se deu o disparo, melhor explanadas supra, tais exigências de prevenção são baixas, ou quando muito médias.
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- Nunca elevadas, sendo certo que pena concreta a que o Tribunal chegou, encontra-se inflacionado pelo facto de, erradamente, se ter considerado serem elevadas.
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– Quanto às exigências de prevenção especial, foram e bem, consideradas baixas, todavia a pena concreta aplicada, não espelha tal facto, pelo contrário equipara-se, e até suplanta, penas aplicadas pela prática do mesmo crime, mas em que as exigências de prevenção especial são elevadas.
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– Quanto o grau de ilicitude, foi considerado “mediano/grave”, quando tal como mencionamos a propósito das exigências de prevenção também o grau de ilicitude da conduta de agente ou é médio ou grave, as duas ou mesmo tempo é que não sob pena de a situação ser dúbia! 9ª - E, também aqui em face do contexto específico em se deu o disparo, melhor explanado supra, nomeadamente na al. c), o grau de ilicitude é baixo, ou “in extremis”, deve ser considerado médio, sendo que, também a pena aplicada repercute um grau de ilicitude elevada.
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– Depois não se pode olvidar, ao nível dos sentimentos manifestados no cometimento do crime e os fins ou motivos que o determinaram, que por um lado actuou para “proteger” a companheira que se encontrava envolvida fisicamente com os ofendidos, numa ratio de 2 para 1; 11ª - Por outro lado já existia, previamente aos factos aqui em causa, divergências/desentendimentos entre ambos os casais; este conjunto de factos de algum modo atenua/mitiga a capacidade de discernimento do recorrente.
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- Ao nível das condições pessoais o arguido tal como mencionado supra é tido como pessoa respeitada na comunidade em que se insere, e granjeou por parte dos seus clientes reconhecimento pelos serviços prestados, sendo considerado uma pessoa de confiança; 13ª - Finalmente além de ser primário, tratou-se, inequivocamente, de um acto ocasional na vida do arguido, que, certamente de futuro não mais se repetirá.
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- De todo o supra exposto, tendo como pano de fundo que, no quadro legislativo actual, a culpa e a prevenção são os traços norteadores da medida da pena, sendo que esta visa a protecção dos bens jurídicos e reintegração do agente na sociedade.
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– A pena concreta aplicada pela prática de um crime de homicídio na forma tentada, p. e p. no arts. 13.º, 22.º e 23.º do CP, é excessiva, pelos fundamentos supra explanados e espelha, essencialmente, a vertente punitiva repressiva das penas, quando o acento tónico deve ser colocado na vertente, preventiva ressocializadora, sobretudo ao nível da prevenção especial positiva.
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- Além de que, foi igualmente exagerada, em face da jurisprudência, que tem aplicado penas inferiores a casos de homicídio tentado, mas qualificado nos termos do 132.º n.ºs 1 e 2 .
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– A pena aplicada ao recorrente ultrapassou o limite da culpa, sendo que a aplicação das penas visa a protecção dos bens jurídicos e a reintegração do agente na sociedade.
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- Tudo ponderado ao recorrente deverá, ser aplicada, pela prática de um crime de homicídio, na forma tentada, p .p artigos 131.º, 22.º, e 23.º, todos do Código Penal, pena não superior a 3 anos de prisão.
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- Aplicando, “mutatis mutandis “ à condenação pela prática de um crime de detenção de arma proibida, os critérios supra, conjugados com a correcta apreciação crítica de todas as atenuantes que militam a favor do arguido, e harmonizando a pena aplicada, com as de casos análogos, em detrimento da pena de 2 anos de prisão aplicada, deverá ser-lhe aplica a pena de 1 ano de prisão.
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- Em cúmulo jurídico, deverá ser aplicada ao recorrente a pena única de 4 anos de prisão, caso assim se não entenda, a título subsidiário, apenas admitimos algum aumento do quantum da pena, quanto á prática do crime de homicídio tentado, para, no máximo 4 anos.
