Acórdão nº 49/16.1T9FNC.L1.S1 de Supremo Tribunal de Justiça (Portugal), 21 de Março de 2018

Magistrado ResponsávelRAUL BORGES
Data da Resolução21 de Março de 2018
EmissorSupremo Tribunal de Justiça (Portugal)

No âmbito do processo comum com intervenção do Tribunal Colectivo n.º 49/16.1T9FNC.L1.S1, dos Juízos Centrais Criminais do --, da Comarca da -- – Juiz 2, foi submetido a julgamento o arguido AA, [...], residente no --.

Por acórdão do Tribunal Colectivo do Juízo Central Criminal do -- – Juiz 2, de 11 de Maio de 2017, constante de fls. 247 a 265, depositado no mesmo dia, conforme declaração de fls. 273, foi deliberado: - Condenar o arguido, pela prática, em autoria material, de um crime de violação agravada, p. e p. pelos artigos 164.º, n.º 1, e 177.º, n.º 3 e 6, do Código Penal (versão resultante da Lei n.º 65/98, de 2-09), na pena de 6 (seis) anos de prisão; - Julgar o pedido de indemnização civil, parcialmente procedente, por parcialmente provado e, consequentemente, condenar o demandante civil (SIC) a pagar à demandada civil (SIC) a quantia de € 20.000,00 a título de indemnização por danos morais.

*** Há um evidente lapso de escrita, que ora se corrige, nos termos do artigo 380.º, n.º 1, alínea b) e n.º 2, do CPP, neste último segmento, pois ter-se-á querido condenar o demandado civil a pagar à demandante civil parte do montante pedido - 100.000,00 € - deduzido a título de indemnização por danos não patrimoniais, conforme pedido de fls. 180 a 187, tendo sido em consequência o demandado civil condenado no pagamento das custas, conforme alínea d) do dispositivo, a fls. 269.

*** Inconformado com a deliberação judicial, o arguido, dizendo ter o recurso “como objecto toda a matéria de facto e de direito da douta sentença condenatória”, interpôs recurso para o Tribunal da Relação de Lisboa, apresentando a motivação de fls. 275 a 283, que remata com as seguintes conclusões (em transcrição integral, incluindo o itálico na conclusão X): I — O recontente foi condenado pela prática de um crime de violação agravada. p. e p. pelo artigo 164°, n°. 1 e 177°, n0s 3 e 6 do C.P., na pena de seis anos de prisão.

II - O presente recurso tem como objeto toda a matéria de facto e de direito da douta sentença condenatória proferida nos presentes autos.

III- A sentença recorrida aplicou ao caso concreto uma pena única de prisão efetiva de 6 anos na ponderação de três factores: grau de ilicitude do facto; existência de dolo directo e exigências ditadas pela necessidade de prevenção.

IV- No entanto, não pretendendo de modo algum negar essa mesma necessidade, consideramos desproporcionada e desadequada a aplicação, ao arguido de uma pena de prisão efetiva de 6 anos.

V- O arguido não aceita, assim, a pena aplicada porquanto a mesma se revela totalmente desadequada e excessiva.

VI - O tribunal “a quo”, violou, assim, na determinação da pena o disposto nos arts. 43.° a 46.°, 50.°. 54.º, 58.° e 70°, todos do C.P. impondo-se, assim, a revogação da douta sentença recorrida.

VII - A prisão efetiva, não dará certamente resposta à prevenção de um comportamento futuro e idêntico, por parte do arguido, muito pelo contrário, poderá produzir efeitos perversos, de dimensões imprevisíveis.

VIII - Cremos, ainda, que a medida e natureza da pena, por excessiva, não se adequa ao grau de culpabilidade do arguido nem atende às circunstâncias a favor do agente, violando, assim, as normas constantes dos arts. 71.º° e 72.° do C.P, devendo: -ser reduzida para, no máximo cinco anos de prisão e subsequentemente ser suspensa a sua execução, nos termos previstos no n° 1 do art.º 50.° do C.P., uma vez que o arguido reúne todos os seus pressupostos e, que, com base no estatuído no n°2 desse mesmo art.º seja subordinada à observância de uma regra de conduta, tal como prevista no n° 2 do art.º 52.° do mesmo diploma, ou seja, a sujeição a cura em instituição adequada, sujeito a regime de prova (arts. 53.° e 50.°, n°2).

IX - “A alteração ao C.P., introduzida pela Lei 59/2007, de 29 de Agosto, assentou na filosofia subjacente ao nosso sistema punitivo de que as penas devem ser sempre executadas com um sentido pedagógico e ressocializador, vindo assim a ampliar o campo de aplicação desta e outras medidas não institucionais que funcionam como medidas de substituição, visando limitar o mais possível os efeitos crirnogéneos da prisão”- Acórdão do Tribunal da Relação de Lisboa, de 23-10-2007.

