Acórdão nº 1173/14.OT2AVR.P1.S1 de Supremo Tribunal de Justiça (Portugal), 19 de Dezembro de 2018

Magistrado ResponsávelFÁTIMA GOMES
Data da Resolução19 de Dezembro de 2018
EmissorSupremo Tribunal de Justiça (Portugal)

Acordam no Supremo Tribunal de Justiça I. RELATÓRIO 1. AA instaurou acção declarativa com processo comum contra: 1ºs) - BB e CC, na qualidade de herdeiros de DD; 2ª) - EE, Ld.ª; 3º) - Fundo de Garantia Automóvel, pedindo que os réus sejam condenados a pagar-lhe:

  1. Quantia nunca inferior a 3.224.000,00 € (três milhões duzentos e vinte e quatro mil euros), a título de ressarcimento pelos danos patrimoniais decorrentes da incapacidade permanente de que a autora ficou a padecer (incapacidade para o exercício de qualquer profissão); b) Pelo quantum doloris, a quantia de 500.000,00 € (quinhentos mil euros); c) Pelo dano estético, a quantia de 500.000,00 € (quinhentos mil euros).

    d) A título de danos não patrimoniais, quantia nunca inferior a 1.000.000,00 € (um milhão de euros); e) A título de obras de adaptação da casa onde reside a autora, o valor de 24.787,30 € (vinte e quatro mil setecentos e oitenta e sete euros e trinta cêntimos); f) A quantia de 66.833,26 € (sessenta e seis mil, oitocentos e trinta e três euros e vinte e seis cêntimos) a título de assistência de uma 3ª pessoa (salários deixados de auferir pelo progenitor da autora); g) A importância de 400.000,00 € (quatrocentos mil euros) devida pela assistência de uma 3ª pessoa para toda a sua vida; h) Montante, a liquidar em execução de sentença, referente a ajudas técnicas de que a autora carece; i) Qualquer tratamento, intervenção cirúrgica, internamento ou medicamentos que a autora venha a necessitar por ordem médica, a liquidar posteriormente; j) O montante de 334,12€, a título de despesas médico-medicamentosas; l) Juros de mora sobre todas as quantias supra referidas, calculados à taxa legal, desde a citação, até efectivo e integral pagamento.

    Para substanciar os pedidos formulados, alegou, em síntese, ter sido vítima de um acidente de viação quando se fazia transportar numa viatura conduzida pelo filho dos 1ºs réus, viatura essa que era propriedade da 2ª ré e relativamente à qual não tinha sido celebrado um contrato de seguro que garantisse a responsabilidade civil decorrente de eventos dessa natureza.

    Mais, alegou que do acidente resultaram extensos danos não patrimoniais e patrimoniais, melhor descritos na petição inicial, que os réus devem ressarcir.

    Os 1ºs réus deduziram contestação, arguindo a ineptidão da petição inicial e impugnado, de forma motivada, parte da factualidade alegada pela autora.

    A 2ª ré contestou, impugnando a factualidade alegada pela autora e sustentando carecer a mesma de legitimidade para peticionar as verbas a que se reportam as alíneas e) e f) do respectivo articulado.

    O 3º réu deduziu, de igual forma, contestação, impugnando parte da matéria alegada no articulado inicial.

    Em resposta, a autora pronunciou-se no sentido da improcedência das invocadas excepções.

    Na sequência de despacho proferido a 4/2/2015, procedeu-se à apensação aos presentes autos de uma acção instaurada pelo Centro Hospitalar do ..., E.P.E, contra os ora réus, na qual o autor peticiona o pagamento (solidário) da importância de 43.422,02 € (quarenta e três mil quatrocentos e vinte e dois euros e dois cêntimos), acrescida de juros moratórios vincendos, à taxa legal, até integral pagamento, decorrente da assistência prestada à demandante AA, em resultado do acidente de viação a que o litígio se reporta.

    Os réus contestaram o pedido formulado pelo Centro Hospitalar do ..., E.P.E, impugnando a factualidade alegada pelo mesmo e sustentando – os 1ºs réus – que a respectiva petição é inepta e que os contestantes carecem de legitimidade para serem demandados.

    Foi realizada audiência prévia, na qual foi proferido despacho a julgar improcedentes as arguidas excepções de ineptidão e de ilegitimidade passiva e procedente a excepção de ilegitimidade activa, no que se refere ao pedido formulado pela autora sob a alínea f).

    Identificado o objecto do litígio e enunciados os temas da prova, os autos prosseguiram os seus ulteriores termos, com realização de exame pericial, após o que se efectuou audiência de julgamento, com observância do formalismo legal.

    A final foi proferida sentença que julgou parcialmente procedente a acção em consequência do que se decidiu:

  2. Condenar os réus Fundo de Garantia Automóvel, BB e CC (estes dois últimos na qualidade de herdeiros de DD), a pagarem à autora AA a quantia de 1.451,650,00 € (um milhão quatrocentos e cinquenta e um mil seiscentos e cinquenta euros), a título de indemnização global pelos danos não patrimoniais e patrimoniais, acrescida de juros de mora, à taxa legal, calculados desde a citação até integral pagamento; b) Condenar os réus Fundo de Garantia Automóvel, BB e CC (estes dois últimos na qualidade de herdeiros de DD), a pagarem à autora AA a quantia que se vier a liquidar referente a intervenções cirúrgicas, internamentos, tratamentos e medicação que a mesma venha a necessitar, tudo por indicação médica, em resultado das lesões/sequelas decorrentes do acidente em discussão nos autos; c) Condenar os réus Fundo de Garantia Automóvel, BB e CC (estes dois últimos na qualidade de herdeiros de DD), a pagarem solidariamente ao Centro Hospitalar do ..., E.P.E, a quantia de 43.422,02€ (quarenta e três mil quatrocentos e vinte e dois euros e dois cêntimos), acrescida de juros moratórios que se tiverem vencido na pendência dos autos, assim como dos vincendos, à taxa legal, até integral pagamento; d) Absolver os réus Fundo de Garantia Automóvel, BB e CC do demais que é peticionado pela autora AA; e) Absolver a ré EE, Ldª, do pedido, sem prejuízo do reembolso a que se fez alusão.