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- Neste ultimo caso, em cúmulo jurídico, deverá ser aplicada ao recorrente a pena única de 4 anos e 6 meses de prisão.
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Da suspensão de execução da pena 22ª - O Tribunal “a quo”, porque a pena única ultrapassava o limite previsto no art.º 50 do CP, não ponderou sequer a possibilidade de suspensão da execução da mesma, todavia após o abaixamento da pena pelo qual pugnamos supra, tal possibilidade terá que ser ponderada.
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– Pesem embora alguma relutância deste Tribunal, na suspensão das penas, nos crimes de homicídio, nos dois acórdãos mencionados na motivação, tal instituto foi decretado.
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- Tais decisões, são a prova, da flexibilidade da jurisprudência, e da respectiva adequação ao caso concreto, e, se o legislador não excluiu, dentro do limite estabelecido no art.º 50.º n.º 1 do CP, e verificados os requisitos aí previstos, a aplicação a determinados tipos de crime de tal instituto, não pode, sob pena de flagrante subversão da letra e do espirito da lei, o intérprete fazê-lo.
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- Nem se argumento que no caso dos autos, pelo facto de o crime ter sido praticado a título de dolo directo, afasta a possibilidade de aplicação de tal instituto.
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- É que “in casu” encontramos perante a prática de um crime de homicídio, tentado p. p art.º 131 do CP, e, em qualquer das situações anteriormente mencionados o crime era o mesmo, mas qualificado pelo 132 nº 2.
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- Do teor do relatório social, em parte plasmado nos factos provados, facilmente se extrai a conclusão de que pode ser “formulado um juízo de prognose favorável no âmbito das exigências de prevenção especial em face do arrependimento manifestado pelo arguido em audiência, e do facto de ser pessoa social e familiarmente bem integrada.
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– Acresce que, para o legislador a suspensão da pena deve arrancar desde logo de considerações de natureza especial preventivas, no sentido de que, é possível formular um juízo de prognose favorável quanto ao seu comportamento futuro.
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- Quanto às exigências de prevenção especial, importa realçar, mais uma vez, que que o arguido é pessoa de trabalho, está inserido social, familiar e laboralmente, é tido como pessoa respeitada na comunidade em que se insere, e granjeou por parte dos seus clientes reconhecimento pelos serviços prestados, sendo considerado uma pessoa de confiança.
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- Se e quando restituído à liberdade, irá viver para zona geográfica distinta daquela onde vivia aquando da prática dos factos, não tem antecedentes criminais; 31ª - Perante este conjunto de circunstâncias, conjugadas com o facto de constar do texto da própria decisão recorrida que tudo “… se passou momentaneamente na sequência de uma altercação, no calor do momento … não houve qualquer actuação calculada ou reflexiva …”.
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- Tudo aponta pois para um acto isolado na sua vida, que não voltará a repetir-se, sendo certo que este nunca anteriormente teve qualquer contacto com o sistema prisional (no qual se encontra vai para 18 meses) e que manutenção da efectividade da pena irá trazer-lhe um risco de desestruturação e, um corte no esforço reintegrativo; 33ª – As exigências de prevenção ficam plenamente salvaguardas através da aplicação de pena suspensa na respectiva execução, acompanhada de regime de prova.
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- O tribunal da primeira instância deverá ainda elaborar o plano de reinserção social do arguido, de acordo com o art. 54.º do C. Penal, plano esse que incluirá, para além do mais, que se entenda por conveniente, e como condição de suspensão da pena, o cumprimento da seguintes obrigações: a) Pagar ao demandante a quantia fixada na primeira Instância; b) Não utilizar nem ter em seu poder qualquer arma de fogo ou munições, art. 52.º n.º 2 al. f) do C. Penal.
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- A decisão recorrida violou o disposto nos artigos, 40.º n.ºs 1 e 2, 50.º nºs 1 e 5, art. 52.º nº 2 al. f), 53.º nºs 1 a 3, 54.º, 70.º e 71.º, todos do CP».
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Respondeu o Ministério Público, dizendo, em conclusão, que...
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