Acórdão nº 9633/16.2T8LSB.L1.S1 de Supremo Tribunal de Justiça (Portugal), 19 de Dezembro de 2018

Magistrado ResponsávelOLINDO GERALDES
Data da Resolução19 de Dezembro de 2018
EmissorSupremo Tribunal de Justiça (Portugal)

Acordam no Supremo Tribunal de Justiça: I – RELATÓRIO AA e mulher, BB, instauraram, em 13 de abril de 2016, na Instância Central Cível de …, Comarca de Lisboa, contra Banco CC, S.A., ação declarativa, sob a forma de processo comum, pedindo que o Réu fosse condenado a restituir-lhes a quantia de € 53 380,14, acrescida de juros, à taxa supletiva legal para as operações comerciais, desde a citação até integral e efetivo pagamento sobre a quantia de € 50 000,00.

Para tanto, alegaram, em síntese, serem há mais de dez anos clientes do R. (antes designado por Banco DD), tendo pouca instrução escolar e sendo avessos ao risco; no dia 12 de abril de 2006, a A. foi abordada pelo seu gestor de conta, que lhe apresentou um produto financeiro de características similares às de um depósito a prazo, mas melhor remunerado, sem qualquer risco; convencida, a A. subscreveu uma “obrigação EE”, no valor de € 50 000,00; não lhes foram dadas as notas informativas da operação, com as condições, à qual só tiveram acesso em 2015; a A. nunca teria aceitado tal produto se lhe tivessem explicado as suas características; a FF (depois denominada GG) pagou os respetivos juros até 30 de abril de 2015, por intermédio do R.; o R., como intermediário financeiro, levou a A. a convencer-se de que o Banco garantia o retorno do capital, violando os deveres de informação, lealdade e proteção, constituindo-se na obrigação de indemnizar os AA.

Contestou o R., por exceção, arguindo a prescrição, e por impugnação, alegando o cumprimento dos seus deveres, para concluir pela absolvição do pedido.

Realizou-se a audiência prévia, durante a qual foi proferido o despacho saneador, identificado o objeto do litígio e enunciados os temas da prova.

Prosseguindo o processo, e realizada a audiência de discussão e julgamento, foi proferida, em 5 de maio de 2017, a sentença, julgando-se a ação totalmente improcedente.

Inconformados, os Autores apelaram para o Tribunal da Relação de …, que, por acórdão de 5 de junho de 2018, julgando a apelação procedente, revogou a sentença e condenou o Réu a pagar aos Autores a quantia peticionada na ação.

Inconformado, o Réu recorreu para o Supremo Tribunal de Justiça e, tendo alegado, formulou essencialmente as conclusões:

  1. A decisão recorrida violou, por errada aplicação e interpretação do disposto nos arts. 7.º, 290.º, n.º 1, alínea a), 304.º-A, 312.º a 314.º-D e 323.º a 323.º-D, do CVM, 4.º,12.º e 19.º, do DL n.º 69/2004, de 25 de março, e da Diretiva 2004/39/CE e 220.º, 232.º e 236.º, 483.º e seg., 595.º e 615.º do Código Civil.

  2. À data, o intermediário financeiro não tinha obrigação legal de informar o investidor sobre os riscos do instrumento financeiro subscrito.

  3. Não houve do Réu a prestação de qualquer informação falsa ou a utilização de artifício falacioso ou subterfúgio ardiloso que fosse apto a enganar o A.

  4. Houve do A. um erro espontâneo, mas nunca um erro provocado.

  5. Fica a cargo dos credores/autores alegar e provar a ilicitude.

  6. Não pode haver presunção de ilicitude quanto ao incumprimento de deveres acessórios.

  7. A origem dos deveres acessórios não radica no contrato, mas no princípio da boa-fé na execução dos contratos.

  8. A violação do dever de informação no contrato de intermediação financeira de receção e transmissão de ordens não implica qualquer (inexistente) presunção de ilicitude.

  9. Tinha de ser o A. a alegar e provar as concretas informações que o R. estava obrigado a dar, e não deu.

  10. A condenação no pagamento da integralidade do valor desembolsado é manifestamente excessiva e não cumpre com o critério da teoria da diferença prevista no art. 566.º, n.º 2, do CC, uma vez que dá azo a que o A. venha depois a receber o que lhe couber do emitente do título.

  11. O funcionário do R. estava absolutamente convencido da segurança do investimento e da adequação do mesmo ao perfil de investidor do A.

  12. Uma tal conduta apenas pode ser reconduzível à mais leve das formas de negligência – a negligência inconsciente.

  13. Quando a ação foi proposta, já se encontrava prescrita qualquer putativa responsabilidade do R. (art. 324.º do CVM).

Com a revista, o Réu pretende a revogação da decisão recorrida e a sua substituição por outra que o absolva do pedido.

O Réu juntou ainda dois pareceres jurídicos.

Contra-alegaram os Autores, no sentido da improcedência do recurso.

Corridos os vistos legais, cumpre apreciar e decidir.

Neste recurso, está em discussão a responsabilidade civil por intermediação financeira, designadamente em resultado da violação do dever de informação, assim como a prescrição do direito.

II – FUNDAMENTAÇÃO 2.1. No acórdão recorrido, foram dados como provados os seguintes factos: 1.

Os AA. são gerentes de HH, Lda., a qual se obriga com a assinatura de um gerente.

  1. O R. tem por objeto o exercício de atividades consentidas por lei aos bancos, sendo que, anteriormente, tinha a firma Banco DD, S. A.

  2. A totalidade das ações representativas do capital social do Banco DD, S. A., foi nacionalizada pelo DL n.º 62-A/2008, de 11 de novembro.

  3. Até à nacionalização, a totalidade do capital social do DD era detida, na íntegra, pela dd, SGPS, S.A., que, por sua vez, era detida, na íntegra, pela FF, SGPS, S.A., que, a partir de 19 de julho de 2010, alterou a firma para GG, SGPS, S. A.

  4. À data da nacionalização, o R. era, também, intermediário financeiro em instrumentos financeiros, estando, como tal, registado na Comissão de Mercado de Valores Mobiliários (CMVM), desde, pelo menos, o ano de 1993.

  5. Os AA. são, há mais de dez anos, clientes do R.

    , através da agência de ….

  6. No início de 2006, na sequência de mais uma auditoria às contas do R., o Banco de Portugal ordenou que este reforçasse os capitais próprios, através de um aumento de capital subscrito pelos acionistas.

  7. Os funcionários do balcão onde os AA. tinham depositadas as suas quantias estavam de boa-fé e acreditavam que os produtos que vendiam...

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