    2.

    Inconformados com tal decisão vieram dela interpor recurso, a Autora, os Réus BB e CC, na qualidade de herdeiros de DD, e o réu, Fundo de Garantia Automóvel.

    O Tribunal da Relação do Porto proferiu acórdão em que decidiu: “i) - julgar a apelação interposta pelos réus BB e FF (na qualidade de herdeiros de DD) parcialmente procedente e consequentemente revogando a decisão recorrida, absolvem-se os mesmos dos pedidos contra si aduzidos pela autora; ii) - julgar parcialmente procedente a apelação interposta pelo réu Fundo de Garantia Automóvel, em consequência do que se altera a decisão recorrida, condenando-se, solidariamente, a ré EE, Ldª e o réu Fundo de Garantia Automóvel no pagamento na quantia de € 1.171.485,00 (um milhão cento e setenta e um mil quatrocentos e oitenta e cinco euros) a título de indemnização pelos danos patrimoniais e não patrimoniais sofridos pelo autora, mantendo-a no mais; iii)- julgar parcialmente procedente a apelação interposta pelo réu Fundo de Garantia Automóvel, em consequência do que se altera a decisão recorrida, condenando-se, solidariamente, a ré EE, Ldª e o réu Fundo de Garantia Automóvel no pagamento ao Centro Hospitalar do ..., E.P.E. da quantia de € 39.079,82 (trinta e nove mil e setenta e nove euros e oitenta e dois cêntimos), mantendo-a no mais; iv)- julgar improcedente a apelação interposta pela autora; v)- manter o restante decidido; vi)- determinar o desentranhamento e a devolução aos apelantes BB e CC (na qualidade de herdeiros de DD) dos documentos que ofereceram com as suas alegações, condenando-os na multa de uma Uc pelo incidente a que deram causa.

    Custas pelos recorrentes e recorridos, na proporção do decaimento, sem prejuízo do apoio judiciário de que a autora beneficia.” 3.

    Novamente inconformados interpuseram revista: a A.

    , os Réus – Fundo de Garantia Automóvel e a EE, Lda.

    4.

    Com o requerimento de interposição do recurso a Autora apresentou alegações, formulando, a final, as seguintes conclusões (transcrição): 1º “O presente Recurso de Revista vem interposto dos concretos pontos decisivos, i, ii e iv- I – e V da decisão do douto Acórdão recorrido, supra identificados em que a aqui recorrente ficou vencida, bem como, da decisão proferida quanto ao agravamento dos danos por acto omissivo da aqui recorrente (alegado pelos aqui recorridos FF e 2º BB - na qualidade de herdeiros de DD - e pelo Fundo de Garantia Automóvel).

    1. A não utilização de cinto de segurança pelo recorrente não é causa adequada a promover o agravamento das lesões sofridas pela mesma.

    2. Caso a recorrente levasse o cinto de segurança colocado, não teria sido projectada para o exterior do veículo, e teria permanecido dentro do mesmo até à sua imobilização, que ocorreu após um percurso de uma distância superior a 300 metros – confrontar facto provado n.º 9 da douta sentença -, provocando-lhe com grande probabilidade a morte.

    3. A recorrente seguia precisamente no lado esquerdo traseiro do veículo, ou seja, do mesmo lado do condutor falecido e do qual o veículo sofreu os maiores danos, como se constata pelos vários documentos juntos aos autos-fotografias e relatório do NICAVE.

    4. Pela dinâmica do sinistro e vítimas mortais, constata-se que o cinto de segurança não impediu nenhuma delas de ter um desfecho trágico e lamentável, como bem refere a douta sentença proferida em primeira instância.

    5. Ao constatar-se os danos mortais provocados ao condutor daquele veículo, que utilizava o cinto de segurança, e as regras de experiência comuns, a inutilização de cinto de segurança em nada influenciou a produção de danos e lesões na recorrente.

    6. Não existe nexo causal entre a não utilização do cinto de segurança pela recorrente e a produção das lesões de que padece, não tendo sido produzida qualquer prova nos autos que permita essa constatação causal, bem pelo contrário, existindo provas testemunhais que esclareceram devidamente o 9º Tribunal a quo, os depoimentos das testemunhas GG e HH.

    7. Os danos provocados pelo possível encarceramento da recorrente, e consequente esmagamento no interior do aludido veículo, em virtude do mecanismo de retenção do cinto de segurança, seriam superiores, nomeadamente com a morte da recorrente.

    8. O Acórdão do Tribunal da Relação do Porto, proferido à data de 21/02/2013, no âmbito do processo nº 2044/06.0TJVNF.P1.S1, relatado pela Juiz-Desembargadora Maria dos Prazeres Pizarro Beleza (consultável em...

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