Acórdão nº 18364/16.2T8LSB-A.L1.S2 de Supremo Tribunal de Justiça (Portugal), 06 de Novembro de 2018

Magistrado ResponsávelPEDRO DE LIMA GONÇALVES
Data da Resolução06 de Novembro de 2018
EmissorSupremo Tribunal de Justiça (Portugal)

Acordam na 1ª Secção do Supremo Tribunal de Justiça: I. Relatório 1.

AA intentou ação declarativa de condenação com processo comum, contra Banco BB, S.A., Banco de Portugal, CC, S.A., DD, CMVM – Comissão de Mercado de Valores Mobiliários e EE, pedindo: a) a condenação solidária destes no pagamento da quantia de €319 855,88 (trezentos e dezanove mil oitocentos e cinquenta e cinco euros e oitenta e oito cêntimos), acrescida dos juros vencidos e vincendos, perfazendo os primeiros €92 475,62 (noventa e dois mil quatrocentos e setenta e cinco euros e sessenta e dois cêntimos), a título de indemnização por danos emergentes da violação de deveres de informação, diligência e lealdade enquanto intermediários financeiros; ou, caso assim não se entenda b) a nulidade do contrato de intermediação financeira por inobservância de forma nos termos do art. 321.º do CVM e a consequente condenação solidária dos réus: (i) na restituição da quantia de €319 855,88 (trezentos e dezanove mil oitocentos e cinquenta e cinco euros e oitenta e oito cêntimos), (ii) acrescida de €92 475,62 (noventa e dois mil quatrocentos e setenta e cinco euros e sessenta e dois cêntimos) a título de juros vencidos à taxa legal desde a data da utilização ilícita das quantias monetárias em causa, (iii) bem como dos juros vincendos desde a citação até integral pagamento; e ainda a c) condenação solidária dos réus no pagamento de indemnização por danos não patrimoniais a apurar em liquidação de sentença.

  1. Citados, os Réus vieram contestar.

    O Réu Banco BB, S.A. (...) – neste recurso só importa a defesa deste Réu - defendeu-se, no que ora releva, por exceção, invocando que, tendo sido revogada a autorização para o exercício da sua atividade, por deliberação do BCE, com efeitos a partir das 19 horas do dia 13 de julho de 2016, a declaração de insolvência associada ao processo de liquidação judicial implica a inutilidade da lide e que, mesmo que se entenda que não há fundamento para a extinção imediata da instância, deve a mesma ser suspensa até que a decisão do BCE se torne definitiva.

  2. Por decisão de 21/02/2017 (fls.115 destes autos de recurso) foi decretada a extinção da instância, por inutilidade superveniente da lide, quanto ao réu FF, por se ter considerado que, produzindo a decisão do BCE – que retirou ao FF a autorização para o exercício da atividade de instituição de crédito – os efeitos da declaração da insolvência e sendo tal decisão definitiva, a ação tinha ficado impossibilitada de alcançar o seu efeito útil normal face à doutrina do AUJ do STJ de 08-05-2013.

  3. Inconformado com esta decisão, o Autor interpôs recurso de apelação.

  4. O Tribunal da Relação de Lisboa veio a julgar improcedente a apelação, confirmando a decisão recorrida.

  5. Inconformado com tal decisão, o Autor/Apelante veio interpor recurso de revista “excecional”, que foi admitida pela Formação de Juízes a que alude o nº3 do artigo 672º do Código de Processo Civil, formulando as seguintes (transcritas) conclusões: 1ª. Entende o Recorrente subsistir, no Douto Acórdão proferido pelo Tribunal da Relação de Lisboa, um erro de interpretação e de aplicação de lei processual, concretamente, do disposto na alínea e), do artigo 277°, do Código de Processo Civil, já que não se verifica a inutilidade superveniente da lide, quanto ao Réu, ora Recorrido FF, por duas ordens de razão: 2ª. Em primeiro lugar, porque o pedido da presente ação declarativa não tem índole exclusivamente patrimonial, uma vez que o Recorrente de entre outras questões trouxe à colação a questão da nulidade do contrato de intermediação financeira, pedindo em consequência a indemnização que por essa causa lhe entende ser devida.

    1. O Tribunal de Primeira Instância responsável pelo processo de insolvência do Réu, ora Recorrido FF, limitar-se-á a verificar e reconhecer créditos da insolvente, não lhe cabendo decidir sobre a constituição da obrigação de prestar.

