Acórdão nº 8/15.1GGVNG.P1.S1 de Supremo Tribunal de Justiça (Portugal), 18 de Setembro de 2018

Magistrado ResponsávelMANUEL AUGUSTO DE MATOS
Data da Resolução18 de Setembro de 2018
EmissorSupremo Tribunal de Justiça (Portugal)

Acordam no Supremo Tribunal de Justiça: I – RELATÓRIO 1.

Por acórdão do Tribunal Colectivo do Juízo Central Criminal de Vila Nova de Gaia – Juiz 3 – Comarca do Porto, foi o arguido AA, [...], condenado «como autor imediato, sob a forma consumada e em concurso efectivo, de um crime de tráfico e outras actividades ilícitas, p. e p. pelos arts. 14.º, n.º 1, 26.º, do C.P. e 21.º, n.º 1, do Decreto-Lei n.º 15/93, de 22 de Janeiro, por referência à Tabela I-C a ele anexa, cujo último ato ocorreu em 10-02-2015, na pena de 4 (quatro) anos e 6 (seis) meses de prisão, de um crime de detenção de arma proibida, p. e p. pelos arts. 14.º, n.º 1, 26.º, do C.P. e 2.º, n.º 1, als. m), ax), n.º 5, al. g), 3.º, n.º 2, al. e), 4.º, n.º 1, e 86.º, n.º 1, al. d), do Regime Jurídico das Armas e suas Munições, praticado em 10-02-2015 na pena de 4 (quatro) meses de prisão, e de um crime de tráfico e outras actividades ilícitas, p. e p. pelos arts. 14.º, n.º 1, 26.º, do C.P. e 21.º, n.º 1, do Decreto-Lei n.º 15/93, de 22 de Janeiro, por referência à Tabela I-C a ele anexa, cujo último ato ocorreu em 02-02-2016, na pena de 4 (quatro) anos e 6 (seis) meses de prisão».

Em cúmulo jurídico, foi o arguido condenado na pena única de 6 (seis) anos de prisão.

2.

Inconformado, interpõe o arguido o presente recurso «da matéria de facto e de direito da decisão condenatória proferida», extraindo da respectiva motivação as seguintes conclusões: «CONCLUSÕES (Art.º 412.º, n.º 1 e n.º 2 do C.P.P.) Da condenação pelo crime de tráfico de estupefacientes 1. Ora, considera o arguido que, face à prova produzida, foi este erradamente condenado pela prática de 2 (dois) crimes de tráfico de estupefacientes, p.p. pelo art.º 21.º n.º 1 do DL 15/93, de 22/1 devendo antes sim ter sido condenado pela prática de 2 (dois) crimes de tráfico de estupefacientes de menor gravidade previstos e punidos pelo artigo 25.º do acima referido Decreto- Lei.

  1. As substâncias transaccionadas pelo arguido são exclusivamente cannabis, e, não obstante o Decreto-Lei n.º 15/93 não aderir totalmente à distinção entre drogas duras e drogas leves, não deixa no preâmbulo referir uma certa gradação de perigosidade das substâncias, dando um passo nesse sentido com o reordenamento em novas tabelas e daí extraindo efeitos no tocante às sanções, e de afirmar que “A gradação das penas aplicáveis ao tráfico, tendo em conta a real perigosidade das respectivas drogas afigura-se ser a posição mais compatível com a ideia de proporcionalidade”, havendo, pois, que atender à inserção de cada droga nas tabelas anexas, o que constitui indicativo da respectiva gradação, pois a organização e colocação nas tabelas segue, como princípio, o critério da sua periculosidade intrínseca e social.

  2. O crime de tráfico de menor gravidade, previsto no art.º 25.º do DL 15/93, de 22-01, como a sua própria denominação legal sugere, caracteriza-se por constituir um minus relativamente ao crime matricial, previsto no art.º 21.º do diploma citado.

  3. Trata-se de um facto típico cujo elemento distintivo do crime reside, apenas, na diminuição da ilicitude do facto, redução que o legislador impõe seja considerável, indicando como factores aferidores do menor grau da ilicitude do facto, a título meramente exemplificativo, os meios utilizados, a modalidade ou as circunstâncias da acção e a qualidade (haxixe) ou quantidade das plantas substâncias ou preparações.

  4. Tal aferição, consabido que a ilicitude do facto se revela, essencialmente, no seu segmento objectivo, com destaque para o desvalor da acção e do resultado, deverá ser feita a partir de todas as circunstâncias que, em concreto, se revelem e sejam susceptíveis de aumentar ou diminuir a quantidade do ilícito, quer do ponto de vista da acção, quer do ponto de vista do resultado.

  5. Considerando, porém, a limitada dimensão da actividade de tráfico imputada ao arguido era, ao tempo da prática dos factos ilícitos, adicto de haxixe, esse consumo inegavelmente esbateu-lhe os critérios normais de comportamento socialmente aceite, determinando uma inequívoca diminuição da sua capacidade valorativa e de autodeterminação nomeadamente no que se refere à ilicitude dos actos ligados ao consumo e eventual tráfico de haxixe.

  6. Ilicitude que, destarte, mostra-se diminuída, atenta a ainda pouca significativa quantidade de produto estupefaciente apreendido e o facto de os autos não fornecerem elementos de facto que permita extrair uma actividade matricial de tráfico de estupefacientes, sendo ele próprio consumidor de substâncias psicotrópicas.

