Acórdão nº 41/12.5YUSTR.L1-E de Supremo Tribunal de Justiça (Portugal), 08 de Março de 2018
Magistrado Responsável | SOUTO DE MOURA |
Data da Resolução | 08 de Março de 2018 |
Emissor | Supremo Tribunal de Justiça (Portugal) |
AA, BB e CC, arguidos devidamente identificados nos autos em epígrafe, interpuseram recurso extraordinário para fixação de jurisprudência, ao abrigo do art. 437º, nº 2, 3, 4 e 5 e 438º, nº 1 e 2, ambos do CPP, afirmando a oposição entre o acórdão recorrido, do Tribunal da Relação de Lisboa, proferido a 10/3/2016 nos autos em epígrafe, e o acórdão de 15/12/2015 do Tribunal da Relação de Évora, proferido no Pº 468/09.0GDSTB.E1, que assim se considera acórdão fundamento.
Adianta o recorrente, que a questão sobre que se considera haver oposição reside na consequência a tirar, do facto de a leitura da sentença ser feita por súmula em audiência, mas o seu depósito na Secretaria ser muito posterior. Designadamente, sobre se se está perante uma mera irregularidade ou perante a inexistência da própria sentença.
A – RECURSO 1. Depois de se pronunciarem no sentido da tempestividade do recurso, face ao trânsito em julgado do acórdão ora recorrido só a 13/1/2017, se bem que lavrado a 10/3/2016, os recorrentes identificam este acórdão recorrido, do Tribunal da Relação de Lisboa, constante de fls. 38 770 a 41 139, que negou provimento à pretensão de se considerar inexistente, a sentença do Tribunal da Concorrência, Regulação e Supervisão, “lida” a 21/10/2014 e depositada a 7/9/2015.
Indicaram os recorrentes como acórdão fundamento, como já se disse, o acórdão de 15/12/2015, do Tribunal da Relação de Évora, proferido no Pº 468/09.0GDSTB.E1, e também devidamente transitado em julgado. Aí, a seu ver, foi apreciada a mesma questão de direito: “o [des]valor jurídico – e consequente inexistência – de sentença depositada em momento consideravelmente posterior ao da sua leitura” (fls. 3).
Depois de proceder à transcrição das passagens dos dois arestos que consideraram relevantes para o caso, os recorrentes analisaram o “C. (DES)VALOR JURÍDICO DE SENTENÇA DEPOSITADA EM MOMENTO CONSIDERAVELMENTE POSTERIOR AO DA SUA LEITURA PÚBLICA Verifica-se, assim, relativamente aos Acórdãos em oposição, que o quadro factual relevante para a questão de direito aqui em causa é de manifesta identidade, porquanto tanto no Acórdão Recorrido, como no Acórdão Fundamento, foi lida publicamente a respetiva “sentença” em determinado dia, e o seu depósito ocorreu em momento consideravelmente posterior, em clara violação do disposto no n.º 5 do artigo 372.º do CPP, o qual estabelece que «Logo após a leitura da sentença, o presidente procede ao seu depósito na secretaria».
Recorde-se que no caso do Acórdão Recorrido, a “sentença” foi lida publicamente a 21 de outubro de 2014 e depositada apenas em 7 de setembro de 2015, e no caso do Acórdão Fundamento, a “sentença” foi lida publicamente a 3 de julho de 2013 e depositada apenas a 28 de maio de 2015.
Ou seja, no primeiro caso, quase um ano depois, e no segundo, quase dois anos depois (!).
Ademais, em ambos os casos, não houve uma leitura integral da (suposta) sentença, sendo que no caso do Acórdão Recorrido, a fundamentação da sentença foi assumidamente lida por súmula, o mesmo sucedendo no caso do Acórdão Fundamento.
Note-se que os Acórdãos aqui em causa, que originaram o conflito de jurisprudência, foram proferidos no domínio da mesma legislação, porquanto durante o intervalo da sua prolação, não ocorreu qualquer modificação legislativa que haja interferido, direta ou indiretamente, na resolução da questão de direito controvertida.
A questão de direito, relativamente à qual se requer uma decisão uniforme, é, pois, a de saber qual o (des)valor jurídico de sentença depositada em momento consideravelmente posterior (maxime, meses depois) ao da sua leitura pública.
Entendeu-se no Acórdão Recorrido que a (in)existência jurídica da sentença não está dependente do respetivo depósito na secretaria – se bem que também se refere nesse Acórdão que «No caso dos autos, estamos assim perante uma situação absolutamente diversa daquelas em que os nossos tribunais declararam a inexistência jurídica de sentenças, por as mesmas, apesar de lidas, jamais terem sido depositadas», o que manifestamente contradiz a afirmação anterior (!) – e que a circunstância de o depósito da sentença na secretaria apenas ter ocorrido volvidos quase 11 meses sobre a leitura da sentença constitui «sem sombra de dúvida, uma irregularidade», e não um caso de inexistência de sentença.
