Acórdão nº 4739/16.0T8LOU-A.P1.S1 de Supremo Tribunal de Justiça (Portugal), 06 de Dezembro de 2018
Magistrado Responsável | TOMÉ GOMES |
Data da Resolução | 06 de Dezembro de 2018 |
Emissor | Supremo Tribunal de Justiça (Portugal) |
Acordam na 2.ª Secção do Supremo Tribunal de Justiça: I – Relatório 1.
A Caixa AA, S.A.
, instaurou, em 11/11/2016, execução contra BB e cônjuge CC para o pagamento da quantia global de € 42.933,43, incluindo capital, juros de mora vencidos até 18/10/2016, despesas e comissões, com base em dois contratos de mútuo, garantidos por hipoteca e fiança, em que os executados figuram como fiadores e principais pagadores, conforme documentos reproduzidos de fls. 76 a 88, alegando, logo no requerimento executivo, que: .
O mútuo constante da escritura pública e documento complementar reproduzidos a fls. 76-82/v.º foi no montante de € 80.000,00 e destinado a facultar à parte devedora recursos para o financiamento de investimentos múltiplos, não especificados, em bens imóveis; .
O mútuo constante da escritura pública e documento complementar reproduzidos a fls. 83 a 88, foi no montante de € 15.000,00, destinando-se a aquisição de imóvel para habitação própria e permanente da parte devedora; .
O imóvel sobre que recaiu a garantia hipotecária foi vendido no âmbito de um processo executivo pelo valor de € 66.750,00, não sendo o produto da venda suficiente para liquidar o montante então em dívida emergente dos sobreditos mútuos, enquanto que os mutuários se encontram insolventes; .
Tendo os executados deixado de cumprir as obrigações emergentes dos referidos contratos, nomeadamente o pagamento pontual das prestações, estão, por isso, obrigados ao pagamento da quantia global de € 42.933,43, em dívida à data de 18/10/2016.
Concluiu a exequente com a discriminação dos seguintes valores em dívida: a) – Referente ao primeiro mútuo: capital - € 14.323,21; juros, à taxa anual de 10,246%, de 11/10/2012 a 18/10/2016 - € 9.317,79; despesas - € 144,83; comissões - € 266,23; b) – Referente ao segundo mútuo: capital - € 13.422,77; juros, à taxa anual de 10,246%, de 11/10/2012 a 18/10/2016 - € 5.337,20; Comissões - € 121, 40.
Pede ainda os juros vincendos desde 18/10/2016 a liquidar oportunamente.
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Os executados deduziram embargos àquela execução, em 02/01/2017, alegando, no essencial, que: .
Do requerimento executivo não decorre desde quando ocorreu o incumprimento contratual nem sequer que, nesse caso, a exequente tenha considerado vencida toda a dívida; .
A liquidação efetuada pela exequente é manifestamente incompreensível, não se encontrando fundamentada, limitando-se aquela exequente a indicar valores de capital, juros e despesas alegadamente vencidos sem especificar como fez tal apuramento; .
À exequente assiste apenas o direito de lhes exigir, na qualidade de fiadores, o valor correspondente às prestações vencidas e não pagas pelo devedor principal no âmbito dos contratos de mútuo dados à execução; .
A estipulação nos documentos complementares às escrituras de mútuo de que se considerava o empréstimo vencido se o imóvel hipotecado fosse alienado sem consentimento ou se a parte devedora deixasse de cumprir alguma das obrigações contratuais, em termos idênticos ao previsto no artigo 781.º do CC, não importa a renúncia ao benefício do prazo por parte dos fiadores, que afaste a norma supletiva do artigo 782.º do mesmo Código; .
Nem tal afastamento resulta da mera renúncia dos fiadores ao benefício da excussão prévia; .
Assim, não tendo a exequente alegado qualquer interpelação dos executados, na qualidade de fiadores, para a cobrança das prestações fracionadas vencidas, não é lícito àquela exigir-lhes a quantia peticionada, a título do vencimento imediato das prestações vincendas.