  7. Acresce que a quantidade de haxixe apreendida não obstante ser superior ao limite quantitativo máximo de detenção de substâncias psicotrópicas previstas na lei para o consumo, a conduta do arguido enquadrar-se-ia, ainda, atenta essa não muito significativa quantidade de produto estupefaciente apreendido, na previsão do art.º 25.º da Lei n.º 15/93, de 22 de Janeiro, sendo certo que a substância estupefaciente apreendida ao arguido era também destinada ao seu consumo pessoal.

  8. Assim, a conduta do arguido deve ser considerada como integrando a prática de 2 (dois) crimes de tráfico de menor gravidade, p. e p. pelo art.º 25.º da Lei 15/93 de 22 de Janeiro, e a pena a aplicar deve ser obtida de acordo com os limites daquele normativo e suspensa na sua execução, sujeita a regime de prova.

  9. Pelo que face à prova produzida nos presentes autos a conduta do arguido deveria enquadrar-se nos termos previstos no art.º 25.º do D.L. 15/93, de 22/01 e não nos termos previstos no art.º 21.º do mesmo D.L.

  10. No caso concreto do arguido AA temos de destacar o número reduzido de consumidores a quem se destinaria parte do produto na posse do arguido, uma vez que ele próprio afectava produto estupefaciente para seu próprio consumo, bem como a natureza pouco viciante da substância apreendida – situada na escala de menor danosidade social – e a actividade circunscrita à área de residência do próprio.

  11. Assim, todas as circunstâncias objectivas, apuradas e descritas no Acórdão, apontam no sentido de uma dimensão pouco gravosa da imagem global do facto, não se vislumbrando possível concluir estarmos em presença de uma estrutura organizativa substancial, antes se destacando o cariz doméstico e os procedimentos básicos de venda do produto estupefaciente, nada inculcando, por outro lado, a existência de qualquer desígnio de obter um diferencial com expressão monetária, ou seja de obtenção de proventos económicos elevados, atenta a pouca quantia em dinheiro que foi apreendida ao arguido Ivo.

  12. Isto posto, temos de concluir que o pouco dinheiro encontrado em casa do arguido não é indicador de uma actividade subsumível à previsão do artigo 21.º, n.º 1.

  13. Parece-nos, pois, que tal circunstancialismo sustentam a subsunção da conduta do arguido ao crime de tráfico de menor gravidade previsto e punido pelo citado art.º 25.º, sendo claramente excessiva a integração no tipo matriz plasmado no artigo 21.º.

  14. Reflectindo-se tal convolação na medida da pena aplicada ao arguido pelo que não pode o arguido concordar de todo em todo com uma condenação pela prática de 2 (dois) crimes de tráfico de estupefacientes p. e p. pelo art.º 21.º do DL n.º 15/93 de 22/01, devendo antes sim, ter sido condenado pela prática de 2 (dois) crimes de tráfico de estupefacientes de menor gravidade p. e p. pelo art.º 25.º alínea a) do mesmo DL n.º 15/93 de 22/01.

    Da condenação pelo crime de detenção de arma proibida 16. O arguido considera que a pena parcelar de 4 (quatro) meses de prisão efectiva pela prática do crime de detenção de arma proibida é manifestamente excessiva e desproporcional atento por um lado o facto de o referido canivete se encontrar no seu quarto e por outro à ausência de antecedentes criminais.

    Deficiente fixação da medida concreta da pena: 17. Na determinação concreta da pena o tribunal atende a todas as circunstâncias que não fazendo parte do tipo de crime, depuseram a favor do agente ou contra ele, considerando nomeadamente; • A ilicitude do facto grau, o modo de execução e a gravidade das suas consequências, bem como o grau de violação dos deveres impostos ao agente; • A intensidade do dolo ou negligência; • Os sentimentos manifestados no cometimento do crime, os fins, os motivos que o determinam; • As condições pessoais do agente e a sua situação económica; • A conduta anterior e posterior aos factos; • A falta de preparação para manter uma conduta licita, manifestada no facto quando essa falta deva ser censurada através da aplicação da pena.

  15. O arguido necessita de uma oportunidade e não de prisão, pelo que, faria todo o sentido que a pena aplicada fosse muito inferior e, sobretudo suspensa na sua execução.

  16. É evidente que, o tribunal deverá correr um risco prudente, uma vez que esperança não é seguramente certeza. Ou seja, ninguém pode assegurar que um arguido a quem é aplicada uma pena de prisão suspensa não venha, de futuro, e mesmo no decorrer do período da suspensão, a cometer um novo crime.

  17. Porém há sempre que correr algum risco, embora um risco calculado, devendo atender-se na prognose a efectuar à personalidade do arguido, às suas condições de vida, à conduta anterior e posterior ao facto punível e às circunstâncias deste, ou seja, devem ser valoradas todas as circunstâncias que tornam possível uma conclusão sobre a conduta futura do arguido.

  18. Estamos, assim, em crer que existe uma prognose favorável ao arguido em termos que permitem ser-lhe aplicada uma pena inferior e repita-se, suspender-lhe a execução da pena de prisão em que vier a ser condenado, evitando assim, o contacto com o meio prisional do que resta de saudável da sua personalidade.

  19. Podendo, afirmar-se que relativamente ao arguido é possível formular um juízo favorável no tocante às exigências de prevenção de futuras delinquências podendo formular-se um juízo de prognose social favorável tendo o arguido interiorizado a gravidade dos actos praticados no passado, tendo...

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