Acórdão nº 116/15.9JACBR.C1.S1 de Supremo Tribunal de Justiça (Portugal), 12 de Julho de 2018

Magistrado ResponsávelRAUL BORGES
Data da Resolução12 de Julho de 2018
EmissorSupremo Tribunal de Justiça (Portugal)

No âmbito do processo comum com intervenção de Tribunal Colectivo n.º 116/15.9JACBR, da Instância Central - Secção Criminal - do Tribunal Judicial da Comarca de ..., foram submetidos a julgamento os arguidos: AA, [...], nascida em .................. ...; e BB, [...], filho de CC e de AA – a aqui arguida –, natural da freguesia e concelho de ..., ........, actualmente preso em cumprimento de pena no Estabelecimento Prisional de ...

* Vinham acusados os dois arguidos, pela prática em co-autoria material, de um crime de tráfico de estupefacientes agravado, p. e p. nos artigos 21.º, n.º 1 e 24.º, alínea h), do Decreto-Lei n.º 15/93, de 22 de Janeiro.

* Realizado o julgamento, por acórdão do Tribunal Colectivo da Instância Central - Secção Criminal, do Tribunal Judicial da Comarca de ..., de 2 de Novembro de 2016, constante de fls. 349 a 362, depositado no mesmo dia, conforme declaração de depósito de fls. 365, foi deliberado: a) Condenar a arguida AA, como autora material de um crime de tráfico de estupefacientes agravado, p. e p. nos artigos 21.º, n.º 1 e 24.º, alínea h), do Decreto-Lei n.º 15/93, de 22 de Janeiro, na pena de 5 (cinco) anos de prisão; b) Absolver o arguido BB de um crime de tráfico de estupefacientes agravado, p. e p. nos artigos 21.º, n.º 1 e 24.º, alínea h), do Decreto-Lei n.º 15/93, de 22 de Janeiro; Ao abrigo do disposto nos arts. 50.º, 52.º e 53.º, do CP, suspender a execução da pena de prisão definida à arguida AA pelo respectivo período de 5 (cinco) anos, acompanhada cumulativamente de um regime de prova assente em plano individual de reinserção social, tendente ao seu afastamento de ambientes e pessoas relacionadas com o tráfico de substâncias estupefacientes [tudo nos moldes a definir oportunamente mediante plano a elaborar pelos serviços de reinserção social e a aprovar pelo Tribunal; para tais efeitos, deve ainda a arguida apresentar-se e (ou) responder a todas as convocatórias que para o efeito lhe venham a ser feitas pelo Tribunal e pelos técnicos de reinserção social, e sem prejuízo de o plano de reinserção poder vir a ser completado posteriormente pelos aludidos serviços].

* O acórdão teve um voto de vencido, expresso a fls. 360 a 362, e respectivos versos, em que foi defendido que a pena a aplicar nunca deveria ser inferior a 5 anos e 6 meses de prisão, o que, inevitavelmente, redundaria num cumprimento efectivo da pena de prisão.

* Discordando da pena aplicada, recorreu o Ministério Público, para o Tribunal da Relação de ..., apresentando a motivação de fls. 369 a 378, pedindo a revogação do acórdão recorrido com pena fixada na ordem dos 6 anos de prisão e que caso se decidisse manter a pena, não seria de aplicar o instituto da suspensão da execução da pena.

* O recurso foi admitido por despacho de fls. 379.

* A arguida respondeu de fls. 392 a 395, pugnando pela improcedência do recurso e confirmação da decisão recorrida.

* Pelo acórdão da Relação de ..., de 28 de Junho de 2017, constante de fls. 414 a 427, foi concedido provimento ao recurso, revogando o acórdão recorrido e fixando a pena em 6 anos de prisão.

* Inconformada com a nova condenação, mais gravosa, a arguida, que se conformara com a anterior condenação, interpôs recurso para o Supremo Tribunal de Justiça, apresentando a motivação de fls. 432 a 437 verso, que remata com as seguintes conclusões (em transcrição integral): 1.ª - Enquanto o art.º 21° do Decreto - Lei n.º 15/93 de 22 de Janeiro, estabelece um crime de perigo comum, a agravante prevista na al. h) do art.º 24° do mesmo diploma não prescinde da verificação dos pressupostos da sua aplicação; 2.ª - Para a aplicação dessa agravante necessário se torna averiguar se a conduta da arguida teve como finalidade ofender os bens jurídicos que a norma quis salvaguardar 3.ª - No caso dos autos não existem quaisquer elementos que permitissem concluir que os estupefacientes apreendidos se destinavam à sua inserção em contexto prisional 4.ª - Pelo contrário, o tribunal deliberadamente entendeu dar por não provado a que se destinavam os estupefacientes apreendidos 5.ª - Assim, há contradição insanável entre a fundamentação e a decisão que condena a recorrente na prática de um crime de tráfico de estupefacientes agravado em função do dispostos no art.º 24° al. h) daquele decreto-lei, 6.ª - E existe erro na aplicação do direito quando condena a arguida na prática daquele crime agravado e se calcula a medida concreta da pena com base numa moldura penal entre 5 a 15 anos 7.ª - A moldura penal na qual o tribunal se deve atender para determinar a pena a aplicar à arguida é a constante do art.º 21° do Decreto-Lei n.º 15/93 de 22 de Janeiro, entre 4 a 12 anos.

  1. - Face aos factos apurados, deveria ser aplicada à Arguida Recorrente uma pena de apenas 4 anos e dois meses.

