Acórdão nº 359/16.8JAFAR.S1 de Supremo Tribunal de Justiça (Portugal), 18 de Setembro de 2018
Magistrado Responsável | LOPES DA MOTA |
Data da Resolução | 18 de Setembro de 2018 |
Emissor | Supremo Tribunal de Justiça (Portugal) |
Acordam na Secção Criminal do Supremo Tribunal de Justiça: I. Relatório 1.
AA, arguido no processo acima identificado, interpõe recurso do acórdão de 9 de Outubro de 2017, do Juízo Central Criminal de Portimão, comarca de Faro, que o condenou pela prática de: - Um crime de violação, previsto e punível pelo artigo 164.º, n.º 1, al. b), do Código Penal, na pena de 8 (oito) anos de prisão; e de - Um crime de homicídio qualificado na forma tentada, previsto e punido pelos artigos 22.º, 23.º, 73.º e 131.º e 132.º, n.ºs 1 e 2, als. c) e d), do Código Penal, na pena de 8 (oito) anos de prisão.
Efectuado o cúmulo jurídico destas penas foi o arguido condenado na pena única de 13 (treze) anos de prisão.
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Indicando que “a questão a resolver no âmbito do presente recurso, é, assim, a de saber se, na fixação das penas parcelares supra referidas, e na pena única de 13 (treze) anos de prisão aplicadas (…) foram tidos em conta os requisitos previstos no supra referido artigo [40.º do Código Penal], para a determinação da medida das penas que lhe foram em concreto aplicadas”, o recorrente termina a motivação do recurso concluindo: «1 – O arguido, ora recorrente, foi condenado pela prática, de um crime de violação p. e p. pelo art. 164.º, n.º 1, al. b) do Código Penal e de um crime de homicídio qualificado na forma tentada, p. e p. pelos arts. 22.º, 23.º, 7.3º e 131.º, 132.º, nº.s 1 e 2, als. c) e d), todos do Código Penal, em cúmulo jurídico, na pena única de 13 (treze) anos de prisão.
2 – A matéria de facto dada como provada não nos merece qualquer reparo.
3 – Discorda-se, tão-somente, das penas concretamente aplicadas ao arguido, porquanto, se considera as mesmas excessivas e desproporcionadas.
4 – Visando a revogação do Douto Acórdão ora recorrido, substituindo-se por outro que reduza as penas de prisão que lhe foram em concreto aplicadas: - pelo crime de violação – 8 anos de prisão - pelo crime de homicídio qualificado na forma tentada – 8 anos de prisão 5 – Devendo as mesmas ser reduzidas e fixadas dentro dos limites mínimos legais.
6 – Conforme dispõe o artigo 40.º do Código Penal, a aplicação das penas deve ser norteada pela protecção dos bens jurídicos e, em simultâneo, visar a reintegração do arguido em sociedade.
7 – A questão a resolver no âmbito do presente recurso, é, assim, a de saber se, na fixação das penas de prisão aplicadas ao arguido AA foram tidos em consideração todos os requisitos previstos no supra referido artigo, para a determinação da escolha e medida das penas.
8 – Salvo o devido respeito por diversa opinião, as penas em concreto aplicadas ao arguido, mostram-se excessivas e demasiado severas e desproporcionadas, que resultaram na pena única de 13 (treze) anos de prisão, não contribuindo para a ressocialização do arguido em sociedade.
9 – A moldura abstracta da pena aplicável ao crime de violação situa-se entre os 3 e os 10 anos de prisão, de acordo com o plasmado no artigo 164.º n.º 1 al. b) do Código Penal.
10 – A moldura abstracta da pena aplicável ao crime de homicídio qualificado na forma tentada, previsto e punido pelos artigos 22.º, 23.º, 73.º e 131.º, 132.º, n.ºs 1 e 2, als. c) e d) do Código Penal, se situa entre os 2 anos e 4 meses e 24 dias a 16 anos e 8 meses de prisão.
11 – Além do mais, salvo o devido respeito por diverso entendimento, tendo o arguido sofrido 10 meses e 7 dias de prisão preventiva à ordem deste processo, deveria o Tribunal “a quo” ter procedido ao desconto desse tempo na pena concretamente aplicada.
12 – Entende o arguido que as penas de prisão que lhe foram em concreto aplicadas, deverão ser reduzidas: a) no que concerne ao crime de violação para o mínimo legal de 3 anos de prisão; b) e no que ao crime de homicídio qualificado na forma tentada para 2 anos 4 meses e 24 dias.
13 – A moldura penal abstracta do concurso terá, assim, o limite máximo de 5 anos, 4 meses e 24 dias.
14 – À qual, deve ser descontado, o tempo de prisão preventiva sofrida pelo arguido, de 10 meses e 7 dias.
15 – Julgando-se adequado e suficiente ao caso concreto, condenar o arguido numa pena única 4 anos e 6 meses de prisão.
16 – Dispõe o artigo 50.º do C. Penal que: “ O Tribunal suspende a execução da pena de prisão aplicada em medida não superior a cinco anos se, atendendo à personalidade do agente, às condições da sua vida, à sua conduta anterior e posterior ao crime e às circunstâncias deste, concluir que a simples censura do facto e a ameaça da prisão realizam de forma adequada e suficiente as finalidades da punição”.
17 – Pelo que deverá o Douto Acórdão recorrido ser substituído por outro, que reduza a pena única de 13 anos de prisão aplicada ao arguido, para a pena de 4 anos e 6 meses de prisão suspensa na sua execução.