X - E como se refere no Acórdão do Tribunal da Relação de Lisboa, de 22-01-2008, “os direitos fundamentais não poderão ser limitados senão na medida do estritamente indispensável à defesa dos próprios direitos e liberdades constitucionalmente consagrados. É o que decorre do princípio da máxima restrição das normas afetadoras dos direitos e liberdades fundamentais, só se justificando a pena e o seu quantum na medida do indispensável à salvaguarda dos “direitos ou interesses constitucionalmente protegidos” (art.º 18°, n°2 da CRP). Se o legislador entende que uma pena menos grave e, portanto, menos limitadora dos direitos fundamentais, maxime da liberdade, é suficiente para realizar as funções político-criminais da prevenção geral (de integração e de intimidação) e de prevenção especial, deve esta ser aplicada.” XI - E ainda como se escreveu no mesmo Acórdão “(....) com a Lei 59/07, o legislador introduziu um conjunto de alterações ( ) no sentido de reforçar a aplicação de penas não privativas da liberdade, reconhecendo a estas especial aptidão para prosseguir a reinserção do agente e dando a ideia que o recurso à pena de prisão, preventiva e efectiva, deve ser reservado à criminalidade especialmente grave.” XII - E como sublinha o Prof Figueiredo Dias, “à pena privativa da liberdade, o tribunal deve preferir urna pena alternativa ou de substituição sempre que, verificados os respectivos pressupostos de aplicação, a pena alternativa ou a de substituição se revelem adequadas e suficientes à realização das finalidades da punição. O que vale por dizer que são finalidades exclusivarnente preventivas, de prevenção especial e de prevenção gera não finalidades de compensação da culpa, que justificam a preferência por uma pena alternativa ou por uma pena de substituição e a sua efectiva aplicação.” XIII - O arguido rejeita, por conseguinte, que a pena de prisão efetiva seja a única espécie de pena que realize, no caso concreto, de forma adequada e suficiente as finalidades da prisão, por se encontrarem esgotadas todas as virtualidades pedagógicas e ressocializadoras que uma pena não detentiva poderá ainda ter sobre o arguido, não obstante as suas anteriores condenações pela prática do mesmo crime.

XIV - O tribunal “a quo” violou, assim, o preceituado no art.º 70.° do C.P porquanto o critério de escolha da pena estabelecido no aludido artigo impõe ao julgador a preferência pela pena não detentiva desde que esta se mostre adequada e suficiente para realizar as finalidades da punição prescritas no art.º 40.°. n.° 1 do C.P. ou seja, a protecção dos bens jurídicos e a reintegração do agente na sociedade.

XV - Encontram-se reunidas todas as condições necessárias à aplicação de uma pena não privativa da liberdade ao arguido.

XVI - Assim sendo, o Tribunal “a quo” deveria ter determinado a suspensão da execução da pena de prisão aplicada ao arguido, conforme previsto no art.º 50.° do C.P, ainda que, subordinando-a ao cumprimento de deveres ou à observância de regras de conduta destinados a facilitar a sua reintegração na sociedade nos termos do disposto nos arts.51.º e 52.º do C.P.

XVII - A prisão efetiva do Recorrente é desnecessária, desadequada, desproporcional e mais prejudicial do que benéfica, além de que representa custos elevados para a comunidade.

XVIII - A douta sentença recorrida é nula por omissão de pronúncia, pois não ponderou todas as possibilidades de substituição da pena de prisão efectiva aplicada pelas penas não detentivas previstas no C.P.

XIX - Pelo que, a douta decisão recorrida deverá ser revogada e substituída por outra que aplique ao arguido uma pena não superior a cinco anos suspensa na sua execução.

Termos em que, nos melhores de direito e com o sempre mui douto suprimento de Vossas Excelências, deve a decisão do tribunal de 1.ª instância ser revogada e substituída por outra que aplique ao arguido uma pena não superior a cinco anos suspensa na sua execução nos termos previstos no n° 1 do art.º 50.° do C.P., por ser suficiente e certamente mais adequada para dar resposta às necessidades ditadas pela prevenção especial.

*** O recurso foi admitido por despacho de fls. 285.

*** A fls. 289 veio o recorrente dizer ter por lapso endereçado as alegações de recurso ao Tribunal da Relação de Lisboa, requerendo que as mesmas fossem remetidas ao Supremo Tribunal de Justiça por ser, neste caso concreto, o Tribunal competente.

Este requerimento, que deu entrada em 11 de Julho de 2017, faz fls. 289, estando colocado antes da resposta do Ministério Público, que deu entrada em 20 de Junho de 2017, fazendo fls. 290 a 292, o que poderá explicar, de alguma forma, a indevida remessa dos autos para o Tribunal da Relação de Lisboa.

*** O Ministério Público junto da Procuradoria da Instância Central - Secção Criminal da Comarca da -- apresentou resposta, de fls. 290 a 292, dirigida aos Venerandos Desembargadores do Tribunal da Relação de Lisboa, concluindo: 1.º O Tribunal “a quo” explicou de forma clara como chegou à pena de seis (6) anos de prisão.

  1. Na determinação da medida concreta da pena, o Tribunal “a quo” teve em conta todas as circunstâncias atenuantes que militavam a favor do arguido.

  2. Esta pena é, sem dúvida alguma, a que afigura mais justa em face dos factos praticados pelo recorrente AA.

  3. O tribunal “a quo” fez uma mais que correcta aplicação dos arts. 40.°, n.º 1, 70°, ns. 1 e 2, 71°, 164°, n°1 e 177°, n°s 3 e 6, todos do Código Penal.

Nestes termos, entende-se ser de negar provimento ao recurso interposto pelo arguido AA e, em consequência, a manutenção do acórdão recorrido.

*** Em 22-09-2017 foi proferido o despacho de fls. 293, a dizer “Subam os autos”, sem especificar o tribunal ad quem, e sem ter em conta a correcção antecedente.

Face a essa falta de...

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