Acórdão nº 233/14.2T8BRG.G1.S2 de Supremo Tribunal de Justiça (Portugal), 19 de Dezembro de 2018
Magistrado Responsável | MARIA OLINDA GARCIA |
Data da Resolução | 19 de Dezembro de 2018 |
Emissor | Supremo Tribunal de Justiça (Portugal) |
-
RELATÓRIO 1. GG Unipessoal L.
da propôs ação declarativa, no Juízo Central Cível de Braga, contra BB e CC S.A., formulando os pedidos de condenação: "A. Solidariamente ambos os RR, a quantia de 150.000,00 € (cento e cinquenta mil euros), por via dos factos em apreço nos autos - vide 4 a 76 e 98 a 111 da p.i, acrescidas de juros contados desde a citação até efetivo e integral pagamento B. O primeiro réu, a quantia de 49.953,65€ (quarenta e nove mil, quinhentos e trinta e seis euros e sessenta e cinco cêntimos) acrescidas de juros contados desde a citação até efetivo e integral pagamento." Alegou, em síntese, que DD instaurou contra si o processo 17/10.7TBAMR, no Tribunal Judicial da Comarca de Amares, e que, depois de citado, contactou o réu BB, que é advogado, para o representar nessa lide. No entanto, o réu BB contestou já depois de concluído o respectivo prazo, motivo por que tal peça não foi admitida, o que conduziu à sua condenação a: - realizar as obras e trabalhos tendentes à conclusão da obra e retificação, supressão e eliminação dos vícios, defeitos e desconformidades verificados no prédio urbano identificado nessa ação; - suportar despesas e encargos com o transporte e armazenamento/depósito dos artigos que se encontravam no interior do imóvel, pelo tempo necessário à realização das obras; - pagar ao demandante, a título de compensação pelos danos de natureza patrimonial, a quantia de € 163 045.87, acrescida de juros calculados desde a citação até efetivo pagamento.
Acrescentou que tal ação n.17/10.7TBAMR estava inevitavelmente condenada ao fracasso, atenta a falta de fundamento do aí Autor.
Mais alegou que a ré CC, por força da apólice n. ..., de seguro de grupo de responsabilidade civil profissional, subscrita pela Ordem dos Advogados, responde pelos atos do réu BB até ao limite de € 150 000,00.
-
A ré CC contestou dizendo, em síntese, que o réu BB, pelo menos desde 13 de janeiro de 2012, que tinha conhecimento dos factos que poderiam vir a gerar a sua responsabilização civil, pelo que "nos termos expressamente previstos no artigo 3º alínea a) das condições especiais da apólice …, encontra-se o presente sinistro excluído das coberturas e garantias previstas da referida apólice de seguro." 3. O réu BB contestou afirmando, em síntese, que "nunca foi mandatado pela autora para contestar o processo 17/10.7TBAMR, dentro do prazo legal.
" 4. Procedeu-se a julgamento e foi proferida sentença na qual se entendeu que: “não tendo a Autora demonstrado ter conferido o mandato de forma a que fosse possível apresentar a contestação dentro do prazo legal entendemos não se poder concluir que existiu incumprimento do contrato de mandato pelo primeiro Réu”; e se decidiu nos seguintes termos:"julga-se totalmente improcedente a presente acção e consequentemente decide-se absolver os Réus dos pedidos formulados pela Autora." 5. Inconformada com essa decisão, a autora interpôs recurso para o Tribunal da Relação de Guimarães. O réu BB apresentou contra-alegações defendendo a improcedência do recurso.
-
O Tribunal da Relação de Guimarães confirmou a decisão da primeira instância, sustentando, como se transcreve, que: “(…) sendo verdade que a A. mandatou o Réu para a realização de serviços jurídicos, está em causa responsabilidade contratual, não é menos verdade que não se provou que o mandatou nummomento em que este ainda dispunha de prazo para apresentar contestação no respectivo processo. E assentando o pedido da autora, entre outros, no facto de ter contratado os serviços do réu a tempo deste poder contestar no processo 17/10.7TBAMR, nos termos do artigo 342° n.1 do Código Civil, cabia-lhe a ela o ónus da prova da tempestividade dessa contratação.
Só uma vez provado que o mandato tinha sido confiado ao réu a tempo dele apresentar contestação em nome da sua mandatária é que, depois, perante a junção intempestiva dessa peça, funcionava a presunção estabelecida no artigo 799° n. 1 do CC (…)” 7. Inconformada com aquela decisão, a Autora interpôs recurso de Revista excecional, ao abrigo do art.672º, n.1, alínea a) do CPC, formulando nas suas alegações as seguintes conclusões: «1. O recurso é interposto nos termos do artigo 672º 1, alínea a) do CPC, por estar em causa uma questão cuja apreciação, pela sua relevância jurídica, é claramente necessária para uma melhor aplicação do direito.
-
Vem o presente recurso interposto do Acórdão proferido pela 2a Secção Cível do Tribunal da Relação de Guimarães, que negou provimento ao recurso interposto da sentença proferida pelo Juízo Central Cível — J3, da Instância Central da Comarca de Braga, a qual entendeu que pese embora a Recorrente tenha mandatado o Réu BB, para contestar a ação que correu termos no Tribunal de Amares sob o n.17/10.7TBAMR, a Recorrente não o mandatou em tempo, no prazo em curso para a contestação.