18 – Por se considerar, em abono da Justiça, a mesma, suficiente e adequada para satisfazer as necessidades de prevenção, quer gerais, quer especiais.
19 – Pelas razões atrás aduzidas, não tendo o Tribunal “a quo” considerado todas as circunstâncias que depõem a favor do arguido na aplicação da medida concreta da pena, foram violadas as disposições constantes dos artigos 40.º, n.º 2, 70.º e 71.º do Código Penal.
Nestes termos, e nos mais de direito que serão objecto do douto suprimento de Vossas Excelências, deve ser dado provimento ao presente recurso, com as legais consequências, designadamente, deve o Douto Acórdão ser substituído por outro que reduza as penas de prisão concretamente aplicadas ao arguido: a) no que concerne ao crime de violação para o mínimo legal de 3 anos de prisão; b) no que ao crime de homicídio qualificado na forma tentada, para 2 anos 4 meses e 24 dias de prisão; Ser, ainda, descontado o tempo de prisão preventiva sofrida pelo arguido à ordem dos presentes autos de 10 meses e 7 dias.
Devendo ser aplicada, em concreto, ao arguido AA, a pena única de 4 anos e 6 meses de prisão, suspensa na sua execução.» 3.
Notificado nos termos e para os efeitos do disposto no artigo 413.º, n.º 1, do CPP, respondeu o Ministério Público, através da Exma. Procuradora da República, concluindo assim, no sentido da improcedência do recurso (transcrição): «1. Considerando a moldura penal dos crimes de Violação e de Homicídio qualificado na forma tentada imputados ao recorrente, temos por corretas e em nada exageradas cada uma das penas parcelares em concreto aplicadas, que se mostram bem doseadas e merecidas face à conduta daquele.
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Foram corretamente observados os critérios gerais da medida da pena contidos no artigo 71º do Código Penal, bem como os princípios ínsitos no artigo 40º do citado Código.
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Na determinação concreta da pena unitária importa considerar, os critérios gerais da medida da pena contidos no artigo 71.º do Código Penal, em conjugação com a proclamação de princípios ínsita no artigo 40.º do citado Código, acrescendo o critério especial fornecido pelo artigo 77.º, n.º 1, do Código Penal, de consideração, em conjunto, dos factos e da personalidade do agente.
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O acórdão recorrido, depois de fixar as penas parcelares aplicadas aos crimes de Violação e de Homicídio qualificado na forma tentada, situou a moldura penal abstrata do concurso entre o limite máximo de 16 (dezasseis) anos de prisão, e um limite mínimo de 08 (oito) anos de prisão, em observância do disposto no artigo 77.º, n.º 2, do Código Penal.
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Salientando a crueldade com que o arguido/recorrente atuou, a sua intenção de provocar sofrimento na vítima, e a ausência de uma verdadeira capacidade de autocrítica.
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Sublinhando que não conta com apoio familiar, não possui quaisquer ligações ao território nacional, nem lhe são conhecidos antecedentes criminais.
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Conjugando todas essas circunstâncias, concluiu e bem o acórdão recorrido por justa e adequada a aplicação da pena única de 13 (treze) anos de prisão.
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Tal pena mostra-se adequada à culpa concreta global, e respeita o princípio da proporcionalidade e da proibição do excesso.
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Foram corretamente observados os critérios gerais da medida da pena, os princípios ínsitos no artigo 40.º do citado Código, bem como o critério especial fornecido pelo artigo 77.º, n.º 1, do Código Penal.
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O acórdão recorrido não violou qualquer disposição legal.
Nestes termos, e pelos fundamentos expostos, deverá negar-se provimento ao recurso, confirmando-se o douto acórdão recorrido.» 4.
Recebidos, foram os autos com vista ao Ministério Público, nos termos e para os efeitos do disposto no artigo 416.º, n.º 1, do CPP, tendo o Exmo. Procurador-Geral Adjunto emitido parecer concordante com o Ministério Público em 1.ª instância, nos seguintes termos: «I. A única questão submetida a reexame é a medida das penas parcelares e da única, fixadas em 8 anos de prisão (por cada um dos crimes de violação e de homicídio qualificado na forma tentada) e 13 anos de prisão, respectivamente.
Pretende que as penas parcelares sejam fixadas nos mínimos das correspondentes molduras penais, e que por força destas reduções, a pena única se situe em 4 anos e 6 meses de prisão, que deve ser suspensa na sua execução.
Como fundamento desta pretensão faz apelo à sua primariedade criminal, apresentar em meio prisional uma conduta discreta e adaptada ao sistema, trabalhando como faxina, e ser um refugiado, fugido à guerra, ditadura e pobreza.
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Respondeu a Ex. ma Procuradora da República (544-555), pronunciando-se pela improcedência do recurso, considerando que, quer as penas parcelares, quer a única, se mostram bem doseadas, obedecendo aos critérios legais que as devem determinar.
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Sem particulares considerações a acrescentar ou tecer sobre a fundamentação do acórdão, que acompanhamos, no que respeita à medida das penas, cumpre tão só salientar que as atenuantes que o arguido convoca têm reduzido valor atenuante.
Apenas poderia assumir algum relevo o facto de se tratar de um refugiado de guerra. Porém, ao contrário do que pretende, a eventual passagem pelas agruras e tormentos de um conflito, não legitimam minimamente os comportamentos de extrema violência que assumiu, antes...
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