    2. Resulta do Acórdão Fundamento do Tribunal da Relação de Évora de 29.01.2015 que “Por causa da pendência de processo de insolvência não tem que ser julgada extinta uma acção que não visa a declaração de qualquer direito de crédito, mas em que se pede que sejam declarados nulos ou resolvidos os negócios jurídicos celebrados entre as partes, ou seja, em que só estão em causa efeitos reais inerentes à nulidade/resolução/anulação peticionados.

      ".

    3. Assim, discutindo-se a nulidade de negócios jurídicos celebrado entre as partes, a insolvência não determina a inutilidade superveniente da lide declarativa, ao contrário do decidido no Acórdão sub judice.

    4. Em segundo lugar, no despacho de prosseguimento nos termos do artigo 9° do DL 199/2006 aquele Tribunal de Primeira Instância responsável pelo processo de liquidação judicial do Recorrido FF não declarou aberto o incidente de qualificação de insolvência, e tal significa, então, que ainda não é possível determinar se o património do devedor insolvente será suficiente para responder aos créditos reclamados.

    5. Resulta do Acórdão Fundamento do Tribunal da Relação do Porto de 15-04-2013 que: “A declaração de insolvência do empregador não conduz de imediato à inutilidade superveniente da lide da acção declarativa proposta pelo trabalhador quando na sentença de declaração de insolvência foi declarado aberto o incidente de qualificação da insolvência com carácter limitado e não veio a ser requerida a complementação da sentença." 8ª. Assim, não se encontrando aberto o incidente de qualificação da insolvência não se poderá concluir pela imediata inutilidade superveniente da lide e, em consequência, não será de absolver o Recorrido da instância declarativa, ao contrário do perfilhado no Acórdão em recurso.

    6. Não está, assim, em causa a aplicação do entendimento sufragado no Acórdão de Uniforrnização de Jurisprudência [AUJ] nº1/2014 [publicado no DR 1a Série, n° 39 de 25 de Fevereiro de 2014], que serviu de base à decisão em apreço, já que o mesmo teve na base da sua construção e substância os casos em que seja "Certificado o trânsito em julgado da sentença declaratória e declarado aberto o incidente de qualificação da insolvência com carácter pleno e fixado o prazo para reclamação de créditos.

      ", e tal como consta da proposta da Exma. Procuradora Geral Adjunta, transcrita naquele documento.

    7. Assim, ao declarar a inutilidade superveniente da lide e, em consequência, absolver o Recorrido FF da instância, quando se tratava de apreciar também, mas não só, a nulidade de negócio jurídico e não tendo sido, ainda, aberto incidente de qualificação da insolvência, violou o Acórdão em apreço, a lei processual vertida na alínea e) do artigo 277.

      0 do Código de Processo Civil.

    8. Tal demonstra, também no caso em apreço, a utilidade do prosseguimento da presente demanda para o Autor, que poderá pela mesma obter título do seu direito de crédito invocado, e só assim se garantindo o acesso do mesmo à defesa dos seus direitos e interesses legalmente protegidos (constitucionalmente protegidos - artigo 20° da CRP).

    9. Encontram-se reunidos os pressupostos da revista, designadamente, a relevância jurídica da questão, necessária para uma melhor aplicação do direito, revelando-se essencial determinar o sentido e alcance com que deve ser interpretado e aplicado o disposto na alínea e) do artigo 277º. do Código de Processo Civil em situações de insolvência e idênticas, bem como a interpretação dada ao Acórdão Uniformizador de Jurisprudência nº. 1/2014 de 25 de Fevereiro.

    10. Os interesses em causa são de particular relevância social, estando em causa a confiança no sistema bancário com todo o alarme social que os recentes acontecimentos têm causado.

    11. O Acórdão sindicado encontra-se em contradição com O Acórdão Fundamento proferido pelo Tribunal da Relação de Évora de 29/01/2015 porquanto decidiram diversamente a mesma questão de direito, a saber, num rnesmo contexto de insolvência ou situação equiparada, perante o pedido de declaração de nulidade de negócio jurídico, o Acórdão em apreço absolveu o Recorrido FF da instância por inutilidade superveniente da lide enquanto o Acórdão fundamento supra mencionado determinou o prosseguimento dos autos.

    12. No que respeita ao Acórdão Fundamento do Tribunal da Relação do Porto, de 15/04/2013, verifica-se um tratamento jurídico diferente dado à situação jurídica de abertura de incidente de qualificação da insolvência, defendendo este Acórdão Fundamento que a declaração de insolvência não conduz de imediato à inutilidade superveniente da lide da ação declarativa quando a abertura do...

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