-
Não se conformando com a absolvição dos Réus, a ora Recorrente interpôs recurso para o Tribunal da Relação de Guimarães, que o recebeu como de apelação.
-
Apreciado o recurso, veio a Relação de Guimarães julga-lo improcedente, mantendo a decisão proferida na 1 a instância.
-
Ora, com o regime de recursos introduzido pelo DL n.
303/2007, de 24.08, a regra é a da inadmissibilidade de recurso de revista para o STJ das decisões da Relação que confirmem, sem voto de vencido, a decisão da lª instância (dupla conforme).
-
Estando presentes os requisitos da revista "normal", a qual apenas não será admissível nos autos por se verificar uma situação de dupla conforme, poderá o recurso ser admitido como de revista excecional, caso em que a sua admissão caberá à Formação a que alude o n.3 do art. 672º do CPC.
7. No caso, entende a recorrente que se verificam preenchidos os pressupostos para ser admitido o recurso como de revista excecional, nos termos do artigo 672º 1.
alínea a) do CPC, por estar em causa uma questão cuja apreciação, pela sua relevância jurídica, é claramente necessária para uma melhor aplicação do direito.
-
Na verdade, há relevância jurídica necessária para uma melhor aplicação do direito quando se trate de questão complexa, de difícil resolução, cuja subsunção jurídica imponha um importante, e detalhado, exercício de exegese, um largo debate pela doutrina e jurisprudência com o objetivo de obter um consenso em termos de servir de orientação, quer para as pessoas que possam ter interesse jurídico ou profissional na resolução de tal questão a fim de tomarem conhecimento da provável interpretação, com que poderão contar, das normas aplicáveis, quer para as instâncias, por forma a obter-se uma melhor aplicação do direito.
-
O conceito genérico da citada alínea a) implica que a questão “sub judice” surja, em geral, quando o quadro legal suscite dúvidas profundas na doutrina e na jurisprudência, a ponto de ser de presumir que gere com probabilidade decisões divergentes (cfr., v.g. e “inter alia”, o Acórdão do Supremo Tribunal Administrativo de 16 de Dezembro de 2009, P.
n.
01206/09 e Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça proferido no P.
n.
417/08.2 TBCBR.C1.S1; cf. também, “una voce sine discrepante”, os Acórdãos dos Processos n.s 1949/08.TBGMR.C1.S1, 9630/08.1TBMAI.P1.SI e 1742/08.8TBAVR.C1.S1).
-
No caso em apreço, assume especial relevância, senão mesmo determinante e decisiva, a seguinte questão: o mandato, em que a Recorrente mandatou o Réu para a realização de serviços jurídicos, estando em causa a responsabilidade contratual, empobrecimento e perda de chance do Recorrente, aquando da não apresentação de contestação em prazo.
-
Conforme já referido, a base para a improcedência da presente ação resulta no facto de o tribunal ter entendido que a Recorrente não fez prova de que mandatou o Réu BB, em tempo legal, para contestar a ação que correu termos sob o n.
17/10.7TBAMR no Tribunal de Amares.
-
A verdade é que, além da prova documental junta, foi, em julgamento produzida prova testemunhal, segura, isenta, clara, objetiva e credível, demonstrativa que a Recorrente confiou, em tempo, o processo ao Réu BB, a quem mandatou para contestar a ação, que a Relação igualmente ignorou.
-
Quanto à testemunha EE, foi ela a pessoa que rececionou o expediente pelo qual a Recorrente foi citada no âmbito do processo n.
17/10.7TBAMR do Tribunal de Amares, tendo sido ela que, deu disso conhecimento ao legal representante da Recorrente.
-
Mais estabeleceu no tempo, lugar e espaço o momento em que o legal representante se deslocou ao escritório do Réu BB a propósito desta ação e o mandatou para efetuar a contestação.
-
Não se trata de não agradar à Recorrente a forma como a prova foi apreciada, mas sim de, resultar da prova produzida, prova que deve a levar a decisão diversa.
-
Conforme resulta das suas declarações do legal representante da Recorrente, deslocou-se a Portugal para festejar com a sua esposa e testemunha EE, no seu aniversário.
-
Resultando que a mesma faz anos no dia 14 de janeiro de 2010 e tendo este regressado a ... dois dias depois, voltou a Portugal, motivado pelo alerta da sua esposa e com vista a reunir e mandatar o Réu BB para contestar e conduzir tal processo contra si instaurado.
-
Por essa altura e estando em Portugal, atenta a preocupação e gravidade com este assunto — ação judicial intentada contra a Recorrente — deslocou-se ao escritório do réu BB, pessoa a quem confiou o assunto.
-
Não há, pois, dúvidas que rececionou a carta com a citação remetida pelo Tribunal de Amares no âmbito do proc. 17/10.7TBAMR.
-
Nessa sequência, avisou de imediato, o seu marido e legal representante da Recorrente, que se deslocou a Portugal para mandatar o réu para contestar a ação declarativa.
-
O que veio a suceder, tendo o legal representante da Recorrente mandatado 0 1º Réu, a quem deixou a carta com a citação e assinou uma procuração, o que aconteceu ainda no decorrer do mês de janeiro de 2010.
-
0 mandato conferido pela Recorrente resulta também do depoimento da testemunha FF.
-
Das declarações desta testemunha, Inspetor da Polícia Judiciária...
-
Para continuar a ler
PEÇA SUA AVALIAÇÃO