Em sentido diametralmente oposto, entendeu-se no Acórdão Fundamento ser evidente que a sentença é inexistente até ao seu depósito e que a sentença em apreço naqueles autos não existia na data em que foi lida, pois que se existisse poderia ter sido depositada em momento subsequente ao da sua leitura, e não em momento largamente posterior como realmente sucedeu.
Ou seja, e conforme se explica neste Acórdão (Fundamento), atenta a circunstância de a sentença aí em questão apenas ter sido depositada em 28 de maio de 2015, forçosa se torna a conclusão de que no dia 3 de julho de 2013 foi publicamente lido algo que não pode ser considerado uma sentença, sendo esta, por conseguinte, inexistente.
Exposto, assim, o conflito de jurisprudência de Tribunais da Relação, deverá ser proferida decisão que uniformize tal jurisprudência no que concerne à determinação do concreto (des)valor de sentença depositada em momento consideravelmente posterior ao da sua leitura pública, em violação do disposto no n.º 5 do artigo 372.º do CPP.” Os arguidos juntaram cópia do acórdão fundamento.
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O Mº Pº respondeu e concluiu: “1- O Acórdão Recorrido e o Acórdão Fundamento não se pronunciam sobre a mesma situação de facto, e como tal, não estamos perante dois acórdãos que, relativamente à mesma questão de direito, assentem em soluções opostas.
2 - Não se verifica, assim, a oposição de julgados pretendida pelo Recorrente.
3 - As questões formuladas pelos Recorrentes e que segundo eles consubstanciam a oposição do Acórdão Recorrido e do Acórdão Fundamento são apenas interpretações que os Recorrentes fazem do Acórdão Fundamento, não se tratando, pois, manifestamente, de soluções expressas constantes do referido Acórdão fundamento que porventura fossem opostas a soluções expressas constantes do Acórdão recorrido.
4- Termos em que se tem de concluir pela não verificação dos requisitos legais previstos no art.º 437° do C. de Processo Penal, por não estarmos perante dois Acórdãos que, relativamente à mesma questão de direito, assentem em soluções opostas.
5- O que constitui causa de rejeição do recurso, por inadmissibilidade legal, nos termos dos arts.ºs 414° n.º 2 e 420.º n.° 1 aI. b). do C. de Processo Penal.” 3. O recorrido Banco de Portugal também se pronunciou dizendo: “(…) 1. Nos termos do disposto no artigo 438.°. n.º 1. do Código de Processo Penal, aqui aplicável, o recurso para uniformização de jurisprudência deve ser interposto no prazo de 30 dias a contar do trânsito em julgado do acórdão proferido em último lugar; e de acordo com o artigo 628.° do Código de Processo Civil, a decisão considera-se transitada em julgado logo que não seja passível de recurso ordinário ou de reclamação.
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No caso presente, os Recorrentes arguiram, nomeadamente, diversas nulidades de que o douto acórdão recorrido, de 10 de março de 2016, padeceria, as quais foram desatendidas através de douto Acórdão desse Venerando Tribunal da Relação de Lisboa de 14 de abril seguinte.
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Deste segundo aresto interpuseram, é certo, recurso para o Tribunal Constitucional e para o Supremo Tribunal de Justiça; 4. e não tendo os referidos recursos sido admitidos por esse Venerando Tribunal da Relação — como bem se decidiu em 23 de maio. 8 e 14 de junho de 2016—, reclamaram dessa não admissão junto do Supremo Tribunal de Justiça e do Tribunal Constitucional.
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As reclamações quanto à inadmissibilidade do recurso interposto junto do Tribunal Constitucional foram, porém, desatendidas em 19 de outubro de 2016 pelo Venerando Supremo Tribunal de justiça e em 20 de dezembro de 2016 pelo Venerando Tribunal Constitucional — sendo esta última data, por mais “conveniente”, aquela que os Recorrentes naturalmente elegem para balizar a definitividade do acórdão impugnado e, desse modo, alicerçar a oportunidade do recurso.
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Salvo, porém, melhor entendimento, as contas dos Recorrentes não se encontram bem feitas, tendo o acórdão recorrido transitado em julgado em momento muito anterior, do que se segue a intempestividade dos presentes recursos.
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Com efeito, as pretensas nulidades do acórdão recorrido foram definitivamente decididas em 14 de abril de 2016, pelo que, sendo manifestamente infundados os recursos e reclamações subsequentes, o trânsito em julgado do douto acórdão sob censura ocorreu nesse més e ano.
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Pour cause, deveriam os Recorrentes ter apresentado o presente recurso, o mais tardar, até ao final do mês seguinte, o que não aconteceu.
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Consequentemente, os recursos interpostos em fevereiro de 2017 são extemporâneos.
Conforme decorre do disposto conjugadamente nos artigos 438.°. n.º 1. do Código de Processo Penal, 628°. 615.º n.º 4. e 617°. n.º 6. do Código de Processo Civil, aplicável subsidiariamente ex vi do artigo 448.° do diploma mencionado em primeiro lugar, e 75.° n.º 1 do Regime Geral das Contraordenações.
devendo, em conformidade...
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