  2. - Todos os elementos probatórios apreciados segundo as regras de experiência comum e da livre convicção do julgador, permitem concluir com inteira segurança que a aplicação da medida concreta da pena perto do limite da moldura penal abstracta do crime praticado e a suspensão da pena de prisão aplicada, realizam de forma adequada e suficiente as finalidades da punição; 10.ª - Com efeito, ficou provado que a arguida é primária e que, apesar de nos seus 50 anos de vida, ter tido um percurso de provações e dificuldades; 11.ª - Estando preenchidos os pressupostos da aplicação do disposto no art.º 50° do Código Penal.

Termos em que deve o presente recurso ser admitido, e em consequência ser revogada a decisão recorrida, antes substituindo por outra que: - Condene a Arguida Recorrente pela prática de um crime de tráfico de estupefacientes e outras condutas proibidas, nos termos do artigo 21°, n.º 1 do Decreto-Lei n.º 15/93 de 22 de Janeiro, - Condenar a Arguida numa pena de prisão de 04 anos e dois meses, substituindo-se a mesma na sua aplicação por pena de prisão suspensa na sua execução pelo mesmo período.

* O recurso foi admitido por despacho de fls. 438.

* O Ministério Público respondeu ao recurso, de fls. 442 a 447, concluindo: 1. A recorrente AA, deveria ter impugnado os vícios enunciados no art.º. 410.º, n° 2, do Cod. Proc. Penal, relativamente à decisão proferida em 1ª Instância, junto do Tribunal da Relação, não podendo tal matéria ser objecto de apreciação, nesta fase processual, por parte do STJ, sem prejuízo do conhecimento oficioso dos mesmos pelo STJ, quando detectados, nos termos do art.º 434° do Cod. Proc. Penal.

2. O Tribunal recorrido apreciou devidamente os actos praticados pela recorrente AA, que integram a prática de um crime de tráfico de estupefacientes agravado, p. p. pelos arts.º 21.º, n° 1 e 24°, al. h), ambos do Dec. Lei n° 15/93, de 22 de Janeiro.

3. O Tribunal recorrido ponderou, avaliou, e qualificou devidamente a ilicitude da conduta da recorrente AA, ao condená-la na pena de 6 (seis) anos de prisão.

4. A decisão proferida pelo Tribunal recorrido é correcta, por não violar qualquer dispositivo legal, pelo que, não merecendo censura, deve ser mantida e confirmada nos seus precisos termos.

* Por despacho de fls. 448 foi ordenada a remessa dos autos ao Supremo Tribunal de Justiça.

* A Exma. Procuradora-Geral Adjunta neste Supremo Tribunal emitiu douto parecer de fls. 455 a 459, de que se extraem as seguintes passagens: “1. O primeiro e principal objecto do recurso da arguida AA parece-nos visar a possibilidade da matéria de facto dada como provada não ser suficiente para integrar a qualificação p. no art. 24º h) do dec-lei 15/93.

No entanto segundo nos parece a questão do preenchimento dos pressupostos desta agravação poder-se-á questionar doutra forma e através de outros fundamentos, até porque entre a matéria de facto provada e não provada existirá uma contradição que poderá ter bastante relevância conjugada com a fundamentação de direito.

É que no dia 05.04.2015, cerca das 15h e30 m, a arguida dirigiu-se ao Estabelecimento Prisional de ... e, aproveitando o horário das visitas e a pretexto de ir visitar o seu filho …, levou haxixe escondido na zona da virilha (ponto 2); Porém, antes de concretizar a visita, a arguida foi abordada…(ponto 3) (fls 417 do acórdão recorrido) E foi dado como não provado que “a arguida haja praticado a factualidade supra mencionada nos pontos 2 a 6 com o objectivo de entregar as substâncias estupefacientes ao arguido a fim de serem depois as mesmas distribuídas e cedidas, no interior do estabelecimento prisional de ...”( último & do p. B).

Deverá resultar desta apreciação uma contradição insanável p na alínea b) do nº 2 do artº 410º do CPP que oficiosamente deverá ser apreciado e declarada no Supremo Tribunal de Justiça o que propomos aos Ex.mos Conselheiros.

2. Vejamos pois como se enquadram os factos e os pressupostos da agravação.

Tráfico do art. 21°, n° 1 e agravação p. no art. 24° do dec-lei 15/93. (…) A agravação p. no art. 24° pressupõe um grau de ilicitude muito forte e que ultrapasse sem dúvida o círculo do crime/base, devendo assim a forma agravada ter uma dimensão que vá sem dúvida para além do modelo, espaço e grau de ilicitude do crime tipo.

As circunstâncias que integram o crime de tráfico agravado terão, pois, de adensar o nível do ilícito, estabelecendo-se na dimensão do perigo para os bens jurídicos protegidos com a incriminação do crime de tráfico.

2.1 Dos factos assentes não resulta que tivesse havido algum acordo/combinação entre o filho e a mãe para ser introduzido qualquer estupefaciente no estabelecimento prisional, nem tão pouco se havia alguma intenção da arguida deixar e/ou entregar a alguém (recluso ou terceira pessoa) para consumo e/ou venda, a quantidade de canábis que transportava tão esco[n]dida .

2.2 A arguida DD [SIC] não entrou no estabelecimento prisional pois quando se preparava para efectuar a visita foi descoberto que levava um produto estupefaciente pelo que só se pode concluir que os factos integram apenas o crime do art. 21º sem se mostrar preenchida a agravação da al. h) do art. 24º...

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