Acórdão nº 168/06.2TBVGS.P1.S1 de Supremo Tribunal de Justiça (Portugal), 29 de Janeiro de 2019

Magistrado ResponsávelMARIA OLINDA GARCIA
Data da Resolução29 de Janeiro de 2019
EmissorSupremo Tribunal de Justiça (Portugal)
  1. RELATÓRIO 1. Em 2006, AA intentou inquérito judicial contra “BB, Ldª” e os titulares das quotas sociais desta, CC, DD e EE (esta na qualidade de gerente nomeada em abril de 2005; e ambas na qualidade de herdeiras do sócio FF, falecido em setembro de 2002) e ainda contra GG, na qualidade de gerente da “BB, Ldª” (nomeado por deliberação de abril de 2005), com os seguintes objetivos: realização de inquérito judicial à sociedade “BB, Ldª”, para averiguar questões que enumerou em sede de articulado: - Prestação de contas dos exercícios dos anos de 1997 a 2005 (com prévia nomeação de gerente para elaboração das mesmas) para submissão das mesmas a aprovação da assembleia geral de sócios; - Distribuição de lucros; pagamento de lucros ao autor; suspensão imediata dos requeridos CC, EE e GG das funções de gerente, proibindo-os de interferirem nas tarefas conferidas ao gerente nomeado.

    2.

    Por despacho de 18.2.2010 (fls. 531 a 538), foi admitida a cumulação do pedido de inquérito judicial, previsto nos artigos 1479º e seguintes do C.P.C. [correspondente ao atual art.1048º do CPC], com o pedido de inquérito por falta de apresentação de contas e de deliberação sobre as mesmas, previsto no artigo 67º do C.S.C.

    Os autos prosseguiram para averiguação das questões objeto do pedido de inquérito (stricto sensu) em simultâneo com a prestação de contas referentes aos exercícios de 1996 a 2010, desiderato que a senhora administradora judicial concretizou, elaborando as contas referentes aos anos de 1996 a 2005 por recurso a documentos contabilísticos, documentos de suporte contabilístico (incluindo a apreendida nas instalações da Polícia Judiciária), informações prestadas pelas partes, pelo TOC da requerida e por entidades bancárias (estas limitadas às autorizações para o efeito concedidas e declaradas nos autos), com vinculação ao resultado e valor de caso julgado material da sentença judicial transitada em julgado proferida no âmbito da ação instaurada pelo autor contra a aqui sociedade requerida e que correu termos sob o nº 528/03.0TBVGS do extinto Tribunal de Vagos, na parte em que pela mesma foi declarado que os negócios referentes a 77 lotes da sociedade foram celebrados por valores que totalizam o montante global de € 5.188.495,73; e elaborando as contas referentes aos anos de 2006 a 2010 por recurso à informação contida nas IES.

    1. A prestação de contas para determinação e posterior afetação/distribuição do lucro obtido pela atividade da sociedade requerida ao longo dos anos de 1996 a 2010 consubstancia o objetivo último do pedido do inquérito deduzido pelo autor, para os quais as questões objeto do pedido de averiguação/inquérito que pelo requerente foi ab initio deduzido configuram factos instrumentais e/ou dependentes, precisamente da realização das contas dos exercícios da sociedade.

    2. Foram elaborados os relatórios de gestão e as contas da sociedade referentes aos exercícios de 1996 a 2006 e 2006 a 2010, juntas a fls. 864 e seguintes e 1281 e seguintes, cujo resultado a senhora administradora justificou referindo: 4.1. Limitações na elaboração das contas referentes aos anos de 1996 a 2006, decorrentes da dificuldade em obter informação por existirem algumas falhas nos diários contabilísticos, traduzidas na ausência de documentação no diário de operações diversas, nos meses de agosto a dezembro de 1996 e na maioria dos meses nos anos posteriores, impossibilitando a verificação da veracidade das informações; 4.2. A consideração da venda de 33 lotes descrito no documento n.8, de maio de 2001 (que em sede de assembleia geral retificou para 36 lotes) pelos valores pelas mesmas declarados, por ausência de sentença para correção dos mesmos (não obstante a discrepância com os valores de venda de 77 lotes fisicamente idênticos e cujos valores de venda foram corrigidos por sentença no âmbito do processo 528/03OTBVGS); 4.3. O apuramento e correção dos valores em falta relativamente à venda de 77 lotes e os registos das mesmas na contabilidade correspondente à diferença entre os montantes dos preços que para as ditas vendas resultaram demonstrados no âmbito ação judicial e os preços constantes das escrituras públicas; 4.4. Creditou a conta de juros e debitou a conta de sócios no valor de Esc.

      3.670.000$00, correspondentes aos juros calculados no documento n.15 de 15.09.1998 sobre quantias emprestadas por CC à sociedade, por entender não serem devidos; 4.5. No documento n. 1 do mês 3 de 1998, retificou a conta dos sócios por contrapartida das contas 31138 e 62298, por estas terem mantido saldos que já se encontravam atrasados em 1997, no valor de Esc.