Nessa base, concluíram os embargantes pela procedência dos embargos, pedindo que seja reconhecido à exequente apenas o direito de exigir-lhes o valor correspondente às prestações vencidas e dos respetivos juros desde a citação. 3.
A exequente/embargada apresentou contestação a sustentar, no essencial, que: .
Indicou expressamente o cálculo aritmético que esteve na base dos valores peticionados, discriminando tais valores a título de capital, juros moratórios contabilizados, à respetiva taxa anual, desde 11/10/2012 a 18/ 10/2016, despesas e comissões; .
Indicou também o momento do incumprimento contratual, ao peticionar os juros desde 11/10/2012; .
Os embargantes renunciaram ao benefício da excussão prévia, assumindo-se como fiadores solidários; .
Os mesmos foram interpelados, pela carta datada reproduzida a fls. 29, datada de 16/07/2014 para pagarem o remanescente da dívida resultante do seu vencimento antecipado; .
Ainda que se verificasse a falta de interpelação quanto às prestações em falta, a declaração da insolvência do devedor principal teve como efeito automático o vencimento das prestações vincendas mesmo quanto aos fiadores; .
O bem imóvel dado em garantia hipotecária dos mútuos em referência foi vendido no âmbito do processo de insolvência n.º 2272/12.9TBFLG-F, o que implicou o vencimento automático da quantia ainda em dívida.
Concluiu, pois, a exequente pela improcedência dos embargos.
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Findos os articulados, foi fixado o valor da causa em € 42.933,43 e, seguidamente, proferido o saneador-sentença de fls. 32-40, datado de 06/12/2017, a julgar os embargos totalmente improcedentes, determinando-se o prosseguimento da execução.
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Inconformados com tal decisão, os embargantes interpuseram recurso para o Tribunal da Relação do …, tendo sido proferido o acórdão de fls. 102 a 117, datado de 27/06/2018, a revogar a sentença recorrida, determinando-se o prosseguimento da execução apenas pelo montante das prestações que viessem a ser apuradas como vencidas e não pagas, acrescidas de juros a partir da citação. 6.
Desta feita, veio agora a exequente pedir revista, formulando as seguintes conclusões: 1.ª - O acórdão recorrido revogou a sentença da 1.ª instância, ordenando o prosseguimento da execução apenas pelo montante das prestações que se vier a apurar já estarem vencidas e não pagas, acrescidas de juros a partir da citação; 2.ª - A exequente AA, S.A., deu entrada da presente execução para a cobrança da quantia de € 42.933,43 contra os executados BB e CC, tendo invocado a outorga com os Executados, como fiadores e principais pagadores, dois contratos de mútuo com hipoteca sobre a fração autónoma designada pela letra "H" do bem imóvel descrito na Conservatória de Registo Predial de … sob o n.º 1151; 3.ª - O bem imóvel hipotecado foi adjudicado à exequente pela quantia de € 66.750,00, no âmbito do processo n.º 2272/12.9TBFLG, não tendo sido o produto da venda suficiente para liquidar as responsabilidades contratadas; 4.ª - A exequente juntou os dois contratos de mútuo com hipoteca e fiança, o auto de abertura de propostas no processo n.º 2272/12. 9TBFLG, e as duas notas de débito explicativas dos valores peticionados; 5.ª - Os executados BB e CC deduziram embargos com fundamento na iliquidez e na inexigibilidade da obrigação exequenda, tendo a Exequente, na sua contestação, explicitado os valores peticionados e invocado o vencimento antecipado dos empréstimos em virtude da venda judicial do bem imóvel garantido por hipoteca, para além de os Executados terem sido devidamente interpelados; 6.ª - Na 1.