      55.7778,660,90, retificação que operou (conforme esclarecimento prestado em diligência para o efeito designada) debitando créditos inscritos em benefício dos sócios nas contas 31 (conta de compras) e 62 (conta de fornecimentos) e creditando-os na conta 25; 4.6. Creditou as contas nº … e … (de outros devedores e credores) pelos valores de €42.407,62, e debitou-os na conta de sócios (n.25, como dívida dos sócios à sociedade) por entender que, na falta de documentos justificativos daqueles valores da conta 268, estes são da responsabilidade dos sócios; 4.7. De 2005 a 2010 a conta de accionistas/sócios manteve o mesmo valor no lado do passivo, e sofreu alterações no lado do ativo face aos saldos apresentados pela sociedade; 4.8. Depois das alterações efetuadas na conta de sócios procedeu a cálculo de juros sobre os valores que cada sócio devia à sociedade no final de cada ano desde 1996 até 2010, às taxas sucessivas de 10%, 7% e 4%, conforme portarias nº 1171/95 de 25.09, 263/99 de 12.04 e 291/03 de 08.04.

    3. Submetidas a apreciação e deliberação no âmbito de assembleia geral de sócios realizada em 20.11.2015, a proposta de aprovação das contas apresentada pela senhora perita/administradora judicial foi rejeitada com os votos contra dos sócios CC (titular de quota de €2.693,51) e EE (esta como representante comum dos herdeiros de FF, titular de quota de € 1.316,83), e o voto favorável de HH (titular de quota de 1.975,24).

      6.

      Notificados para se pronunciarem sobre as contas e sobre os fundamentos da não aprovação das mesmas, os sócios CC, DD e EE, alegaram que as contas submetidas à aprovação dos sócios são decalque das elaboradas pelos dois dos três peritos/ROC’s nomeados no âmbito da (tentativa de) transação que formalizaram nos autos (o ROC indicado pelo autor e o ROC indicado pelos ROCs indicadas pelas partes), das quais diverge apenas quanto à exclusão do saldo de Esc: 172.813.147$20 em conta do II– Portugal, e à consideração da venda dos 33 lotes descritos no documento n. 08.05.2001 pelos valores declarados, portanto, sem correção por analogia à correção dos valores das vendas dos 77 lotes que foram objeto de apreciação judicial no âmbito da ação nº 528/03.0TBVGS (fls. 912 e seguintes e 1302 e seguintes).

      Mais alegaram que, expurgadas dos efeitos artificialmente introduzidos pela sentença proferida no processo n. 528/03.0TBVGS, as ditas contas correspondem às apresentadas e aprovadas em assembleia geral de 16.11.2013 (fls. 1303a).

      Excluindo a questão sobre a qual recaiu já despacho transitado em julgado (invocada ausência de idoneidade dos presentes autos e requerida extinção da instância em consequência e na sequência da elaboração das contas pela gerência desde 2006) justificaram a não aprovação das contas alegando: a) Inexistir fundamento, de facto e de direito, para a correção do valor das vendas de 77 lotes, alegando que na ação n. 528/03 não houve apreciação de mérito do pedido de condenação dos réus no pagamento dos montantes líquidos e ilíquidos resultante da atividade da ré sociedade, aqui requerida porque o autor foi considerado para ilegítima para o mesmo por preterição de litisconsórcio necessário ativo, com todas as consequências daí decorrentes, mormente aquelas que aqui se visam alcançar quanto ao valor atribuído aos 77 lotes e terreno alienados.

      b) Inexiste fundamento para imputar como dívida dos ex-sócios gerentes os pretensos ‘desvios de dinheiros’ decorrentes das ‘supostas’ vendas à margem da contabilidade.

      c) Inexiste fundamento legal ou qualquer base técnico-contabilística para a liquidação de juros a cargo dos sócios CC e JJ e a favor da sociedade, que assenta no único pressuposto de que os apuros das vendas obtidos à margem da contabilidade teriam sido apropriados por aqueles, interpretação que contraria o teor da sentença proferida no processo nº 528/03.0TBVGS que deu como não provado que se tivessem apropriado de quaisquer quantias.

      d) Inexiste fundamento para o cálculo dos ditos juros à taxa de juro comercial atendendo à qualidade de não comerciante do gerente, pelo que os juros considerados apenas poderiam ser os civis e, nesse caso, após a citação.

      e) As contas do ano de 2007 revelam a venda de um ativo (lote de terreno para construção) sem que em contraponto seja considerado o respetivo ‘custo de existência’ acumulado na conta ‘produtos e trabalhos em curso’, em tudo equivalente ao tratamento contabilístico dado pelo TOC responsável pelas contas da sociedade, que apenas demonstra o ‘seguidismo’ da senhora administradora em relação ao trabalho daquele.» 7. Foi proferida sentença, na qual se determinou a correção das contas elaboradas, impondo a alteração das mesmas com a supressão dos juros liquidados a cargo dos sócios CC e JJ. No mais, considerou-se que as contas se mostravam corretamente elaboradas.

    4. ...

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