ª Instância, entendeu-se que, por um lado, a exequente indicou expressamente o cálculo aritmético que esteve na base dos valores peticionados e procedeu à sua discriminação e, por outro, que a Exequente procedeu à interpelação dos executados, para além da declaração de insolvência dos mutuários no âmbito do processo n.º 2272/12.9TBFLG-F; 7.ª - Por não concordarem com essa decisão, os executados BB e CC vieram apelar para a Relação do …, que revogou a sentença recorrida e ordenou o prosseguimento da execução apenas pelo montante das prestações que se vier a apurar já estarem vencidas e não pagas, acrescidas de juros a partir da citação; 8.ª - A Recorrente discorda do entendimento ali sufragado com fundamento na alegada inexigibilidade da obrigação exequenda quanto às prestações ainda não vencidas dos empréstimos peticionados nos autos; 9.ª - O tribunal “a quo” entende que a interpelação dos fiadores para a liquidação das prestações em dívida é um requisito obrigatório para a exigibilidade das restantes prestações, não vencidas, considerando que o artigo 781.º do CC não é aplicável aos garantes da obrigação, sendo que a missiva remetida a 16/07/2014 apenas interpela os executados, na qualidade de fiadores, para procederem ao pagamento do remanescente da dívida, não indicando quais as prestações em dívida e pedindo o respetivo pagamento; 10.ª - O Tribunal entende que os executados, na qualidade de fiadores, não foram interpelados para porem termo à mora, pelo que não tiveram a possibilidade de impedir o vencimento antecipado das prestações vincendas, pelo que a Exequente apenas pode exigir o pagamento das prestações vencidas e não pagas acrescidas dos respetivos juros moratórios a contar desde a data de citação; 11.ª - O Tribunal “a quo” não teve em consideração as disposições contratuais acordadas entre as partes, nomeadamente, entre a AA, S.A., enquanto mutuante, DD e EE, enquanto mutuários, e BB e CC, enquanto fiadores e principais pagadores; 12.ª - Nos termos do n.º 1 do art.º 627.º do CC, é fiador o terceiro que assegura com o seu património o cumprimento de obrigação alheia, ficando pessoalmente responsável perante o respetivo credor; 13.ª - A fiança tem o conteúdo da obrigação principal pelo que se molda pela obrigação do devedor principal e abrange tudo aquilo a que ele está obrigado nos termos dos artigos 631.º e 634.º do CC; 14.ª - Uma das exceções ao artigo 634.º do CC é a perda do benefício do prazo, uma vez que, de acordo com o artigo 782.º do CC, a mesma não se estende aos coobrigados do devedor, nem a terceiro que a favor do crédito tenha constituído qualquer garantia; 15.ª - A perda do benefício do prazo encontra-se expressamente contemplada nos artigos 780.º e 781.º do CC, sendo que, neste último artigo, encontra-se previsto o respetivo regime jurídico para a divida liquidável em prestações; 16.ª – No caso em apreço, estamos perante...
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Acórdão nº 3646/18.7T8GMR-C.G1 de Tribunal da Relação de Guimarães, 03 de Outubro de 2019
...é extensível ao fiador nos termos da norma supletiva do artigo 782.º (cfr. neste sentido o Ac. STJ de 6-12-2018, proferido no proc. 4739/16.0T8LOU-A.P1.S1, publicado no site da Nesta senda, já o Ac. STJ de 19-01-2016, proc. n.º 1453/12.0TBGDM-B.P1.S1, também publicado no site da dgsi, defen......
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Acórdão nº 1275/17.1T8ENT-B-E1 de Tribunal da Relação de Évora, 30 de Janeiro de 2020
...963/13.6TBVRS-A.E1, in www.dgsi.pt, também citado na decisão recorrida. [5] Cfr., inter alia, o acórdão do STJ de 06.12.2018, proc. 4739/16.0T8LOU-A.P1.S1, in [6] Cfr. o Acórdão desta Relação de 21.12.2017, citado na nota anterior. [7] Vide conclusão 29. [8] Cfr. o Acórdão do STJ de 11.07.2......
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